Caminho das águas: Filme amapaense ‘Utopia’ participa de eventos ao redor do país

Por Laura Machado

Viajando por vários cantos do Brasil, Rayane Penha possui trabalhos exibidos em grandes eventos para além do Amapá. A diferença de “Utopia”, seu mais novo projeto, é a narrativa pessoal que envolve uma de suas grandes inspirações, o pai, falecido em 2017.

A história que surge no garimpo foi lapidada com amor por uma filha, que na dor, precisava homenagear e honrar a memória do pai.

“O filme nasceu em um processo trágico da minha vida que foi a morte do meu pai. Em 2017 eu estava finalizando o primeiro filme que dirigi, meu pai tinha sido produtor de campo pois conhecia o lugar onde gravamos. Ele me apoiou muito a realizar tudo e queria aparecer no filme, mas não deu porque a história era sobre mulheres [risos]”, relembra Rayane com carinho.

O documentário se passa no garimpo e conta a história do pai de Rayane – Foto: Luiza Nobre

Força da natureza

Banhada pelas águas e pela luz do sol, Rayane sempre envolve em seus projetos o que existe de mais importante na arte: o coração. Histórias contadas de maneira forte e principalmente humanizadas, em que o personagem ganha o maior papel na cena. O protagonista de Utopia já não é mais presente em vida, mas foi eternizado na memória em forma de arte.

“Comecei a escrever um filme que gostaria que ele atuasse. Queria muito trabalhar com não atores e achava que meu pai iria render muito. Ele era um artista, tocava violão e escrevia muitas músicas, mesmo tendo estudado só a primeira série. Era muito inteligente e adorava estar nos holofotes, [risos], como um bom leonino”, explica.

‘Ray de sol’, como é chamada carinhosamente por amigos, carrega marcado na pele o trecho da música ‘Caminho das águas’. A canção fala sobre o reencontro de pai e filha, assim como a história de Rayane. “Caminho bordado à fé, caminho das águas, me leva que quero ver meu pai”.

O cinema sempre esteve presente na história da jovem jornalista – Foto: Luiza Nobre

Perdas e recomeços

“Iniciei a escrita desse novo projeto, em seguida fui pra Belém, trabalhar e finalizar o filme que já estava em andamento, quando voltei ‘o pai’ estava para o garimpo. Ele era garimpo. Houve um acidente no serviço em que ele estava e ele faleceu. É difícil descrever esse sentimento, mas nessa ausência eu resolvi transformar o filme que estava escrevendo em um documentário que trouxesse a memória dele, mas que também mostrasse o quanto esses corpos são violados assim como a terra que eles também violam, trazendo uma outra perspectiva sobre o masculino que, muitas vezes, é retratado a partir de um fetiche de truculência e insensibilidade”.

De acordo com dados da Fundação Jorge Duprat e Figueiredo de Segurança e Medicina do Trabalho (Fundacentro), o índice médio de acidentes de trabalho no Brasil foi de 8,66%, de 2002 a 2010, em contrapartida, na mineração essa taxa chegava a 21,99%.

A produção de Rayane foi uma maneira de homenagear a memória do pai, que morreu trabalhando no garimpo – Foto: Luiza Nobre

“No Utopia você vê homens desamparados vivendo o luto, a perda de alguém amado e importante. Eles choram, sentem saudade e mostram que ali é um lugar de sobrevivência, um lugar que o estado faz questão de não alcançar e estar presente. Não existe outra possibilidade para eles. Meu pai morreu porque nós não tínhamos como pagar a conta de energia e ele teve que voltar para o garimpo”.

Em abril, o documentário da amapaense participou da Mostra de Cinema Negro Itinerante na Paraíba, a Mostra Pilão. O evento foi totalmente online e gratuito, dos 126 filmes inscritos, 27 foram selecionados na curadoria. Utopia foi executado com recursos do 1º Edital de Produção Audiovisual – FSA do Estado do Amapá 2017/2018, produzido pela Catraia Filmes e dirigido por Rayane Penha.

“É lindo ver a trajetória do Utopia” – Foto: Luiza Nobre

“Eu tenho tantos sonhos [risos], sempre digo que a maior herança que papai me deixou foi a capacidade de sonhar, eu sempre vou ter um sonho para realizar. Mas hoje, especificamente no trabalho, sonho em realizar meu primeiro longa de ficção”.

Recentemente a jornalista venceu um concurso de roteiro da Associação de Profissionais Negros do Audiovisual Brasileiro, para desenvolver um projeto em um laboratório junto com a Amazon Prime. De acordo com a diretora, a produção deve lançar em breve.

Fonte: Café com Notícias.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *