Estatuto do Boêmio do Bar do Abreu – Crônica de Renivaldo Costa – @renivaldo_costa

Caricatura do artista plástico Wagner Ribeiro

Crônica de Renivaldo Costa

Aprendi a ser boêmio com o Fernando Canto. Grande escritor, frequentador inveterado do Bar do Abreu e amante ativo da boa boemia (segundo Houaiss “boêmia” e “boemia”, estão certos, optei pelo segundo por uma questão de pronúncia), ele me fez entender seus fundamentos e princípios mais primitivos.

Quem me conhece um pouco sabe que qualquer hora da noite é uma boa hora pra me chamar pra uma conversa no Bar do Abreu. Sempre que posso, ou seja, quase todo dia, procuro exercer, essa que acredito ser minha verdadeira vocação.

Antigo Bar do Abreu da Avenida Fab – Foto: O Canto da Amazônia

O papo de uma mesa boêmia nunca tem função ou um objetivo claro. Nunca é totalmente concordado e nunca absolutamente negado. Sempre existem espaços pra novos comentários, desde que não sejam definitivos. O verdadeiro papo boêmio pode ser aparentemente banal e repetitivo (aos olhos de um amador).

Qualquer um que entenda muito de um assunto a ponto de esgotá-lo deve ser evitado numa boa mesa, assim como aquele que não se interessa por um assunto que não domina. Tudo interessa a todos sempre, mas nada chega a ser resolvido.

A boemia levada a sério pouco se lembra da boemia imaginada por aí. O combustível principal e verdadeiro de um boêmio de verdade é uma boa conversa. Este é o único requisito para que 8 horas passem como se fossem 5 minutos e ainda pareçam muito pouco.

Uma bebida alcoólica pode ajudar esse papo a funcionar melhor, mas, não se engane, para ser um bom boêmio você tem duas opções : 1 – beber responsavelmente, 2 – não beber. Explico:

Pessoas que não sabem beber, que passam da conta, que ficam bêbadas, de fato, não conversam. Elas falam (sozinhas), gritam, choram, balbuciam, abraçam, expelem fluídos, produzem ruídos, enfim, estragam sua própria noite fazendo qualquer coisa que esteja bem longe de um bom papo.

Segundo o Fernando Canto, um boêmio convicto tem que estar preparado pra enfrentar tantas noites quantas tais for convocado. Mesmo que sejam na seqüência, mesmo que sejam no dia de trabalho.

Diferencio um boêmio de uma fraude qualquer ao escutar uma frase como “hoje eu vou curtir muito a noite”. Essa frase me soa tão absurda como “agora vou curtir essa respirada”. Quem sai “pra curtir a noite”, não pode trabalhar no dia seguinte, vai ficar com ressaca, dor de cabeça, peso na consciência e etc.

Toda noite é digna de uma “curtição” e portanto, pode ser curtida. Triste é aquele que espera a sexta-feira pra isso.

Carnaval do Abreu da Fab, em 2016. Foto: arquivo pessoal de Elton Tavares

Para se aproveitar a noite como um profissional da boemia basta apenas que escureça, e daí por diante, amigo, a vida fica bem mais fácil. Concorda ?

Não.

Ótimo! Então puxe a cadeira, pede um “qualquer coisa” e seja bem-vindo ao Bar do Abreu. Temos muito o que conversar e a noite está apenas começando.

Arte, literatura, música e cerveja gelada essa é a proposta do Baluarte Cultural, novo espaço cultural da cidade

Por Marcelo Guido

Capitaneado pelos queridíssimos Aldine Moura , Amires Cardoso e Artur Mendes o espaço pretende devolver a áurea boêmia, filosófica e artística ao centro da cidade.

O centro da cidade de Macapá ganhou um novo espaço cultural, trata se do ” Baluarte Cultural “, espaço aberto para artistas, boêmios e admiradores das artes e da noite .

O local esta estrategicamente alocado na Avenida Iracema Carvão Nunes, n 330 entre as as avenidas Tiradentes e General Rondon.

Quem é de Macapá sabe que em primaveras passadas o espaço boêmio da cidade era localizado nestas bandas, com os já saudosos Bar Lennon, Xodó , Tio Chico e a sorveteria do Abel.

A proposta é clara, espaço aberto para comercialização de literatura, música e artes em geral, tudo isso acompanhado de uma infinidade de drinks e claro cerveja gelada.

Além disso, o espaço oferece um estúdio para ensaios, sala para reunião e o agenciamento de artistas principalmente no começo de carreira.

A turma é muito boa e te espera de braços e corações luxuosos abertos, vale muito a pena conhecer:

Baluarte Cultural.
Aberto de domingo à domingo a partir das 16h.
Local: Avenida Iracema Carvão Nunes , Nª 330.
Fone: 96-981197112.

*Marcelo Guido é Jornalista. Pai da Lanna Guido e do Bento Guido. Maridão da Bia.

Tomei uma com Zaratustra – Crônica de Lorena Queiroz – @LorenaadvLorena

Crônica de Lorena Queiroz

Eu gosto é de paz, mas minha cabeça insiste em viver na porrada. Socos que são trocados todos os dias. Um ringue montado ao fim do dia e que se estende por horas ininterruptas. É uma merda, mas a vitamina de meus neurônios mais brigões é o álcool. É como se essa substância quase indigna fosse o Duke do Apollo. (Não é problema meu se tu não sacar de Rocky Balboa, te informa). Nos últimos tempos não estava conseguindo escrever.

Os pensamentos vinham e eu os sufocava ao invés de levá-los para dançar no papel. Não queria nada difícil. Não queria organizar a quebradeira que tomava conta da minha cabeça. Não estava bebendo e se, fosse fazê-lo, queria coisas simples. Fui beber com uma amiga que, aparentemente, tinha os pensamentos e uma vida mais organizada que a minha. Com ela seria simples, seria leve.

Mas é aí que a gente encontra o engano. Subestimamos as pessoas. Temos a péssima mania de concluir coisas pela superfície. Eu pude sentir o tapa da Clarisse Lispector no pé da minha orelha, dizendo; ‘’ Decifra-me, mas não me conclua, eu posso te surpreender”. E na realidade não é assim com tudo na vida? Uma sequência de boas e más surpresas mescladas tanto por nossa inocência quanto por nossa soberba.

Eu e minha amiga começamos a beber. Foi a primeira caixa de cerveja. Logo já estávamos trazendo a segunda e, quando chegou a terceira, foi quando eu soube mais sobre quem me fazia companhia. É engraçado como a mesa de bar se torna um divã, onde as dores aparecem e a gente percebe que cada vida tem uma boa dose de alegria e uma maior de tragédia.

Aquela mulher risonha com quem eu só falava de futilidades e os preços das coisas, me trouxe a sua história e que, para minha surpresa, havia mais desgraças do que eu poderia ter imaginado um dia. O Duke vestido de cevada então entrou em ação e eu tentava entender como ela havia se tornado a pessoa que é, mesmo tendo comido um caminhão de merda oferecida pela vida. Foi nesse momento que o inevitável paralelo e as associações começaram a surgir, eu estava bebendo com Zaratustra!

Ela havia passado pelas três transformações: foi um camelo submisso, rebaixado e humilhado. Durante as porradas da vida se transformou no leão, uma combatente. E agora, o leão se transformava na criança que é inocência, o esquecimento que recomeça. Enfrentou seus demônios e afirmou a vida. E mesmo com toda a dor, ela amou a guerra, pela consciência de que nos tornamos mais fortes com a dor. Ela entendeu que o esforço é contínuo. Me ensinou que o caminho é seguido não largando tudo, mas transformando a dor e o sofrimento em força. Não tenha pressa na hora de viver, o mundo está cheio de gente querendo te foder.

Eu não sou uma pessoa de certezas, aliás, ultimamente o que mais tenho são dúvidas, mas mesmo com toda minha ignorância e imperfeição, sei que é possível descer a montanha, mesmo que esteja bêbada de álcool, verdades ou dor.

Bebemos por mais de dez horas e eu consegui entender mais coisas sobre minha própria vida do que em dez horas de terapia. Não estou desmerecendo nenhum psicólogo, apenas enaltecendo a didática desses momentos e as pessoas que podem sentar contigo em uma mesa de bar, onde o álcool e a embriaguez podem te despir da armadura que a vida e as dores te colocam. Eu sou uma pessoa torta e não seria uma surpresa que eu aprenda da maneira menos usual para os retos. E por fim, como disse Zaratustra: ‘’ Recebe ordem aquele que não sabe obedecer a si próprio”.

*Lorena Queiroz é advogada, amante de literatura, devoradora compulsiva de livros e crítica literária oficial deste site, além disso é escritora contista e cronista. E, ainda, de prima/irmã amada deste editor.

Neste sábado-feira (23), rola Especial Paulo Diniz, com o cantor Nonato Santos, no Farofa Tropical Gastrobar

O cantor e compositor amapaense Nonato Santos, apresenta, neste sábado-feira (23), a partir das 20h, o Especial Paulo Diniz, no Farofa Tropical Gastrobar. O show será homenagem ao artista que é um dos grandes nomes da música brasileira.

Sobre Nonato Santos

O músico, que passou a infância e parte da adolescência nas Ilhas do Xingu e na cidade de Senador José Porfírio, no Pará, e teve o seu primeiro contato musical através das composições de Luis Gonzaga, Jacson do Pandeiro, Nelson Gonçalves e mais tarde com Waldick Soriano e a moçada da jovem guarda, agora se prepara para homenagear Paulo Diniz.

O pernambucano Paulo Diniz é uma referência musical na carreira de Nonato Santos, que nos anos 70, definitivamente de volta a Macapá, começou a compor músicas que traziam nas suas letras a inspiração na cultura da Amazônia. O artista queria através da música fazer com que as pessoas valorizassem mais o lugar onde vivem. Tendo participado de festivais universitários da música amapaense, hoje tem três cd’s gravados, o “Canto Tapuia”, “Quixote Caboco”, e “Nas Asas da Noite”.

Sobre Paulo Diniz

Paulo Diniz é um cantor brasileiro natural da cidade de Pesqueira – Pernambuco, nascido em 1940. Paulo fez sucesso com as canções “Pingos de Amor”, “Canoeiro”, “Um Chopp pra Distrair” e “Ponha um arco íris na sua moringa”, mas o sucesso que o consagrou foi a canção “Quero Voltar Pra Bahia”. Suas canções foram gravadas por Clara Nunes, Emílio Santiago, Simone e outros cantores.

Serviço:

Especial Paulo Diniz, com o cantor Nonato Santos
Data 23/04/2022
Hora: 20h
Local: Farofa Tropical Gastrobar, localizado na Rua São José 1024, centro.

Elton Tavares, com informações de Andreza Gil (texto de 2017 da jornalista, sobre um show de Nonato Santos no mesmo formato).

Bar cochilo – Conto de Luiz Jorge Ferreira

Conto de Luiz Jorge Ferreira

Tia Caetana comprou um bar, quando ficou viúva…
Era um bar perto de sua casa onde seu falecido esposo passava horas antes de chegar em casa vindo do trabalho, na companhia dos amigos, tomando vinho e jogando dominó, ou dama, nas diversas mesas já preparadas para isso. O tabuleiro pintado nas mesas.

Ninguém da família tinha experiência nesse ramo de negócio…diziam que um primo, que morava em Soure no Pará, fora dono de uma Casa Noturna de nome Cochilo. De tal forma que tia Caetana reformou tudo mas manteve as mesas do estilo tabuleiro de Dama, e a equipe da casa, cozinheiros garçons, e a moça que anotava as solicitações para o violonista Cantor.

Arrumou as mesas de forma que diante do tablado onde se posicionava o Cantor, ficasse um espaço para algum casal de clientes mais alegres, poder dançar.

Tia Caetana, não fumava, não bebia, era carola, de frequência rigorosa nas missas, e atividades da Igreja, desde de que não interferissem na sua jornada de trabalho, no Cochilo, nome com que havia rebatizado, o antigo estabelecimento, vestia-se quase sempre com roupas escuras, e sapatos que imitavam pequenas botinas, usava óculos de lentes de grau azulados, que na atmosfera de pouca luz no interior do Cochilo, lembravam um par de olhos de gato.

Bebia em ocasiões que ela dizia serem especiais uma mistura que ela guardavam em uma garrafa de vidro decorada com uma paisagem parisiense em que se via a torre Eiffel e sobre ela a imagem do Mademoiselle do Santos Dumont.

Tal garrafa era guardada como uma peça preciosa e seu conteúdo intocável.
…a garrafa continha o que ela denominava …de meu Absinto caseiro.

O dia que o Papa visitou o Brasil ela nos brindou por conta da casa com esse néctar…
A casa ainda não abrirá e ela nos convidou para sentarmos nas várias mesas postas em volta, em círculos, e colocou a bebida dentro de seu reluzente cálice e em seguida tocou fogo vendo a chama azulada criar corpo, juro que me pareceu ver um rosto entre meio das chamas, que lembrou a figura do tio que falecerá, antes dela comprar o Cochilo.

Tia Caetana deu um gole, e passou o cálice para os amigos e parentes em torno. Nenhum de nós lembrou de mais nada, eu mesmo que nunca falará Chinês citei Confúcio em vários parágrafos sei que o fiz pela gravação feita pela moça que anotava as solicitações musicais, e depois postou no número do celular que lhe passei…ela mesmo fez vídeo de todos em uma pequena procissão ao redor das mesas e tia Caetana liderando e cantando Cantos Gregorianos que ninguém ali com certeza tinham escutado, mas a acompanhavam perfeitamente bem com sotaque romano.

Depois desse dia, o Cochilo ganhou um público diferente, antes das 22 horas, era um entra e saí de senhoras, que eu sempre via nas festas ecumênicas da Igreja…agora as via entrar no Bar Cochilo, e dirigirem-se ao balcão de chás que Tia Caetana tinha posicionado um pouco antes dos banheiros femininos, másculos e o indiferenciado que ela batizará com o nome de Neutros.
Tia Caetana fizera um mix no Bar …Religiosidade e Boêmia…
Até as 22…aconselhamentos, chás, bolachas biscoitos, e outros salgados…


Depois das 22…as meninas de botas, calças super apertadas, shorts fujões do corpo, e shows de nádegas.  Tia Caetana reformava a postura punha um lenço colorido nos cabelos, trocava os óculos sisudos por um leve óculos ray-ban dégradé, e um vestido amarelo com grandes floreios lilás…
E se manifestava batendo cadenciadas palmas apropriadas para um casal dançando um Passo Dublê…

Aos sábados lavagem geral com sal grosso e espalhamento dos vasos do Tajá … ‘ Comigo ninguém pode…’ e no Domingo não abria… Tia Caetana ia a Missa e comungava sem confessar, apregoava que a Confissão era íntima consigo mesmo…Tia Caetana fazia escola na Matriz…dava Curso para Formação de Casais, com fila de espera…


De noite, aos domingos, lia o jornal da Cúria Romana …L’Osservatore Romano …que todos os dias era publicado em Italiano, e na semana em outros idiomas.Depois anotava as duvidas e as suas o piniões para serem enviadas a Roma, por meio da correspondência que a Matriz mandava.

Eu ia apanhar uma vez ao mês as Cartas endereçadas a Matriz e outras enviadas ao Bar Cochilo, coisas comerciais, impostos, propaganda de novos eletrodomésticos etc…etc. Um dia deparei com um envelope internacional, vindo da Itália…Tia Caetana ficou eufórica, nesse dia os clientes do Bar Cochilo tiveram abatimentos gigantes em suas contas…
Foi uma noite de alegria.

Daquele dia em diante ela dedicou-se mais ao treinamento do Gerente, e começou a pensar em viajar…incluiu um repertório romantico de Músicas Italianas, e ajudou a canta-las, ensaiou uns sapateados, e tirou Passaporte…

Certo dia …notei sua ausência, tomei a liberdade de remexer suas correspondências nas gavetas da sua escrivaninha em seu escritório, muitos jornais, muitos L’ Osservatore Romano, folhei, tia tinha se tornado uma colaboradora frequente, escrevia sobre as religiões afro amazônicas e suas presenças no controle e tratamento dos seguidores delas.

O Bar Cochilo, nesses três meses de ausência dela, havia mudado seu perfil, vinham os frequentadores das igrejas vizinhas, faziam um lanche, tomavam café, bebiam água, discutiam passagens bíblicas e renovavam as flores sob os retratos dos Religiosos locais falecidos mais influentes…e considerados Santos. O Cantor agora cantava Louvores e sua esposa fazia saladas veganas…

Escritores Elton Tavares, Lorena Queiroz e Fernando Canto, no imaginário Bar Cochilo, da Caetana e Luiz Jorge

Um dia o gerente me viu passar defronte, veio em minha direção, disse-me que Tia Caetana havia lhe doado o Bar Cochilo, e que ele queria saber se eu me opunha, a esse fato, e que trocaria o nome de Bar Cochilo, para Cantinho Santo Cochilo, disse o fizesse, e que havia recebido um telefonema de Macapá dos escritores Fernando Canto, Elton Tavares, Lorena Queiroz, porque haviam tido notícias sobre o Bar Cochilo, e vinham a mim convidar para escrever alguma coisa sobre ele, tendo em vista que havia morado em Macapá e haveriam de publicar um Livro sobre estórias de Bares…
Agradeci ao Gerente pela notícia, pedi que agradecesse ao convite quando ligassem…
E dissesse que gostaria muito de fazê-lo. Mas que eu poderia escrever de interessante sobre Bar?

Música & Cultura:  a “Barca do Iraguany” e convidados se apresentam neste domingo (3), no bar Farofa Tropical

Neste domingo (3), a partir das 20h, bar Farofa Tropical, vai rolar show da banda “A Barca do Iraguany”. O grupo é formado pelos músicos Ricardo Iraguany, Peterson Assis no violão,  Neiton percussão e eletro reggae, Edu Gomes na guitarra, Laura Do Marabaixo voz e percussão.

A noite contará com participação especial dos renomados Enrico Di Miceli, Roni Moraes e a poesia do Coletivo Juremas. A produção da Quarta da Arte da Pleta, assinada pela competente Andreia Lopes.

Mais sobre a Barca do Iraguany

Ricardo Iraguany é músico e criou a Barca do Iraguany para o Círio de Nazaré, há oito anos, com o propósito de reunir artistas de vários segmentos da arte, como música, dança, poesia, entre outros, para fazerem uma anunciação da festa. Desta forma, começou a fazer a alegria em bares e casas de shows da nossa cidade com muito batuque, marabaixo, entre outros ritmos nossos.

Serviço:

Show  da “Barca do Iraguany” e convidados

Data 03/04/2022

Hora: 20h

Local: Farofa Tropical Gastrobar, localizado na Rua São José 1024, centro.

Elton Tavares

Programação “Farofando com Elas” inicia nesta quinta no espaço cultural Farofa Tropical

Por Pérola Pedrosa

Farofando com Elas é a programação do Gastrobar Farofa Tropical, que inicia nesta quinta-feira, 10 e vai até o sábado, 12, a partir das 20h.

Serão show temáticos em homenagem ao Dia da Mulher, a Quinta Lilás terá a cantora Sandra Lima com todo seu repertório de interpretes brasileiras, vai rolar Cássia Ellen, Marisa Monte e outras.

Na sexta-feira, 11, o palco será da cantora Márcia Fonseca trazendo o Brega Retrô, para embalar a noite. No sábado, 12, é a vez da cantora Deize Pinheiro numa apresentação especial da diva Clara Nunes.

A promoter cultural e proprietária do espaço, Marta Lacerda, ressalta que a programação é toda voltada para as mulheres, no entanto os homens não estão de fora, a intenção é homenagear e exaltar o talento das cantoras amapaenses e também celebrar a luta das mulheres por seus direitos.

Vamos celebrar nossas conquista e o talento das mulheres, embora muito ainda precisa ser feito, podemos sempre vibrar com o que já conseguimos”, relata Marta Lacerda.

Serviço:

Horário das atrações: a partir das 20h.
Bar aberto as 18:00.
Informações e reservas 98137 3130.

Fonte: Café com Notícias

O porão da velha Marta – Conto de Lorena Queiroz – @LorenaadvLorena

Conto de Lorena Queiroz

Viúva, rabugenta e peculiarmente religiosa, era assim a velha Marta. Tudo mudou depois que o marido faleceu, ou melhor, se tornou o que era antes de nascer. Era assim que ela pensava nele e em sua morte, algo associado com uma das poucas coisas que lembrava da leitura de Schopenhauer.

Ao se tornar viúva, a nossa Marta não teve mais como se sustentar. Tinha uma única filha, uma ingrata que foi embora com o marido e nunca mais deu notícias. Mas quem nasceu sobrevivente nunca é engolido por naufrágio. Pensou em abrir um pequeno comércio, mas não tinha simpatia para lidar com os clientes. Pensou em ser prostituta, mas lhe faltava vocação e sobrava bexiga baixa.

Então, olhou para seu porão e pensou em abrir um bar e, com bêbado, ela sabia tratar. Viveu com um durante trinta e cinco anos, tinha plena consciência que dono de bar não precisa ser simpático se a cerveja estiver gelada e o tira-gosto com preço camarada e, como não lhe passava pela cabeça pagar impostos, seu preço seria um atrativo.

Assim nasceu o porão da velha Marta, escada de madeira velha, umidade demais e tubulação aparente. Aquelas escadas levavam até o submundo das almas perdidas, como se o próprio Hades tivesse abençoado o lugar em parceria com Dionísio. E se lá era o lado divertido do inferno, Cérbero andava entre aqueles que bebem, um cachorro caolho e de três patas que a velha Marta adotou após encontrar o pobre estropiado em sua porta.

Muitas pessoas desciam aquelas escadas; gente de todo jeito, com um fator em comum, a clandestinidade. E isso a velha Marta adorava. Era a mãe de todos os que foram rejeitados pela normalidade. A velha Marta conhecia os hábitos e as histórias de cada um, e os que iam chegando, a nova leva, como dizia nossa Marta, ela adivinhava algum traço de personalidade pela bebida que pediam; Campari; bicha velha. Martini; hum, puta. Gim; atrás de sexo. Marta também reconhecia vários de seus clientes assistindo o noticiário; o prefeito desportista que adorava a prostituta de cabelos vermelhos. O rapaz que sempre bebia whisky, sozinho no canto mais escuro do porão, e se matou enforcado dentro do próprio quarto. Entre muitos outros. A velha Marta era conselheira e ouvinte de muitos deles, ouvia cada empolgação, desgraça ou ilusão que lhe relatavam. Era impaciente, mas sua vasta experiência de vida lhe propiciara a dar conselhos; se eram bons? Questão de perspectiva. Sempre aconselhava os casados que a viuvez é melhor que a separação. Toda mágoa vai junto com eles para o fundo da terra, é libertador, dizia ela à uma. O que é a vida? É o simples agora, o imediato e nada vale mais a pena do que o agora, disse ela para o outro. E o que seria a morte? Um momento inevitável de solidão, pois você pode viver junto, mas vai morrer sozinho, disse para mais um.

E todos os dias ao nascer do sol, a velha Marta fechava o caixa, alimentava Cérbero e se despedia de cada uma daquelas almas que continuariam; algumas felizes, outras perdidas e muitas mutiladas, mas agora, expostas à luz do sol.

*Lorena Queiroz é advogada, amante de literatura, devoradora compulsiva de livros e crítica literária oficial deste site, além disso é escritora contista e cronista. E, ainda, de prima/irmã amada deste editor.

O bar de Yeye – Conto de Luiz Jorge Ferreira

Conto de Luiz Jorge Ferreira

A Yeye a senhora que trabalhava em casa há muitos anos, vinda de Belém do Pará, trazida por minha esposa, e recomendada por minha sogra, aposentou-se depois de trinta anos de trabalho, tendo inclusive ajudado na tarefa de auxiliar as crianças em sua criação, nas suas atividades do dia a dia, tal como banho, encontrar os sapatos, os chinelos, as tiaras, acertar franjas… etc… etc…

Yeye, que se chamava Maria de Nazaré Viana de Castro, foi uma profissional cumpridora de suas tarefas, e tornou-se uma pessoa da família. Chegou mesmo a se aposentar nessas tarefas todas.

Yeye criava canários, pintassilgos, cães, gatos, um loro cego do olho direito que xingava em Nagô, aprendido em seu tempo de moradia em Oiapoque, e em francês cantava marselhesa, e Edith Piaf Hynme a L’amour… primeira parte porque na segunda punha-se a chorar…

Passava horas conversando com as tartarugas após lhes banhar com água e as massagear com um pouco de azeite para lhes lubrificar os cascos. Todos lhe entendiam, e ela se entendia com todos.


As crianças cresceram, foram embora para outras cidades e o trabalho ficou resumido a limpeza da casa e ao cuidar dos animais e o preparo da alimentação que também era coisa pouca, porque eu passava a maior parte da semana no trabalho em outro município e por lá fazia as refeições. Nos momentos de folga dediquei-me como hobby a um curso de ventríloquo amador… coisa que me deu muita alegria e a possibilidade de brincar com amigos. Treinei bastante nas horas vagas e já conseguia projetar a ilusão da voz anasalada a uma distância de uns 5 metros…

Yeye andava muito triste, conversando com ela sobre o motivo… tive a impressão de que começará a beber, e que suas novas amizades no bar mais perto da única farmácia do bairro, agora consumia muito seu tempo, o que a fazia se descuidar do trato dos animais, que já começavam a apresentar marcas deste descuido, perdas exageradas de penas, perda de peso dos cães e gatos, casco ressecado nas tartarugas, e tristeza do velho loro que enrouquecido cantava Edith Piaf, dois tons abaixo.

Dei de presente uma viagem para Yeye ir rever seus parentes em Belém do Pará, e férias de 90 dias, para que eu pudesse contratar um mestre de obras para fazer uma reforma que tinha em mente…
Para cuidar dos animais pedi ajuda a um casal vizinho que também criava passarinhos, gatos e alguns cães.

De modo que eles até se animaram mais… recuperaram penas, cascos e pelos, e voltaram a gorjear, tomar banho de sol e o loro voltou a xingar os times pelo qual não torcia… focando no goleiro, que ele chamava de guarda-metas, coisa herdada de uma vizinhança luzitana pelos bairro do jurunas em Belém, muitos anos atrás.


Os pedreiros terminaram o trabalho e eu gostei do resultado. Uma das tardes de sábado fui até o bar onde Yeye bebia com os amigos, razão da sua alegria, e vi poucos frequentadores, estava “às moscas”… fui até a moça detrás do balcão e indaguei por todos os veteranos cujo apelidos havia levado anotado um pedaço de papel.

De quem tanto ela contava casos e gafes. Lamentável disse-me ela, com essa pandemia, a maior parte deles adoeceu e faleceram, os que escaparam ficaram muito ruins, não conseguem vir aqui… sabemos notícias deles por seus parentes quando os encontramos.  Triste.


Declinou o nome de muitos deles, que não moravam longe dali, os boêmios têm preferência sempre por lugares próximos as suas residências para evitar longas caminhadas com o “tanque cheio”.  Anotei tudo e dei um até logo.

Yeye chega. Vem de táxi. Traz na bagagem quase toda a flora Amazônica, e da fauna muitos mosquitos escondidos nos vasos de espada de São Jorge e latinhas de “comigo ninguém pode” e uma gaiola coberta com um pano fino servindo de capa. Peço que a vizinha lhe tampe os olhos e só os descubra na cozinha.

Agora depois da reforma fisicamente duble do bar que ela frequentava e na parede as imagens dos parceiros que há muito custo tinha conseguido que um retratista os desenhassem.. Um toca disco recuperado com LP’s variados, esses emprestados do bar, e uns dois ou três da vizinhança fazendo número.

Os animais dispostos no quintal com visão para a porta aberta aumentada de tamanho, a semelhança de um saloon dos filmes de bang bang… e o Loro sobre um varal de madeira extenso que o permitia se movimentar em quase toda a extensão do bar que cozinha agora imitava. Cantaram parabéns, embora não fosse seu aniversário e retiraram o pano dos seus olhos.

Houve choro e Yeye quase desmaia de feliz. o Loro gritava feliz. Mais feliz ficou quando descobriram a gaiola que ela havia trazido e ele viu a Lora de penas coloridas e vistosas. Quando eu subi a noite para dormir ainda ouvia os gritos do Loro, agora já com a voz rouca:

Tragam ela para cá…
Tragam ela para cá…

O TRAÍDO DO BAR DA MARIAH – Conto de Fernando Canto

Conto de Fernando Canto

Estava anoitecendo e eu acabara de tomar solitariamente uma cerveja supergelada no bar da Mariah. Ao me despedir levantei a mão para um grupo de jovens empresários e profissionais liberais burguesinhos, que ora prescrutavam as redes sociais, ora discutiam e gesticulavam. Eram contumazes fregueses de fins de semana reunidos para beber em uma grande mesa de plástico, uma junção de três outras. Na passagem para pegar meu carro ouvi um deles dizer:

– O poeta já vai dormir. Saudou-me com reverência.
Em seguida, um rapaz de barriga proeminente, barba aparada e cabelos da moda, mas extremamente bêbado, rosnou como um hipopótamo, babando pela boca adiposa.

– Esse poeta deve ser é corno. E gargalhava e tossia uma tosse seca, quase se afogando.

Seus amigos o censuraram imediatamente:

– Eh, rapaz, para com isso. Tu nem conheces o cara…
Fiz ouvido de mercador e em vez de chegar ao carro voltei para comprar algo esquecido. Tomei mais uma cerveja, paguei a conta, deixei passar um tempo, passei na mesa deles e disse, olhando bem a cara do ofensor, um sujeito que realmente eu não conhecia.

– Ei, bicho, nunca te vi. Por que que tu me ofendes, seu filho de uma puta?
Falei alto para que todos ouvissem. Ficou um silêncio de arrepiar os pelos. Os olhos verdes do bêbado cresceram sob o baque inesperado da minha reação.

– Eu ouvi o que falaste, mas vou te dizer uma coisa: é melhor ser um poeta sozinho e corno do que um idiota como você, seu porco fascista, que pelo jeito já deve ter tido essa experiência, porque tens cara de pederasta depravado, seu porteiro de puteiro.

Todos me olharam estupefatos. O cavalo do rio então… Mandava raios roxos de raiva em minha direção. Eu aproveitei o momento da surpresa e continuei:

– Eu não sei se sou ou não porque todo mundo é livre pra trair e pra fazer o que quiser, mas se eu sou eu vou saber. E prossegui: – Eu acho que tua diversão em ofender as pessoas deve ser um reflexo do teu recalque como um chifrudo que tu – eu disse apontando para a cara dele – que tu és, com certeza.

E completei, pra acabar logo a frescura:

– Não tô nem aí pra processo. Foda-se o politicamente correto. Tu não me conheces, sua baleia dopada.

O impacto da minha fala ligeira e contundente ficou no ar e nos olhos do pesado insultador. Ele babava, e quando pegou o lenço no bolso traseiro da calça, para limpar a baba e os líquidos que escorriam do nariz e dos olhos, fiquei tenso, pois pensei que fosse uma arma. Os caras que eu conhecia nessa mesa me aplaudiram fazendo pilhérias dele. O porco se tocou e quis se levantar, rebarbado, mas foi amparado para não cair.

– Senta aí, porra. Tu tás porre.
– Viu o que dá, ficar ofendendo as pessoas de graça?
– Te aquieta que ninguém compra uma briga dessas.
– Vai pra tua casa, caralho que tu tás bêbado, seu otário.

Para a minha surpresa o cara se acalmou e começou a chorar. Depois se levantou cambaleante, como se estivesse iluminado de uma necessidade de falar, e disse, se voltando para um companheiro a seu lado:

– Minha mulher está me traindo contigo, seu filho da puta. Tás pensando que eu não sei? Eu descobri e ela confessou. Vê aqui esse vídeo de vocês dois se beijando. Eu que filmei. Tu és um amigo falso. Não sei como é que ainda pago cerveja pra ti, porra.

O porcão chorava e apontava o dedo para o amigo impiedosamente. O acusado o abraçou e redarguiu que era tudo mentira, que era fake news, mas o traído não acreditava. E mesmo chorando e puto da vida falava a todos:

– Esse porra é o meu melhor amigo desde a infância. Eu amo ele. Mas ele me traiu com a minha mulher que me traiu com ele.

Enquanto os dois se perdiam perdão chorando abraçados, esfregando testa com testa em cima da mesa e seus amigos pagavam a despesa, eu pensei: “isso vai dar merda. É melhor tirar o time de campo”. Fui saindo à francesa na direção do carro, mas me viram. Ao ligar a ignição ouvi o porcão gritar meio choramingando ainda:

– Desculpa aí, tio. O corno aqui sou eu. E você está certo. Eu sou um idiota mesmo. E voltou a desatar no choro a mostrar o vídeo para os componentes da mesa.
Pelo retrovisor vi seus amigos rindo e acenado a mão para mim. O mesmo cara que me conhecia gritou:

– O poeta já vai dormir o sono dos justos.

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Ainda era cedo quando cheguei em casa pensando no que se sucedera no bar da Mariah, inclusive nas possibilidades de reação e caminhos que teria, no sofrimento que passaria e nas inúmeras desculpas e culpas recíprocas, se eu traísse ou viesse a ser traído pela minha amada mulher. Ela era muito bonita e bem mais jovem do que eu. Tínhamos uma relação de confiança e respeito, mesmo assim imaginava que a segurança de cada um acaba quando o diabo nos lambe o rosto com sua língua preta em tempo e lugar não imaginado. Vinha abrupto na minha frente o desenho bíblico da serpente ofertando a fruta proibida à Eva no paraíso. Em seguida o anjo portador da espada de fogo os expulsava para a realidade da vida, nus, sob intempéries, sob tormentas.

Eu lembrei do amigo Lúcio, um professor de filosofia falecido recentemente de Covid-19, que dizia: “Minha alma é como a sociedade de Hobbes, a que perverteu o homem. Eu era puro e fui corrompido quando amei pela primeira vez na adolescência ao encontrar a mulher da minha vida. O gênero humano se corrompe reciprocamente, por isso cada um é o lobo de si mesmo. Então eu amei e me perverti, amei e me corrompi sempre, mas nunca fui radical com as mulheres que amei, tanto que as deixei que se amassem e se corrompessem, afinal eram lobas que se devoravam a si mesmas. Isso também é poesia, meu poeta”, ele afirmava às gargalhadas. Dizia ainda que “todos nós somos corrompidos pela sociedade e pelas circunstâncias, que passam pela janela dos desajustados e até pela fantasia do amor, meu irmão. Por isso eu te digo: Hobbes tinha razão, Rousseau tinha razão, Locke tinha razão. Todos esses filhos da puta contratualistas tinham razão. Eles mudaram o rumo interpretativo da humanidade para provar que ainda somos e seremos uns filhos da puta por muito tempo”. E gargalhava como só ele sabia fazer.

Fiquei refletindo sobre os acontecimentos que já testemunhei em bares, dos que vivi como protagonista em brigas e confusões e sobre como eles nutrem de matéria-prima a construção de textos poéticos ou não, afinal as coisas da vida são feitas de realidades, mas também de sonhos e pesadelos, de poder, amor, sedução e traição. E de fatos que penetram a mente do poeta e são manipulados pela imaginação. Parece até que deixam o inconsciente prenhe de material do qual precisamos fazer dowload para gerar a literatura que nasce da memória, do que vimos e do que nunca vimos.

Claro que fiquei surpreso com a minha reação no bar da Mariah. Logo eu que abandonei essa vida de confuzeiro e brigão. Logo eu que me havia descoberto um poeta e publiquei dois livros. Porém, pensei no outro eu, aquele que já havia brigado em todo lugar. Saía para a porrada em silêncio, sempre esperando o ataque dos desafiadores, chamando-os com gestos e punhos cerrados, prontos para enfiá-los nos focinhos deles. Juro que me surpreendi comigo mesmo. Hoje, lá na Mariah, talvez eu estivesse usando a mesma técnica ameaçadora e inútil dos meus antigos contentores, gritando ofensas, e utilizando-as em minha defesa porque já estava ficando velho e não aguentaria mais uma briga de bar. Porra, o tempo passa e não dá para ganhar mais no grito. Ora, até a voz fica baixinha. Afinal, não foram as palavras do bêbado que me ofenderam, mas a forma gratuita como foram colocadas. Daí veio uma espécie de ferimento, um fulgor inesperado que me atingiu o brio e a dignidade da minha querida esposa.

Eu queimava os neurônios lembrando do esforço que fiz para acabar com meus preconceitos de um certo tempo para cá. “Caralho!”, eu dizia. Como é difícil se libertar dessas coisas arraigadas. Isso está no íntimo de toda a minha geração, um monte de palavras amarradas nos escaninhos da alma, prontas a serem libertadas quando os fatos da vida nos surpreendem e nos obrigam inconscientemente a vociferar palavras desagradáveis contra o mundo e até mesmo a ofender com humor, pois queira ou não, nunca estaremos preparados para nos policiar sempre, desde a infância. É difícil se reeducar sob um arcabouço de preconceitos ao qual estamos abrigados. Tudo é volatizado até nas brincadeiras e conceitos que trazemos sobre pessoas diferentes de nós.

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Naquela noite de sábado minha mulher tinha um compromisso com sua velha turma da faculdade e me esperava sorrindo, igual o cachorro do Roberto Carlos – assim pensei com o meu humor cruel e viscoso, inerente ao meu modo de ser, infelizmente. Ela estava tão contente com os cabelos pintados e penteados… As unhas postiças enormes e coloridas. Parecia uma adolescente se mostrando para o namoradinho.

– Amor, ainda bem que você já chegou. Estou esperando a minha brodona Katiúscia me ligar pra gente ir na festa de aniversário da nossa formatura. Todos vão estar lá. Cuide das crianças, tá?

Ainda pensei em perguntar: “Todos? Inclusive aquele seu primeiro namorado, o tal de Ted Garanhão?”. Só pensei. E resolvi engolir o meu ciúme.
Abri a geladeira, peguei uma heineken long neck e a enfiei na boca de um gole só. Ela desceu as escadas linda e sensual, perfumada e feliz. E eu puto ali me lembrando do porco pirado que tinha me ofendido. Ela ensaiou uns passos de forró universitário e umas gingadas de samba e funk, só pra me deixar mais enciumado ainda. Mas nem pode perceber como eu estava, pois sua excitação para a festa era maior que qualquer preocupação. Me deu um beijo no rosto, “pra não manchar a boca de batom” e falou:

– Me dá a chave do carro, moreco. Não sei que horas volto. Vou pegar a minha amiga.
E saiu rebolando como eu nunca mais tinha visto. E justo ia logo junto com a sua amiga solteira, também conhecida no bairro como “A Fera da Noite”.
Tomei todas as cervejas da geladeira. Terminei de ler um livro do Bukowiski. Liguei a TV para assistir a um filme bom, entretanto os temas que escolhia aleatoriamente eram sempre sobre traição, vingança, essas porras… Eu pensava nela, em mim e até no gordo traído do bar da Mariah. Meio atormentado, eu dizia reclamando sem necessidade: “caralho”, “caralho”. Até que bati uma bronha para ela e adormeci.

De manhã ela me acordou no sofá. Estava desgrenhada e meio porrote ainda. E muito invocada. Ordenou:

– Vai fazer o café, caralho! E faz umas tapiocas do jeito que eu faço pras crianças que eu vou dormir até tarde. Não me chama.
Entrou no quarto e se jogou na cama de roupa e tudo. Roncando e babando. Balbuciava: “égua da festa escrota”, “égua da festa escrota”. “Essa Katiúscia é foda, mesmo”.

Eu, com os Fernandos Bedran e Canto, sempre rindo dos “otaros”, no Bar da Maria

Enquanto eu fazia o café o sol rompia lá fora num clima quente que só o do inferno, onde mora a língua preta do diabo. Passei a mão na careca suada, lembrei de novo do traído do bar da Mariah com uma respiração de alívio, para depois rir aparentemente à toa, enquanto as crianças chegavam à mesa da cozinha esfregando os olhos remelentos e bocejando horrores. Nem liguei para o pára-choque do carro enviesado na garagem, todo batido. Eu ria igual nas redes sociais – onde ninguém sabe se as coisas são verdadeiras mesmo. KKKKKK! E dizia me rasgando de rir: “fowda-se!” “fowda-se!”, e repetia, para o espanto das crianças que sempre me viam muito sério. KKKKK! Elas riam comigo: -KKKKK! KKKKK! Kkkkk! KkKkK!

Sobre o extinto Bar da Euda (texto republicado por ser sexta-feira e os amantes dos botecos estarem com saudades de coisas assim)

Vez ou outra, gosto de reviver momentos ou lembrar de locais marcantes de Macapá, meu lugar no mundo. Afinal, “relembrar é rememorar”, como diz o poeta Fernando Canto.

Isso dentro do meu estilo de vida, pois amo a boemia. Hoje falarei um pouco sobre o extinto Bar da Euda, estabelecimento comercial que foi meio restaurante (durante o dia) e boteco raiz no centro da capital amapaense.

Hoje é sexta-feira, dia de tomar uma e de lembrar do Bar da Euda, estabelecimento que ficava localizado no centro de Macapá. Foi desde os anos 70, até 2013 (dona Euda faleceu em 2013 e seu filho, Miguel, conseguiu manter o bar até 2014) um espaço democrático para os halterocopistas se deliciarem com cervejas enevoadas, a tradicional cachaça de cravinho, tira gostos variados e a especialidade da casa, o “tempurá de camarão”, uma iguaria sem igual.

Lá éramos muito bem tratados pela saudosa dona Euda, o preço era justo e os frequentadores eram quase todos amigos. O Bar possuía bom atendimento, não tinha garçom de mau humor e banheiros sempre limpos. Ah, o bar não era sofisticado, tinha o modelo clássico de boteco, com mesas que invadem as calçadas.

Saudades de beber lá com o jornalista Tagaha Soares (que também virou saudades), o escritor Fernando Canto, meu herói literário tucuju ou gênio dos botecos Fernando Bedran (meu irmão diz que ele é melhor para tomar cerveja do que tira-gosto de charque), era festa!

Conheci figuras que molhavam a palavra por lá há mais de 30 anos. O Bar foi frequentado por biriteiros brancos, pretos, intelectuais, pseudointelectuais, religiosos, ateus, políticos, apolíticos, etc. Todos sempre de bem com a vida.

Enfim, o Bar da Euda foi um local aconchegante e sem frescura. Por lá, conversávamos sobre cultura, política, filosofia e sacanagem. Alguns até traçavam planos mirabolantes para dominar o mundo. Devaneios comuns nos botecos.

Muitas saudades da dona Euda, do bar e do bate papo descompromissado com a galera depois do trabalho, quando afogávamos o stress com boa bebida e companhia porreta, em um bar paidégua!

Há certas memórias que são como pedaços da gente, em que não podemos tocar sem algum gozo e dor, misturas de que se fazem saudades” – Machado de Assis.

Elton Tavares

“Papos de Rocha e outras crônicas no meio do mundo”: segundo livro de Elton Tavares visita paisagens da memória, boemia, poesia e cotidiano Amapaense.

Arte: Nina Ellen
A nova obra assinada pelo jornalista e editor do site De Rocha chega aos amapaenses no dia 22 de novembro. O livro conta com recursos da Lei Aldir Blac, executados pela Secult/AP – Arte: Nina Ellen

Viradas do cotidiano intenso e surpreendente povoam as páginas do segundo livro do jornalista Elton Tavares, fundador e editor do site De Rocha, portal mais do que enraizado nas buscas de internet dos amapaenses e fonte de cultura desde 2009. O lançamento de “Papos de Rocha e outras crônicas no meio do mundo” acontece no dia 22 de novembro, em um dos ambientes mais visitado e revisitado pelo autor, Bar e Restaurante Station 57.

Assim como na primeira coletânea, lançada em 2020, o jornalista volta a envolver o leitor em histórias que acontecem no dia a dia de Macapá e em sua vida pessoal. Com linguagem coloquial que aproxima e convida o leitor a mergulhar na narrativa dessa construção repleta de tanta verdade, que é possível se sentir dentro das “estórias”. Assuntos inusitados, porém vivenciados, como a reclamar por ter que usar uniforme, como também, sonhando com uma máquina do tempo cinematográfica ou sentindo o cheiro da educada, elegante e sábia, vó Peró. Relatos e mistérios surpreendentes que somente a boa literatura poderia revelar.

Como grande é o universo descrito nas páginas do “Papos de Rocha e outras crônicas no meio do mundo”, ainda maiores são os integrantes desse projeto liderado por Elton. As ilustrações são do artista plástico Ronaldo Roni, projeto gráfico e diagramação são assinados pelo publicitário Andrew Punk, projeto do produtor cultural e jornalista Daniel Alves e revisões da poeta Jaci Rocha e jornalista Marcelle Nunes.

Autor de diversas obras e lenda da cultura tucuju, o escritor Fernando Canto assina o prefácio do livro, deixando claro que se trata de uma experiência de imersão: “Ele fala de si mesmo como se colocasse palavras nas nossas bocas leitoras, latentes bocas do inferno, bocas devoradoras de letras e de pensamentos Tavarianos”.

As 43 crônicas que compõem o novo livro de Elton Tavares foram publicadas originalmente em seu site, o De Rocha. A obra foi realizada com recursos da Lei Aldir Blanc, executados pela Secretaria de Estado de Cultura (Secult). “Há 12 anos o portal faz parte da vida cultural e política do amapaense, fico muito satisfeito em ver que o virtual é palpável e virou um segundo livro. Agradeço à Secult e ao secretário Evandro Milhomen pelo suporte e confiança, à equipe que me ajudou nesse trabalho e ao amigo Fernando Canto pelo apoio e incentivo”, ressaltou o autor.

Para Elton, a obra tem o intuito de materializar o imaginário e dar vida diária à memória e à identidade que todos os amapaenses carregam. “É isso que o De Rocha realiza há 12 anos: o olhar de muitos observadores, suas vivências, realidades e o modo de dizer meu, do Amapá e tudo que faz parte da construção histórica da nossa cultura, espero que gostem, é isso”, conclui.

Lançamento

O lançamento acontecerá no dia 22 de novembro, no restaurante Station 57. Bem frequentado, o aconchegante espaço reúne boa culinária, cervejas incontestavelmente geladas, vívida playlist e atendimento impecável. Localizado no coração de Macapá, a escolha do lugar para o momento é parte da garantia de uma noite agradável de confraternização entre amantes das palavras bem escritas.

Serviço:

Lançamento do Livro “Papos de Rocha e outras crônicas no meio do mundo” de Elton Tavares
Dia: 22/11/2021 (segunda-feira)
Local: Station 57
Endereço: Rio Plaza Shopping – Central, Macapá.
Horário: das 19h às 21h
Entrada franca
Apoio: Secult – Secretário Evandro Milhomen

Marcelle Nunes – Jornalista

O Tratado Noturno em uma mesa de bar  – Crônica de Lorena Queiroz – @LorenaadvLorena

Crônica de Lorena Queiroz

Como todo ser noturno que ama habitar à meia luz da boêmia, andando pelos caminhos incertos das garrafas verdes e marrons, já me deparei analisando várias vezes este mundo que, a princípio, parece a alguns, fútil e vazio de perspectivas. Ora, se você pensa assim deve ser um daqueles sujeitos estranhamente sóbrios que nunca contou um segredo a um garçom considerado, aquele que te apresenta a conta quando o dia nasce e que sabe mais da tua vida que a tua própria mãe. Agora vou mentir um pouco dizendo que não te julgo, pois todos sempre o fazem, dizer que cada ser sabe da própria felicidade e que os caminhos são próprios de cada um, mas na verdade, que vida incompleta penso eu ser a sua. Concordo com o pensamento Bukowski quando diz que ser são é fácil, mas pra ser bêbado tem que ter talento.

O fato é que a mesa de bar é um divã, um confessionário onde embalado pelo álcool e os petiscos que entupirão nossas artérias e nos trarão um péssimo dia seguinte, despejamos uma parte significativa de nós. Uma porção que nunca daríamos em outro lugar. Talvez a boemia tenha que ser promovida a religião, pois eu nunca contei para um padre o que já disse desavergonhadamente em uma mesa de bar. E se Jesus multiplicou o vinho, eis aí o aval de que eu precisava.

Não, caro leitor, não quero que você se torne um alcoólatra que acabará em alguma sarjeta com a cara lambida por algum vira-lata marrom e amistoso. Mas é como nosso velho safado disse, você precisa ter talento para se meter com os seres noturnos e se você não possui tal traquejo, beba sua água com gás e faça caminhadas quando o sol te agredir menos a pele. Eu gosto da filosofia da mesa de bar, esse tratado em que todos se entendem mesmo quando o peso do álcool torna as coisas desconexas, onde um sujeito só julgará o outro se este tiver bebido menos, assim, certamente estará ele no lugar errado. São momentos de liberdade e de amores que duram a eternidade que os minutos te proporcionam, e isso é bom, pois também é bom esquecer ou simplesmente não lembrar de tudo.

Portanto, seja paciente com os bêbados, seja gentil com a noite, mesmo se você for um ser diurno. Somos feitos de filosofia, histórias e saudade. Nossos devaneios nunca incomodarão ninguém, pois eles se esvaem quando fechamos a conta e o dia. Por fim, siga o conselho do poeta francês Charles Baudelaire: “Para não ser escravos martirizados pelo tempo, embriagai-vos, embriagai-vos, sem cessar! Com vinho, poesia ou virtude, a vossa escolha.”

*Lorena Queiroz é advogada, amante de literatura, devoradora compulsiva de livros e crítica literária oficial deste site, além de prima/irmã amada deste editor.

Vamos brindar à vida: começa hoje o maior festival de bares do Brasil. Até 21 de novembro, Bar em Bar movimenta 25 bares de Macapá e Santana

“Saúde, vamos brindar à vida”. Esse é o cartão de visitas dos bares participantes do Bar em Bar em 2021 aos seus milhares de consumidores. Um convite para festejar, com a devida segurança, o que realmente importa: os amores, os amigos e a família. E qual palco melhor para isso senão um bar? Afinal, lá tudo se conversa. É uma instituição nacional que faz a alegria de todos, abriga o papo, o riso, o violão em festa, a contestação e a comemoração.

É em torno dessa ideia que acontece o festival Bar em Bar, que até 21 de novembro movimenta 25 bares em Macapá e Santana. O evento é realizado no Amapá pela Abrasel, Sebrae e Prefeitura de Macapá por meio da Macapatur, com o apoio do Sicred, 99Food e patrocínio da Devassa.

“O tema do festival não poderia vir em melhor hora. Os bares foram extremamente afetados pelas restrições e fechamentos. Precisamos continuar a retomada, de forma segura. Mais do que nunca é preciso celebrar a vida”, diz Yukio Nagano, presidente da Abrasel no Amapá.

A presença de bares em cada região dá um toque especial para o festival por meio da diversidade gastronômica. Para participar do Bar em Bar, as casas criaram uma receita diferente daquelas já ofertadas no cardápio, que estão sendo oferecidas a um preço único de R$ 25,00 sempre com a sugestão de uma boba bebida para harmonizar.

Um desses estabelecimentos é o Bar do Vila, que está participando pela terceira vez do evento gastronômico. Especializado em servir a um público alternativo e exigente, a casa oferece uma opção vegetariana do tradicional bolinho de bar, incrivelmente crocante por fora e macio por dentro, recheio especial com queijo da região, acompanhado de maionese e para beber uma bela caipirinha de caju.

“Aproveitamos os festivais para inovar nosso cardápio. Tivemos a felicidade de ter nosso trabalho reconhecido. Estamos ansiosos para o evento, pois diferente do ano passado o bar está sem restrições (de funcionamento), mas seguindo todas as normas exigidas” comenta Aline Araújo, proprietária do estabelecimento.

De acordo com Marianna Zampolo, executiva da Abrasel, os bares e restaurantes participantes receberão visitas dos críticos gastronômicos que emitirão notas com os quesitos apresentação, originalidade com a comida de bar e paladar. Os três petiscos melhores avaliados receberão troféus e premiações e o cidadão que primeiro completar o circuito de 25 bares com comprovação da visita com a hastag #barembarap receberá troféu de Papudinho do Bar em Bar. “Com o avanço da vacinação, cada vez mais pessoas estão seguras em frequentar bares, e poder voltar com o entretenimento oferecido pelo festival é uma boa pedida na retomada”, comenta Marianna.

Serviço:

Bar em Bar 2021
11 a 21 de novembro
Realização: Abrasel, Sebrae e Prefeitura de Macapá por meio da Macapatur
04 de novembro: coquetel de lançamento para imprensa e participantes
11 de novembro: abertura com show em frente ao Mercado Central
21 de novembro: encerramento com show e premiações no Complexo do Araxá
Mais informações para o consumidor final: barembar.com.br e instagram.com/festivalbarembar/

Assessoria de comunicação do Festival Bar em Bar