Poema de agora: A CENA – Marven Junius Franklin

A CENA

o envelhecido tênis adidas arremessado no porta-malas;
o e-mail de amor que não despachei;
a verdade que calei [não sei por qual motivo];
a estação que não passou…[como passam os ferozes tsunamis];
a canção do the cure que ainda não tocou no rádio;
o vento gélido que ainda não bateu em meu semblante morno;
a sorte que ainda não chegou [e marcamos no sopé da aurora boreal];
o dia que não amanheceu…[talvez aprisionado pela antemanhã].

Marven Junius Franklin

Poema de agora: O OITAVO ANJO – Obdias Araújo

O OITAVO ANJO

Feito criança que atravessa a rua
Com o sinal aberto ele para e olha o tempo
Como se o sol fosse a voz
Que ordena a partida.

Solitário percorreu caminhos
E deixou seu rastro nas escadarias.

Na sua solidão
Alisou as ondas do Amazonas
Como se fossem seus próprios cabelos
E se deixou beijar lentamente
Pela deusa do sonho inacabado.

E muitos olhos viram
Seu sorriso assolando os campos.

E muitos outros olhos
Hão de ver. E muitos outros ouvidos
-Ouvidos perto -ouvidos longe hão de ouvir.
Até os surdos escutarão em braile.

Haverá desusado movimento
Nas Ilhas Galápagos.

Seguirá sem a pressa costumeira
Deixando no caminho às suas costas
Uma sombra larga e o brilho de um farol.

Semeará a dor e a desgraça
Com suas armas afiadas de palavras
Fazendo brotar dos olhos verdes
Negros azuis cinzas vesgos míopes
Glaucomados ou castanhos
Um chafariz de lagrimas impuras
E a imagem da desolação.

Obdias Araújo

*À memória do Doutor Isnard Brandão de Lima Filho. Advogado, Poeta e Sacanocrata.

Poema de agora: MÍSTICO – ISNARD BRANDÃO

MÍSTICO

Estou feliz Senhor, no dia de hoje,
Alimentado, forrado, amanhecido…
Parece que estou feliz.

No meio do areal deixei a caravana,
E vim, trazendo no rosto a bruteza do Simum,
Nos olhos a secura dos viajores cansados,
Nas mãos o orvalho quente do deserto.

Não sou um peregrino a caminho da Meca:
O túmulo de Moisés foi profanado,
Levaram as urnas, as vestes
E o grão de ouro batido nunca existiu
(era esmeralda),
Mas terás dentro de mim, um servo, meu Senhor,
Há trigo, cevada e mirra.
Usarás como dono daquilo que é teu.

E se a porta não abrir no dia em que chegares
Sabe: minha resposta é pobre e sem valor o ato.
Saberás: estarei dormindo, embrionário ainda,
O sono das terríveis noites seculares,
À espera da Tua luz, do Teu amor, dos Cravos
E da Cruz…

ISNARD BRANDÃO

* ISNARD BRANDÃO LIMA FILHO chegou a Macapá em 1949; o primeiro poema apareceu aos 12 anos, no Amapá Jornal, através do poeta Alcy Araújo. Em 1968 publicou Rosa para a Madrugada, livro de estreia, que teve duas edições esgotadas em poucos dias. Descobriu, estimulou e abriu roteiro para muitos talentos artísticos da terra de Julião Ramos. Contribuição de Fernando Canto.

Poema de agora: Dona Louca – Marven Junius Franklin

Imagem: Christopher Lovell More

Dona Louca

Dona Louca – uma portuguesa
que vivia zanzando pelas ruas de Santarém
empunhando um guarda-sol furado
vez ou outra ela adentrava o Cemitério Municipal
e furtava as flores dos túmulos
e dando risos zangadiços
– gritava:
flores para os vivos…os mortos não carecem de flores!
flores para os vivos…os mortos não carecem de flores!
Ah, Dona Louca!
Foi a primeira poeta que conheci.

Marven Junius Franklin.

Poema de agora: Pequenos notas sobre o “Quando…” – Jaci Rocha

Pequenos notas sobre o “Quando…”

O último pedaço de bolo, um domingo no cinema,
Perder a hora do poema, esquecer e não anotar a rima,
Não ir gastar o fim de tarde na Paulista
Deixar de observar o vento balançar a vida…

Não viver o momento, adocicado e lento
Com a delicadeza de estar presente, inteira.

Esquecer o aniversário de alguém amado,
Esconder um verso, ir menos ao teatro e mais ao supermercado,
Apagar um sonho riscado com a ponta de giz,
ter medo, errar e não pedir perdão…

Só me devora o que não fiz, quase sem querer!
A aula que não pude aprender, o tempo em que desfiz laços…
As vezes que fugi de mim e nem notei
A lágrima sentida, no bolso esquerdo guardado

O amor que esqueci no varal e secou,
A velha dor nos joelhos, o tempo que não me doo,
e justifico e sigo! a falta que não digo,
e às vezes, nem percebo.

Não fazer o melhor poema de amor a cada ser amado,
às vezes, desatentamente, errar a curva da estrada
machucar a emoção de alguém
Ou não doar o melhor em mim no ‘agora’,

—- Só o que não fiz e o que não vivi
O que não doei e não me dispus,
A dor que gerei e não pude reparar
A vida flagrante, que deixei de respirar :

São as coisas tantas que, às vezes, junto do poema
Sentam comigo, sob minha janela
e perguntam sempre e muito:
Quando? Quando? Quando?

Jaci Rocha

Poema de agora: Luz e Assombros – Jaci Rocha

Luz e Assombros

A poeira acumulada na calçada dos dias
O vento que sopra a esquina da tarde que cai
Um fantasma sentado na esquina da Hamilton Silva
A lembrança da pureza batendo à porta.

A luz do dia e a sombra das coisas que já disse adeus
Às vezes se encontram
Sentam para uma cerveja
Ou para um simples olá….

Acho que encontrei comigo
Risonha, pateta.
O espelho sussurrou “já passou”
Sigo aqui, sei que ali, já não há mais nada

É só a poeira do tempo
Trazida no vento
E nas flores do jambeiro
Que jazem naquela calçada.

-E a chuva lava o fim de tarde
Com o (e)terno cheiro dos domingos.

Jaci Rocha

Poema de agora: ARRANJO DO FENECIMENTO¹ – Marven Junius Franklin

ARRANJO DO FENECIMENTO¹

assim que meu pai se foi
– levado pelos modos indolentes da morte –
girassóis petrificados ladearam as calçadas mornas
da avenida magalhães barata

(os túneis de mangueiras
que cobrem a avenida nazaré esmaeceram
e a brisa leve – que invariavelmente batia da baia –
tornaram-se borboletas mortas a compor o fim).

assim que meu pai se foi
– distorcido por ventos e brisas –
uma nuvem gris permaneceu estacionada
em seu leito de extenuação

(a vidraça do quarto
partiu-se em miúdos estilhaços de silêncio
e minha mãe morreu um pouquinho
– simulando cuidar de seu jardim bordado
de brinco-de-princesa).

quando meu pai feneceu
eu morri um pouco com ele
a cada dia que enevoava em meu alpendre de vidro

(era como se minha se alma
estivesse atrelada ao seu boldrié
a não querer largá-lo pela imortalidade).

quando meu pai feneceu
eu naveguei por vales e cordilheiras da morte
até adormecer com o ocaso

(era como a lhe esperar regressar
de seu voejo único – tal ícaro a se expor no firmamento).

Marven Junius Franklin

Poema de agora: SALIVA – Luiz Jorge Ferreira

SALIVA

Mãe, não ponha está fronha suja de mãos sob o céu.
É Janeiro, e os homens vindo lá de trás apagam com ela os lampiões.
– temo que nascerá, um escuro de breu, um silêncio de ateus, é uma lua minguante, cheirando a incenso e mirra.
….tia Benedita, não lave estes rastros na trilha, e nem ponha sal sobre as gralhas, que catam migalhas que são restos de mim.
– Cadê pai?
O pai de olhos vendados, está sentado do lado em que eu amarrei a fotografia do meu velocípede.
Ele está de costas para a janela que eu abri, quando todos estavam dormindo.
Por ser um Domingo…Deus estava na Missa, no louvor, no tambor, no ninho, no crepúsculo, no molusco.
Vindo do.mar, um vento com o cheiro de peixe podre esvoaçou as páginas do Livro do Galvão.
Espalhou areia no Disco do Alcides, e calou Edvaldo Gandi, que dados jogava sobre o violão.
Lá no lixão, um cachorro parecido com cães feitos de gesso.
Latia para o por do sol, que colore as Araras.
Parecia com tantos outros cães.Que parecem com tantos outros cães, que parece, que parecerão, com tantos outros cães.

Tenho que ficar atento, ameaça- me um tempo em que ficarei, mais triste ainda.
Imaginando a lua nova, como coisa perdida na Aurora, arranharei a vida, ultrapassando a alma.
Até machucar a esperança.
Mãe… Mãe…nem saliva…nem leite.
Lavarei com chuva as feridas, e darei guarida as paixões.
Sem que nenhuma delas lembrem-se das outras.
Será o dia, em que uma vez…em vezes.
Enterrarei a saudade.

Luiz Jorge Ferreira

*Luiz Jorge Ferreira é amapaense, médico que reside em São Paulo e vice-presidente da Sociedade Brasileira de Médicos Escritores (Sobrames).
**Contribuição do amigo Fernando Canto.

Poema de agora: Vida em Marte! – Jaci Rocha

Vida em Marte!

Sob o mesmo sol que brilha amarelo
E ainda roda,
descobriram que há água em Marte
– Lastros de futura ou pretérita civilização?

Será que em Marte alguém já amou,
Já disse adeus…virou carbono e voltou
Viagem entre o universo e a vontade de reencontrar
Será que foi anteontem ou ainda acontecerá?

E dizem que há mais mistérios
que poderá supor nossas vãs teorias
Mas, se até a poeira da terra já esteve n´outro mundo,
E mesmas palavras compõem outras poesias

Entre as estrelas, quantas milhões de formas de vida?

Digo olá ao exótico – Que pode ser eu, ao espelho
Afinal, quem poderá dizer quem é o ‘outro’
Não seríamos nós, afinal, o estrangeiro? –
Eu, passageiro,

Viajo entre as estrelas e o desconhecido
Até com certa familiaridade !
não pasmo se no Universo
Houver ou houve vida em Marte

Afinal, dentro de mim moram tantas
Gente que até não mais conheço
E outras se achegarão, no tempo, no espaço,
Com outros versos,luz, assombros , sonhos e avessos.

Jaci Rocha

Poema de agora: ADEUS – Obdias Araújo (Para Fernando Canto)

ADEUS

Quando a morte chegar eu estarei à porta principal
À sua espera tendo em uma das mãos o bocal
De meu trombone polonês armado em dó
Que foi presente do Mastro Tenente Clodomiro Martins
E ninguém toca nele. Conversaremos por alguns minutos.

Ela a morte me narrará interessantes fatos de sua longa viagem
E eu lhe falarei depois do medo que tenho de não suportar
A falta dos amigos e a ausência dos carinhos da mulher amada.

À minha mão direita a Rosa do Deserto despetalada em pranto.
À minha mão esquerda o retrato de minha mãe e uma lágrima
Cuidadosamente retirada de seu olhar de Santa.

Assobiarei baixinho Bolero de Maurice Ravel
E bordarei no centro do meu peito
Um Sinal-da-Cruz imaginário.

Obdias Araújo (Para Fernando Canto).

Amapá Garden Shopping recebe os Poetas Azuis com recital “Enquanto a Pele Arrepiar”

Hoje (26), na Praça de alimentação do Amapá Garden Shopping haverá apresentação do Recital “Enquanto a Pele Arrepiar”, do grupo lítero – musical, Poetas Azuis. Será um show de poesia e música para toda a família.

A proposta prevê um show interativo com o público. Embalados pelo amor à poesia, os Poetas Azuis apresentam canções conhecidas e inéditas, que compõe o trabalho “Enquanto a Pele Arrepiar”.

Criado em 2012, pelos poetas Pedro Stkls e Thiago Soeiro em parceria com o produtor musical Igor de Oliveira, os Poetas Azuis reúne elementos diversos, suas letras abordam temas como o amor, a saudade, a solidão e as histórias do cotidiano.

Serviço

Recital “Enquanto a Pele Arrepiar”
Data: 26/07 (Hoje)
Hora: 19h
Local: Praça de alimentação do Amapá Garden Shopping

Assessoria de comunicação

Poema de agora: Canto Marginal – Marven Junius Franklin

Canto Marginal

pondero
que qualquer dia
retrocedo às prática marginais

(e unido
aos meus antigos cúmplices
tirarei da inércia uma antiga parceira)

[eu]
Sancho e Quixote
embraveemos outra vez
lutas inolvidáveis contra anfibológicos
moinhos de vento.

nos aguardem!
Dulcinéias esquálidas
e impérios desalumiados

(pois a hoste de abstrações
açoitará suas portas de presunção).

Marven Junius Franklin

Poema de agora: Rio! – Jaci Rocha

Rio!

O que será que é o amor?
Quantas milhões de coisas ele ainda virá a ser?
Quem um dia poderá, ainda que breve
Explicar, ponderar, compreender?

Sei que é toque, canção, cheiro, emoção (alucinada!)
Sei que é dia a dia, mão na mão
Segurar o coração,
Seguir em par pela estrada…

É perda, suor e ganho
Inocência, saliva e ilusão
Mas é que é também o possível
Depois de encontrar com a razão…

É deixar de abrir páginas encantadas
Para estar na pele amada
ter absoluto medo e ainda assim,
aceitar-se desassossegada…

Mas eis que não sei mais do amor
do que aquilo já alcancei.
Sempre à procura de seu infinito!
Feito chuva, molha a alma, invade a pele,

Doce rio de mistério…

Jaci Rocha

Poema de agora: Existencial – Jaci Rocha

Existencial

Tudo que se movimenta, vibra
Vida é coisa tão bonita, pulsa!
De repente, o olho cai na curva
Da beleza mágica de um arco-íris…

– água e luz no céu que tornam em cor… –

Olho ao redor, todos em busca da própria paz
Por que a gente não veio em linhas retas?
Com tarja de “cuide bem de mim”
Entregue com a rota certa?

E no reverso, tudo é descoberta
Missão particular de cada um
Escolha entre o tato e o coração
Sem lógica ou porque algum…

Ah! me diz, qual o sentido?
Nós, Multiversos, a grande charada!
Sem lógica:caos ou destino?
encontro de luz e de cores na mesma jornada…

Jaci Rocha