A REVOLUÇÃO – Conto de Mauro Guilherme

Conto de Mauro Guilherme

Eu sabia que aqui seria ruim, mas não sabia que seria tanto. Cheguei aqui há um ano, mas parece que estou aqui há um século. Algumas regras eu entendo, mas outras não tem sentido. Fogo e tridente todo dia tudo bem. Uma vez por semana o caldeirão fervente, nada contra. Mas essa história de proibir festa, bebida e mulher, não tem nenhum sentido.

Questionei o gerente da minha ala, que era a ala justamente dos que gostavam de festa, bebida e mulher, por que lá não havia nada disso. Ele me respondeu que cumpria ordens superiores. Então eu lhe pedi para falar com o seu superior, e ele me disse que o seu superior não atendia ninguém.

Eu me retirei, mas não havia desistido de mudar aquela situação. Nos meses seguintes comecei a planejar uma revolução. Muitos, como eu, não estavam gostando nada da atual gestão. Eles tinham medo do governante do local, mas eu lhe prometia que no meu governo, festa, bebida e mulher estariam liberados.

Fiquei sabendo das justificativas da proibição. O governante não liberava as festas e as bebidas, porque não queria ver ninguém alegre ali. Mulheres existiam, mas estavam na ala feminina. Segundo me disseram, ele não deixava homem e mulher misturados, porque quem juntara Adão e Eva fora Deus, não ele.

O interessante é que enquanto havia aquela proibição, uma vez por mês o governante promovia alguém para o céu, uma regra totalmente absurda, e que me dava medo. Durante toda a minha vida, nunca gostei de padre, igreja ou reza. O meu negócio era bar, bebida e mulher. Eu nunca quis ir para o céu, aquele lugar sem graça.

O nome do escolhido saia pelos autofalantes. Toda vez eu respirava fundo, quando ouvia um nome que não era o meu. Eu estava no lugar certo, onde eu queria estar. Eu só tinha que mudar algumas coisas, e tudo ficaria às mil maravilhas, e estava me preparando para isso.

Depois de um ano de planejamento, explodiu a revolução. Não era só a minha a minha ala que estava insatisfeita, todas as alas estavam. Eu prometi que faria as mudanças necessárias para que todos tivessem o que quisessem, caso chegasse ao poder.

O poder central tinham muitos ajudantes, mas nós éramos era quantidade bem maior. Alguns ajudantes do governo, quando viram que a luta estava perdida, renderam-se. Outros foram convencidos a se unir à nós, sob a promessa de serem anistiados.

Foram dez dias de luta, até que vencemos a peleja. O governante havia fugido, não se sabe para onde. Tomei posse no governo sem muitas formalidades, mas não cumpri algumas promessas feitas. Agora que era governante, tinha que governar com responsabilidade.

Mulher, bebida e festa, só uma vez por mês. Para os outros, porque para mim todo dia. Afinal, eu era o governante. Aboli a regra de promoção para o céu, que não estava entre as reivindicações, porque ali quem mandava era eu. Tive que prender alguns dos meus aliados mais fiéis, porque viviam dando pitaco na minha administração, e assim por diante.

Depois de seis meses da minha administração, comandada com mão de ferro, como era certo se fazer naquele lugar, o clima começou a ficar quente de novo entre os residentes. A insatisfação era gera.

Por isso explodiu uma nova revolução, comandada pelo antigo gestor, que, finalmente, resolvera dar as caras. Ele prometera o dobro do que eu havia prometido, razão pela qual foi deposto facilmente, até porque de tanto prender os meus aliados, acabara ficando sozinho.

Foi a primeira vez que o vi. Ele estava sentado na cadeira executiva para me julgar. Só que eu não estava muito preocupado, pois eu já tinha sido condenado ao fogo eterno. O que poderia ser pior? Ele se levantou, caminhou até onde estava e me olhou fixamente. Depois me promoveu para o céu.

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