As palavras vivas! – Crônica de Jaci Rocha

Crônica de Jaci Rocha

São 21h23 no relógio de bordo de painel. Olho para o carpete do carro e vejo pontas de um jornal amassado por debaixo do tapete. Algo incomoda na cena: sei, são apenas recortes de jornal.Com palavras aleatórias, esquisitas. Aliás, mesmo juntas, não fazem sentido! sim, o abecedário inteiro está ali, desperdiçado.

Explico.

Não gosto de palavras mortas. Gosto de poemas, pois as palavras voam e se eternizam. De canções, pois elas dançam. Gosto de palavras como: Quintal…

Eu caibo inteirinha em um quintal.
Ou em uma varanda.
Um varal.
Poesia…
Coração.
Amor. 
Abraço.
Saudade.
Oração…
Felicidade!

Palavras nos chamam para dançar. Aliás, gosto de gente que baila com as palavras e forma mundos. Por isso, o amor pela literatura. Paixão antiga: Lembro que me apaixonei pelas palavras através do uso do dicionário, algo vivo e divertido, pois me foi apresentado como riqueza, e como era bonito ver no olhar de meu pai a alegria por ensinar o valor e o significado das palavras. Por outro lado, nunca gostei de quem fala difícil para esconder a mensagem. Mensagem tem de ser coisa clara, bem dita, eis outra palavra bonita: Bendita.

Também não gosto de gírias de laboratório, aquelas criadas por agências de publicidade para testar seu poder das “massas”. Aquelas coisas atuais,meio grotescas. Falta à elas a originalidade do impulso criativo. Mas acho bonitas as regionalizadas, as criadas sob contexto e acho que tem que ter atitude para sustentar um bom vocabulário “sujo”.

Pensei quantas palavras já usei e quantas me valeram, as muitas palavras repetidas, geralmente as minhas preferidas…e no quanto certas palavras nos levam diretamente à lembrança de algumas pessoas. É como uma playlist linguística!

…Olho novamente o jornal, na parte debaixo do banco.

Retiro aquela coisa estranha de lá, mais parece um corpo, morto, no porta-malas. Graças a Deus não tenho estes instintos (rs). São só palavras. Só? Não. São palavras! as amadas palavras, letrinha por letrinha de um alfabeto, dispostas aleatoriamente. Confesso que isso me dói um pouco, a prostituição da palavra: “Vendo palavrinhas rasas,em textos pequenos,para leitores amenos” – é o título do jornal.

Se você chegou até aqui, neste texto com bem mais do que 140 caracteres, sabe como é chato coisas resumidas. Aquela coisa espremida no espaço.

É que bom mesmo são versinhos à vontade, em meio a rua, praças,nuvens… é, sou daquela gente que escreve para se salvar do mundo. Sou da ‘tribo’ que quer que a mensagem chegue, se aconchegue, faça coisas bonitas no corpo das pessoas.A roda que se salva e se enamora, por isso escreve…aliás, pensa em outra palavra amada: E….s….c….r….e….v…e….r….

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