Antídoto – Por Mayara La-Rocque

Por Mayara La-Rocque

É linda a página em branco. Há infinitas formas dizer o que não sei dizer. Acho que Luiza teve Malu. Olho a contraluz do tempo refratada sobre nós. Há algo de manga chupada, esgarçada aos sulcos na incidência dos trópicos e do verão. Essa mesma claridade de um astro tremeluz sobre meus pais depois da sombra de meus avós. Algo incide sobre a memória e o horizonte. Ao longe, não há idades, o que passou não foram os anos, os noticiários, as estatísticas, as planilhas, as ferrovias, os lucros, as moedas de troca, as crises, os golpistas, o intelecto e os lutos. Nada disso é palpável. O que se inclina sobre a guilhotina dos cronômetros, relógios sem ponteiros nem mesura, é um perfume de pétala caída, um barulho de folha seca pisada, tronco de árvore esfacelado pelo sol e pelos tantos meios-dias. Vejo velhos em beiras de estrada de terra seca; quantas vidas percorridas, quantas atravessadas! A maturância não vem com as idades. É algo a mais que o tempo. Não é saber ler a bula, nem entender a posologia. Está no antídoto.

*Mayara La-Rocque é paraense, educadora, escritora. Publicou a plaquete literária “Uma luminária pensa no céu”, pela Editora Escriba, em 2017. (além de velha amiga minha e colaboradora deste site).

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