Poema de agora – Quintal dos dias – Júlio Miragaia ( @julio_miragaia )

Quintal dos dias

Sou pouco,
Ergui, ao longo do quintal,
Árvores inteiras de interrogações,
Algumas sementes deixei,
Amei saudades e agoras.

Sou pouco,
Meu lento e frouxo olhar
Às vezes dorme aberto,
Apaixonado no cio das manhãs,
Cio de passarinhos e mangas.

Sou pouco
E não gosto quando
As chuvas perdem para o sol,
Quando venta o cheiro das visagens
E a vampira fome dos carapanãs.

Sou pouco
Mas guardo, no quitinete
Espaço-temporal,
Minhas próprias faxinas forjadas
Entre sentir e ler a vida
No balançar da rede dos dias.

Júlio Miragaia

Cai dentro, 2023. Feliz ano novo! – Crônica de ano novo de Elton Tavares

2023 está ali, dobrando a esquina. Que todos nós, eu, você e demais pessoas que estão lendo este texto, assim como nossos amores, sigamos saudáveis e sejamos felizes no ano que chegará logo. A vida boa e lôca. Só é feliz quem arrisca. Vamos com toda a força no novo ciclo. E, é claro, agradecer por termos sido felizes, apesar de tudo, em 2022.

Mesmo com todos os desafios, injustiças de toda ordem,  tristeza por conta de coisas terríveis,  vivi intensamente 2022. Sou grato aos meus companheiros de jornada, tanto os familiares, amigos e colegas de trabalho, quanto aos que me ajudaram e não estão inclusos em nenhum destes grupos citados.

Que tenhamos luz e sabedoria para encarar as adversidades e os desalmados que certamente aparecerão no novo ciclo. E que nos esforcemos para sermos pessoas melhores que em 2023. Esse “vinte, vinte e três ” será desafiador.

Que em 2023 tenhamos muito boa vontade, forças positivas, disposição e autoconfiança para corrermos atrás de tudo o que desejamos alcançar. Tenho certeza de que muita alegria nos espera no ano vindouro. Pelo menos a esperança nisso não é pouca. E, sobretudo, SAÚDE!

Viverei 2023 como se fosse o último ano de minha vida, podem apostar (sempre faço isso). O ano novo promete. Que ele se cumpra então, que seja mágico/fabuloso e sem muitas aporrinhações. E quando fraquejarmos, que haja amor e força para recomeçar.

Tomara que eu e você sigamos lutando por uma vida digna, menos ordinária, no combate a dias e noites tediosas, e mais cheias de amor. Ou paixões. Afinal, tudo depende de você. E se possível, sem muitas “fingidades”, como dizia Guimarães Rosa. E isso sempre contou pra caralho. E continuará contando sempre!

A todos os que fazem parte da minha vida e aos leitores do De Rocha, desejo um ano novo transbordante de amor e paz. Na hora em o Ano Novo chegar, desejo que vocês estejam felizes, com boa comida, boa bebida e pessoas que amam.

O escritor Rubem Alves, no livro de crônicas intitulado “Pimentas”, disse: “a gente fala as palavras sem pensar em seu sentido. ‘Benção vem de bendição’. Que vem de ‘dizer o bem ou bem dizer’. De bem dizer nasce ‘Benzer’. Quem bem diz é feiticeiro ou mágico. Vive no mundo do encantamento, onde as palavras são poderosas. Lá, basta dizer a palavra para que ela aconteça”. Então, que Deus continue nos abençoando!

Boas energias, muita saúde e prosperidade. E que as surpresas sejam felizes, que a força se movimente em seu favor nesse poderoso universo, afinal, já disse o grande Mestre Yoda: “Difícil de ver. Sempre em movimento está o futuro”.

2023, vem com tudo, cai dentro! Feliz ano novo!

Elton Tavares

BALANÇO ANUAL – Crônica de Lorena Queiroz – @LorenaadvLorena

Crônica de Lorena Queiroz

Ao fim de cada ano, geralmente na última semana, faço um balanço dos acontecimentos, de todas as efemérides vividas e passadas ao longo desses 365 dias. Este ano aprendi a aprender. Compreendi que é preciso analisar e aprender com cada sim e não dado pela vida. O resultado de meu aprendizado é que somos eternos aprendizes de nós mesmos, aqueles de poucas certezas e muitas dúvidas. A grande sorte é que uma de minhas poucas certezas é de que não é difícil viver, mas claro, se você tiver algumas armas em seu arsenal; coração leve, coragem e malandragem. Ah, a malandragem, essa característica tão incompreendida pelos que ainda não entenderam as necessidades da vida. A malandragem nos possibilita a arcar com as outras duas armas sem tomar no cu.

Certa vez assisti um vídeo que um velho malandro diz; ‘’ Malandro não é o vagabundo, o periculoso. Malandro é um artista”. E segundo Fernando Candido, o malandro é o indivíduo que vive fora das normas estabelecidas pela sociedade, situando-se entre a ordem e a desordem. E não é assim que todos nós vivemos? Entre a ordem e a desordem de tudo que não conseguimos compreender. Malandragem te faz repousar em águas tranquilas, tal qual o salmo 23. O tal Rei Davi sabia das coisas, ele nunca passaria pelo vale da sombra da morte sem coragem, coração leve e malandragem. Flexibilidade é tudo!

Compreendi ainda que o agradecimento precisa ser um costume diário. Que cada coisa que acontece, seja bom ou ruim, acontece pra que a gente se prepare para os próximos dias que estão por vir. É necessário entender que cada ser humano só entrega o que tem, e que, se alguém não te entrega aquilo que você espera ou acha que merece, não quer dizer que não entregou tudo o que podia. A liberdade de errar e acertar é uma dadiva divina e encontrar a felicidade nos erros fará parte do processo. Tudo que vem e que vai, te ensina alguma coisa e sempre agradeça pelo que veio e pelo o que se foi. Eu agradeço a tudo e a todos que se foram, pois abriram espaço para que semelhantes chegassem. Agradeço cada lágrima e cada risada que me brindaram esse ano. Pois sem elas eu não escutaria Gal cantando Vaca profana com o mesmo significado. Tampouco entenderia o que Belchior tinha razão quando dizia que a noite fria lhe ensinou a amar mais o seu dia, pois na dor se compreende o poder da alegria e que, sim, todos temos coisas novas pra dizer.

Caro leitor, espero que este ano você tenha vivido, mudado de ideia e de ideais inúmeras vezes. Espero que tenha chorado, caído e levantado. Intenciono que tenha acertado e errado por várias e incansáveis vezes. Pois disso é feita a boa vida. Torço para que compreendas que a única coisa que não muda é a eterna mudança, como diz Gilberto Gil em Tempo rei; Tempo rei, transformai as velhas formas do viver. Ensinai-me, ó pai, o que eu ainda não sei”. E por fim, se eu puder lhe dar um conselho, viva com leveza, coragem e malandragem. Divida seu amor e seu pão até com o cão.

*Lorena Queiroz é advogada, amante de literatura, devoradora compulsiva de livros e crítica literária oficial deste site, além disso é escritora, contista e cronista. E, ainda, mãe de duas meninas lindas, prima/irmã amada deste editor.

Rita Lee chega aos 75 anos. Meus parabéns a Rainha do Rock and Roll nacional! – @LitaRee_real

Rita Lee Padula Jones de Carvalho, conhecida apenas como Rita Lee, é uma cantora, compositora, multi-instrumentista, atriz, escritora e ativista brasileira. É conhecida como a “Rainha do Rock Brasileiro”. Nasceu em São Paulo em 31 de dezembro de 1947, atualmente com 75 anos de idade

Sou fã de muitos músicos e compositores, brasileiros e gringos. Uma das maiores estrelas é a Rita Lee, a Rainha do Rock and Roll nacional, que hoje gira a roda da vida pela 75ª vez.  Trata-se de uma cantora, compositora, multi-instrumentista, atriz, escritora e ativista brasileira. Uma mulher sensacional em todos os aspectos. Sobretudo, um grande expoente da musicalidade feminina brazuca.

Ex-integrante do grupo Os Mutantes (1966-1972) e do Tutti Frutti (1973-1978), Lee participou de importantes revoluções no mundo da música e da sociedade. Suas canções, em geral regadas com uma ironia ácida ou com uma reivindicação da independência feminina.

Com uma carreira de cinco décadas, Rita Lee passou da inovação e do gueto musical do final dos anos 1960 e anos 1970 (casou em 1976 com o músico Roberto de Carvalho, com quem tem três filhos e é seu parceiro de vida e música até hoje) para as baladas românticas de muito sucesso nos anos 1980 e uma revolução musical e já se apresentou com inúmeros artistas que variam de Elis Regina, João Gilberto à banda Titãs.

Em outubro de 2008, a revista Rolling Stone promoveu a Lista dos 100 Maiores Artistas da Música Brasileira, onde Rita Lee ocupa o 15° lugar. Foram mais de 50 anos de carreira recheados de sucessos, atitude e humor. A ruiva mais Rock do Brasil cantou e encantou várias gerações.

No dia 22 de janeiro de 2012, Rita anunciou sua aposentadoria dos palcos em um show no Circo Voador no Rio de Janeiro, devido à sua fragilidade física: “Me aposento dos shows, mas da música nunca”, explicou a cantora no seu Twitter.

No dia 11 de abril de 2020, a cantora deixou a aposentadoria de lado e, de casa, apresentou a canção “Saúde” ao lado do marido, Roberto de Carvalho.O casal mais famoso do rock nacional passava o período de isolamento social em seu sítio, no interior de São Paulo.

Rita lutou e curou um câncer há  dois anos. De rosa choque ou não, Rita sempre foi uma adorável ovelha negra. Dona de ironia fina, total irreverência e genialidade, sempre marcou presença, deu seu recado. Com seu Hino Dos Malucos, ela sempre cantou a nossa loucura.  Coisas da Vida, pois pra variar estamos em guerra.

Rita Lee me emocionou muitas vezes em mesas de bar. O roqueira merece nosso reconhecimento, respeito e gratidão. Enfim, por tudo que representa essa espetacular artista.

Obrigado, felicidades e Saúde, Rita Lee!

Elton Tavares

Balanço de fim de ano – Crônica de Ronaldo Rodrigues

Ilustração de Ronaldo Rony

Crônica de Ronaldo Rodrigues

Este senhor senta-se à mesa do café exatamente às 7h18 para um frugal desjejum. Sai às 7h20 e vai conferindo as pedras pretas e brancas do calçamento. Sua rua termina na vista pro mar, um pedaço de muro e uma trilha de terra batida que vai dar na praia. Seus pés recebem a areia com a mesma felicidade fofa com que a areia recebe seus pés. Este senhor sou eu mesmo e me reconheço nele sempre que abaixa a cabeça para fazer espelho da água e olhar seu reflexo.

Não me reconheço nele quando passa a mão na cabeça de um cão que caminha tranquilo. Não tenho amizade com cachorros, gatos, cangurus… Admiro as hienas e os elefantes, mas apenas nos documentários que passam no canal da minha madrugada. Hienas e elefantes vivem em sociedades matriarcais e isso é bom. Quando/se eu voltar, na pele de outra pessoa, tentarei ter mais afeição por animais. E seu eu vier na forma de um animal, que seja uma jubarte com sua eterna cauda mergulhando no mar.

Este senhor está se despedindo da vida (ou se despindo da vida?) ou vice-versa. Mas isso não se dará hoje ou mesmo este ano. Talvez não ocorra nenhuma ruptura nos próximos 30 anos. Quem sabe ele vai festejar sua trajetória pra muito além do tempo de seu tempo? Quem sabe expressará sua frustração por não ter feito aquela viagem maluca para os confins do Himalaia, por não ter tido a ousadia suficiente para invadir a igreja e interromper aquela cerimônia em que a mulher que amava se casava com outro homem?

Neste senhor, que o corvo, empoleirado no ombro do espantalho, disse que sou eu, está minha determinação de permanecer vivo pelo tempo que me for dado por quem maneja a ampulheta. O mesmo tempo que foi dado ao portão do quintal, à rede que ainda balança na varanda, ao peixe que comi ontem e me mantém vivo hoje. E a essa árvore, que sou eu, orvalhada nos galhos e fincada na raiz desse porto de chegada/saída que se chama… Como se chama?! Ah, sim! Diz que é a vida…

Parar (ou desesperar)? JAMAIS! – Crônica de Telma Miranda – @telmamiranda

Crônica de Telma Miranda

2022 foi um ano muito intenso, pois além de termos tido eleições, copa do mundo, COVID indo e voltando, ameaça de guerra, cancelamento, todos nós tivemos pequenos ou grandes vitórias, perdas, problemas, percalços e alegrias.

A sensação que tenho hoje, findando essa maratona louca, é a de que eu vivi dez anos em um, pelos seguintes motivos:

Minha alma se curou, descobriu amor por todos os lados (não do romântico, claro!), me senti acolhida, amada e depois sofri um golpe que ainda não me recuperei, mas me deixou mais calejada. Mesmo assim ainda tenho fé nas pessoas (poucas!) e não me tornei amarga, pois tenho afeto de QUALIDADE e diariamente descubro novos laços que não me deixam desistir da humanidade.

O meu coração rasgado, costurado, remendado, dilacerado, reconstruído e lapidado resiste aqui, batendo forte, e amando MUITO.

Conheci muita gente e tive a oportunidade de visitar lugares, uns novos e outros conhecidos, passando perrengue, gargalhando, guardando imagens e momentos no meu coração que seguirão para sempre comigo. HAJA MEMÓRIA AFETIVA!

Engordei, emagreci, engordei, emagreci e engordei de novo e continuo na luta. Meu tio Cabuquinho disse gentilmente que não fico feia gorda e o resto não posso escrever aqui, mas foi bem reconfortante (fechem os olhos e me imaginem gargalhando BEM alto!) e a balança do Felipe (onde tomo shake) praticamente disse que gorda fico mais jovem.

Sou MUITO agradecida POR TODAS as experiências vividas em 2022, pelas pessoas que vieram, ficaram ou foram, encerrando ciclo, mas com certeza deixando lições. Agradeço cada ruga, cabelo branco, celulite e qualquer outra marca nova, pois me lembram que mesmo que eu tenha chorado, eu sorri, gargalhei, que mesmo que eu tenha me estressado, o que eu poderia ter feito, fiz, e me lembram que o tempo está passando, estou envelhecendo como todos nós iremos inevitavelmente envelhecer, mas estou em paz com as marcas que a vida me faz, pois olho pra trás e vejo que o tempo, o universo e todas as forças que nos movem têm sido bastante generosos comigo.

Enfim: o que interessa que estou bem, cabeça leve, consciência tranquila de sempre buscar fazer o meu melhor e continuo seguindo. Parar ou desesperar, como escreveu o Ivan Lins e a Simone canta lindamente, JAMAIS!

E se você leu isso até aqui, gratidão! Se puder, escute e cante bem alto a música antes do ano findar ( DESESPERAR JAMAIS – Confira este vídeo no YouTube:

E nos “vemos” novamente em 2023.

* Telma Miranda é advogada, fã de literatura, música e amiga deste editor.

Amo bobagens. Odeio futilidades – Crônica de Elton Tavares

Ilustração de Ronaldo Rony

Crônica de Elton Tavares

Sabem, quando escrevo minhas doidices aqui é só sobre mim mesmo. Não quero (já quis e me ferrei) ser o dono da verdade ou que concordem comigo. Quem não respeita o gosto ou vontades alheias, sofre. Digo isso por experiência própria. Tipo música, detesto sertanejo, tecnobrega, entre outros estilos. Mas se você gosta dessa merda, azar o seu. E ainda bem que é SEU.

Não quero e nunca quis ser “cult” ou pagar de intelectual. Nunquinha mesmo. Aliás, amo bobagens legais, filmes com roteiros bestas, comédias nonsense, piadas ácidas, etc. Mas detesto séries e longas sobre futilidades como gente rica que e babaca, que inspira pobres que sonham em ser ricos.

Não que eu não goste de grana. Claro que gosto. O dono daquela frase de que “dinheiro não traz felicidade” nunca teve um pouco pra viajar, comer o que quis ou comprar algo bacana, entre outras tantas coisas que nos deixam felizes se tivermos uma micha no bolso.

Dia desses, entrei numa loja metida à chiquenta. Foi uma forçação de barra durante os 10 minutos que passei no estabelecimento. Fui lá somente de acompanhante. Encheram a porra do saco oferecendo suas bebidas e comidinhas palhoças, mas com aspecto de caras. A cada mulher que adentrava o seboso local, os vendedores soltavam um “maravilhoooosaaa”, com um tom tão baba ovo que, como diz uma amiga minha: “me deu 300 tipos de nojo”.

Isso vale para rodas de quem só conta vantagens sobre sucesso profissional e financeiro. Égua, esse pessoal não tem derrota não? Só vitória e pavulagem. Não que eu não curta falar sobre coisas legais, mas isso o faço com os meus amigos de verdade. E esses também escutam sobre minhas desventuras, azares, cagadas e afins. Afinal, a gente não é mocinho de filme gringo, que só vence as paradas.

Toda vez que escuto essas merdas dessas pessoas, que a maioria encontro contra minha vontade, penso: nunca duvide da previsibilidade da burrice de uma pessoa deslumbrada ou da cara de pau de alguém tentando se autoafirmar.

O mesmo pensamento tenho sobre roupas de grife ou não. Se uma camisa ficar legal, fouda-se se é da “Dion Caralion Fashion” ou do Zé Marreteiro. Mas tem gente  adora mostrar uma etiqueta e ainda dizer quanto aquilo custou. Eu hein!!

Por conta do meu jeito, às vezes sou rotulado com vários adjetivos como chato, ranzinza, etc. Pode ser. Até concordo. Mas nunca falso. Quer dizer, algumas poucas vezes sim, pois a “falsidade institucional” faz parte da jogatina da vida. Mas juro que tento ser cem por cento verdadeiro sempre.

Enfim, amo bobagens. Odeio futilidades. É isso!

Poema de agora: GRÃOS DE TEMPO – Ori Fonseca

GRÃOS DE TEMPO

Meu pai morreu, e é só mais um defunto,
E as mulheres me chamam de senhor.
O tempo que ciranda ao meu redor
É pouco agora, mas um dia foi muito.

As migalhas de segundos que ajunto,
Inutilmente, tentam recompor
Um tempo de esperança e de fresco,
— Respostas ao que sempre me pergunto.

Em que prato hoje é servido o que se vai?
Em que açougue, em que feira, em que cozinha
Será rasgada a minha carne em rinha?

É tarde! Ouço vozes! A Noite cai!
Eu não chorei a morte de meu pai,
Filho nenhum há de chorar a minha.

Ori Fonseca
Ilustração: Imagem Google

Gigantes – Conto firmeza de Luiz Jorge Ferreira

Conto de Luiz Jorge Ferreira

Eu brincava com bolhas de sabão quando vieram os gigantes, cada um deles trazia outros pequenos gigantes, que pensei serem seus filhos, mas soube mais tarde que faziam parte de um circo, em que as pessoas nasciam sempre com mais de cinco metros.

Eu vi quando um deles menorzinho, mas muito, muito grande, quebrou a torre da igreja e derrubou o sino que nos chamava para a missa nos dias de Domingo. O sino era verde por dentro, cheio de limo e espalhou este verde por muitos lugares.

Minha mãe assustou-se com a chegada dos grandes gigantes, não catou mais feijão, não se demorou mais indo ao poço apanhar água, nem foi mais a casa de Dona Maricota, que era pertinho então eu pensei que estavam de mal. O cego Faustino que costumava sacudir a cuia com moedas cantarolando gemidos e quase uivos, agora pedia com um mexer de lábios. Tinha medo de com os seus lamentos, acordar os gigantes.

Eles ficavam na frente da televisão, riam e roíam as unhas e mexiam com as mãos entre os cabelos, depois atiravam no chão uns piolhões que possuíam o tamanho do carro de boi de Seu Jaime. Os piolhões corriam e começavam a cavar ate desaparecem entre a terra que ficava fofa e amontoada formando um morro, que depois subíamos. Era tal como escalar uma montanha.

Os gigantes apesar do fedor que exalavam, fomos nos acostumando com eles. Muitas vezes eu vi Seu Faustino entre os dedos dos seus pés, catando moedas. Ate mesmo os cavalos dos que apeavam a frente da venda de Quele, pastavam encostados aos pelos de suas pernas. Eu voltei a brincar com as bolhas de sabão e mamãe voltou a atravessar dois quintais para ir a prosa com Maricota, bastava entardecer.

Eu já tecia paneiros que vendia para os pescadores do Porto, quando os gigantes foram embora. Os menorzinho estavam pálidos e saíram arrastando os maiores e deixando enormes valados que acabaram por derrubar os montes abrir crateras e fazer com que aqueles piolhões pulassem de volta para o corpo deles.

O cego iniciou a cantar lamentos para pedir moedas e eu comecei a tecer enormes caixões de cipós e folhas de açaí, de maneira que para quem olhava de longe já não enxergava mais minha casa e nem mamãe conseguia sair para ir ao poço apanhar água e nem ouvia mais Dona Maricota gritar.

–Ô vizinha!-Ô vizinha!

Dentro de casa era sempre escuro porque os enormes caixões impediam a entrada da luz do sol.E eu não conseguia parar de tece-los. Certa vez eu deitei dentro de um e morri.

Mamãe gritou tanto que estranhamente voltarão os gigantes e os piolhões. Agora tão pequenos, que para vê-los, ela precisou da lente dos seus óculos, uma sobre a outra. Ela se afeiçoou a eles. Passaram o resto de suas vidas, falando da minha vida aventureira e cristã.

E tecendo minúsculos paneiros e caixões. Construíram um sino de cipó, que todos os Domingos toca. Mas ninguém escuta.

*Luiz Jorge Ferreira é poeta e médico Macapaense criado no Laguinho, que atua em São Paulo. Ele também é vice-presidente da Sociedade Brasileira de escritores Médicos (Sobrames).
**Do livro “Antena de Arame”.

As Mirandas que encontramos na vida – (Crônica de Elton Tavares – do livro “Crônicas De Rocha – Sobre Bênçãos e Canalhices Diárias”)

Crônica de Elton Tavares

Quem curte cinema lembra-se da Miranda Priestly, a nojenta editora de uma revista de moda famosa, interpretada por Meryl Streep, no filme The Devil Wears Prada (O Diabo Veste Prada).

Então, conheço algumas “Mirandas” que vivem a atazanar a vida dos outros. É, tem gente mestre na arte da escrotidão. Ah, se tem!

Uma em especial parece muito com a do cinema, só não possui a fineza (mas pensa que sim) e nem a sinceridade da personagem de Streep. A editora da revista deixava claro quem era para todos e não dava uma de “gente boa”, de acordo com sua conveniência.

Fico só observando essas figuras, que pensam ser a bala que matou Lennon, o suprassumo da competência, mas não são. Ainda bem que, apesar de continuar um cara cascudo, brabo, encrenqueiro, irônico e genioso, aprendi a lidar com elas.

Portanto, querido leitorado, não dê moral para este tipo de canalha. A não ser que já seja “assédio moral”, ignorem as “Mirandas”, pois é tudo que elas não querem. É isso!

*Crônica de 2016. 

**Texto do livro “Crônicas De Rocha – Sobre Bênçãos e Canalhices Diárias”, de minha autoria, lançado em setembro de 2020.

A fábrica de best-seller – Crônica de Ronaldo Rodrigues

Crônica de Ronaldo Rodrigues

A consagrada escritora de livros infantis, com um sorriso que quase chega a ofuscar os flashs das câmeras fotográficas, desfila à luz dos holofotes da fama. É a noite de autógrafos de seu quinquagésimo oitavo livro, que deve seguir o caminho dos anteriores: se transformar em best-seller, sucesso total de crítica e público.

A escritora de livros infantis está esfuziante em seu vestido de pedras preciosas. Agora, sentada em sua mesa florida, ela distribui autógrafos e simpatia entre seus milhares de leitores. Apesar de ter crianças como público-alvo, sua literatura atrai pessoas de todas as idades. As quinze secretárias e os trinta e cinco garçons transitam pra cá e pra lá na gigantesca mansão da escritora, atendendo imprensa, convidados e penetras.

Após o festejado evento, onde houve distribuição de comidas e bebidas da melhor procedência e discursos das maiores autoridades da cidade e do mundo literário, vamos encontrar a grande escritora de livros infantis em seu gabinete. Longe do glamour que a cercou por toda a noite, ela se despe de seu vestido de pedras preciosas, veste uma bata simples, pega um cesto, onde estão algumas migalhas do que restou do farto coquetel, e se dirige ao porão de sua mansão. É lá que ela encontra um batalhão de crianças acorrentadas, diante de computadores, digitando alucinadamente. São elas as verdadeiras autoras das histórias lançadas regularmente e com as quais a escritora obteve o reconhecimento de toda a indústria editorial.

Com os olhos brilhando de satisfação cada vez que escuta o som de notificação de pix chegando ao seu celular, a consagrada escritora passa a distribuir as migalhas entre as crianças.

Escritor Fernando Canto protagoniza lançamento de projeto cultural

Nesta sexta-feira (16), acontece em Macapá, o lançamento de mais uma ação cultural do Quarta de Arte da Pleta e do Coletivo Juremas. Trata-se do projeto O Boêmio e a Poesia, protagonizado pelo escritor, músico e compositor Fernando Canto.

Nesta primeira edição, o cantor Nivito Guedes é o convidado e vai apresentar canções autorais e composições criadas em parceria com outros artistas, inclusive com o próprio Fernando.

Para Andreia Lopes, organizadora do evento, a ideia é que o projeto aconteça uma vez por semana de forma itinerante, ocupando espaços com potencial para receber música e poesia.

Fernando Canto é o homenageado deste projeto. Ele é paraense, da cidade de Óbidos e mora em Macapá desde a infância. É escritor, com 18 livros publicados.

É cronista e compositor. Um dos fundadores do Grupo Pilão (tradicional grupo de música amapaense). Sociólogo por formação e doutor em sociologia pela Universidade Federal do Ceará.  Na música, Fernando Canto tem parceria com vários artistas do Amapá.

O convidado Nivito Guedes é cantor e compositor amapaense, autodidata em violão. Possui composições solo gravadas em cds e em coletâneas de músicas, além de canções gravadas por outros intérpretes. Seu show autoral traz uma pluralidade de estilos e diversidade de ritmos.

Realização: Quarta de Artes da Pleta e Coletivo Juremas com apoio de Farofa Tropical Gastrobar e o Blog da Mary.

Serviço:

O Boêmio e a Poesia
Dia 16 de dezembro | Sexta-feira | 20h
Local: Farofa Tropical Rua São José, 1024 – Laguinho
Informações e reservas: (96)98137-3130

Texto: Mary Paes
Assessoria de Imprensa
(96)98138-5712

Poema de agora: “Brinquedo ” – Ricardo Iraguany

Cortejo de Verão do Banzeiro do Brilho-de-Fogo — Foto: Márcia do Carmo/Divulgação

Brinquedo

Brinquedo banzeiro bailando
Rufar de tambores nas ruas
No brilho do sol ou da lua
Tocando alforria nas praças
Do som ancestral dos tambores
Ė um brilho de fogo que afaga
Batendo as asinhas ao vento
No sonho do amor que se espalha
É feito o Natal de Deus menino
Nossa manjedoura nosso ninho
É esse colorido de gente
Soltando alegria de graça
Blem blem blem blem blem bate o sino
Que os magos já estão a caminho
Com mirra imenso ouro prata
Lá no céu a estrela luzindo
Encendeia o estrondo das caixas
Se tem marabaixo e batuque
A noite é feliz Macapaba

Ricardo Iraguany