Por Victor Vidigal
Enfrentando os medos internos e o preconceito social, a servidora pública Beatrice de Borges de Alencar, de 50 anos, se tornou a primeira mulher transgênero no efetivo da Guarda Civil Municipal de Macapá.
Depois de finalizar o processo de mudança de gênero e nome na certidão de nascimento em outubro de 2020, em fevereiro deste ano ela também começou a usar farda com o nome feminino tarjado.
Para Beatrice, o sentimento é de alívio depois de duas décadas atuando na corporação e muitas crises devido ao sofrimento psicológico causado pela não aceitação dos colegas em relação ao gênero.
“Agora a farda não tem mais aquele peso de uma armadura, de uma expressão que não me representava. Antes parecia que eu estava bem, mas eu não estava. Queria terminar o trabalho o mais rápido possível para ir para casa, porque eu não aguentava”, relatou.
Desde 2017, o Amapá instituiu a emissão da carteira de registro de identidade social para travestis e pessoas transexuais.
Com isso, fica permitido o uso do nome social em fichas cadastrais, formulários e documentos, nos atos e procedimentos promovidos pela administração pública, e nos espaços particulares que prestam atendimento público.
Nascida em família tradicional, Beatrice contou que adiou por muito tempo a mudança de gênero, o que gerou problemas no psicológico, físico e espiritual desde a adolescência até a fase adulta.
“Eu vim de família tradicional e antigamente era muito difícil para alguém se assumir assim. Eu fiquei adiando isso por muito tempo e começou a fazer muito mal para mim no psicológico, no físico e no espiritual. Eu sofri muito”, desabafou.
Sobre a repercussão da mudança de gênero dentro da corporação, a guarda disse que até o momento não sofreu nenhum caso de transfobia por parte dos colegas.
“Estão tomando choque agora, porque a minha transição foi muito discreta por conta da pandemia e ninguém soube. Mas não houve nenhum caso de transfobia. Só na rua às vezes alguém olha com deboche, mas é coisa mínima”, contou.
Beatrice contou ainda que sente atração por mulheres, por isso, se considera uma mulher transgênero lésbica. Na vida social, ela carrega duas paixões: os esportes radicais e o rock.
Skate, mountain bike e rapel foram alguns dos esportes já praticados. Na parte musical, foi baterista na banda Madame Butterfly que tocava em pubs da cidade na década de 2000.
Inclusive é do círculo social do rock que vem uma das mágoas do pós-transição, já que sentiu pessoas que considerava amigas se afastaram depois do processo.
“Eram identificados apenas por um perfil do qual eu fazia que era o rockeiro, o badboy, o baterista. E quando eles não viram mais isso, principalmente os homens, começaram a se afastar de mim. E isso me magoou muito, porque sou uma pessoa que trabalhei muito pela causa do rock em Macapá”, disse.
Para o futuro, Beatrice espera que a história dela sirva de motivação para outras pessoas que não se identificam com o gênero que nasceram. Por enquanto, ela busca aproveitar no presente a sensação de se sentir bem consigo mesma.
Meu comentário: Beatrice era um velho amigo e agora uma velha amiga (no sentido da nossa amizade ter décadas). Estou feliz por ela. Muito porreta mesmo! (Elton Tavares).
Fonte: G1 Amapá.