Poema de agora: Escólio (para Fernando Canto) – Obdias Araújo

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Desenho de Obdias feito por Fernando

Escólio (para Fernando Canto) – Obdias Araújo

A palavra é conto e canto
O calar é desencanto
A palavra é alegria.
Por isso
meu povo
canta
Que o calar é nostalgia
A palavra é conto e canto
O silêncio é desencanto
A palavra é alegria.
E se a palavra é alegria
O silêncio é desencanto.
A palavra é conto e canto
Por isso
Meu povo
Canta
Que o calar é nostalgia!

Obdias Araújo

OUÇA BEM O QUE VOU GRITAR NO SEU OUVIDO – Poema de Fernando Canto

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OUÇA BEM O QUE VOU GRITAR NO SEU OUVIDO

Ouça bem o que vou gritar no seu ouvido:
Este avião segrega a minha dor e sequestra meu desejo.
Mas nem assim tirarei o ranço da mochila pra te machucar nesta viagem.
Sou, bem sabes, um viajante extemporâneo hoje em dia,
Ainda que tenha te seguido em prantos
Por desertos e luas paridas sem orgulho.
Sou estratégia, luta e morte agora.
Um calcanhar de sólido e obtuso aço
A deixar pegadas órfãs de grama ao caminhar.
Por ti gestei palavras e poemas
Ensanguentado de mágoas e lâminas enferrujadas no nosso jardim de amarílis, mas não deixei que mesmo à tua voz renitente a dor fosse objeto de vindita.
Mas ouça bem, porque neste avião a manobra de valsalsa me faz surdo e um surto de angústia povoa meu ser, posta a natureza falsa do cabelo da aeromoça que passa me ofertando um tango e um sanduíche no cartão de crédito.
Tiro da cartola um coelho e um moinho de lágrimas e te digo novamente: ouça-me bem, amore, a minha biografia foi filmada em celular e num segundo milhões de acessos contemplei. Ouça -me: despertei do sonho, da prisão do pesadelo que embalava minha rede branca na varanda. Meu coração já não sofre tanto por ti. Ouça -me. Ouça -me! Você pode me ouvir, sim. O avião pousou. Desembarca. Já!

Fernando Canto

Poema de agora: RUA DA SAUDADE – Poetaz Azuis

RUA DA SAUDADE – (Pedro Stkls/Paulo Junior/ Deize Pinheiro)

agora é primavera
e eu não florir
meu peito não faz festa
e eu não sei sorrir

tem resto de carnaval
tem tanto de tristeza
e um poema branco
sobre a mesa

nem sei sou lembrança
nas tuas noites azuis
há um rasgo no peito
só a marca do beijo

e você me mudou de endereço
pra uma rua
onde só passa saudade…

Caminhada – Poema de Fernando Canto

FernandoCanto

Caminhada

Aos que caminham dentro de si e ainda se assombram

De manhã
Meu corpo
É longo
Em sua sombra
Caminhante

Ao meio-dia
Assombro-me
Em segredo
– Encolhidinho –
No equinócio
Da alma

À tarde
Eu me projeto
Rumo ao mar
Com o sol
A bater meu rosto
Nos umbrais da noite

E se um lado é luz
Que me orienta
E de outro
Meu rastro
É a escuridão

Sou, perdoem-me,
Um obscuro ponto
Na paisagem
Que me embala
Ao sol do dia seguinte.

Fernando Canto

Poema de agora: Se morrer hoje – Carla Nobre

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Se morrer hoje você me leva aquele cozidão na panela velha? É que lá no céu só tem comida fria e eu sinto falta de ser da terra. Adorei as asas de anjo que ganhei das outras vezes que morri, mas comida fria é ruim. Se eu morrer hoje, promete que não me deixa sem teu cabelo suado? Detesto chegar no céu de roupa limpa e toda arrumada. Das outras vezes que morri, levei também uns vidros de perfume que comprei na importadora. Mas depois que você desarrumou meu corpo inteiro, não consigo sentir cheiro bom em nada, nem mesmo em nascer do sol. Esse mundo ficou bemol sem tuas histórias no meu ouvido. Se eu morrer hoje fica prometido um novo beijo desses de engolir as estrelas para minha nova encarnação? Ah, não fica bem negar amor para um fantasma e sua dor…

Carla Nobre

Poema de agora: O Roubo do Velho Forte (Obdias Araújo)

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O Roubo do Velho Forte

Tu sabias
que a Fortaleza
foi toda construída
no Curiaú?
Diz que o Sacaca
o Paulino e o Julião Ramos
vieram em cima da Fortaleza
varejando até chegar na beira do Igarapé Bacaba
onde amarraram a bichona na Pedra do Guindaste
e foram tomar uma lá
no boteco do sêo Neco.
Diz que o o Alcy escreveu uma crônica
E o Pedro Afonso da Silveira Júnior leu
Oito horas da noite
no Grande Jornal Falado E-2.
Diz que, né?
Diz que o mestre Zacarias
vinha em cima do farol
tocando um flautim feito
com as aparas da porta de ébano…
E que Dona Odália vinha fazendo
flores de raiz de Aturiá
sentada no maior de todos os canhões
brincando com a Iranilde
que acabara de nascer.

Diz que o Amazonas Tapajós vinha
cantando ladrões de Marabaixo
-ele, o Edvar Mota e o Psiu.
E o João Lázaro transmitia tudo para a Difusora.
Diz que até o R. Peixe pintou um mural
-aquele que ficou no pátio da casa do Isnard
lá no Humilde Bairro de Santa Inês
de onde foi roubado pelo Galego e trocado
por duas garrafas de Canta Galo
e uma de Flip Guaraná, lá na Casa Santa Brígida…
Hoje Macapá amanheceu bem
mais triste que de costume.
Roubaram a Fortaleza!
Levaram o velho forte! De madrugada
Dois ou três bêbados remanescentes
viram passar aquela enorme coisa boiando
rumo norte, parecendo uma usina
de pelotização.

Andam comentando lá
pelo Banco da Amizade
que foi o Pitoca
a Souza
o Quipilino o Pombo
o Zee e o Amaparino…
E que o Olivar
do Criôlo Branco
e o Cirão
estão metidos nessa história.
Eu, hem!

Obdias Araújo

Poesia que não se esgota (Fernando Canto)

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A poesia não se esgota no pensamento porque ela é o esforço da linguagem para fazer um mundo mais doce, mais puro em sua essência;

A poesia procura tocar o inacessível e conhecer o incognoscível na medida em que articula e conecta palavras e significados;

Cada imagem representada, projetada pelo sonho, pela imaginação ou pela realidade, é um símbolo que marca o que sabemos da vida e seus desdobramentos, às vezes fugidios.

Mas nem sempre é o poeta o autor dessa representação, pois tudo o que surge tem base social e comunitária, depende da vivência de realidade de quem propõe a linguagem e a criação poética.

Quando isso ocorre estamos diante da autenticidade do texto poético. E todos somos poetas, embora nem sempre saibamos disso. E ainda que nem tentemos sê-lo.

Fernando Canto

 

Poema de agora: Fico – @ThiagoSoeiro

Fico

Eu fico entre o silêncio
E o som da tua voz
Um ruído novo
Neste mundo de
corações barulhentos

Fico entre os corais
e o teu maxilar
[Desviando todos os meus caminhos]

Ainda que eu desse
a volta ao mundo
Cairia bem aqui
No meio dos teus dedos
Às 18h
De um dia qualquer
Entre o beijo do poema
E o teu coração.

Thiago Soeiro

Poema de agora: Plano para o futuro – @ThiagoSoeiro

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Plano para o futuro

Anoiteço escrevendo cartas e ninguém lê
Guardo todas debaixo do colchão
Faço planos para o dia que serão abertas e lidas
Você vai vir
Sentará ao meu lado na sala
E lerá todas as cartas que te fiz
Vamos rir juntos
Vou perguntar porque demorou
E o som da sua voz vai ecoar pela casa
A tanto acostumada com meu silêncio
‘Tava te esperando chegar’.

Thiago Soeiro

Poema de agora: Passarinho de Flor – Poetas Azuis


Passarinho de Flor – Poetas Azuis – (Pedro Stkls, Deize Pinheiro e Marcelo Souza)

vem, meu bem
vamos nos encontrar no amor
me serve do teu colo
a gente gira o mundo
e brinca de voar

hoje me veio a vontade de dizer
que você é tão bonito
quanto um jardim de setembro

e é do teu lado esquerdo
que quero me perder
me jogar de ponta de cabeça
e nunca mais voltar

deve ser porque
esse teu ar de passarinho de flor
que me deixa assim
sujeito ao teu amor