A chegada do Banana no céu – Crônica muito porreta de João Lamarão (contribuição paid’égua de Fernando Canto)

Banana – O chato mais querido do Amapá – Foto: Chico Terra

Por João Lamarão

Um mês já havia se passado daquela noite fatídica, tempo mais do que suficiente para que os tramites burocráticos do Purgatório se processassem normalmente, contando é claro, com o jeitinho brasileiro, instrumento fundamental para que qualquer processo corra rapidamente em qualquer lugar e o Banana foi autorizado a ingressar no átrio que dá acesso a porta do Céu. O ambiente normalmente tranqüilo, nesta hora estava altamente congestionado. Filas intermináveis, parecia mais com o pronto socorro durante os finais de semana do que a ante-sala do Paraíso.

Como era de se esperar, a situação mexeu com os brios do Banana que esbravejou aos quatro cantos que aquilo era uma esculhambação geral e que até ali, não havia respeito com as almas que aguardam a redenção eterna, por isso, iria se queixar diretamente a Ele. Deus, seu amigo intimo, que já o salvara de poucas e boas, de forma que a BACOL não deixaria aquilo barato.

Antigo Bar Xodó – Fotos: arquivo de Fernando Canto

Em um cantinho apertado, tipo 3×4, pois o preço do aluguel no Céu está pela hora da morte e onde foram implantadas as modernas instalações do Xodó Celestial, várias almas disputavam uma vaga no exíguo espaço a fim de conseguirem tomar uma cerveja geladinha enquanto aguardavam a vez de serem chamados pelo assessor especial de São Pedro, um negro alto e forte, ar de bonachão, que pela sua estatura sobressaia a turba, impondo respeito ao ambiente. Era nada mais, nada menos que o Pururuca.

Numa área reservada àqueles do regime semi-aberto que podem sair e entrar no Céu a qualquer hora, ao redor de uma mesa estrategicamente colocada, Paulão, Waldir Carrera, Marlindo Serrano e Bode, jogavam conversa fora. Faziam conjecturas de como estava a vida pelas bandas daqui de baixo, se haveria ou não carnaval, se a micareta na orla seria liberada, entre outras coisas.

O saudoso Albino Marçal, dono do Xodó – Foto: arquivo de Cláudio Pinho

Pela parte interna do balcão de mármore branco italiano, entre santinhos, velas e terços postos a venda, o Albino muito p… da vida meio a confusão peculiar, reconheceu nosso amigo ao longe, perdido meio a multidão e esbravejou:

– P.Q.P., taí o motivo da minha cuíra. Acabou o nosso sossego. Vejam quem acaba de chegar prá me aporrinhar.

Todos se viraram rapidamente na direção indicada. A alegria foi geral e imediatamente uma festa foi armada para receber o novo hóspede, gerando grande confusão, todos ávidos por notícias da terra, uma vez que por aquelas bandas não tem televisão e nem pega celular. Sabedores de que o Banana era onipresente, conseguia a proeza estar em vários lugares praticamente ao mesmo tempo, teria portanto, muita informação a dar.

Passada a euforia inicial, as coisas foram acalmando, mas ao largo, um grupo de almas francesas xingava até em patuá, a falta de organização do ambiente, exigindo providencias urgentes. Ao fundo, uma voz em fluente francês tentava acalmar o agitado grupo dizendo:

Franky de Lámour – Arquivo de Fernando Canto.

Monsiers et mademoiselles, calma, calma… aqui as coisas são assim mesmo. Não se preocupem que vou ajeitar tudo pra vocês. Se há necessidade de dar um jeitinho, daremos; para isso, sou a alma certa, conheço todo mundo aqui no pedaço; tenho até autorização do Todo Poderoso para trabalhar como lobista e, mais rápido do que o pensam, vocês estarão rezando um terço com Senhor. Mas antes, preciso de um adiantamentozinho prá molhar a mão do porteiro.

Ouvindo isso e intrigado com a presença de tantos franceses, o Banana virou-se rapidamente e deu de cara com nada mais nada menos que o Franky de Lámour que tentava resolver a questão:

– Franky, que bagunça é essa, cara? Aqui não é o Céu, onde tudo é mil maravilhas?

– Não Banana! Aqui não é o Céu, aqui é Caiena.

– Valha-me Deus! Dancei.

João Lamarão – Arquivo Sônia Canto

*”Essa crônica sobre o Banana é antológica. Foi escrita pelo nosso parceiro João Lamarão, engenheiro e escritor que também já foi pra Caiena, infelizmente. Ele é o autor do livro “No tempo do Ronca,- Dicionário do falar Tucuju”. Essa é uma singela homenagem àqueles que fazem parte da vida macapaense e que partiram deixando saudades e para não esquecer o quanto ele também fez parte de nossa história. Sua simplicidade, bom-humor (às vezes mau-humor, mas sem ser grosseiro) e profundo amor por esta terra” – Fernando Canto.

**Fotos encontradas nos blogs “O Canto da Amazônia”, do Chico Terra e da Sônia Canto.

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