Poema de agora: A cidade submersa – Pedro Stkls

Foto: Floriano Lima

A cidade submersa

quando a cidade quase submerge
agarra-se numa bóia
um tronco de árvore sonâmbulo
que vagueia pelas águas
no mapa sublinho a palavra Macapá
que quer dizer:
senhora de óculos sentada de costas para o portão
com 261 primaveras floridas
em uma saia de marabaixo
a coisa mais bonita do mundo
aquilo que vem enfiado nos pés
uma ponta de madeira, uma dança
o meio do mundo
uma fortaleza nunca usada
lugar de muitas bacabas
boêmios, laguinho
por onde um trem nunca para
em nenhuma estação
há sempre de seguir viagem
é um trava língua pronunciar: buritizal
é inevitável sobretudo não dizer:
“cidade morena ou linha do equador”
desconfio que a palavra Macapá
não vem do tupi como dizem os historiadores
surpreendente seria se Macapá
tivesse sido extraída do barro escuro
que estranhamente se espreguiça
no rio amazonas.

Pedro Stkls

Poema de agora: MACAPÁ – @PedroStkls1

MACAPÁ

maria, bem no olho do mundo
há uma flor distraída
bebendo a chuva da goteira
como as vozes guardadas
das tribos que trouxeram o rio
pintaram um céu azul marabaixo
quando a chuva voltou pra casa
só ficou o perfume na lama
da saliva de um jambeiro
que veio fora de época
no inverno brincar de primavera
só pra confundir o nosso coração
acho que foi assim que a pedra sagrada
onde o padroeiro ergueu o seu quintal
onde o rio amazonas deixa florir
dilúvios e dilúvios em roda de batuque
foi assim que a pedra do rio veio parar
na beleza das marés
em dias onde o inverno vestido de primavera
sacoleja o jardim das águas o soneto do barro
no alumiar das lamparinas
maria, eu brinco de fazer banzeiro
na ponta da tua doçura
por você me contar três palavras
é como se o meu rio fosse o teu sentimento
olha, vamos atravessar esse mundo de água
que fica nas costas do padroeiro
vamos descobrir onde nasce a cidade
essa será nossa aventura
nosso pacto secreto de canoa
e se chover a gente descobre a chuva
e se der saudade a gente passa amor crescido
vamos você e eu descobrir por onde anda
a pororoca.

Pedro Stkls

Poema de agora: MACAPÁ NÃO TEM MAPA – @ThiagoSoeiro

MACAPÁ NÃO TEM MAPA

encontrei a palavra saudade hoje
em um caderno de cartografia
ela se estende inteira
por essa cidade
desde o seu ponto mais seco
as margens do rio

parece mesmo que estamos
morando na saudade

no mapa
está é
uma cidade inteira
feita de pontes
ligando as faltas
que as pessoas fazem

imagino que quando acontece
do alto podemos
ver as luzes
que cada saudade
faz brilhar.

Thiago Soeiro

Poema de agora: Eco ((@cantigadeninar)

Eco

Respirar o ar da solidão
Nem sempre é um peso intranquilo,
Um penar para o coração,
Prestes a cometer algum vacilo.

Nas quatro paredes do quarto,
O eco é meu amigo.
De minha presença nunca me farto;
Apenas um bom livro comigo.

O barulho lá fora é alto.
Buzinas, ruídos das bocas falando…
O céu adquire tons de azul cobalto
E na janela observo as pessoas passando.

Ouço meus tantos pensamentos,
Tento organizá-los de forma sistematizada.
Somente não possuo muito talento
Quando o quesito é ser amada.

Estar só é um privilégio
Em tempos que todos mascaram.
Num bar, vozes vazias recheadas de tédio
Refletem almas que se decepcionaram.

Viver só é um estado de espírito
Em tempos que todos disfarçam tal condição.
Na rua, o poeta culpa seu eu-lírico,
Enquanto, na parada, aguardo a próxima condução.

Terminei o livro e gostei do enredo.
Busco um novo alvo na vasta estante.
Do som do silêncio não tenho medo:
De mim mesma, sou ótima acompanhante.

Lara Utzig

Poema de agora: AS ANGÚSTIAS SE CURVAM – Saulo Mendes

AS ANGÚSTIAS SE CURVAM

As angústias se curvam
ao peso de uma só dor.
Uma só memória cala
a força, a vontade, a cor.
Poderíamos estar juntos
se não fosse a conjuntura.
Doze espinhos são encravados
aos gritos, sem compostura,
na forma bruta da morte,
na desmemória dos jovens
na face da própria sorte.

Doze horas são passadas
antes que a última vez
se projetasse ao futuro
na glória de cada mês.
Doze instantes sem tarjeta
mudaram-se em flores mortas
cresceu força da sarjeta
rompendo amarras e portas.
Nova vida rompeu seio
E aos gritos cada manhã,
queimou formas, vias e meios
conformou todo o amanhã.
É preciso ainda esperar,
ainda espero, ainda que venha
a doce força de um mar.

Saulo Mendes

*Saulo Mendes foi um poeta carioca que se instalou por aqui nos anos 70, Era compositor, poeta, radialista e diretor teatral, inclusive montou duas peças, de autoria dele: o Louco, encenada no auditório da Rádio Educadora e Morte e Vida Severina, encenada no Cine Teatro Territorial. Foi casado com a cantora Lurdinha Mon’Alverne e morreu nos anos 80 em acidente na Br-156.
**Contribuição de Fernando Canto.

Poetas Azuis apresentam Recital Enquanto a Pele Arrepiar nesta quinta-feira, 31

O grupo litero-musical Poetas Azuis irá apresenta na versão voz, poesia e violão o recital Enquanto a Pele Arrepiar, nesta quinta-feira, 31, a partir das 21h30 no Bar do Vila. A Apresentação também marca o final da turnê desse recital.

O show contará ainda com as participações especiais de Ozzy Rodrigues, que irá acompanhar os poetas no violão, e com as vozes de Brenda Melo, Alexandra Moraes e Enrico Di Miceli.

Para o poeta, Pedro Stkls, o encontro vai ser uma oportunidade de confraternizar a poesia e a música. “Nós estamos em pleno planejamento para o lançamento do novo recital, mas antes queríamos mesmo nos despedir do recital Enquanto a Pele Arrepiar e agradecer ao nosso público, que sempre com carinho nos acompanha”, conta Pedro.

O público pode esperar uma noite leve e cheia de boas energias. No repertório estarão poemas-canções que já são conhecidos pelos fãs que acompanham o grupo como Feliz e Meio, Dia Dez, Quando o Amor Florir, A Poesia em Movimento, entre outros.

Poetas Azuis

 

O grupo litero-musical surgiu em junho de 2012 na capital amapaense e foi criado pelos poetas Pedro Stkls e Thiago Soeiro em parceria com o produtor musical Igor de Oliveira. A poesia-musical dos Poetas Azuis reúne elementos diversos tendo como principais influências o Folk, MPB, MPA e o Marabaixo (dança tipicamente amapaense). Suas letras abordam temas como o amor, a saudade, a solidão e as histórias do cotidiano.

Serviço:

Poetas Azuis – Enquanto a Pele Arrepiar
Local: Bar do Vila – Avenida Mendonça Furtado, 596 – Centro
Data: 31 de janeiro
Horário: A partir das 21h30
Couvert Artístico: R$ 3,00
Classificação: 16 anos

Fotos: Eudes Vinicius
Assessoria de comunicação dos Poetas Azuis

Poema de agora: Script – (@cantigadeninar)

Script

E eu que não tinha mais medo
esqueci o enredo
pra te conquistar.
O que é que a gente diz depois de um olá?

Quando eu fico sem jeito
é mais um defeito
a consertar.
O que é que a gente diz depois de como está?

Se o script eu não leio
me perco tão feio,
não sei o que falar.
O que é que a gente diz depois de amarelar?

Tenho os mesmos receios,
mas então me veio
uma conclusão a acatar:
quanto mais perguntas a gente se faz,
menos tempo sobra pra amar.

Lara Utzig

Poema de agora: Convite – Luiz Jorge Ferreira

Hospede-se em mim
Venha uma tarde dessas, à toa
Traga um sorriso aberto na boca
e pronuncie palavras quaisquer

Decore um trecho de canções do Chico
Em que o amor não merece castigo, e se
Assente, onde achar que deve

Fique até que se despenque a tarde,
pode ficar muito mais depois desta tarde, que a gente junto imaginou.

Se você me perguntar…Me vou?
Eu lhe pedirei…Se fique.
Pois retornar é infinitamente mais
Difícil.

Luiz Jorge Ferreira

*Publicado no livro Signo do Sol – 2015.

Poema de agora: Khalor – Luiz Jorge Ferreira

Khalor

– Estamos sob um calor de derreter palito de picolé.
Olhei para o Curió vibrando as duas asas antogônicas ao raio de sol que se espreguiça deitado na gaiola, como se beija-flor fosse.


Que bom ! Respondi…adoro pisar nas poças d’água.
Chafurdando feito um cão sem dono…
Não amo noites sem lua,deserto sem areia, sereia sem cauda, e pólens sem abelhas.

Amo pisar nas poças d’água.
Chafurdar água para o Pólo Sul, e para o Pólo Norte, e tudo cair no Equador.
Sobre a rua Ernestino Borges…sobre a minha cadelinha Lilás.


Sobre meu Canário Belga.
Nos pés de minha tia Benedita, que agora debruçada sobre o Delta Larousse lê sobre rendados roseos de Macramê, e ungüentos especiais.
Ela imagina-se em paz, regando o deserto das palavras que espalhei sem magoas, com as lagrimas que plantei.
No alpendre o vaso de Dálias ama as poças d’água como eu as amei.

Queria descrever o barulho das minhas bolas de gude.
Atiradas a esmo para o Grêmio Estudantil…visando estourar as lâmpadas não Led …pescando o escuro da poça de luz…

Gosto de pisar nas poças d’água…
Pisar na sombra da lua…
Chapiscar os gatos da rua de água raz.
E os ratos cúmplices do silêncio cego das retinas das Araras empalhadas, e quase azuis.
Sonho os molhar de saliva, e sal de suor.

Gosto de falar em Libras …para que se comportem… as rasteiras gramas dos valados.
Para que entre si dancem as valsas triviais que o vento canta.
Para que não matem sede e desejos, com a água que evapora no asfalto antes da casa do Avulu.

As Bachianas eu recomponho os compassos, mergulhando meus pés um a um dentro da poça d’água que carrego n’alma…
Ela nem vaza, nem seca, nem dói.

Luiz Jorge Ferreira