Poesia de agora: Comentários a respeito da Vida – Jaci Rocha

Comentários a respeito da Vida

Vida! Quem dera um remoto controle,

mas ao vivo não tem replay
Pausa para ir ao banheiro
não tem mocinhos ou bandidos
nem mesmo um super-herói
dentro de um secreto esconderijo.

Ah! deve ser por isso
que a gente corre para o cinema
ou põe na telinha um romance
meio que comédia
– esquece o apelo cotidiano da tragédia –

existir é coisa de gente bruta, meu bem
amar é para quem tem coragem de ir além
e é cada coisa louca que inspira emoção
– Mesmo tudo que habita o apelo do não.

Aqui, o segundo vira sem garantia de sucesso
às vezes nem mesmo um nexo,
e a nossa temporada é cancelada inesperadamente
há tempos de flor, outros de esperar e regar a semente…

ah! mundo real,
belo e cruel.

A dor é mesmo dor
Na tragicomédia ambígua de um maluco inventor
pois eis, que entre o concreto e o cotidiano
Nasce flor, verso, arte e amor…

O código reto da realidade,
não tem título, não existe segunda temporada
Apenas os fios do agora,
puxados entre o nunca mais e a eternidade…

E eu, que brinco de normalista*
Ando por aí cheia de fórmulas e antigas teorias
Finalmente descobri na última curva da estrada
Que não sei mesmo nada,
não sei nada e talvez jamais saiba…

É que ao vivo, meu bem, não tem sinopse
é de sustentar o porte
Como bem me disse Martha
“Pena a vida não ter corte”!

(E se tiver, esteja certo:
“às vezes não sara nunca,
às vezes, sara amanhã”)

Jaci Rocha

Poema de agora: Por ti – Alcinéa Cavalcante (@alcinea)

Por ti

Gosto de ser assim
– livre.
Sem relógio
sem telefone
sem hora de partir
ou de voltar.

Gosto de ser assim
– livre.
Não ter que dizer
estou aqui
vou ali
irei acolá.

Gosto de ser assim
– livre.
Sem hora marcada
pra dormir
acordar
comer
passear
cantar
trabalhar.

Mas se me quiseres
compro um relógio
e um celular.
Organizo o tempo
e até aprendo a cozinhar.

(Alcinéa Cavalcante)

Como escrever um texto polêmico – Crônica de Elton Tavares ( e ilustração de Ronaldo Rony)

Ilustração de Ronaldo Rony

Faz tempo que aprendi como escrever um texto polêmico e “cool”. Você contextualiza e detona o objeto que já está na pauta do momento. Sim, pega carona com a merda que já está na palheta (implantação da pena de morte no país, diminuição da maioridade penal, legalização do aborto e maconha, enfim, atualidade, política, religião, pessoas, música, etc…). Sim, textos de revolta, sangue nos olhos e tals. Ou crônicas dúbias, mas inteligentes (o problema é que nem todo mundo entende a segunda opção).

Desenvolvimento: durante o artigo ou crônica, esmiúça um “porém” e descreve alguma hipocrisia de ordem genérica, absolvendo o objeto. Com falsidade, claro. Ah, use frases de impacto. Tipo => como disse Bill Gates : “O sucesso é um professor perverso. Ele seduz as pessoas inteligentes e as faz pensar que jamais vão cair” ou Oscar Wilde, quando disse que ”o descontentamento é o primeiro passo na evolução de um homem ou uma nação”. Isso sempre funciona.

Ah, faça perguntas? O sistema é falho, portanto deixa brechas para críticas no bandão. Aliás, falar mal é sucesso garantido!

Já na conclusão, você moraliza no formato bunda-mole tipo: “um tapa na cara da sociedade”. Todo mundo, aliás, é bunda-mole, em algum aspecto, claro. Só não aqueles que concordarem com este texto (Rá!).

Por fim, você pega o embasamento de alguma pessoa consideradona no meio de comunicação para o epílogo e afirma que aquele é o melhor texto produzido sobre o tema.

Claro que, brincadeiras à parte, devemos criticar, discernir e entender as coisas como elas são, de fato. Ver o mundo de outra ótica, a dos que não querem que a verdade venha à tona. Então, textos polêmicos são mais que necessários. O importante é seguir questionando os fatos e acontecimentos ao nosso redor. Seguimos discordando, sempre. E fim de papo!

A desobediência é uma virtude necessária à criatividade” – Raul Seixas

Elton Tavares


*Texto do livro “Crônicas De Rocha – Sobre Bênçãos e Canalhices Diárias”, de minha autoria, lançado em setembro de 2020. 

Poesia de agora: NATIVO – Luiz Jorge Ferreira

Foto: Floriano Lima

NATIVO

Eu não quero ser Ianque em Miami Beach
Quero doar meu sangue para os Carapanãs, em Apurema.
Quero chamar Deus de Manitu…
E ser chamado de Tuchauã.
Quero voar com as asas brancas das Garças, rumo ao rumo que soprar os ventos.
Quero estar atento a luz…
E estar sedendo das águas dos Igarapés, que deixam profundas lembranças as terras das margens, por onde correm.
Quero estar Kaipora, Mapinguari, ou vagalume, expelindo um arco-íris submergido em trevas.

Sou Aurora e anoiteço.
Sou esperança e não creio.
Sou a Preguiça que amanhece cedo, e chega quando o sol se foi.
Estou de volta, no início.
E estou no início, quando finda.

Eu não quero o destino dos carapalidas, sugados pelos Carapanãs.
Quero ser o Pajé.
Quero ser a crista da onda, espumante e bela…
Não seu barulho assustador e voraz.
Quero ser o Plácido Igarapé, onde lavo a voz…
Onde afogo o Ontem, e ponho a nadar as lembranças…
As mesmas que ele escavou nas margens…
Exatamente, gêmeas, das que ele incrustou em mim.

Luiz Jorge Ferreira

Poema de agora: Irmãos – Marven Junius Franklin

Índios wajãpi do Amapá – Foto: Victor Moriyama.

Irmãos

Sou daqui, irmão
— nortenho entristecido pela vida,
que segue o voo incerto
pelos rios contaminados de mercúrio.
Sou dos cafundós, irmão
— meus olhos enfadaram
ao ver a imensidão de mata demolida.
Sou indígena, irmão
— ancestral sem moeda de troca,
que luta & sonha com a sua terra edificada
(já passou o tempo
de espelhos & miçangas).

Marven Junius Franklin

A MALÁRIA DE GALLUCIO – Crônica porreta de Fernando Canto

 

Quando leio nos jornais que um novo surto de malária está ocorrendo nas comunidades indígenas do Oiapoque, pergunto logo quando será que essa doença, que já vitimou tanta gente, será erradicada.

Amigos e conhecidos morreram dessa doença terrível. Vi pessoas no interior e aqui mesmo em Macapá tremendo de febre e me senti impotente diante da falta de remédio e de outros recursos para poder ajudá-las. Sabia que ela era uma doença infecciosa causada por um parasito do gênero plasmodium, transmitida entre pessoas por um mosquito chamado anofelino, mas me confundia com os nomes dados a ela: maleita, sezão, impaludismo, febre intermitente, tremedeira, febre terçã, febre quartã, etc…

E se hoje ela ainda mata muita gente, imaginem então nos tempos da Colônia. Em 1752 Mendonça Furtado veio à Macapá para tentar conter uma grande epidemia de malária, acompanhado do único médico da província do Grão-Pará. Anos depois, em 1769, Galúcio, o engenheiro construtor da Fortaleza de São José, morreria de “hidropezia” (segundo o médico-cirurgião da obra), a acumulação de líquido seroso em tecido ou em cavidade do corpo, e uma consequência da maleita, pois os plamódios vivem nos glóbulos vermelhos e no fígado do homem. Outros sintomas são os acessos febris, a anemia, que resulta da destruição contínua dos glóbulos vermelhos e a esplenomegalia, que é o aumento do baço.

Mas ainda que a malária seja uma doença frequente nos países tropicais, não é exclusiva deles. Nas vastas regiões pantanosas do norte da Europa, nas regiões bálticas, no sul da Suécia, Holanda e muitas outras regiões têm ocorrido focos de malária. Ela é uma enfermidade conhecida desde a Antiguidade. Os textos de Hipócrates já falavam de febres intermitentes acompanhadas da descrição dos sintomas característicos, como aumento do tamanho do baço e anemia. Hipócrates discorria ainda sobre as causas da doença. Por exemplo, recomendava construir as cidades no alto das montanhas ou em ladeiras, evitando os vales e a proximidade com os pântanos e zonas úmidas. Segundo os escritos, nos vales e zonas pantanosas o “ar impuro” provocava enfermidades de todo tipo. Daí se pode compreender melhor o significado do termo malária, que vem do italiano “mal aria”, ou seja, mal ar.

O papel que esse mal tem desempenhado na humanidade é muito maior que supomos habitualmente. Há testemunhos escritos de que as “febres” despovoaram cidades inteiras. Éfeso, na Grécia, cidade que São Paulo sempre visitava foi destruída por ela. A transformação do rio Caistro em zona pantanosa, as guerras, os terremotos e a expansão dos pântanos contribuíram para a sua destruição, precipitada pelas epidemias de malária que selaram para sempre o destino de seus habitantes. Durante as campanhas napoleônicas no norte da Itália (1796 e 1797, em especial em Mantua, muitas baixas foram causadas pelas temidas febres. Curiosamente foi nessa cidade que nasceu Henrique Galúcio.

Os conquistadores espanhóis trouxeram a malária ao Novo Mundo, de onde precisamente vem o primeiro remédio eficaz contra a doença: o quinino, que se obtém das árvores do gênero Chinchona. Sua eficácia gerou a importação indiscriminada da árvore pelos europeus, a partir do século XVII, e se converteu num negócio muito lucrativo em que os jesuítas também participavam. A produção do quinino provocou uma elevação generalizada nos preços e o aparecimento de falsificações. Só em 1854 é que os holandeses começaram a cultivar as árvores nas suas colônias da Ásia, o que veio cobrir totalmente a demanda.

Muitos avanços ocorreram na história da malária, mas apesar disso os estados do norte ainda convivem com ela. E são preferencialmente os pobres e necessitados das mais longínquas paragens da Amazônia os mais atingidos por ela.

Poema de agora: FOGO BRANDO – Pat Andrade

FOGO BRANDO

cortaram
sua existência
pela metade

no cartaz
mal escrito e tosco
a curta história de vida
em cada linha do rosto
um sorriso que foi roubado

o mundo virou-lhe
as costas
arrancaram-lhe
a dignidade
falta-lhe a cama
e a mesa
não tem endereço
nem identidade

o semáforo
lhe rouba o tempo

deixa o ponto
de mãos vazias
volta pra casa
a passos lentos
pensando na vida
sem jeito

hoje é mais um dia
em que vai cozinhar
apenas desespero

Pat Andrade

Resenha do livro “O som e a fúria”, de William Faulkner – (Por Lorena Queiroz – @LorenaadvLorena)

Resenha literária de Lorena Queiroz

O som e a fúria é uma obra de William Faulkner publicada em 1929, e que, sem dúvidas, foi o maior e mais recompensador quebra-cabeças que já desvendei.

Antes de falarmos da obra é importante entender quem foi Faulkner para compreender este mundo criado e assinado por ele. William Faulkner ganhou o Nobel de literatura em 1949. Trabalhou em Hollywood escrevendo roteiros durante 1930 até 1940. E a respeito desta experiência ele disse em 1947 – ‘’Compreendi recentemente o quanto escrever lixo e textos ordinários para o cinema corrompeu minha escrita”. Mas o detalhe mais importante sobre Faulkner é o local e o período de seu nascimento. Nosso querido nasceu em 1897, em New Albany, no Mississipi. Vinha de uma família aristocrática tradicional e financeiramente decadente. O período de seu nascimento, a virada do século que carrega as mudanças. O sul dos EUA, o racismo, aquela atmosfera sulista pós guerra de secessão, o contraste entre norte e sul, tudo serviu como base para ambientação do mundo criado por Faulkner. É importante frisar que a influência para construção deste livro é o modernismo, que quebrou paradigmas e inovou a forma de ser fazer literatura, como também podemos observar nas obras de Virginia Woolf, Proust entre outros.

Este livro está entre os cem livros mais importantes pelo Le Monde, e em 1998, a Modern Library o classificou em sexta colocação entre os cem melhores romances da literatura inglesa do século XX.

O enredo da obra é bem simples, trata-se da história da decadência financeira e moral de uma família, os Compson. Uma família aristocrática que vivia no sul dos EUA, na fictícia Yoknapatawpha Country. Essa família é composta pelo Pai Jason, a mãe Caroline, uma mulher fraca que passa a maior parte do tempo acamada, seus quatro filhos; Benji, Quentin, Caddy e Jason. A escravidão já era abolida à época, mas era comum que as famílias conservassem seus antigos escravos na casa como empregados, assim, temos também nesta casa Dilsey, a empregada preta que é a pessoa mais sensata de toda a trama. Dilsey tem três filhos, T.P, Froney e Luster, que a ajudam nos cuidados com a casa.

O que tem de mais difícil na leitura e compreensão deste livro não é o enredo e sim a estrutura narrativa escolhida pelo autor. O livro é narrado em quatro partes e por quatro narradores diferentes, e adianto que o único spoiler dado aqui será a identidade destes quatro narradores, e com isso já facilitarei bastante a sua vida. O mais desafiador neste livro é conseguir passar do primeiro narrador, que é Benji. Benji nasceu com uma deficiência mental, ou como eles mesmos o descrevem: “nasceu bobo’. Benji, que antes era Maury, nome de um tio, foi rebatizado Benjamim com intuito de que a mudança do nome lhe mudasse a sorte. É importante ressaltar que há uma grande influência bíblica nesta obra. Assim, a mudança do nome da personagem conversa com Gênesis 35.18, que diz que o nome Benjamim foi dado pelo seu pai Jacó, pois antes de morrer no parto, Raquel, sua mãe, tinha lhe dado o nome de Benoni (filho da minha aflição). Entretanto, Jacó lhe renomeou como Benjamin, o filho próspero.

O livro se inicia em 1928 sendo narrado por Benji, um homem de 33 (trinta e três) anos, com deficiência mental que ama três coisas na vida: o pasto, a luz do fogo e sua irmã, Caddy. Benji tem alguns sentidos bem aguçados, como um som ou cheiros, que lhe remetem a lembranças que se misturam em uma narrativa que se dá através de fluxo de consciência. Ou seja, além da narrativa não ser linear, ainda encontramos fatos que estão soltos dentro de uma história que o leitor ainda não conhece, e que está inicialmente sendo narrada por uma personagem que não   compreende a própria história que narra. Então, neste momento nos deparamos com a influência da peça Macbeth, de Shakespeare. Na 5 cena do 5 ato de Macbeth, encontramos o seguinte trecho: ‘’ …. A vida é um conto narrado por um idiota cheio de som e fúria e sem nenhum significado”.

A segunda parte do livro é um pouco mais inteligível que a primeira, aqui encontramos o sensível e atormentado Quentin como narrador. Temos um retrocesso no tempo, pois Quentin narra acontecimentos que se passam em 1910, como já mencionei, a narrativa não é linear. Ainda encontramos bastante fluxo de consciência que se intercalam com a narrativa do presente. O importante sobre Quentin, ainda sob a influência de Macbeth, é o trecho: ‘’ A vida é uma sombra errante; um pobre comediante que se pavoneia no breve instante que lhe reserva a cena, para depois não ser mais ouvido”.

Outra coisa muito cara a Quentin, devido a influência do pai, é o tempo. Como fica claro em um dos meus trechos favoritos do livro, quando Quentin ganha de seu pai o relógio que foi de seu avô; “Dou-lhe este relógio não para que você se lembre do tempo, mas para que você possa esquecê-lo por um momento de vez em quando e não gaste todo seu fôlego tentando conquistá-lo. Porque jamais se ganha batalha alguma, ele disse. Nenhuma batalha sequer é lutada. O campo revela ao homem apenas sua própria loucura e desespero, e a vitória é uma ilusão de filósofos e néscios.’’

A terceira parte deste livro volta para 1928 e é narrado por Jason, um homem mesquinho, racista, ganancioso, misógino e amargurado, pois acredita que teve seu futuro prejudicado por decisões e caminhos seguidos por sua família. Apesar de ser um sujeito odioso Jason é muito direto, o que facilita bastante a compressão do que já foi lido através dos dois narradores anteriores. Aqui já não temos mais o fluxo de consciência, e sim, um monólogo interior. Aqui sabemos mais sobre Caddy. Pois essa personagem não tem voz na trama. Todos os traços de personalidade de Caddy chega até o leitor através dos dois primeiros narradores que amam a irmã, como também através de Jason que a odeia.

É importante advertir que o leitor encontrará bastante a repetição de nomes como: Jason ( pai ou filho?) O Quentin, A Quentin. Mas isso tudo será esclarecido conforme a leitura avançar, então, vá até o fim.

A quarta e última parte deste livro é a mais esclarecedora e a única narrada em terceira pessoa. Aqui o narrador se concentra mais em Dilsey, a empregada preta que cuidava da família incansavelmente. Aqui conhecemos mais sobre a fibra moral de Dilsey e demais questões sobre racismo que não podem passar despercebidas, como no trecho; ‘’…Os brancos morrem também. Tua vó morreu como qualquer negro’’.  Em uma entrevista na Univesp, a professora Munira Mutran, esclareceu que com os primeiros narradores o leitor poderia ter a dúvida sobre se eles são confiáveis, mentem? Então Faulkner usa um narrador onisciente para contar o fim de uma forma mais precisa.

Em 1946 o autor inseriu um apêndice no livro que esclarece a linhagem e o destino dos Compson. Além disso, na edição mais recente encontramos um ensaio de Jean-Paul Sartre, intitulado A temporalidade na obra de Faulkner, que é bem interessante.

Para finalizar destaco um trecho do discurso de Faulkner durante a recepção do Nobel de 1950; ‘’Nossa tragédia, hoje, é um geral e universal temor físico suportado há tanto tempo que podemos mesmo tocá-lo. Não há mais problemas do espírito. Há somente uma questão: quando irão me explodir? Por causa disto, o jovem ou a jovem que hoje escreve tem esquecido os problemas do coração humano em conflito consigo mesmo, os quais por si só fazem a boa literatura, uma vez que apenas sobre isso vale a pena escrever, apenas isso vale a angústia e o sofrimento’’.

* Lorena Queiroz é advogada, amante de literatura, devoradora compulsiva de livros e crítica literária oficial deste site.

Poema de agora: Delonga – Lara Utzig (@cantigadeninar)

 


Delonga

taciturno
o controle de Saturno
se põe sobre a gente
e eu que sempre fui paciente
percebo a pressa
emergência submersa
que se tatua
na pele
nos olhares
nas mensagens
na urgência de ser tua

nos desencontros do destino
[esse nosso adversário]
esbarrei em ti tantas vezes
e acenei para seguir caminho
em outro itinerário
mas permanecia sempre olhando pra trás
e para o que eu havia deixado
[um amor que nunca se liquefaz]

eis minha sina
mística fase:
os dias que nos separam agora
são esses intervalos do quase
que tecem junto com a aurora
o senão
que é a certeza
do teu sim

não mais tardo:
em breve
chegarás como uma prece
pois eu, que sou filha do Tempo,
te aguardo
como quem espera um milagre

Lara Utzig

Poema de agora: Músicas que aperfeiçoam o coração (de Marcelo Guido para Nonato Leal)

Foto: Chico Terra

Músicas que aperfeiçoam o coração

Salve Nonato Leal.
Talvez, o mais emblemático músico deste estado.
Talvez, melodia em estado bruto.
Talvez, um mago das cordas.
Mas com certeza, um ser iluminado.

Como vinho enobrece com tempo.
Uma vida de alegrias e melodias.
Embaladas por cordas de um violão
Músicas que aperfeiçoam o coração.

Nonato Leal 94 anos. Vida longa ao grande mestre….

Marcelo Guido

E se? (como seria se eu tivesse feito escolhas diferentes?) – Crônica de Elton Tavares

Ilustração de Ronaldo Rony

Escrever/dizer que “todos somos produtos de nossas escolhas” é chover no molhado, ok? Ok. Entre tantos caminhos, certos ou errados por conta das decisões que tomamos, chegamos aqui. É como disse o filósofo e escritor francês Jean-Paul Sartre: “ser é escolher-se”. Pois é, mesmo com muitos erros, poucos fracassos e muitas reviravoltas, quem me escolheu foi eu mesmo (ou inventou), consequentemente, meus rumos.

Assim como em uma crônica do escritor Luís Fernando Veríssimo, intitulada “Alternativas”, resolvi escrever novamente (de forma sintetizada) sobre escolhas (aventuras e desventuras). Aí saiu esse devaneio aí debaixo:

Tenho 44 anos, sou jornalista, assessor de comunicação, escritor e editor deste site, mas como seria se tivesse feito escolhas diferentes?

Se tivesse escutado mais os meus pais e passado direto em todas as séries e me formado em Belém (PA)? Talvez não tivesse me envolvido em tantas brigas e furadas, mas saberia do que os maus são capazes? Certamente não. Ah, se tivesse continuado com a natação ou o basquete, ao invés de ter começado a beber aos 14 anos? A única certeza é que seria mais saudável e não estaria tão porrudo.

Se não tivesse ido morar com aquela menina em 1996? E se tivesse me empolgado ao ponto de ir para a Bolívia (BOL) em 2000? Se não tivesse ido para a Fortaleza (CE) em 2006? Se não tivesse me enrolado com quem não conhecia de verdade? Se não tivesse me envolvido com tanta gente de lá pra cá…Feito e desfeito laços afetivos? E refeito? Nunca será possível saber.

E se tivesse lido mais livros do que ouvido discos de rock e assistido filmes? Não, prefiro do jeito que foi mesmo. Deu para sorver conhecimento divertindo-me e ainda li bastante, para um cara meio marginal na juventude.

Se tivesse topado aquele convite da chefe de redação do Portal Amazônia e ido morar em Manaus (AM) estaria lá ainda? Não tenho certeza, mas se estivesse, seria doloroso, pois sou muito apegado aos meus.

Se não tivesse dito a dura verdade tantas vezes e magoado amigos? Não, prefiro a verdade, doa a quem doer. Arrependimentos ou desculpas não desatam nós ou colam o que se quebrou. Seja lá qual foi a sua escolha no passado, seja nostálgico, triste, feliz ou engraçado. O importante é o hoje e o amanhã, mas isso não impede de pensar como seria?

Se aqueles tiros, em 2001, tivessem me acertado? Se aquele carro na estrada, em 2011, tivesse capotado, aos invés de somente girar várias vezes e sair da rodovia? Estaria vivo ou sequelado? Se não tivesse me metido em tantas brigas de rua, teria aprendido a me defender?

E se em universos paralelos, ou outras dimensões, cada um de nós possui vidas vivendo as outras escolhas? Quem sabe? Não, já é doidice minha.

Se não vivêssemos tantos momentos eufóricos e decepcionantes? De volta aos escritos de Sartre, que falou sobre as consequências de “ter escolhido algo/alguém ou deixado de escolher algo/alguém”. O único arrependimento? Não ter cuidado da saúde e ter virado este gordão. O resto está melhor do que eu pensava.

Com todas as escolhas ao longo da jornada, aprendi que, se você trabalha, faz o bem e não interfere na felicidade alheia, tudo se ajeita com o tempo. E ainda há tempo para muita vida. Sejam quem vocês querem ou pelo menos lutem por isso.

Sua vida não é feita de decisões que você não toma, ou das atitudes que você não teve, mas sim, daquilo que foi feito! Se bom ou não, penso, é melhor viver do futuro que do passado” – Luís Fernando Veríssimo.

Elton Tavares

*Texto do livro “Crônicas De Rocha – Sobre Bênçãos e Canalhices Diárias”, de minha autoria, lançado em 2020. 

Poema de agora: O POÇO – Arilson Souza

Imagem: WEB

O POÇO

O poço
Da vida vivida,
Que reconstrói almas
Ou as deixa destruídas.

O poço
Da des[esperança]
Que acolhe sem acepção
Àqueles que nele se lançam.

Ah, o poço!!
E seu cabalístico fundo;
Para uns: A CERTEZA DO FIM!
Para outros: O RECOMEÇO DE TUDO!

Arilson Souza

Poeta Luiz Jorge Ferreira gira a roda da vida pela 66ª vez. Feliz aniversário, amigo!

Os poetas Fernando Canto e Luiz Jorge Ferreira, em algum lugar do passado.

Tenho alguns companheiros (brothers e brodas) com quem mantenho uma relação de amizade e respeito, mesmo a gente com pouco contato. É o caso do Luiz Jorge Ferreira. Hoje é aniversário desse figura talentoso e gente fina, que gira a roda da vida neste décimo nono dia de julho pela 66ª vez e fico feliz pelo seu ano novo particular, pois ele é muito porreta!

Luiz Jorge é médico, escritor, poeta, contista, cronista e cara porreta. Um amigo que eu nunca vi pessoalmente, mas tenho respeito e admiração por ele.

Em 2016 ou 2017 – não recordo agora a data precisa – o Fernando Canto, maior escritor vivo do Amapá, apresentou este site – por conta de incontáveis publicações da obra do amigo – ao Luiz Jorge.

A partir daí, o Fernando começou a me passar contos e poemas deste tal Luiz Jorge. Rapá, o cara é fera! Peguei o contato do escritor e me tornei amigo do figura. Comecei a publicar. De lá pra cá, mantenho contato com o Jorge, que é fã de música boa, um cara muito pai’égua e excelente artista das letras. Até livros dele ganhei de presente via Correios.

O Jorge nasceu em Belém (PA), morou quando criança e jovem em Macapá (AP) e formou-se médico na Universidade Federal do Pará, hoje exercendo o nobre ofício em hospitais da grande São Paulo, onde reside há décadas. Além de ser um sujeito muito gente boa, um médico competente e um escritor foda, sei também que o cara é ainda um pai e um avô amoroso.

Livros de Luiz Jorge que ganhei de presente do autor.

Luiz Jorge Ferreira é um dos membros fundadores da Sociedade Brasileira de Médicos Escritores (SOBRAMES). Autor dos livros “Cão Vadio”, “Berro Verde”, “Beco das Araras”, “Thybum” e “O Avesso do Espantalho”, participou em coletâneas da União Brasileira de Escritores – UBE (PA), da qual também é membro. Já letrou música pra compositores de MPB e Música Regional de Raiz. Milton Batista, Edinaldo Lobato, Alfredo Reis, José Serra e Fernando Canto são alguns dos seus parceiros (fonte Rumo Editorial).

O cara é um escritor premiado em vários concursos literários de contos e poesia no Brasil e no exterior. E vocês acreditam que um figura com esse currículo me manda mensagens e diz: “mestre, segue um conto (ou poema). Veja se gosta”? Porra! Sempre adoro, pois é cheio de memória afetiva, poesia nostálgica, contos cinematográficos. A cabeça do homem é uma usina de coisas legais passadas pelas palavras.

Quando estive em São Paulo (SP), tentei tomar umas cervejas com ele, mas não deu certo por conta de compromissos profissionais dele (plantão) e meus, já que eu estava na capital paulista a trabalho.

Já andava há algum tempo com vontade de escrever algo sobre esse amigo e colaborador deste site. Mas a convivência é a munição para tais textos. Ontem comentei com o Fernando Canto sobre o aniversário do Luiz e pedi uma manifestação dele, já que é amigo do cara desde que lamparina dava choque e foi quem me apresentou o médico escritor.

Não tenho fotos com o aniversariante. Montagem feita gentilmente pela poeta Pat Andrade. Eu, com Luiz Jorge (centro) e Fernando Canto (esquerda). Enquanto esse encontro etílico não rola, vale o improviso.

“Luiz Jorge Ferreira é médico de coração e letras. Vai ser amigo assim nas nuvens, na terra e na ferrugem . Além do grande talento como escritor, compositor, cantor e médico seu gênio é encantar o mundo com sua poesia fantástica. Adoro esse meu amigo. Feliz aniversário“, disse o Fernando Canto.

Por tudo dito e escrito acima, hoje rendo homenagens para o Luiz Jorge. Mestre, que tu sigas com toda essa humildade, talento e paideguice que te é peculiar, sempre com muita saúde para curtir a vida e os teus amores. Gosto de ti. Agradeço as contribuições. Sucesso sempre, parabéns pelo teu dia e feliz aniversário!

Elton Tavares

Poema de agora: AS AS – Ori Fonseca #ForaBolsonaro

AS AS

o amor que sinto não carece de primícias
nem de abrir malas pelas aduanas
nem sofrer calor à luz dos dias
o meu amor vem de heluanas
lias
de patrícias
de gente da arte-gente
rosa rente
gente da poesia
da delicia
da semana
em que patrícia
borda o dia a dia
de lua, de lulih, de lia
e heluana
num dia
de quinta
de todas as quintas
de aliane quintas
heluana quintas
andando nas frentes
acordando o dia
quando o sol raia
com suas rosas rentes
ao feito da paz
ao peito de maria
ao peito perfeito de mary paes
ao peito de soraia
ao peito de rebecca, de rebecca
minha fantasia
minha biblioteca
em que sempre li
li, li, lili
em que sempre lia
a poesia, a prosa
no barco de rosa
na ilha de lia
lia, minha lia,
a vida fictíciia
de tanta fabrícia
orquestrando este mundo
com o coração
o mundo, mundo, vago mundo
se eu me chamasse raimundo
seria uma rima, não uma decepção

Ori Fonseca

 


*Poema escrito às 2h26min do dia 15.07.21, uma quinta-feira. Mais do que uma homenagem a algumas das mulheres lindas que eu conheço, é uma declaração de amor e um pedido de desculpas por tudo o que as mulheres vêm sofrendo em um mundo afundado em lixo machista. Nesta semana, minha amiga Heluana Quintas foi alvo de uma agressão nojenta porque cometeu o terrível pecado de ter opinião e a expor. Saiu da pequenez do agressor mais gigante do que já era.