Cartas Que recebi, Mas leio agora – Conto de Luiz Jorge Ferreira

Conto de Luiz Jorge Ferreira

19.07.1955

Caro Luiz Jorge,

D’aqui de ilhéus da Casa Amarela, tendo por céu o céu e por chão, o solo adorado da minha Bahia. Escrevo para comentar contigo modificações que fiz em Mar Morto, Quincas Berro d’Água, e o País do Carnaval. Inclusive estas vieram depois de trocarmos cartas sobre enredo e personagens destes acima citados romances.

Em o País do Carnaval. Paulo Rigger. Eu tinha dúvidas se ele ficaria no Brasil após suas paixões mal resolvidas ou voltaria para a Europa. Você até estranhou que a aversão dele pelo mulatismo do país fosse capaz de apaixona-lo a tal ponto de faze-lo ficar. Até insinuou que o navio em que ele ia regressar a Europa, afundasse, coisa que não fiz.

Ideia boa foi em Mar Morto, tratar Guma como lenda, porém muito temente. Mas a que? Veio em mim a dúvida. Ao que. Você quando leu os manuscritos. Devolveu-os grifados.A amuletos. Foi que fiz.

Perdoe esta mancha mais escura neste parágrafo. Não é tinta. Caiu um pouco de licor de cacau. Enxuguei com pano e coloquei giz raspado, mas não absorveu de todo. Já com Quincas Berro D’Água a ideia sempre foi faze-lo morrer duas vezes. Primeiro: Encontrado morto; e a segunda “imaginado vivo” pelos amigos, morrer afogado, após uma bebedeira de comemoração.

O diabo foi convence-lo de colocar as meias do avesso como reza a tradição no enterro dos pescadores. Você conversando com ele pensaria que sou eu.

Despeço-me antes que conversemos mais, pelo avançar das horas, porém guardo uns dois dedos de prosa para quando vieres, caso venhas, coisa que prometestes, e ainda não o fizestes.
Mesmo assim aguardo.
Um abraço.

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