Curiosidades do reino animal – Crônica de Ronaldo Rodrigues

 

Crônica de Ronaldo Rodrigues

Assistir documentários sobre o reino animal sempre foi uma curtição pra mim. É um misto de aprendizado e diversão ficar entrdownload (7)e danças de acasalamento, demarcação de território e outras atrações. Eu gosto mesmo é de me deter nas curiosidades. Tipo as que se seguem:

– Ami é uma espécie de aranha que não tece. Isso mesmo, ela não tem o poder de produzir teia. Eu me pergunto como essa aranha deve se sentir. Na minha ignorância simplista, a única coisa que justifica o fato de uma aranha ser aranha, além de poder andar pelas paredes, é a facupiranha vegetarianaldade de fazer teia. Imagino uma aranha dessas no psicanalista reclamando de sua sina e do bullying imposto pelas aranhas que produzem teia. Pra finalizar este tópico, leio num site sobre curiosidades animais que o material mais resistente criado pela natureza é a teia de aranha.

– Outro bicho que me chamou a atenção foi a piranha vegetariana. Fui acostumado a pensar em piranhas atacando bois e/ou pessoas ao menor sinal de sangue. Tometes camunani (este é o nome científico dadownload (6) espécie) vive na Amazônia e poderia muito bem ser adotada como mascote de alguma seita vegetariana.

– Muitos supersticiosos têm um pé de coelho como talismã. Não, esse tópico não foi visto em nenhum documentário. Veio da minha curiosidade sobre o lance. Dizem que pé de coelho dá a maior sorte. Sendo assim, por que o pé de coelho não deu sorte para o próprio. Se desse sorte, o coelho não teria perdido o pé, não é mesmo? E logo ele, que tinha quatro.images (9)

– Mosquitos causaram mais mortes que todas as guerras juntas. Foi o que li num site. E aproveito pra falar de uma curiosidade que tenho sobre mosquitos. O Aedes aegypti é o causador da dengue e agora de mais outras modalidades de doença. Creio que deveria ser estudada uma maneira de esse mosquito ser nosso aliado e não inimigo. Se um bichinho daquele tamanho carrega um veneno que pode derrubar uma pessoa de mais de 100 quilos, imagine esse poder todo a nosso favor, usado para o bem! Caso a se pensar, cientistas.

– Bicho gozad12576163_10201189381094199_834523491_nor: o orgasmo do porco dura 30 minutos, é o que diz outro site de curiosidades animais. Coloquei aqui pelo fato de sexo ser algo que atrai muita curiosidade.

– O filhote da girafa tem 15 minutos pra nascer, se levantar, aprender a andar e sair correndo pra fora do raio de ação da leoa.12625667_10201189379534160_1156240878_n

– Nessa minha breve pesquisa sobre o mundo animal, li num site o que eu já sabia, mas é bom ressaltar aqui, para reabilitar esse bicho tão engraçado. Saiba que não passa de mito a história de que o avestruz é um animal covarde que, em vez de enfrentar suas crises, prefere enfiar a cabeça num buraco. Pois é. Isso é mais próprio do ser humano do que do avestruz, que, além de tudo, tem um coice poderosíssimo.12596500_10201189379094149_590106409_n

Comentei essas curiosidades com alguns amigos, que também poderiam constar em pesquisas sobre animais estranhos, e saíram algumas considerações. Tipo esta: a maioria dos animais sabe nadar. Já nasce sabendo, é algo natural. O ser humano, que se acha o mais esperto de todos, o bam-bam-bam, tem que passar por uma fase de aprendizado. E mesmo depois de ter ficado a maior parte da vida uterina nadando, tem muita gente que não aprende nunca depois que nasce.

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Pensou-se em outras curiosidades, mas a maioria já estava beirando a insanidade, como o peixe que não sabe nadar, o gambá cheiroso, uma espécie de flor carnívora a ser chamada de violeta violenta, a girafa de pescoço curto e por aí afora. Mas é melhor ficar por aqui, prometendo aprofundar esse tema e desenvolver mais crônicas sobre ele. E pra terminar, arrisco uma tese não comprovada, que pode muito bem ser encontrada em algum site ou documentário sobre curiosidades do mundo animal: o homem é o único animal que escreve crônicas.

Um santo na minha infância – Crônica de Ronaldo Rodrigues

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Crônica de Ronaldo Rodrigues

Eu conheci um santo. Ele se aproximava de nós e imediatamente a paz se fazia. Ele passava sem nada dizer. Simplesmente passava. Nós continuávamos a brincar, na maior tranquilidade.

Um dia o santo foi acusado de sei lá o quê. Como criança, eu não podia me inteirar do acontecido. Só sei que parte da cidade virou a cara para ele. Até tentativas de linchamento ele sofreu. E não dizia nada em sua defesa.

Em casa, a conversa sobre o fato era velada. Mamãe pedia para papai não comentar nada diante de nós, as crianças da casa. Mas aqui e ali se pegava pedaços de conversa.

Um dia acordamos com a notícia que o santo seria executado. Tinha pena de morte na minha cidade? Pelo jeito, sim. Talvez tenha sido instaurada só para o caso do santo. A parte da cidade que acreditava na santidade do santo fez o maior barulho: protestos, passeatas, manifestações violentas. Teve gente que fez até greve de fome. A outra parte da cidade, a que queria a condenação do santo, fez festa o dia todo, estourou foguetes, fez churrasco, cantou e dançou até a hora da execução.

Ninguém nunca soube mesmo se ele era santo. Para mim era. Só com aquela passada que deixava a gente sem pensar em briga. Agora, depois de 30 anos de sua morte, ao passar pela cidadezinha que deixei aos doze anos, o túmulo do santo continua visitado diariamente. A sepultura está sempre com flores novas. E os descendentes da parcela da cidade que festejou sua morte juram que ele é santo mesmo. E faz cada milagre!

Ronaldo Rodrigues

Menina Legal – Crônica de Ronaldo Rodrigues

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Crônica de Ronaldo Rodrigues

Dentro do olho plantei um grão de areia, um cisco que deixei ficar no cantinho do olho, de propósito. De tanto regar esse grão de areia com lágrimas e gotas de chuva, ele foi se transformando em duna. Depois de alguns meses, já era uma praia completa, com coqueiros & conchinhas.

Passei a levar essa praia para todo lugar que ia. Quando me encontrava de folga, invocava o sol e convocava Menina Legal para curtir essa praia. Dava uma esfregadela no olho, muito lentamente, para não irritar a paisagem, e deixava cair uma cascata de areia branquinha, que ia se estendendo pelo chão, feito um tapete. Aí, eu deitava & rolava com MeninaLegal, nos bronzeando nus do umbigo pra cima e completamente pelados do umbigo pra baixo.

Quando a tarde caía, colocava o outro lado da lua na vitrola, respirando música misturada ao som da blusa estendida no varal. MeninaLegal olhava longamente/farolmente para o horizonte e deixava o barquinho de papel navegargalhar sobre a ponte do infinito, atravessando um puríssimo azul, resto do dia que ia e promessa da noite que chegava. O coração pegava carona no barquinho de papel e alçava voo de gaivota sobre os edifícios cinzentos da Avenida Crepuscular. Deixava cair uma clave de sol no mar. Mostrava ao trânsito engarrafado a saída do labirinto urbano. Devolvia à Cidadela do Carnaval o despertar da folia. A fauna & a flora dos bares & becos ecoavam na TV seu grito de fera.

Na manhã seguinte, o paraíso se dissipava. MeninaLegal colocava uma flor verdemelha no longo cabelo e ia embora, trabalhar de fada encantada de feira de artesanato. À noite, passava um batom lilás e assumia sua identidade secreta: esposa de executivo com golpe armado pra cima do marido.

Solitário, só me restava recolher ao olho minha praia portátil, distribuir meus últimos dólares entre os cachorrorosos bêbados do boulevard e seguir para a Caverna Central, em busca de um drops de dicionário antigo. Só assim eu conseguiria entender o significado da minha dor e talvez falar a linguagem dos ratos da Biblioteca de Alexandria.

Ano novo de novo – Crônica de Ronaldo Rodrigues

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Crônica de Ronaldo Rodrigues

Fiz uma confraternização com meu parceiro de todas as horas, o cartunista Ronaldo Rony, e na ocasião aproveitei para ficar sabendo de alguns de seus projetos para este ano. Como ele me fez jurar que eu não iria contar nada pra ninguém, aqui estou cumprindo a promessa. Lá vai:

– 50
O cara vai completar meio século de existência. Os planos são muitos: aproveitar as festas de início de ano e ficar bebendo até o dia do aniversário, 17 de janeiro; publicar um fanzine comemorativo dos 50 aninhos; montar uma exposição retrospectiva. Este último projeto tem menos possibilidade de ocorrer, já que no ano passado foi realizada a exposição 50 menos 1, que já anunciava este momento do cinquentenário e abria a Galeria Ronaldo Rony, no Espaço Caos.

– A Revista do Capitão Açaí
Sim, senhoras e senhores fãs do atrapalhado super-herói amazônico. O Capitão Açaí vai atingir um patamar mais, digamos assim, profissional, e ser digitalizado, colorizado e impresso em gráfica. A estreia está pensada já para este mês, começando o ano com a força devastadora do açaí. A revista terá espaço também para outros personagens do Ronaldo Rony. Além da revista, será intensificada a produção de camisas com estampas do Capitão. Será que desta vez o Capitão Açaí cumprirá a sua principal missão: tirar o seu criador do miserê? É o que veremos!

– Alice no País das Olimpíadas
Uma personagem criada para tirar onda das Olimpíadas que serão realizadas no Rio de Janeiro. Alice vai aparecer na página do Facebook do cartunista e em fanzine. Alice é uma menina da Guiana Francesa deslumbrada com as Olimpíadas. Ela vai para o Rio e passa por algumas situações que supõe estarem dentro da normalidade, mas que representam perigo para ela, como achar que tiroteios são fogos de artifício saudando os atletas, um arrastão é uma equipe de maratonistas treinando, e por aí vai. O cartunista não quer, com essas situações, que se forme um retrato um tanto negativo do Rio de Janeiro e que os cariocas possam ficar chateados. Nós, do lado de cima do mapa do Brasil, somos tão sacaneados pelos do Sul/Sudeste que uma vingançazinha boba não vai causar incidente diplomático ou outro trauma qualquer, não é mesmo? E o Ronaldo Rony diz que é um grande torcedor pelo sucesso do Brasil na realização do maior evento esportivo do mundo. Então nada de interpretações errôneas, certo?

Então são esses os planos do Ronaldo Rony para 2016, mas ele pediu segredo. Não vão contar pra ninguém, hein! Quanto aos meus planos, continuar escrevendo para este blog e ter, junto com todos vocês, um Feliz Ano Novo Todo Dia! Saúde!

Microcontos de Ronaldo Rodrigues

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BUROCRACIA É O FIM

– Vim falar com Deus.
– Tem hora marcada?

MUDARAM AS ESTAÇÕES
No outono, no inverno,
minha prima Vera vira verão.

BLÁ-BLÁ-BLÁ
Quando faltar assunto, fique em silêncio.

CUIDADO – FRÁGIL
Quebrei meus olhos nas plumas do caminho.

BALA PERDIDA NÃO EXISTE
Todo coração tem endereço fixo.

MATOU A SAUDADE
Deu um tiro no peito.

GANGORRA
– Olha como eu toco no chão!
– Olha como eu toco no céu!

BASEADO BLUES
Fumaça colorida no ar de Barcelona.

FOLHA DE PAPEL A ME DESAFIAR
Te risco.
Me arrisco.

NO PAÍS DO CARNAVAL
Na quarta-feira, deparou com as cinzas do pierrô.

PÁSSARO NA GAIOLA
Só a ilusão conseguiu fugir.

ME DEIXASTE!
Me vingo te amando mais.

EM BRANCAS NUVENS
Lá vai a vida assim
sem saber se foi bom ou ruim.

MUDARAM AS ESTAÇÕES
A flor e a folha mudaram de ramo

MINHA VIDA É UM MAR DE ROSAS
Disse Elvira se afogando mais uma vez.

ONANISMO
(ou está tudo acabado entre nós)
Ao deceparem minhas mãos
dissolveram meu harém.

CAPITÃO GANCHO TAMBÉM AMA
Numa dessas ainda leva Sininho pro navio.

E SE EU ESCALASSE ESSA MONTANHA?
Pensou a aranha pouco antes de aceitar a missão.

AI, MEU FÍGADO…
Você ainda me mata do coração!

QUERIDO DIÁRIO
Vou rasgar-te, queimar-te, perder-te…
Apagar-me.

MEMORANDO DE DEUS PARA LÚCIFER
Considere-se demitido!

ORELHÃO QUEBRADO NO MEIO DA MADRUGADA
– Caraaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaalho!

OVERDOSE
Depois do pó
o pós.

BANDA SEM FUTURO
Aqui jazz
(esta teve colaboração de Marconi Lima)

A FLOR
Despetala para despertá-la.

COM A MORTE
– Enfim, sós…

MINHA VIDA É UM MAR DE ROSAS
Disse Elvira se afogando mais uma vez.

ONANISMO
(ou está tudo acabado entre nós)
Ao deceparem minhas mãos
dissolveram meu harém.

CAPITÃO GANCHO TAMBÉM AMA
Numa dessas ainda leva Sininho pro navio.

E SE EU ESCALASSE ESSA MONTANHA?
Pensou a aranha pouco antes de aceitar a missão.

AI, MEU FÍGADO…
Você ainda me mata do coração!

QUERIDO DIÁRIO
Vou rasgar-te, queimar-te, perder-te…
Apagar-me.

MEMORANDO DE DEUS PARA LÚCIFER
Considere-se demitido!

ORELHÃO QUEBRADO NO MEIO DA MADRUGADA
– Caraaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaalho!

OVERDOSE
Depois do pó
o pós.

BANDA SEM FUTURO
Aqui jazz
(esta teve colaboração de Marconi Lima)

A FLOR
Despetala para despertá-la.

COM A MORTE
– Enfim, sós…

Ronaldo Rodrigues

Muro branco – Conto de Ronaldo Rodrigues

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Conto de Ronaldo Rodrigues

“Ninguém vai me proibir de escrever uma mensagem neste muro”. Foi o que pensou, vendo aquele muro de brancura imaculada. O muro chamava mais atenção porque era uma ilha em meio a um oceano de muros pichados, desenhados, pintados, enlameados, carcomidos, vandalizados.

Ele nunca havia escrito ou desenhado nada em muro algum da cidade. Nunca tinha passado isso pela sua cabeça. Nem pensava em encontrar um muro como aquele, virgem de qualquer intervenção.

Ele sempre tivera um olhar de repulsa para a maioria dos muros pintados. Via aquelas figuras e letras apenas como simples vandalismo, como a maioria das pessoas via. Mas ficava maravilhado quando, raramente, se deparava com uma manifestação genuína de arte.

Tudo isso, passando vertiginosamente pela sua cabeça, o instigou a deixar sua impressão, sua expressão, sua marca naquele muro. Claro que, devido ao seu pouco conhecimento do universo dos grafiteiros, não trazia nenhum equipamento apropriado. Ele só intuía que precisava ser rápido, pois ouvia falar de alguns casos de perseguição policial e mesmo os grafiteiros não deixariam aquele muro ficar incólume por muito tempo.

Procurou na sua bolsa algo com o que escrever, mas nada do que encontrou, lápis e canetas, iria se destacar naquela superfície. Precisava de algo bem maior e encontrou o ideal para aquela missão: uma lata de spray jogada no chão, que ele não tinha notado até o momento em que começou a bater aquela inusitada vontade de grafitar.

Achou meio estranho aquela lata aparecer ali, mas não ligou para o fato. Pegou a lata e partiu para o muro branco, certo de que aconteceriam duas coisas inéditas: ele faria a sua primeira grafitagem e aquele muro receberia a primeira carga de spray de sua existência.

Quando ele apertou o pino que disparava a tinta, aconteceu o inverso do que esperava. A tinta que saía do spray, que também era branca, não atingia o muro e, sim, o nosso grafiteiro de primeira viagem. No momento seguinte, o muro passou a se movimentar em torno do grafiteiro, envolvendo-o numa dança louca, deixando-o entre maravilhado e aterrorizado, com seu corpo se misturando ao cimento e aos tijolos do muro e se diluindo em meio àquela brancura.

Em pouco tempo, depois que o grafiteiro despareceu, o muro assumiu sua posição inicial e continuou ali, esperando mais alguém disposto a devassar sua impenetrável brancura.

CAPTARAM A ESSÊNCIA

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Por Ronaldo Rodrigues

No presépio da casa de uma das minhas irmãs, que foi a base da festa da família toda, armaram um presépio que contém estes dois itens: uma máquina de costura e uma kombi. Representam minha mãe, que era costureira competentíssima (eu digo que era estilista, já que, além de costurar, ela fazia a criação de muitas das peças) e meu pai, que era motorista também supercompetente, que tinha um paixão por kombi (fusca também) e, de tanto mexer nos carros que estiveram ao seu alcance na vida, chegou a ser um grande mecânico.

Falei que os dois eram competentes no que faziam e creio que essa é uma herança que eles deixaram pra nós. Eu me sinto alguém competente no que faço e penso isso também dos meus irmão. Honestidade foi outro legado deles.

Obrigado, mãe, pai, irmãos, a linda família que somos e a família que se formou depois.

Feliz Natal!

QUE É QUE HÁ, VELHINHO? – (Ronaldo Rodrigues & Ronaldo Rony entrevistam Papai Noel)

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Foi difícil descolar esta entrevista. Todos sabem que Papai Noel é cheio de compromissos, só perde mesmo para o Pelé. Conseguimos um tempo em sua apertada agenda, graças à nossa influência e (o que realmente influenciou) à injeção de capital que fomos obrigados a fazer na conta bancária do bom velhinho. Entre uma audiência com o Obama e uma partida de pôquer com os dirigentes da Al-Qaeda, Papai Noel concedeu a entrevista, estipulando o prazo de três minutos, porque o superstar não tem saco para entrevistas longas. Ele mostra, num estilo bem Dercy Gonçalves, que não é tão bom e nem tão velhinho assim.

Como é a rotina do Papai Noel?

Sacrificante, estressante! Coordeno toda a produção de brinquedos, trato da distribuição e organizo a correspondência. Escalo meus clones e faço o roteiro de entrega. E você sabe que meu campo de atuação é o mundo todo, pelo menos o primeiro mundo. E ainda tenho que fazer a entrega pessoalmente para filhos de reis, presidentes e primeiros-ministros. Ufa!! É uma canseira! E como eu sou um bom velhinho, não posso falar um palavrão sequer. Às vezes deixo escapar algo como: Caralho! Aí os funcionários me lançam aquele olhar de reprovação. Eu respiro fundo e grito: Foda-se! Só em pensamento, é lógico!

E quanto às denúncias de que o senhor explora o trabalho infantil?

Tudo intriga. Apesar do tamanho, meus anões são todos, como diz o pessoal por aí, “de maior”. E de vez em quando pago uma rodada de cerveja pra eles, descolo umas mulheres gostosas, umas drogas maneiras e tal. Faço umas farras muito loucas. Pra falar a verdade, eu é que sou explorado por esses filhos-da-puta escrotos. Se eles se sentem explorados, que procurem o tribunal de pequenas calças.

E as renas?papai-noel-malvado

Que é que tem as renas? Não me venha com aquele papo fodido de que eu assedio sexualmente as renas. Isso já rendeu! Já fui processado por uma rena safada dessas. Agora, estou movendo uma ação contra o sindicato delas por evasão de rena.

Quem merece receber presente este ano?

O advogado do Fluminense. Esse é mais influente do que o Sarney. E não vamos esquecer o Mário.

Que Mário?

Aquele que te pegou atrás do armário! Rô! Rô! Rô! Você ainda cai nessa, otário? Rô! Rô! Rô! Então pega aqui pra não cair mais! Rô! Rô! Rô!

Engraçadinho! Quem vai ficar sem presente este ano?

Os vândalos que se infiltraram nas passeatas e tentaram sujar o movimento.

O senhor tem posições políticas?

Claro! Você acha que, só porque sou um produto do capitalismo, tenho que ser alienado? Te liga, meu!

O senhor acredita no senhor?1PapaiNoelPunk

Acredito em mim, em ET, em Saci Pererê, em gnomo e no Rubinho Barrichello. Sacanagem, cara! Vê lá se na idade em que estou eu vou acreditar em qualquer coisa nessa porra! E essa história de Natal já tá me enchendo o saco!

Quais as maiores dificuldades que o senhor encontra?

Além de ficar respondendo perguntas idiotas de repórteres imbecis, a maior dificuldade é visitar um país tropical como este, com toda esta roupa. Eu quase morro de calor! E ainda tenho que aparecer sorrindo nas fotos! Carái, véi!

Por falar em roupa, quem criou esse seu modelito ridículo, hein?

Foi o mesmo estilista que bolou a cor da calcinha da tua mãe, seu sacana! Tenha mais respeito, seu merda! E acabou a entrevista! Vai tomar no…

(Nossos repórteres conseguiram desligar o microfone a tempo de manter intacta a imagem de doçura do Papai Noel).

50 TONS DE CINZA (de fumaça, em Macapá) – Ronaldo Rodrigues

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(Foto: Aline Paiva/G1)

Por Ronaldo Rodrigues

Quem mora em segundo andar, como eu (quem mora no térreo também), é só abrir a janela e olhar em volta. A cidade está cinza, vários tons de cinza.

Os pessimistas podem dizer que se trata de prenúncio do ano que está chegando.

Os otimistas podem imaginar que é neblina. Até que ficaria bem nesta época do ano. Mas é fumaça mesmo. Das queimadas no entorno de Macapá e mesmo dentro da cidade. Muita gente ainda mantém o hábito de queimar lixo na rua.

Fazer o quê? Eu fico aguardando, com a devida cautela, que a chuva que todo dia se anuncia resolva cair de vez. E lave nossos corpos e nossas consciências.

Amém.

Eu sei que vou te amar. (Crônica de Ronaldo Rodrigues)

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Crônica de Ronaldo Rodrigues

Eu sei que vou te amar, mas nem tanto assim. Estou me referindo a dinheiro. Começo a achar que a maioria das pessoas é que tem razão. Dinheiro é tudo. Já ouvi uma piada que diz que dinheiro não é tudo, existem também diamantes e propriedades e ouro etc. Dinheiro não traz felicidade. Espero um dia ter muito dinheiro a ponto de provar que essa teoria é fajuta. Também já ouvi esta outra piada: dinheiro não traz felicidade, manda buscar de avião.

Descobri que dou pouca importância a dinheiro, mas a necessidade de ganhá-lo é fundamental. Eu não gosto de dinheiro, mas o açougueiro, o dono do mercadinho, o meu senhorio adoram dinheiro. Então eu me sujeito a fazer essa coisa degradante que é trabalhar para sustentar essa corja.

Eu poderia estar roubando, matando, participando de altas jogadas em Brasília, mas não. Estou trabalhando honestamente para pagar as minhas contas e enriquecer o patrão. Às vezes vendendo a minha dignidade para manter-me digno. Já tentei me prostituir, mas ninguém ficou interessado.

Vou repetir uma velha piada, mas de minha autoria. Meu pai poderia ter deixado casas e terrenos e carros, mas preferiu deixar de herança uma coisa horrível chamada honestidade. Nunca vou perdoá-lo por isso. O pior é que honestidade nem dá para vender, ainda que seja um artigo raríssimo. Mas falando sério sobre honestidade, dignidade, probidade, altruísmo, essas coisas fora de moda, creio que um dia essas palavras e sentimentos farão a grande diferença neste mundo tão devotado ao consumo, à mesquinharia, ao sucesso a qualquer preço.10947577_10200141246771496_338687590_n

Continuando a choradeira por falta de merreca: deposito toda a minha esperança no Capitão Açaí, meu personagem mais conhecido. Adoraria que ele se transformasse num Snoopy da vida. Ou numa Mônica. Ainda espero que algum empresário frio e calculista, que pensa noite e dia em faturamento, me contrate só para criar histórias do Capitão Açaí e fazê-lo cumprir sua verdadeira missão: me tirar da merda. Já pensou eu me transformando num Mauricio de Souza do meio do mundo com o bolso cheio de dinheiro? Melhor nem pensar. Acho que vou morrer de overdose ou ter um coma alcoólico se algum dia colocar a mão num dinheiro muito alto.

Mas, como sou um cara otimista, vou continuando essa vidinha de empregado, funcionário, subalterno, assalariado, me sentindo muito feliz por ter um emprego num momento em que as vacas estão magras. Por falar nisso, acabo de tomar uma decisão: vou pedir demissão. Não, não! Tenho que resistir a essa ideia e ir enrolando, escrevendo esta crônica, até o fim do expediente e sair pra tomar umas cervejas. Nessas horas de bebedeira, a vida nem é tão escrota assim. Saúde pra nós!

Exemplo de dedicação

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Crônica de Ronaldo Rodrigues

Eu estava andando pra casa quando fui abordado por um sujeito que tremia muito. Ele tinha um revólver na mão direita. A mão esquerda comprimia contra o peito um fardo enrolado em pano branco que não identifiquei. Ele estava tão nervoso que não conseguia dizer o que queria. Tive que ajudá-lo:

– É um assalto! É isso que você está querendo dizer?
– Isso mesmo! É um assalto! Um assalto!

Tentei tranquilizá-lo:

– Tenha calma! Já fui assaltado por você antes. Faz uma semana. Você parecia bem mais sereno, seguro do que estava fazendo.

Ele olhou para os lados, vendo se vinha alguém, respirou fundo e retomou um pouco da calma que o caracterizava naquele tipo de profissão. Tudo bem que a situação de um assalto é algo que mexe com a gente, assaltante e assaltado, mas ele tinha estrada, conhecia bem o seu ofício. Eu procurava deixá-lo bem relaxado. Afinal, se desse merda, eu seria a parte mais vulnerável:

– Escuta, porque não sentamos um pouco e conversamos? O assalto está garantido. Vou lhe dar uma grana legal. Só quero que você fique frio.

Ele olhava pra mim, olhava para o fardo no colo, eu insistia:

– Alguma coisa está acontecendo de diferente. Esse seu nervosismo não é normal. Qual é o problema?

Ele ia responder, quando veio um som do fardo que carregava. Eu jurei que era choro de criança pequena. E era:

– Você tem um bebê aí no colo?

Aí ele começou a chorar também, mais alto do que o bebê. Eu continuei a minha tentativa de ajudar:

– Deixa eu pegar o seu revólver. Aí você fica com as mãos livres pra cuidar do bebê.

Ele olhou meio desconfiado, mas aceitou a sugestão. Me deu o revólver, agasalhou melhor o bebê e tirou do bolso da bermuda larga uma mamadeira. A criança passou a sorver com sofreguidão. Algumas pessoas passaram por perto. Eu tinha guardado o revólver e ninguém percebeu que aquela cena era uma pausa de um assalto. Para as pessoas, aquilo era só um pai alimentando o seu filho. A senhora que passou por último alertou que era tarde pra estar com uma criança na rua:

– A cidade estava cheia de ladrões!
– Não se preocupe. Eu já vou voltar pra casa. – disse o pai, já terminando de amamentar a criança.

Ele me contou que sua mulher havia ido embora de casa e deixado o filho:

– E não consegui ninguém pra tomar conta dele. Eu tenho que trabalhar, senão como é que vou conseguir dinheiro pro leite e pras outras coisas? Tive que trazer o moleque.

Olhou com meiguice para o filho:

– Ele é tão bonzinho. Só chora mesmo quando a fome aperta.

Eu devolvi o revólver e juntei mais 100 reais aos 200 que tinha reservado antes:

– Taí uma grana legal. Você vai poder ficar em casa uns dois dias, sem ter que sair pra trabalhar. Nesse tempo, você procura alguém pra tomar conta da criança. Quem sabe até a sua mulher volta.

Ele, que já estava bem tranquilão, fechou a cara:

– O quê? Isso é que não! Ela pode ficar lá onde tá! Não preciso dela! Eu me viro sozinho! Obrigado, moço!

Ele já ia batendo em retirada quando gritei, aconselhando:

– Vá pra casa!
– Já tô indo! E obrigado de novo!

Também peguei meu rumo, pensando que surpresas ainda estariam reservadas pra mim nesta vida.

Diálogo num boteco de beira de estrada

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Crônica de Ronaldo Rodrigues

Eu e minha equipe estávamos andando pelo interior do Amapá, num trabalho que não vem ao caso agora, e paramos num boteco de beira de estrada pra abastecer a cuba de cerveja. Como sou pretendente a escritor, sempre fico observando a conversa dos frequentadores de botecos. De botecos de beira de estrada, então, é muito pitoresco. Dá sempre material pra ser desenvolvido numa crônica. Como esta. Ei-la:

O mais novo dos três que bebiam naquele boteco era o mais inflamado. Ele comentava o ataque terrorista ocorrido recentemente. Como ninguém prestava atenção no que dizia, ele virou pra mim e eu passei a ser seu interlocutor:dialogosplatao

– Pois é, rapaz! O mundo tá pegando fogo! Viu esse negócio que rolou lá na Alemanha? O mundo tá uma zona, concorda? Aquilo foi uma tragédia, concorda?

Respondi meio constrangido, como sempre fico quando tenho que revisar a fala de alguém:

– Concordo que o que aconteceu foi uma tragédia, mas não concordo com o país em que aconteceu. Não teria sido na França?

Ele ficou pensativo um momento e concordou:homens-tipicos-balada-7-1

– Isso! Isso! França! Eu falei o quê? Bélgica, não foi? Que cabeça a minha! Claro que foi na França!

Tomou mais uma dose de cachaça e voltou ao assunto:

– Tudo o que é emissora de televisão tá transmitindo. Sabia que lá pra esse tal de Oriente Médio tem uma emissora de televisão que transmite essas notícias? Acho que é a Al-Saara!
– Al-Jazeera.
– Al-Jazeera! Isso mesmo! Será que eu tô ficando embriagado?

imagesTomou outra dose e voltou à carga:

– Mas acontece que as emissoras de televisão do Brasil só falam nisso. Ninguém fala naquela outra tragédia que aconteceu lá em Santa Catarina.

Como a minha equipe tinha feito a devida compra de cerveja, respondi já de saída:

– Não foi em Santa Catarina. Foi em Minas Gerais. Até logo! E boa sorte na sua conversa!

Embarquei na van e passei a anotar o diálogo acima relatado pra transformar nesta crônica. E podem crer: é 60% verídico.

Desenhos (conto)

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Conto de Ronaldo Rodrigues

Ele estava sempre com aquela pasta preta carregada de desenhos e as pessoas nos bares diziam, quando o viam se aproximando:

– Ei, lá vem o velho desenhista com aquela pasta preta, grande e suja.

Ele chegava à primeira mesa e perguntava se alguém poderia pagar uma cerveja, sempre ameaçando:

– Ou vocês pagam a cerveja ou eu vou abrir a pasta e mostrar uma infinidade de desenhos. Vai levar a noite toda. É melhor alguém pagar. Aí eu vou embora e vocês poderão continuar a falar essas bobagens que falam todo dia.

Alguém sempre pagava uma cerveja e ele ia embora. Bebia devagar, sentado na sarjeta. Quando a cerveja terminava, ele jogava a latinha no lixo e partia pra mais uma abordagem em outra mesa do bar. E assim ia até o amanhecer, quando os bares fechavam. Acho que nunca chegou a mostrar os desenhos a alguém. Pelo menos ninguém que eu conhecia, naquele conjunto de bares, tinha visto os desenhos. Eu me perguntava se eles existiam mesmo. Até quem numa noite eu quis ver os desenhos. Ele deu um pulo:

– Como? Quer ver os desenhos? Há quanto tempo você bebe neste bar?
– Uns três anos.
– E ainda não sabe como é o esquema?
– Que esquema?
– O meu esquema. Eu digo que vou mostrar os desenhos e as pessoas nunca querem ver. Acham que isso vai atrapalhar o papo. E atrapalha mesmo, são muitos desenhos. A galera prefere me pagar uma latinha pra eu ir embora.

– Tudo bem. Eu pago a cerveja, mas quero ver os desenhos.

Ele ficou um pouco indeciso, mas abriu a pasta gigantesca e já ia me mostrar os tais desenhos, quando eu disse:

– Pode ser que eu goste de algum desenho e compre.

Ele fechou a cara, fechou a pasta, pegou a cerveja que eu já tinha dado e saiu caminhando pra longe de mim:
– Comprar um desenho meu? Aí já é demais! Adeus!

Tudo bem, leitor. Eu também não entendi. Só sei que a minha curiosidade pra ver os desenhos aumentou mais ainda.

*Ilustração: Ronaldo Rony / Foto: Maria Lídia Cunha

Szac número um – Crônica de Ronaldo Rodrigues

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Crônica de Ronaldo Rodrigues

Estou só no deserto.

Nu, com fome, sede e frio.

Mas sei que, se levantar os braços e invocar a santidade dos caminhos escuros, a luz virá ao mdownloadeu encontro.

Estive em todos os momentos difíceis da história e nenhum conseguiu me aniquilar.

Vou medindo meus passos, conferindo-os um a um.

Sei que, se pisar no chão com a força que tenho, posso causar um terremoto.

Um sopro meu pomendigo usando Laptop.de desencadear um furacão.

Estou na noite, no cais, e o navio que vem me livrar do naufrágio está a caminho.

A manhã virá. O sol virá. E depois a lua e todos os sonhos e todas as fantasias e todas as realidades.

A esperança é um sentimento bonito, um tanto deturpado, distorcido por quem acha que esperança é simplesmente… esperar.

Vim para mudar o mundo ao meu redor.images (6)

Vim para libertar um povo.

Vim para ouvir música e cantar, enquanto pedalo minha bicicleta pelo labirinto da cidade.

download (5)A cidade que me acolhe e, de repente, me vira a cara.

Eu não nasci para ser triste, me disse o horóscopo, e não vou contrariar isso.

Podem contar comigo.

A grande revolução está em marcha.