Tecendo a memória – Sobre o livro “Tecituras de Helena”, da autora Helena Bermerguy – Por @luizadejobim

Aos 80 anos, Helena Bemerguy reconta sua infância em livro bordado – Foto: Arquivo Helena Bemerguy.

Por Luíza Nobre

Faltando 15 minutos para o horário marcado para o início das fotos, eu ainda procurava no quarteirão o “excelentíssimo jardim” indicado no convite. Noto movimento e portas abertas em uma casa com muros de vidro onde funciona um escritório de advocacia e desço ali. Ainda molhadas, as plantas pareciam cabisbaixas por conta da chuva que tinha acabado de cair. Olho para o chão e vejo uma paleta de tinta gigante, na qual se encaixam vasos de flores. Tive a certeza de que estava no jardim certo.

O final do corredor estreito abria para um quintal aconchegante e coberto, onde se distribuíam cadeiras para os convidados se acomodarem. Uma lona comprida com ilustração de estante de livros prevenia que as cadeiras fossem molhadas. Os guarda-chuvas abertos, no entanto, em nada protegiam da água, mas cumpriam seus papéis decorativos pendurados no teto.

À direita, uma mesa com doces e chocolate quente foi disposta ao lado dos bordados emoldurados da autora, organizados em uma escada com flores. Os bastidores formavam um varal de bordados que balançava com o vento ou com a curiosidade de quem queria ver de perto as obras. Uma boneca de pano escorava-se na garrafa quente e ao fundo dela, via-se um baú aberto repleto de exemplares do livro.

Procurei um lugar para me sentar e montar a câmera, enquanto observava dona Helena, que socializava em uma rodinha de senhoras. Percebi que não via Helena há uns 15 anos, desde a época dos os aniversários de Maíra, sua neta e também minha amiga. Sorri e me apresentei como a moça que faria as fotos do lançamento. Ela sorriu de volta e perguntou meu nome, enquanto sentava em uma poltrona vermelha que combinava com o vestido azul e o tênis moderninho cheio de brilhos e amarrações, para fazer os primeiros registros.

Já com um volume considerável de pessoas, Amélia, a filha caçula da anfitriã, pediu licença para iniciar a apresentação do “Tecituras de Helena”. Ela, a Helena a quem o título do livro se refere, comentava o processo de criação junto dos desenhos de Bárbara Damas, que foram adaptados em linhas de costura e depois impressos em papel.

Abria-se o momento de perguntas e eu, que até então estava com os olhos na câmera tentando me camuflar atrás do móbile de sapatos, levantei a mão. “Queria saber como foi o processo de ressignificação das suas memórias”, ela me olha e diz “Olha, minha filha, acho que ainda está sendo. Quer dizer, eu sento e bordo, tendo motivo ou não. Esse livro eu fiz para deixar de herança para os meus netos, junto das muitas histórias que eu quero contar no livro e fora dele”, assenti com a cabeça e um “muito obrigada” e voltei para o meu lugar de espectadora.

Mais tarde, enquanto ela autografava os livros e eu registrava tudo bem de frente para a mesa, tentando não enquadrar o copo que ela escondeu atrás das flores, dona Helena me olha e pergunta se minha dúvida foi sanada. “Profunda a sua pergunta, menina, eu preciso pensar melhor sobre ela”. E eu, uma jornalista que nutria imensa curiosidade para além das histórias contadas, pedi timidamente para entrevistá-la no dia seguinte. Tempo suficiente para que ela processasse o que perguntei.

Na minha época

Nascida em Belém, capital do estado do Pará, no ano de 1937, Helena Aben Athar Bermerguy teve uma infância movimentada, mas sempre tranquila. Irmã mais velha entre os seis filhos, era ela quem comandava as brincadeiras e, quando necessário, ajudava a mãe em casa. “Eu vivi o século XX, minha infância não teve internet e televisão, precisávamos ser criativos”, comenta olhando para o meu celular que fazia papel de gravador no momento.

Das tecnologias da época que a menina gostava, o rádio era a predileta. Conta que passava tardes sentadas na mesa do pai ouvindo as canções e novelas, e só aprendia músicas se copiasse a letra. Um apreço que foi da palavra falada para a palavra escrita e a fez criar afinidade com as narrativas textuais.

“Na minha época, a menina que não tinha diário não estava por dentro da moda, e tinha que manter ele bem escondido. Eu escondia debaixo do colchão para a mãe não ver. Tive uma adolescência inteira, logo que entrei no ginásio”. Ela dividia com o caderno os sentimentos do dia e os sonhos juvenis. Mas engana-se quem pensa que confidenciar segredos fosse um ato movido pela timidez. Helena gostava mesmo de ter um motivo para contar histórias.

Ainda no início do livro a escritora descreve Belém como uma cidade única, e para ela, o melhor lugar. As comidas, os sabores, os igarapés e as mangueiras que subia para apanhar fruta da janela de casa. Pontualmente fala do pai, que ia à feira e trazia o paneiro carregado de frutas, depois reunia todos os filhos em volta da mesa para que provassem e aprendessem os sabores de cada uma.

”Como disse, meus primeiros pontos foram praticados nos enxovais dos meus irmãos mais novos”, dona Helena fazia dos bordados mais uma de suas brincadeiras em uma rotina em que boa parte do tempo era dentro de casa. De família tradicional judaica, ela sempre foi uma moça reservada pelas questões religiosas, mas o suficiente para não deixar de se destacar.

“É que no meu tempo as coisas eram mais diferentes, a juventude era outra”. E percebo que ela repete essa frase muitas vezes enquanto fala. Mas sem saudosismo. Sem o desejo de retornar ao passado. Fala com apreço às memórias afetivas que ainda são vivas na lembrança, e agora eternizadas em um livro que eu tenho em minhas mãos.

Vou te contar

Os bordados que antes eram passatempo ganharam outro significado na vida da jovem. Aos 17 anos, Helena foi “deportada” para Macapá, para que se afastasse de um namorado cristão. “Eu vim morar aqui muito cedo e sentia muita saudade dos meus pais, então comecei a bordar minhas histórias e alinhavar algumas coisas no meu texto”.

Na expectativa de seguir vivendo um amor impossível, o rapaz veio atrás dela na nova cidade, e lhe propôs um casamento onde ela não precisaria se preocupar em trabalhar e como diz Vinícius de Moraes: ser só perdão. Tudo o que ela não esperava da vida. “Eu sempre sonhei com minha independência financeira, porque eu acho que a mulher tem que ser dona da vida dela”, e preferiu seguir a vida sozinha e focada nos novos interesses.

Mas como diz a expressão popular: casamento e mortalha no céu se talha. E fugindo ou não da orientação do pai, o destino amoroso dela foi com um judeu. “Eu era a única judia em Macapá e só havia um judeu aqui, que era noivo na época. Quando me conheceu, desmanchou o noivado e nos juntamos, casamos e tivemos quatro filhos.” E mesmo trabalhando fora e tendo autonomia, Helena dedicou-se à construção de uma família sólida.

Mair Naftali Bemerguy e Helena Aben-Athar formaram juntos uma das famílias tradicionais de Macapá quando a mesma ainda estava em processo de deixar de ser território do Pará e se tornar uma cidade. “A família é como uma célula, minha filha, quando ela é boa na sua base, aqui embaixo, ela tende a seguir próspera”. Apesar de ter se casado cedo, ela se tornou viúva ainda jovem, quando completou 52 anos.

“Depois dos meus sessenta anos, quando comecei uma nova fase na minha vida, época em que meus filhos foram morar em Brasília, passei a fazer muitos cursos de crochê, frivolité, macramê e outros. Foi nesse movimento entre armarinhos que comecei a pensar na possibilidade de bordar minha história”, diz ela sobre a descoberta dos livros bordados. Por algum motivo, lembrei-me do poema “O Menino Que Guardava Água na Peneira” de Manoel de Barros que fala da infância e pergunto se ela conhece, recitando o primeiro verso para facilitar a lembrança. Ela balança a cabeça positivamente e diz que foi o primeiro livro bordado que leu e a inspirou. Ri da coincidência e tira da mala cópias dos desenhos originais que Bárbara Damas fez para o Tecituras de Helena.

O desejo de dar continuidade a um trabalho que se propôs a fazer na construção da família não lhe permitiu criar interesse em buscar outro casamento, e assim, o foco de sua vida voltou-se para a educação dos filhos. “A Bossa Nova passou em minha vida e não vi”. E nesse momento eu, que a ouvia sentada no chão aos pés da poltrona onde ela deitava esticando as pernas e permaneço observando os olhos dela.

Os olhos de Helena são de um acinzentado límpido, mas sem suavidade. Um olhar que não têm nada de tranquilo e que me atravessaram como a agulha atravessa o tecido para abrir uma nova casa em um ponto corrido. Penetram e constrangem, mas não um constrangimento ruim, e sim de quem se perde na transparente da expressividade deles. E penso que o maior baú de histórias dela talvez esteja guardado no olhar.

Livro Tecituras de Helena.

Das memórias que não soube tornar possíveis

“O meu neto de quinze anos sempre diz: vovó você foi professora, hoje você não é mais. E realmente, o ensino mudou muito, a maneira de ensinar. Confesso que pelo pouco que vejo meus netos estudarem, percebo uma evolução na forma de estudar, tem a internet, a leitura dinâmica”. Aposentada como professora de ciências e matemática, Helena não acredita que existam outros caminhos para o sucesso que não sejam construídos através da educação.

E entender a educação como fator modificador a faz se aproximar da realidade dos netos. Viver e se adaptar ao tempo presente sem grandes esforços e dialogar com diferentes gerações. “Eu sou um ser político, gosto de acompanhar o movimento do mundo. E sempre pugnou pelo social, não admito preconceito racial, de gênero… sou a favor das cotas, políticas públicas para as minorias”. E me mostra em seu celular os contatos do WhatsApp dos netos, com quem ela fala diariamente.

Quando lhe perguntei sobre a rotina, recebi um “eu faço qualquer coisa diariamente” como resposta e achei graça da objetividade dela. Mas compreendi que, para uma senhora de 80 anos com uma mente pensante e inquieta “qualquer coisa” sempre há de ser algo construtivo e interessante. Hoje ela nutre o desejo de ensinar a arte do bordado para quem tiver disposto a aprender e até me oferece uma vaga na possível primeira turma.

Decidir bordar a própria história, literalmente, foi uma forma que ela encontrou de dividir com os filhos os momentos que não teve a oportunidade de contar. Criar memórias a partir das memórias narradas, mesmo que tardiamente e agora, com mais uma geração para ouvir e carregar junto toda essa bagagem. Unir a família em uma única tessitura atemporal.

E deitada em uma poltrona rosa, uma espécie de divã, eu presenciei o que para mim tinha sido uma das maiores manifestações não governamentais do que seja a

memória. Tão espontaneamente que preenchia o espaço e tudo era motivo de um gancho ou explicação para existir naquele cômodo, na casa do filho de Helena. Tão pueril como o próprio livro. E com um convite final para um bolo no pátio, e mais conversa. Enquanto ela se adianta passos à frente, eu abro o prefácio do livro e releio “Quando terminei este livro fiquei pensando se meu pai ao lê-lo não diria: Abu, Helena, Abu*!”

*Abu significa “mentira” em hebraico.

Fonte: Café com Notícias.
* Luíza Nobre é jornalista, fotógrafa e produtora do programa de rádio Café com Notícia na 90,9FM, além de pesquisadora na área de memória e narrativa. Artista e curadora de memes.

Sobre a quarta-feira de cinzas

Hoje é quarta-feira de cinzas. Trata-se do primeiro dia da Quaresma (quarenta dias antes da Páscoa, sem contar os domingos) no calendário Cristão ocidental (Católico). Neste dia, os católicos rezam, silenciam, pagam alguma penitência, fazem caridade e até jejum. Os carolas, claro.

As cinzas que os Cristãos Católicos recebem neste dia, durante uma missa, são um símbolo para a reflexão sobre conversão, mudança pra melhor e ponderação sobre a fragilidade da vida humana em relação à morte.

A data que inicia a Quaresma varia a cada ano, dependendo da data da Páscoa. Pode ser do começo de fevereiro até a segunda semana de março. Sempre depois do carnaval.

Sabem, não sou religioso. Mas acredito na força de codinome Deus, que rege tudo isso aqui. Tenho muitos amigos que se dizem ateus. Respeito a opinião deles. E outros que são religiosos em demasia. Assim como Rubem Alves, “eu achava que religião não era para garantir o céu, depois da morte, mas para tornar esse mundo melhor, enquanto estamos vivos.”

Quem for à missa hoje receber suas cinzas, boa reza. Afinal, cada um de nós deve rezar, orar ou proceder como lhe aprazia.

Para mim, hoje é o dia que o Carnaval acabou (sei que esse ano não teve Carnaval, mas dentro de mim rolou sim).O ano começou de fato e com ele a realidade cotidiana, após alguns dias distante dela.

Ainda bem que a Semana Santa não demora a chegar, graças a Deus!

Elton Tavares

O trajeto da A Banda através do tempo e antigos pontos de referência (minha crônica saudosista)

Foto: Maksuel MArtins

Durante mais de 20 anos, sai na Banda pelas ruas de Macapá. Eu e meus amigos esperamos a terça-feira gorda o ano todo, pois a marcha louca e feliz sempre foi um dos dias mais felizes. Como disse minha amiga Rejane: “o coração batuca na esperança de ver a Banda voltar a passar”. Republico essa crônica por motivos de saudades: 

A Banda, maior bloco de sujos do Norte do Brasil, tem o mesmo trajeto nestes 56 anos de existência (caso a passeata alegre fosse às ruas hoje, mas sabemos que não irá por conta da pandemia), mas o que ficou pelo caminho do tempo nestas mesmas ruas de Macapá? Fiz uma espécie de resgate (um tanto desordenado) de vários locais que povoam a memória afetiva do macapaense. Deixa suas lembranças agirem e vamos lá:

O ponto de partida do bloco, o mais popular dos festejos de Momo no Amapá, é na esquina da lanchonete Gato Azul e a loja Clark. Os foliões seguirão pela frente da loja A Pernambucana, dobrarão na esquina do Banco Bamerindus (pois “o tempo passa, o tempo voa…); Farmácia São Benedito; Moderninha e da Banca do Dorimar. As pessoas se trombam ao redor dos trios e carros de som. Todos molhados de suor, ou chuva.

A folia desce a Rua Cândido Mendes e o trajeto passa em frente também da Irmãos Zagury – Concessionária da Ford; Farmácia Modelo; do Banap; lojas São Paulo Saldo; Esplanada; Cruzeiro; Hotel Mercúrio; Casa Estrela; Casa Marcelo; Setalar; Tecidos do povo; Tecidos do Sul; A Acreditar; Casa Estrela; Beirute na America, ponte do Canal; Banco Econômico e Farmácia Serrano. Pelo caminho, muitos se juntarão a multidão.

Os foliões passarão em frente a Fortaleza de São José de Macapá, dobrarão na esquina da Yamada, subindo pela lateral da Feira do Caranguejo, em frente a boate Freedom e subirão a ladeira até o supermercado Romana, na esquina, a curva do Santa Maria. Sempre com os ritmos levantam nosso astral.

A marcha alegre seguirá pela Feliciano Coelho, onde a maioria já estará possuído pela cerveja, passará pelo Urca Bar; Leão das Peças; Cine Veneza e Farmatrem. A Banda chegará à Esquina do Barrigudo, na Leopoldo Machado. Continuará a passar em frente a Acredilar, lanchonete Chaparral, Casa Nabil, Hotel Glória e Baby Doll. Na brincadeira terá folião de toda idade, a maioria na maior curtição, sempre driblando os poucos que querem confusão.

A Banda é sempre cheia de colombinas faceiras, pierrôs malucos, palhaços embriagados, piratas sorridentes, enfermeiras enxeridas, bailarinas cambaleantes, diabos bonzinhos, anjos não tão angelicais, etc. O importante é alegria de quem vive a emoção de estar lá ou somente ver a banda passar.

A Banda dobrará na Avenida Fab, no canto do CCA (o couro continuará comendo); passa pela Prefeitura de Macapá; Palácio do Governo; Esporte Club Macapá; Praça da Bandeira; lanchonete Táxi Lanches; Bar do Abreu e novamente a Cândido Mendes até a Praça do Barão, onde as bandas Placa Luminosa e Brind’s farão um som até mais tarde.

Nunca saberemos quantos fantasmas carnavalescos seguem conosco na Banda, mas se assim for, que sigam pela luz e brilho do encanto deste sublime momento (entre o ontem e o hoje).

*Hoje seria dia de cair na folia na marcha alegre ou ver a Banda passar. Mesmo a gente com saudades da passeata louca e feliz, o importante é prevenir, combater a Covid-19 e ter esperança para que, em 2022, nos encontramos na Banda. É isso!

Elton Tavares

ÚLTIMA COLUNA – COMO SE FAZ UM SAMBA ENREDO

Neste texto o poeta e cronista Alcy Araújo conta para a gente a história do samba que ele o o violonista e compositor Nonato Leal fizeram para a “A Grande Família”, na década de 1970 (salvo engano), homenageando o grande laguinense (ou laguinhense, como querem alguns) Julião Tomas Ramos, “líder do Marabaixo, em Macapá”, no dizer do Francisco Lino, compositor da Boêmios do Laguinho.

Alcy Araújo, Nonato Leal e Julião Ramos – Imagem montagem

ÚLTIMA COLUNA

Por Alcy Araújo –Jornal do Povo

Era natal e o bloco “Grande Família” pediu um samba, para o carnaval. Numa noite, eu falei para o Nonato Leal. Então ele disse “vamos fazer o samba, parceiro, numa homenagem ao mestre Julião”. Não deu outra coisa:

Julião, Julião, eu procuro e não te acho. Rei Negro do Marabaixo.

O refrão estava feito. O pior foi depois: ‘com a nostalgia no além mar, no bojo escuro dos navios negreiros, enchentes de batuques as noites de luar, para os balés suados dos terreiros’.

Aí eu e o Nonato, tivemos que consultar Nunes Pereira e, surgiu uma nova estrofe: “rei bânto, com Ladislau e tia Felícia, lutaste em favor da tradição e gritaste com ritmo de malícia, o teu protesto em forma de canção”.

Nós estávamos felizes, eu e o Nonato. Arrepiou. Juntos fizemos o final.

Carnaval em Macapá nos anos 60 – Foto: blog Porta Retrato.

Soberano dos campos do Laguinho, teu canto de atávica emoção, com o negror imemorial da escravidão, já não se ouve na margem do caminho”.

E nos abraçamos, pulamos (tomamos uma) e só não levamos o samba para o Martinho, porque estávamos tão felizes como a gente tivesse recebido um presente de papai Noel.

Deus e o samba sabem disto. E um dia, eu e o Nonato, vamos contar esta estória para o Fernando Canto, o Epifânio Sousa, os Jorges (Herberth e Basilie).

A Cristina Homobono Aires, sabe que o samba passou na avenida e provocou lágrimas no poeta. Aí foi só tomar mais uma. – AL.

Prefeitura de Macapá retoma produção de Cartilha sobre a história do Ciclo do Marabaixo

A Prefeitura de Macapá, por meio do Instituto Municipal de Políticas Públicas de Promoção da Igualdade Racial (Improir), anunciou a retomada na produção da cartilha institucional que conta a história do Ciclo do Marabaixo. O anúncio foi feito na sexta-feira (12) pela diretora-presidente do Improir, Maria Carolina Monteiro, durante reunião com representantes do segmento.

‘’A cartilha será um instrumento de implementação da lei n° 10.639/2003, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, incluindo o ensino de História e Cultura Afro-brasileira. Estamos montando o material em parceria com os representantes das famílias que realizam o Ciclo do Marabaixo e pretendemos colocar disponível nas escolas municipais de 1° ao 5° ano’’, ressaltou Maria Carolina.

Cartilha

O projeto vai documentar essa autêntica manifestação cultural e religiosa afro-amapaense, reconhecida como Patrimônio Cultural e Imaterial do Brasil. Desta forma, contará com informações didáticas das famílias tradicionais que iniciaram o Ciclo.

Dona Marinete Costa, de 59 anos, é integrante da Associação Cultural Berço das Tradições Amapaenses (ACBTA), localizada no Santa Rita, bairro conhecido nos ladrões de marabaixo como Favela, comentou a importância da cartilha para as famílias tradicionais.

‘’A cartilha serve para desmistificamos que o Marabaixo não é apenas dança e bebedeira. É a identidade cultural do nosso Amapá’’, destacou Marinete.

A reunião realizada no Improir contou com a presença de representantes dos seis grupos que promovem o Ciclo do Marabaixo em Macapá: Grupo Folclórico Zeca e Bibi Costa (Azebic), Associação Folclórica Marabaixo do Pavão (Afomapa), Associação Cultural Raimundo Ladislau, União Folclórica Campina Grande (USCG), Associação Cultural Berço das Tradições Amapaenses (ACBTA) e Associação Cultural Raízes da Favela – Dica Congó.

Marabaixo

O Marabaixo é uma manifestação cultural afro-amapaense que homenageia o Divino Espírito Santo e Santíssima Trindade, através de missas, ladainhas, ladrões e dança. A comemoração religiosa é realizada durante 61 dias, iniciando no Domingo de Ramos (Páscoa) e finalizando no Domingo do Senhor (Corpus-Christi).

Atualmente, o Marabaixo é considerado Patrimônio Cultural e Imaterial do Brasil. No Amapá, comemora-se no dia 16 de Junho, o Dia Estadual do Marabaixo, implementado pela lei n° 0049/10.

Aline Paiva
Instituto Municipal de Políticas Públicas de Promoção da Igualmente Racial

UM DIA DE ELLEN PAULA – (relato verídico de Carnaval – Por Fernando Canto)

Ellen Paula

Claro que não é a mesma coisa. Mas já me senti a própria miss da Expofeira deste ano que viu seu direito de ganhar o concurso ser usurpado (propositadamente ou não). Tudo por causa de um suposto erro de contagem do júri.

No meu caso a situação aconteceu nos fins de 1985, quando fui convidado para participar de um festival de samba-enredo da Associação Recreativa Piratas da Batucada, na sede do Trem Desportivo Clube. O tema era “O sonho de um rei”, e o regulamento dava margem para mudar o título, desde que o samba se encaixasse no que os carnavalescos da escola queriam.

Como na época eu pertencia à ala de compositores dos Piratas Estilizados, que era do segundo grupo, resolvi participar. Então convidei o Neck para defender a música “O Rei da Brincadeira”, para a qual fiz os arranjos e acompanhei no cavaquinho. Aconteceu, porém, que o Jeconias Alves de Araújo também estava inscrito no festival, mas não havia encontrado quem interpretasse seu samba. Pediu-me para cuidar disso. Cuidei. Ensaiamos os dois sambas na sede dos escoteiros do Laguinho com uma turma de batuqueiros dos Piratinhas.

No dia anunciado para realizar a escolha do melhor samba – um, sábado – havia seis inscritos. O primeiro a ser cantado, por sorteio, foi o do Jeconias, denominado “Sonho de um Rei”, cantado pelo Neck e acompanhado por mim no cavaco. Os intérpretes do samba seguinte – “O sonho de um pirata”, de Leonardo Trindade – não apareceram.

O próximo foi o meu samba, que o Neck interpretou magnífica e profissionalmente, sendo bastante aplaudido. A quanta composição, intitulada “O sonho de um rei no carnaval”, de Alcy Araújo, também não concorreu. Mas as duas seguintes, “Sonho de um rei fantasiado de pirata”, de Venilton Leal, e “Sonho em forma de samba”, de Zoth e Antoney Lima eram muito boas e também foram bastante aplaudidas pela galera do Piratão.

Fernando Canto e o saudoso Jeconias Araújo

Após uma longa e nervosa espera – um sofrimento para quem participa de festivais – finalmente o presidente do júri anunciou o resultado, favorável ao Jeconias Araújo, que por sinal era compositor dos Piratas da Batucada desde a sua fundação. Jeconias recebeu o cheque no valor de dois mil cruzados novos, contente da vida, enquanto eu e o nosso intérprete nos perguntávamos onde foi que erramos. Mais tarde, tomando uma gelada no badalado bar Balaio, na Praça Nossa Senhora da Conceição, o Jeconias, que depois viria se tornar um grande amigo meu, me esnobou balançando o cheque na minha frente. E nem agradeceu o favor.

Como essas coisas aconteciam nos festivais não liguei muito. Na segunda-feira o Manoel Torres, que fora secretário do júri do festival e pertencia à diretoria da escola, chamou-me na reprografia da Secretaria de Planejamento do Governo do Território, repartição que trabalhávamos. Ele queria me mostrar que o festival tinha sido feito com lisura e honestidade. Para tanto me deu uma planilha com os resultados.

Na ocasião eu estava acompanhado do Rui Lima, que como eu também era técnico da SEPLAN. De posse da planilha o Rui somou rapidamente os resultados com olhos de economista e detectou que o mesmo estava alterado. Em vez de 59 pontos o samba de Jeconias aparecia com 69: 10 pontos a mais. O meu samba havia alcançado 65,5 pontos, portanto eu ganhara o festival.

Não devolvi a cópia da planilha. Guardo-a até hoje. Fui atrás dos meus direitos e os consegui: o samba foi gravado (pelo Neck) e cantado na Avenida Fab no Carnaval de 1966.

O ruim disso foi que o Jeconias não recebeu o dinheiro do prêmio e por isso nunca mais fez samba para a sua escola. Por outro lado, no ano seguinte fui convidado pelo Monteiro para fazer o samba que homenagearia o Biroba, espécie de ícone do bairro do Trem. Então o samba ajudou o Piratão a ser campeão pela primeira vez, na FAB. Coisas do carnaval.

Prova do erro: planilha da pontuação

Compreendi a intenção do Manoel Torres, que não foi ingênuo, mas honesto; a de Jeconias, um vencedor que não levou o prêmio; e agora a da jovem miss Ellen Paula, que como eu fez seu trabalho, mas que por causa de um erro (intencional ou não) se viu impedida de comemorar a vitória. Mesmo assim eu acredito que sempre há um tempo para corrigir injustiças.

*Publicado no jornal “A Gazeta” de domingo, 13.12.2009

Cineasta seleciona atores para filme sobre a corrida do ouro no Amapá

Cineasta Rodrigo Aquiles – Foto: Diário do Amapá

Por Cleber Barbosa

Em busca de novos talentos para o cinema, o publicitário, designer, escritor e cineasta Rodrigo Santos, o conhecido “Aquiles”, confirmou na última sexta-feira (05), em entrevista ao programa Café com Notícia, na rádio Diário FM (90,9), estar em busca de dois novos atores para o curta-metragem de ficção “Tu Oro” que começa a ser rodado esse ano.

A produção vem sendo trabalhada desde janeiro de 2020, participando de editais de subvenção tanto estaduais como nacionais, tendo sido aprovado pela Associação Nacional do Audiovisual Negro, que agora presta toda a consultoria para a roteirização, criação do elenco e a pesquisa de campo, que envolve busca por documentos, textos e o assessoramento de um profissional de história – outro objeto de seleção pela produção.

O nome do curta-metragem é uma alusão à corrida pelo ouro que sempre esteve presente na trajetória do Amapá, isso há séculos. “Acaba sendo também uma excelente oportunidade para se mergulhar na história do nosso estado, pois a trama se passa num período histórico do século XIX, numa disputa entre dois homens, então a gente vai sair de um micro cosmo para um macro cosmo”, disse Aquiles.

De acordo com o produtor, a busca agora além das pesquisas para a contextualização do roteiro, é identificar dois atores – um negro e outro branco. “Mas o ator branco terá que falar um francês básico, pois o filme aborda também a questão do contestado entre Brasil e França pela disputa do garimpo no município de Calçoene”, aponta.

Aquiles acredita que a pandemia ainda irá prejudicar bastante o cronograma e o calendário inicial previsto, mas que até o mês de maio a trama começa a ser rodada. Para interessados em alguma etapa da seleção, a produção disponibiliza um contato de WhatsApp, o número (96) 98122-1285.

Fonte: Diário do Amapá

Movimento Costa Norte recebe homenagem do Conselho de Cultura do Amapá

Foto: Cleito Souza

Por Renivaldo Costa

O Conselho Estadual de Política cultural do Amapá (CEPEC) fará, neste sábado (6), a entrega de comendas pelos serviços prestados à cultura e à sociedade amapaense através da música ao MOVIMENTO COSTA NORTE.

A homenagem é fruto de um requerimento apresentado pelo conselheiro Edenildo Gonçalves Teixeira aprovado pela plenária do CEPC. “O movimento Costa Norte é um marco da música amapaense e precisa ser reconhecido e valorizado como tal”, explica o conselheiro.

O presidente Cleverson Baia convida a todos os artistas e a sociedade em geral para acompanhar através do Facebook e YouTube, a partir das 20h, a entrega de comendas ao movimento Costa Norte. Confirmaram presença: Zé Miguel, Osmar Jr, Val Milhomem e Amadeu Cavalcante.

A história e lendas da Pedra do Guindaste – Macapá 263 anos

Foto: Renato Ferreira

A Pedra do Guindaste é um monumento localizado em frente à cidade de Macapá, ao lado do Trapiche Eliezer Levy, dentro do Rio Amazonas. No século passado, ela teve como finalidade servir de alvo aos exercícios de tiro dos soldados, ao lado norte da Fortaleza de São José de Macapá.

Existem lendas em torno da “Pedra do Guindaste”, que ao longo dos tempos vêm servindo de inspiração a muitos poetas e pintores regionais. Uma delas é contada pelos moradores da antiga rua da praia e igarapé das mulheres, que afirmam existir uma cobra grande, com dimensões não calculadas, que na “maré de reponta”- ou seja, quando a água do rio não está na cheia e nem na vazante -, sai dali para tomar água, de maneira que a mesma nunca conseguiu cobrir a pedra. Se por ventura, alguma autoridade tiver a infelicidade de mandar retirar a pedra do rio, a água do amazonas subirá tanto que Macapá toda irá para o fundo.

Pedra do Guindaste – Arquivo de Floriano Lima.

Um dia colocaram a imagem de São José, padroeiro de Macapá, em cima da pedra. Pouco tempo depois um navio chocou-se com ela destruindo-a. No lugar foi construído um pedestal de concreto para São José, colocado de costas para a cidade, mas abençoando todos que aqui chegam pelo majestoso rio Amazonas.

Foto: Manoel Raimundo Fonseca

A imagem do santo padroeiro é uma obra de arte do escultor português Antônio Pereira da Costa. Ele também esculpiu os bustos de Tiradentes (na Polícia Militar) e Coaracy Nunes (no aeroporto) e os leões do Fórum de Macapá (atual sede da OAB).

Fontes: Porta Retrato e Alcinéa

Macapá Cheia de Prosa e Verso (Por Fernando Canto) – republicado por conta dos 263 anos de Macapá

Rei da Espanha, Carlos V

Por Fernando Canto

“Adelantado de Nueva Andaluzia. Tu sabias, mano que esse foi o primeiro nome oficial às terras do nosso Amapá?

Em 1544 o Rei da Espanha, Carlos V, concedeu a Francisco Orellana este lugar, mas o grande navegador não chegou a assumi-lo por ter naufragado quando para cá se dirigia.

Desde Pinzon que os espanhóis e os portugueses disputavam acirradamente nossas terras em virtude do Tratado das Tordesilhas.

Depois vieram os holandeses, os ingleses e os franceses.

Depois portugueses, índios e negros, nossos avós, garantiram nossos destinos conquistando definitivamente a foz do rio Amazonas rechaçando com atos de heroísmo os flibusteiros e marinheiros europeus.

Francisco Xavier de Mendonça Furtado

E nós, como povo, temos nossa História. Brava História.

Por isso, compadre, que um dia, na antiga Província dos Tucujus, chegou o governador Francisco Xavier de Mendonça Furtado para fundar neste local a então Vila de São José de Macapá.

Era o dia 4 de Fevereiro de 1758.

Daí em diante esta cidade cresceu e se fez bonita.

O avião era uma Catalina, anfíbio – Primeiro avião que apareceu em Macapá – Imagem: Google.

E em maio de 1944 Macapá foi transformada em capital do Território Federal do Amapá, criado um ano antes.

Foram chegando os pioneiros.

Cada qual com seu trabalho e sua coragem. Saga e valentia.

Só mesmo homens e mulheres dispostos a trabalhar poderiam modificar aquele quadro triste de doença, analfabetismo e miséria. Nossos pais e avós, todos juntos, reuniram suas forças para trabalhar por esta terra. O sentimento de amor e de progresso era superior ao esmorecimento e ao pessimismo.Tudo foi modificando-se.

Chegou o primeiro carro e o primeiro avião.

O Caixa de Cebola foi o nosso primeiro ônibus – Foto do acervo do jornalista Edgar Rodrigues

O primeiro campo de aviação foi construído e foi para o ar o primeiro programa na velha e querida Rádio Difusora de Macapá, uma das pioneiras do Brasil.

Instalou-se a primeira usina de luz, o primeiro hospital.

Égua! O Caixa de Cebola foi o nosso primeiro ônibus. Depois veio o Gavião Malvado… Tudo tinha nome ou apelido.

“Turma do Buraco” que arborizava Macapá… Em Macapá faziam sátira com a música “Cidade Maravilhosa” e cantavam assim: “Cidade Maravilhosa/ Cheia de catabil…” – Foto: acervo do jornalista Edgar Rodrigues

Havia a “Turma do Buraco” que arborizava Macapá…

Em Macapá faziam sátira com a música “Cidade Maravilhosa” e cantavam assim: “Cidade Maravilhosa/ Cheia de catabil…”

Pois sim, essas pessoas que a cantavam, assim o faziam porque não tinham a visão do futuro.

Macapá tinha o horizonte aberto para receber as mãos dos homens trabalhadores que chegavam de todas as paragens.

Avenida Cora de Carvalho, no bairro alto – Foto: acervo do jornalista Edgar Rodrigues

E juntos, com os que aqui já se encontravam – mineiros, cariocas, nordestinos, gaúchos – todos trabalhavam e pensavam em progresso. E como na lenda da cigarra e da formiga uns cantavam, mas a maioria trabalhava.

E esta cidade, mano, foi crescendo ao som do Marabaixo que a preta velha cantava na Quarta-Feira da Murta pelas ruas do Laguinho e da antiga Favela.

“Passei pelo lírio roxo
Cinco folhinha apanhei
Cinco sentido qu’eu tinha
Todos os cinco lá deixei”.

Todo um sentimento poético abraçava a cidade. E Macapá estava linda sob o sol.

Aliás, a luz sempre simbolizou a vida.

Foto: Camis Rocha

O sol beija o rio na maior parte do ano. E ao nascer todos os dias ele traz para nós a esperança de dias melhores e mais mansos.

Sabe, mano, enquanto soubermos discernir o bom do ruim faremos deste lugar a razão de nossa felicidade, pois ela permanecerá acesa nos nossos lares.

Devemos ainda aprender a amar nosso chão e nosso céu de sonhos. Temos tudo para ir adiante, assim como nosso primeiro nome, lembras?

Adelante, adiante, para a frente.

Foto: Manoel Raimundo Fonseca

É importante sermos otimistas e ter os pés neste solo. Batalhar e trabalhar para fazer desta terra um mundo de coisas boas.

Sim, um mundo moldado com as mãos e com a respeitável inteligência de nossos irmãos.
Tu já fizestes uma viagem, não foi? Sem querer tu pensaste em alguns detalhes e fostes e voltaste.
Assim como tu, nossos dirigentes também pensam, planejam e realizam obras que nossos filhos vão falar com orgulho e seus corações também falarão através de um grande sorriso em suas bocas.

Foto: Netto Lacerda

É preciso continuar planejando para atender aos anseios de nossos irmãos carentes.
É preciso combater os malefícios e pensar no bem-estar geral. É preciso, compadre, é preciso trabalhar.
E nós estamos trabalhando prá viver e se for preciso até morrer por este lugar.
Adiante, adelante, adelantado.
Bem ali, no mais tardar das esperanças tu construirás o teu tempo.
Nem que seja sobre a folha que cairá de uma árvore sob o impacto da chuva.

Olha, mano, deves ter a certeza que o rio corre para um único destino: o mar.
E nesta linda cidade paira a luz sobre nossas cabeças.
Então, iluminados, devemos homenageá-la.
Já viste o rio amazonas deitado no seu leito. Já viste a importância da Fortaleza de São José. Já viste também os namorados apreciando o rio parir uma lua gordinha lá no Quebra-Mar.

Foto: Floriano Lima

Então tu sabes, mano, como é linda e hospitaleira a nossa cidade, né? Pois é.
O Marco Zero do Equador passa aqui pertinho, separando o mundo em dois hemisférios. Já notaste que vem tanta gente aqui pra visitá-lo?
Tem uns turistas louros, morenos, pretos e amarelos que só tiram fotografias com as pernas abertas dizendo que estão no meio do mundo.
Sabes por quê? Ora, Macapá é importante…

Mas tu sabes o que significa a palavra Macapá? Não?
Macapá é uma variação de Macapaba, que quer dizer, na língua dos índios, estância das macabas, o lugar de abundância de bacaba.
Bacaba é uma fruta boa e gostosa, né?

Foto: Alexandre Brito

Apesar de gordurosa ela alimenta muito a gente e o seu vinho ainda tem aparência de café com leite.
É assim como o açaí, o nosso petróleo comestível que a gente compra um litro na amassadeira do Ramiro e dá de pau na hora do almoço. Temos tanta fruta que tu nem imaginas…

Temos cupuaçú, graviola, bacuri, jenipapo, uxi, pupunha, camapu, ingá, chega a dar água na boca.
Mas, compadre, Macapá é uma linda morena.
Vês que de manhã aquele solzão bate no Amazonas que chega até encandear a gente.
Macapá é uma cidade segura. Aqui o rio nunca transbordou.

E quando o sol vai embora, mano, nós ficamos com a certeza que ele voltará.
E assim como nós acreditamos nisso, nós acreditamos no futuro e no trabalho de nossos irmãos.
Na essência da poesia a Macapá o que vamos encontrar é a alma do povo. O povo que sonha, ama e constrói.

Foto: Elton Tavares

Neste poema, cada dia reescrevemos um verso apaixonado. Uma declaração de amor à nossa cidade, que mesmo se tornando uma capital diferente daqueles dias de Adelantado, não aceitou perder sua alma, nem endurecer seu coração.

Nota do Editor: Esta arrumação de história, prosa e poesia do escritor Fernando Canto serviu para ilustrar cartazes e folhetos distribuídos há algum tempo por iniciativa do então secretário de Planejamento, Antero Dias Lopes. A tiragem foi limitada de modo que não muita gente teve acesso a essa tirada do Fernando. publicando o trabalho, a A Província dá oportunidade a milhares de leitores enxergarem Macapá por um lado diferente, saboroso.

*Jornal do Amapá – N°148 Pág.12, 2° Caderno. A Província do Pará – Belém, Domingo, 17 e Segunda-Feira, 18 de abril de 1988.

Editor: Hélio Penafort.

Há 52 anos, os Beatles se apresentaram pela última vez

Foto: Tumblr Bealtes

No dia 30 de janeiro de 1969, uma tarde de quinta-feira fria em Londres, no alto do edifício sede da Apple Records, os Beatles realizaram sua última apresentação para o “público”. Na realidade eles vinham de um trágico período de gravações e ensaios num estúdio londrino, onde gravavam o filme Let It Be. As sessões foram terríveis, pois além da figura de Yoko Ono (grudada em John Lennon 24 horas), a banda estava brigando muito entre si. Desde o Álbum Branco, os quatro já não se entendiam muito no estúdio.

Quando decidiram que Let it Be deveria ser gravado no novo, porém precário Apple Studios, os Beatles também pensaram que poderiam agir normalmente. As sessões no prédio da Apple ocorreram com mais calma, tanto que a ideia de tocar no telhado do prédio veio do próprio Lennon.

Antes, Paul McCartney tinha planejado realizar um concerto no final das gravações. Locais no mundo inteiro foram vistos para o show, porém a maioria deles não havia como, ou estavam com agendas apertadas. Então amargamente, os Beatles decidiram tocar no telhado do prédio. Até Harrison, avesso a shows, gostou da ideia.

Naquela tarde fria, os primeiros acordes de Get Back foram fundamentais para que os moradores dos prédios vizinhos viessem até a sacada para dar uma olhada naqueles cabeludos tocando rock.Os Beatles tocaram nove músicas e durante 40 minutos, até a Polícia bater na porta da Apple e um nervoso Mal Evans tentando explicar que “Os Beatles” estavam tocando no telhado da Apple.

Segundo o livro “The Beatles – Biografia” de Bob Spitz, a polícia nem sequer pediu para acabar com o show, apenas solicitaram que os Beatles abaixassem o volume dos instrumentos, eu disse abaixassem, porém, como eles eram, não houve acordo e o show teve que acabar antes que eles pudessem terminar o set previsto.

As canções tocadas foram:

1. Get Back (1)
2. Get Back (2)
3. Don’t Let Me Down (1)
4: I’ve Got A Feeling (1)
5: One After 909
6: Dig A Pony
7: I’ve Got A Feeling (2)
8: Don’t Let Me Down (2)
9: Get Back (3)

O show foi adicionado ao filme Let it Be e na realidade é o que vale a pena naquele filme. As sessões de Get Back (Let it Be) foram finalizadas, porém os Beatles não deram importância para as fitas, entregando nas mãos de Glyn Jones e depois nas mãos de Phil Spector, que destruiu tudo que eles fizeram, enfiando orquestrações e um solo de guitarra metálico para Let it Be, na qual George odiou.

Após a intervenção da polícia (que precisou ameaçar os funcionários da gravadora de prisão caso não permitissem o acesso ao prédio), os Beatles tocaram durante mais alguns minutos e encerraram o show com “Get Back”.

Foto: Tumblr Bealtes

Paul chegou a brincar com a situação, improvisando a frase “Você está brincando no telhado de novo e sabe que sua mãe não gosta, ela vai mandar te prender”. John Lennon agradeceu ao público presente (e onipresente), com a frase “Quero agradecer em nome do grupo e de nós todos e espero que tenhamos passado no teste”.

Foto: Tumblr Bealtes

Meu comentário: Não lembro onde achei o texto acima, mas o republico aqui há uns 10 anos. Apesar de amar Led Zeppelin e Pink Floyd e Rolling Stones, para mim, os Beatles foram e sempre serão os maiores. O último show, no terraço, foi reconstituído no filme “Across The Universe”, onde a banda que interpretou os caras de Liverpool executou a canção “All You Need Is Love”. Após 52 anos, todos nós ainda curtimos o som dos besouros e sempre precisaremos de amor.

Assista aqui mais sobre esse momento histórico do Rock:

Gino Flex, o Rei dos Malucos de Macapá – Uma crônica sobre saudades e maluquês

Ilustração de Ronaldo Rony

Em novembro de 2013, dia 12 precisamente, morreu o artista, músico, inventor do Clube do Vinil, Dj oficial de encontros memoráveis e Rei dos Malucos de Macapá, Gino Flex . Não sei quantos anos ele tinha, mas acho que eram quase 60 verões.

Conheci o Gino em 1997, ainda com meus 20 e poucos e curta estrada na boemia da capital amapaense. O cara era querido por todos. E não é porque morreu não. O cara era do naipe do fictício Quincas Berro D’Água e do real Charles Bukowski.

O estilo de vida era “de boa”, verdadeiro ode à boemia e hedonismo. Sim, o velho Gino era “brother”. Gino Flex estava internado há dias com complicações no fígado. Chegou a ser operado, mas não resistiu. Certamente, sua passagem para a outra vida foi como nessa, leve.

A vida manda os seus sinais, basta ter o coração aberto e ser amalucado o suficiente pra entender” – Cabo Martim, personagem do livro “A morte e a morte de Quincas Berro D’água”, de Jorge Amado.

Vira e mexe, lembro do Gino Flex, o Rei dos Malucos de Macapá. Ali foi figuraça!

Até a próxima vez, Gino!

Elton Tavares

Colégio Amapaense completa 74 anos. Viva o “C.A.”!

Foto: Elton Tavares

Acredito que nove entre dez pessoas que estudaram no Colégio Amapaense é apaixonado pela escola. É o meu caso. O velho “C.A.” completa 74 anos hoje. Deixo aqui um texto do jornalista Edgar Rodrigues, com meu comentário no final:

Colégio Amapaense, 74 anos formando gerações

Por Edgar Rodrigues

O Colégio Amapaense completa 74 anos hoje. O nosso querido Colosso Cinzento, sediado em Macapá na Avenida Iracema Carvão Nunes nº 419, no bairro Central. Criado pelo governador Janary Gentil Nunes, através do Decreto territorial nº 49, de 25 de janeiro de 1947. Recebeu inicialmente o nome Ginásio Amapaense. Iniciou suas atividades em abril do mesmo ano, de forma condicional, até agosto, quando foi autorizado para funcionar pela Seccional do Ensino Secundário do então Ministério de Educação e Saúde, sediada em Belém (Pará), pela Portaria nº 367/47.

Colégio Amapaense – Foto do acervo do Edgar Rodrigues

Na época, a matrícula inicial foi restrita à 1ª e 2ª séries ginasiais, tendo como sede o Grupo Escolar Barão do Rio Branco (Grupo Escolar de Macapá) em caráter temporário até a conclusão de seu prédio (primeiro bloco). Em 12.03.1949 é fundado o Grêmio Literário e Cívico Ruy Barbosa, congregando alunos do Ginásio Amapaense. A primeira diretoria ficou constituída de José Raimundo Barata (presidente), Mário Quirino da Silva, Edilson Borges de Oliveira. A posse se deu em 24 de março, em solenidade no Salão Nobre da Escola Profissional Getúlio Vargas (atual Escola Integrada de Macapá, antigo GM).

Em 12 de julho de 1950, o Ministério da Educação e Saúde expediu a Portaria nº 244, concedendo equiparação do Ginásio Amapaense, reconhecendo o ensino ministrado com validade para todo o país. Em 25.01.1952, pelo decreto governamental nº 125/1952, o Ginásio Amapaense passa a se chamar Colégio Amapaense, recebendo alunos do antigo Curso Científico, que passa a receber a nomenclatura de Curso Colegial, correspondente atualmente ao Ensino Médio, funcionando em três turnos.

Em 13 de junho de 1952 passa a funcionar definitivamente em seu prédio próprio, na AV Iracema Carvão Nunes com a Rua General Rondon, com apenas 9 salas de aula.

Assim, o Colosso Cinzento da Avenida FAB, como a Fênix da Mitologia Grega, renasce das cinzas do esquecimento de administrações anteriores, e ressurge colossal e maravilhoso, dando um aspecto paisagístico ainda bastante arrojado, no início do século XXI, formando mentes para desenvolvimento da cidadania e realização profissional

Tenho a honra especial de dizer que fui estudante de lá, e com certeza os professores do CA foram a base de todo o meu conhecimento atual.

Foto: Elton Tavares

Meu comentário: Sinto saudade da velha turma, daqueles dias incríveis vividos nos anos 90 e da contribuição do Colégio Amapaense para a minha formação educacional, formação do caráter e amizades inesquecíveis. Aprendi muitos valores morais naquela época. A escola precisa ser homenageada, toda essa bagagem histórica precisa virar documentário e o resgate é fundamental para a memória do C.A. e do Amapá.

Tempos de festas de garagem, estilo de vida meio Bukowski e com trilha sonora rock’n’roll, claro! Internet, Rede Social e toda essa modernidade era coisa de cinema. Eu tinha feito curso de datilografia (com o Werlen), estava aprendendo a mexer no MSDOS (programa de computador com tela preta e letras verdes) e tempos de disket. Quem tinha celular era rico e tocava sempre Legião Urbana.

Bom, apesar de termos tomado cervas pra esta vida e para a próxima nos tempos do Xodó (ainda bebemos bem, mas não como naquela época), cada um seguiu seu caminho da melhor forma.

Só quem viveu ou sacava a gente sabe do quanto aprontamos na época do Colégio. Viva o “C.A.”!

Elton Tavares – Jornalista e aluno da turma de 1990 a 1996

Mazagão velho, a cidade que atravessou o oceano, completa 251 anos – Por Elton Tavares

Mazagão Velho – Foto: Gabriel Penha.

Mazagão Velho completa 251 anos de fundação neste sábado, 23 de janeiro. A minha família paterna veio do Mazagão, não do Velho, mas do “Novo” (que não tem nada de novo). Bom, vou falar um pouco da cidade e depois da relação do local com o meu povo.

Ruínas de uma igreja construída no século XVIII – Foto: Hélida Penafort

O município de Mazagão tem uma história peculiar, rica em detalhes sobre o Amapá. Mazagão foi fundada porque o comerciante Francisco de Mello pretendia continuar com o comércio clandestino de escravos, mas pressionado pelo governador Ataíde Teive, resolveu cooperar, fornecendo índios para os serviços de construção da Fortaleza de São José, na capital do Amapá, Macapá.

Mazagão Velho, no frame de vídeo (documentário em produção) cedido pelo amigo Aladim Júnior

Em retribuição, foi anistiado e agraciado com o título de capitão e diretor do povoado de Santana; mas, por conta de uma epidemia de febre, que acometeu os silvícolas, foi transferido para a foz do Rio Manacapuru, e, pelo mesmo motivo em 1769, para a foz do Rio Mutuacá.

Antigo cemitério de Mazagão Velho, no frame de vídeo (documentário em produção) cedido pelo amigo Aladim Júnior

Em 10 de março de 1769, D. José I, Rei de Portugal (POR), desativou a cidadela de Mazagão, na então colônia do Marrocos (MAR); eram 340 famílias sitiadas pelos mouros. Elas foram transferidas para Belém (PA). Para alojar estes colonos, o governador mandou construir um povoado às margens do Rio Mutuacá. Em 7 de julho de 1770, começaram a ser transferidas 136 famílias para a Nova Mazagão, hoje cidade de Mazagão Velho, como já se denominava o lugar, pois desde o dia 23 de janeiro de 1770, havia sido elevado à categoria de Vila.

Prefeitura de Mazagão – Foto: Elton Tavares

Na verdade, meu saudoso avô paterno, João Espíndola Tavares, nasceu na região do alto Maracá, no Sítio Bom Jesus – localidade de difícil acesso. Para se chegar ao local, as embarcações precisavam passar por muitas cachoeiras do município de Mazagão. E minha santa vó, Perolina Tavares, bisneta do senador do Grão Pará, Manoel Valente Flexa (que foi manda-chuva em Mazagão, no tempo em que lamparina dava choque), também nasceu naquelas bandas. Ah, meu vô foi prefeito do Mazagão (preso pelo golpe de 1964, a então “revolução”).

Acervo familiar.

Lá eles namoraram, casaram e constituíram família. Meu pai, Zé Penha e meus tios Maria e Pedro, nasceram no Mazagão. Os filhos mais novos do casal, Socorro e Paulo, nasceram em Macapá, onde minha família paterna é uma das pioneiras. Meu vô partiu em 1996 e meu pai depois dele, em 1998. Mas a família Tavares preserva a dignidade, o respeito e a amizade – fundamentais para a vida – aprendidos no Mazagão e trazidos para a capital amapaense.

Eu, com vó e vô. Gratidão! – Mazagão (AP) – 1978

Quando criança, fui ao Mazagão, mas não tenho essas lembranças na cachola. Retornei ao município em 2009, quando meu avô foi homenageado na Loja Maçônica da cidade, por ter sido um de seus fundadores. Depois em 2010, a trabalho, para cobrir a Inauguração da Ponte sobre o rio Vila Nova, na divisa da cidade com a vizinha Santana. E depois, em 2012, para a cobertura do aniversário de fundação da antiga vila (há exatos nove anos).

É, minha família paterna veio do Mazagão (na década de 50). De lá trouxe uma nobreza que admiro e muito me orgulho. Não sei explicar a sensação de ir lá, mas a senti todas as vezes. Parece um lugar em que já estive há muito, muito tempo. Quem sabe noutra passagem por aqui. Do que tenho certeza, é que tais raízes nos deram muita cultura, histórias legais e respeito às tradições. Meus parabéns, Mazagão!

Elton Tavares


*Este texto, atualizado para hoje, é parte da monografia que escrevi para o meu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) de Comunicação. E também é um entre os 60 do livro “Crônicas de Rocha – Sobre Bênçãos e Canalhices Diárias”, de minha autoria, lançado no último dia 18 de setembro. Ah, A obra tá linda e está à venda na Public Livraria ao preço de R$ 30,00 ou comigo, Elton Tavares (96-99147-4038).

Ainda sobre Mazagão Velho, assistam os o trailer do documentário “Mazagão – PORTA DO MAR” e a reportagem do programa “Repórter da Amazônia | Mazagão”: