A CASA DO EZEQUIAS – Por do Fernando Canto

Foto: Blog Porta Retrato

Crônica de Fernando Canto

A metade dos anos 80 trazia a grande expectativa de mudanças no caminho político do Brasil. Após a anistia de 1979 restava ainda o término do Governo Figueiredo e a transição democrática que se estabeleceria com a eleição de Tancredo e a posse de Sarney.

No Amapá tudo isso era motivo de conversa e os jornais emitiam opiniões bem diversificadas sobre o destino de nossa terra, causando certo frisson entre os leitores. E com a possibilidade de transformação em estado o antigo Território Federal cedeu espaço a centenas de aproveitadores políticos que para cá vieram em busca de uma vaga no parlamento. Foi nesse contexto que ressurgiu o Amapá Estado, fundado por Haroldo Franco, Silas e Ezequias Assis.

Governador Henning – Foto blog Repiquete no Meio do Mundo

Esse jornal havia sido editado pela primeira vez durante o governo de Henning, que segundo eles, quando leu o primeiro número o amassou e jogou fora dizendo que a pretensão dos jornalistas não passava de um engano,de uma utopia. Foi, também, nesse contexto que posteriormente foi lançado o jornal Fronteira, onde trabalhei com uma coluna informativa, ao lado de grandes expressões do jornalismo local como Alcy Araújo, Luís Melo, Jorge Herberth e Wilson Sena, por sinal o primeiro presidente da Associação dos Jornalistas do Amapá. Antes disso o Silas fechou o Amapá Estado e foi se estabelecer em Belém com um jornal maior.

Humberto Moreira – Foto: Blog Porta Retrato

Mas os grandes assuntos da pauta semanal do Fronteira eram discutidos na casa do Ezequias. Todos os sábados ele nos recebia com aquele jeito brincalhão, mostrando um exemplar que o Ricardo, seu filho, pegava no aeroporto (Naquela época era impresso em Belém.) e não economizava o orgulho de ver editado mais um número. E o que era para ser apenas informação virava celebração, pois nunca faltava uma boa dose do melhor uísque, uma carne de caça que o Baleia fornecia para o dono da casa desde que ele fora chefe de Gabinete da Secretaria de Obras e a viola do Nonato Leal, às vezes em duo com a do Sebastião Mont’Alverne. Ao lado disso, apreciadores da boa música, como o Alcy, se deleitavam ouvindo o Humberto Moreira interpretar Taiguara. Artistas e intelectuais chegavam como se estivessem ligados a uma rede invisível e automática, num tempo em que não havia celulares. Aimorezinho era um espetáculo tocando bossa nova com a sua escaleta e o inesquecível bandolim do Amilar parecia pousar em uma partitura mágica vinda das Brenhas de Mazagão. Ritmos se fundiam numa democracia musical crescente que só acabaria quase no início da noite com o sorriso sempre aberto da ilustre e querida amiga Nazaré Trindade. Antes, porém, Ezequias, Nonato e Sebastião faziam um coral com a música “Saci Pererê” de autoria dos três. Depois cantavam “Tauaparanaçu”, de Nonato, e arrematavam com “Rio Amazonas”, de autor desconhecido. A audiência não poupava elogios ao trio e se despedia de mais uma seresta tropical que a todos encantava.

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Ezequias Assis, Jorge Herberth e Fernando Canto. Professor Munhoz ao fundo – Foto encontrada no blog da Sônia Canto.

Tanto Ezequias como Nazaré já se despediram deste mundo. Mas o dom da generosidade que neles havia fica na memória e na eterna gratidão pelo que ensinaram e pelo que foram.

Certa vez, num tempo de vacas magras do jornal, Ezequias me chamou e disse que não podia me pagar naquele mês, mas que iria dar um jeito. Falou que estava querendo “ajeitar” seu carro e que decidira deixar para o outro mês. Foi lá dentro e voltou com quatro pneus novos e 120 dólares e me disse: – Toma. Troca os pneus carecas do teu carro e fica com esse dinheiro pra quebrar o galho. No mês que vem a gente se acerta.

Depois ele me abraçou e pediu ao Ricardo para preparar uns uísques. Ficamos bebendo em silêncio.

*Fotos: 2-Governador Artur de Azevedo Henning (o que amassou o jornal) – encontrada no blog da Alcilene. 3 – Jornalista e cantor Humberto Moreira (blog Porta Retrato).

Guitar Hero – Texto sensacional de Régis Sanches

Régis, o “Beck” ou “Anjo Galahell”, um dos melhores guitarristas que vi tocar – Fotos: Elton Tavares

Por Por Régis Sanches

Hoje me preparei para escrever sobre a vida errante dos guitarristas. Pensei nos menestréis, com seus alaúdes, levando alguma alegria para o festim dos lúgubres burgos ao redor dos castelos medievais. E não poderia deixar de reverenciar a memória de Django Reinhardt, o cigano belga que criou o naipe de duas guitarras, tendo seu irmão Joseph empunhando a base e ele próprio no solo. Reinhardt vestia-se a caráter. Em plena segunda guerra mundial, enquanto os foguetes alemães V-1 e V-2 explodiam nos céus de Paris, sua banda animava os sobreviventes do conflito no Clube de France.

Certa noite, a cidade-luz às escuras, Django retornou para casa, exaurido, após mais um show. Ele deitou-se em sua cama, os fumos do sono o absorveram por completo. Sua mulher havia esquecido uma vela acesa, a tênue chama tremulou e alcançou os lençóis. O guitarrista cigano sobreviveu, mas teve sua mão direita lesionada pelo fogo. Nas raras imagens desse precursor das modernas bandas de rock, podemos vê-lo com as cicatrizes do incêndio. Ele nunca desistiu de retirar das seis cordas o lamento necessário para cicatrizar as feridas da vida.

No início desta manhã, eu estava eletrizado pelo som metálico da minha guitarra. Lembrei de uma frase de Eric Clapton, chamado de Deus em pichações nas paredes do metrô de Londres, no final da década de 1960. “Ninguém consegue tocar blues honestamente de barriga cheia”. Mister Clapton é a alma dos guitarristas, uma espécie de Fênix que sobreviveu a todas as tragédias. Como mestre de George Harrison, roubou a mulher do melhor amigo. Transtornado, mergulhou e emergiu do mundo negro das drogas. Certa ocasião, seu filho caiu da janela do apartamento. Seu coração ficou dilacerado. Mas a resposta veio na forma da sublime “Tears in Heaven”.

O melhor de Eric Clapton pode ser sorvido, ouvindo-o executar a belíssima “White room”, de Robert Johnson. A poesia que descreve a solidão – “um lugar onde o sol nunca brilha/onde as sombras fogem de si mesmas” – só encontra dueto à altura no lirismo poético dos riffs arrancados pela slowhand do velho bluesman.

Poderia citar uma legião de guitarristas: Chuck Berry, B. B. King, Jimi Hendrix, Jimmy Page, Jeff Beck… Seria em vão. Os verdadeiros guitarristas, nós podemos contá-los nos dedos de apenas uma das mãos. Os homens de verdade sabem que há duas coisas no mundo que não se vende, nem se empresta: a mulher e o carro. Incluo no rol a minha guitarra. Pois aqueles que tiveram a sorte de nascer com a alma de guitarrista hão de concordar. Na essência de todo guitarrista, além da sensibilidade, da disciplina e de uma dose exagerada de humildade, existe uma tragédia iminente rondando o destino desses modernos menestréis. Vida longa a Eric Clapton! 

Meu comentário: Régis Sanches é o jornalista com um dos melhores textos que conheci na vida e um dos maiores guitarristas que vi tocar (Elton). 

COMO É BOM SER MULHER! – Por Mariana Distéfano Ribeiro

Por Mariana Distéfano Ribeiro

É sim, ser mulher é muito legal. Hoje, que é o dia internacional da mulher, vamos tirar um pouco o foco de todas as dificuldades que a gente sofre e atura todos os dias. Na verdade são as pessoas femininas que passam por isso – homens homossexuais, mulheres transexuais, mulheres e qualquer outro gênero ou qualquer coisa humana que seja feminina.

É só o ser humano que despreza outro ser da sua própria espécie à troco de nada. E de todas as outras pra falar a verdade… Mas vamos mudar o rumo dessa prosa porque a intenção hoje é parabenizar, homenagear, congratular, enaltecer não só a mulher, mas a figura feminina que é linda, cheirosa e gostosa!

Ser mulher é bom demais né?! Já parou pra pensar o tanto de coisa que o mundo produz só pras mulheres? Vamos começar com a maquiagem, porque não tem nada mais feminino que maquiagem. A quantidade de cores e texturas e cheiros disponíveis pra gente escolher, misturar e se pintar é quase infinita. E quando a gente se pinta a gente se transforma. A gente, que é feminina, pode mudar de cara todos os dias e quantas vezes quiser. Até quem não curte maquiagem, só de passar um batonzinho e uma máscara para cílios poderosa já dá um boost na autoestima e a gente dá até uma empinada no nariz, como quem diz: uau, tô gat@!

E quanto a roupas e sapatos?! Ah, mas nem comecemos a falar das roupas e sapatos?! Quem não ama um pisante novo? Até a menos consumista das mulheres ama um sapatinho novo, um chinelo que seja. Eu mesmo adoro chinelos! Coleciono, tenho vários, até porque minha cachorra come os que eu esqueço na varanda (rs). Sem falar na variedade de cores e formas e materiais de que são feitos. A variedade de roupas também segue o mesmo caminho. São tantas e de tantos estilos que a gente nem consegue identificar qual o nosso preferido!

A gente pode até escolher se quer engravidar ou não! Se quer casar ou não, se quer ser professora ou gari, engenheira ou advogada, dona de casa ou empresária. Se quer namorar homem ou mulher, ou os dois! Podemos escolher de quem a gente gosta e de quem a gente não gosta. E quando somos grossas com alguém, sempre podemos botar a culpa na TPM na hora de pedir de desculpas (porque toda vez que faz grosseria a gente tem que pedir desculpas, mamãe ensinou)!

É essa variedade de opções disponível pras mulheres que faz a vida da gente ficar divertida. Nem ligamos de menstruar por sete dias todos os meses, sentir as dores das cólicas e ficar alguns dias extremamente irritada ou sensível. E até isso varia! Tem mulher que fica menstruada por três dias, nem sente cólica e nem irritação. Tem mulher que passa dez dias irritada antes da menstruação, depois menstrua por mais dez dias e sente cólica por cinco dias desses dez! Mas até essa oscilação dos hormônios é divertida.

A gente pode fazer o que quiser, quando quiser, onde quiser, como quiser e com quem quiser! E ainda pode fazer de salto alto, com uma maquiagem bafo e aquele vestidinho que arrasa! É claro, os homens também podem. A diferença é que eles sempre puderam e a gente só pode agora porque mulheres visionárias e guerreiras lutaram e morreram pra gente conseguir todos os direitos e liberdades que a gente tem.

Então, o dia hoje é seu, é pra você, pessoa que é feminina de coração ou de corpo. É nosso. Parabéns pra nós, porque a gente merece!

*Além de feminista com orgulho, Mariana Distéfano Ribeiro é bacharel em Direito, servidora do Ministério Público do Amapá e adora tudo e todos que carreguem consigo o brilho de uma vibe positiva.

A Mulher Amapaense – Por Raul Tabajara

Por Raul Tabajara

O dom que leva diretamente a mulher a divindade é sem dúvida a maternidade, e na opinião de muitas pessoas, não existe DEUS e sim DEUSA, que pare, e não um DEUS macho que está no céu e a mulher na terra. Mas isso é papo para outra ocasião.

Hoje, verificamos que o movimento em defesa das mulheres no Amapá, com suas diversas frentes, é proporcionalmente um dos mais intensos do País. Estão na mídia o ano todo, exercem pressão por Políticas Públicas que visam à melhoria da qualidade de vida das mulheres, principalmente as mais necessitadas, que são as de baixa escolaridade e renda, e dentre essas, as que mais se destacam são mulheres negras. Isso ocorre devido alguns grupos de mulheres já terem alcançado certo grau de organização e de reconhecimento de seus direitos básicos de cidadã e principalmente de MULHER.

Em decorrência dessas atuações, observamos nas últimas pesquisas oficiais que os indicadores socioeconômicos têm melhorado com uma taxa acima da média nacional para as mulheres amapaenses e isso é devido a Políticas Públicas implementadas nos últimos anos pelos Governos: Federal, Estadual e Municipal.

Nesta semana li em uma coluna de um diário, a afirmação de que as mulheres amapaenses são maiores que as de Atenas. Essa afirmativa é relativa como tudo é nessa vida, porém, LINDAS, como as mulheres amapaenses. Mas de uma coisa tenho certeza, a mãe amapaense é a maior do BRASIL.

Em 1970, a taxa de fecundidade da mãe amapaense girava em torno de 8 filhos por mulher. Essa era a maior taxa de fecundidade do país na época, e correspondia a taxas de países bem menos desenvolvidas que o nosso. Cerca de 30 anos depois, em 2000, esse indicador teve uma queda de 50 %, e as mulheres amapaenses já tinham quatro filhos em média.

Vale salientar que essa redução não ocorreu naturalmente, pois uma queda dessa proporção em um período de tempo relativamente curto, não ocorre em um indicador tão importante como número médio de filhos por mulher. Então o que ocorreu com as mulheres do Amapá?

Claramente a resposta que vem é a EDUCAÇÃO. A partir da metade dos anos 70, quando a televisão começou a atuar em Macapá, as mulheres começaram a ter acesso às informações da maneira de lidar com seu corpo e exigir seus direitos de mulher. Ainda no começo dos anos oitenta, começou a popularização aqui no Amapá, o que já vinha ocorrendo nos centros mais desenvolvidos, os métodos contraceptivos, principalmente a pílula anticoncepcional, que já havia sido moda nos anos 60 nos grandes centros do país.

Lembramos também que na primeira década dos anos oitenta, programas de televisão como TV mulher e Malu Mulher, tiveram sua contribuição nesse despertar da mulher amapaense, porem o aumento da escolaridade e o acesso das mulheres a universidade e ao mercado de trabalho, foram fundamentais nessa redução da fecundidade.

A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD e o censo de 2010 revelam que a mulher amapaense continua com uma das maiores taxas de fecundidade do país, próximo de 3,0 filhos por mulher, enquanto a do Brasil ficou abaixo de 2,0, praticamente uma taxa de reposição. Essas pesquisas revelam ainda que 70 % das mulheres amapaenses entre 15 a 49 anos já tiveram filhos, hoje correspondendo a 158 mil mulheres, e 57 % das mulheres que já tiveram filhos nascidos vivos, possuem 3 ou mais filhos (um pouco mais de 60 mil mulheres).

Além da redução da fecundidade, outro indicador que mostra o avanço das mulheres amapaenses nas últimas décadas é a responsabilidade pelos domicílios. Possuímos algo em torno de 160 mil domicílios, sendo que em 30 % deles as mulheres foram identificadas como responsáveis, e essa taxa é a terceira do país ficando atrás do Rio de Janeiro e o Distrito Federal. Dentro dessa linha, observamos que dos domicílios cujo responsável é uma mulher, um terço, por volta de 16 mil domicílios, as mulheres se declararam responsáveis mesmo possuindo cônjuge, sendo essa taxa menor apenas ao Distrito federal.

O avanço é também observado nos novos arranjos conjugais que são formados. No censo de 2010 verificou-se que 188 casais se declaram serem do mesmo sexo, e o que chama a atenção é que desses, 148 casais (78 %) são formados por mulheres e 40 (22 %) são casais masculinos.

Essas e outras informações fazem parte de um sistema de indicadores sobre os diversos aspectos associados ao desenvolvimento humano e social das mulheres no âmbito da família, do trabalho, da educação etc., elaborados a partir dos micro dados da amostra dos Censos Demográficos pelo IBGE.

O Sistema Nacional de Informações de Gênero (SNIG) é uma iniciativa da Secretaria Especial de Política para as Mulheres, órgão ligado diretamente à Presidência da República. O Sistema foi desenvolvido para servir como instrumento de conhecimento da realidade das mulheres no Brasil, oferecendo subsídios indispensáveis para o planejamento e implementação de políticas públicas nesta área.

* Contribuição de Fernando Canto.

 

Lançamento do livro Janela que Mostrou o Mundo

A fisioterapeuta Anne Pariz lançará, às 18h do próximo dia 28 de fevereiro, na Livraria Acadêmica, (no segundo piso do Macapá Shopping) o livro “Janela que Mostrou o Mundo”. Na obra, a escritora relata sua experiência com doença mental, tratamento e aprendizado.

A escritora explica que descobrir um transtorno não é difícil, a dificuldade está no preconceito, falta de respeito do não reconhecimento do que o doente é capaz e por isso resolveu colocar sua experiência à disposição da sociedade para ajudar outras pessoas na mesma situação.

“O livro é fruto de um momento que vi o mundo do lado de dentro da janela do meu quarto, como quem observa um passarinho cantando e admira-lo ir embora. Os textos surgem, ora cruéis, ora sensíveis, de acordo com que minha percepção. Escrevi sobre transformação e tratamento de uma doença mental crônica; Entre medicações e médicos saíram estas linhas tortas. Não é fácil, mas aprendi a viver no meio dos meus desenhos, dos meus poemas e dos meus amigos e familiares onde tudo se torna mais leve”, explicou Anne Pariz.

Serviço:

Lançamento do livro Janela que Mostrou o Mundo
Data: 28.02.2019
Horário: 18h
Local: Livraria Acadêmica (Macapá Shopping – piso L2)
Mais informações pelo telefone: 096 981432713

Elton Tavares, com informações de Anne Pariz.

A Banca do Dorimar – Texto legal da Pat Andrade

Por Patrícia Andrade

A história da Banca do Dorimar começa no ano de 1974, quando o paraense Dorimar Marques Monteiro, do município de Vigia no Pará, resolveu deixar seu emprego na Indústria e Comércio de Minérios (Icomi), com o qual estava insatisfeito, para assumir uma nova responsabilidade: tomar conta de uma banca de revistas. Casado com Ana Maria Pontes Monteiro, Dorimar conta que a esposa sempre foi seu braço direito e ajuda dela foi fundamental para manter a banca funcionando até hoje. Aliás, ainda segundo Dorimar, ele sempre pôde contar com o apoio da família.

No início, a Banca era móvel e feita de metal. A freguesia era grande, e a Banca foi ficando pequena para a demanda existente. Após 15 anos de funcionamento, um pequeno prédio em alvenaria foi erguido, mudando um pouco o cenário da esquina da Avenida Presidente Vargas e Rua Cândido Mendes, na Praça Veiga Cabral. No ano de 2000, quando Anníbal Barcellos era prefeito da cidade de Macapá, a Banca do Dorimar foi instituída como Área de Preservação Cultural, através da Lei nº 1062/2000-PMM.

Além disso, a banca já rendeu a Dorimar alguns títulos e comendas, como o Título Honorífico de Cidadão Macapaense, concedido pela Câmara Municipal de Macapá; Título de Honra ao Mérito, da Assembléia Legislativa do Amapá e o Premio de Maior Vendedor de Jornais, concedido pelo Jornal do Dia.

Sr. Dorimar. Foto encontrada no site do Seles Nafes

A Banca do torcedor do São José e tricolor Dorimar transformou-se em ponto de encontro de artistas e intelectuais da cidade de Macapá. Por ali, passaram e passam todos os dias centenas de pessoas, em busca de informação, entretenimento, ou simplesmente um bom bate-papo.

Aos domingos pela manhã, o ritual ou a tradição é sair da missa, passar na Banca do Dorimar, comprar o jornal e encontrar os amigos.

Nas redes sociais do Amapá: “Não, mais firme logo”: com bordão, jovem faz sucesso em comerciais na web

Bruno Cézar de Souza Brito conta que empatia por mensagem positiva foi maior que preconceito

Por Rodrigo Indinho

Após sofrer preconceito por sua forma de agir, falar e se vestir, o jovem amapaense Bruno Cézar de Souza Brito, ou “Bruninho RD”, de 20 anos, está fazendo sucesso nas redes sociais invadindo o competitivo mercado da publicidade, com um bordão muito popular no Amapá: “Não, mais firme logo!!!”.

De origem humilde, Bruninho mora junto com os pais, a avó e outros familiares no Bairro Açaí, na zona norte de Macapá. O estudante do ensino médio conta que a ideia do primeiro vídeo veio através da intenção de fazer um convite de forma diferente para um evento em uma casa de shows. Ele diz que tomou um susto com a proporção que o registro obteve. Veja vídeo:

“Gravei esse vídeo na sexta-feira, quando acordei, no sábado, meu celular estava cheio de notificações e vi que tinha viralizado e estava sendo o maior sucesso. As pessoas marcavam amigos, parentes, namorada e todo mundo, então decidi continuar fazendo vídeos. ‘Não mais firme logo’ quer dizer legal, bacana, massa, da hora, com certeza e várias outras coisas”, comentou Bruninho.

Os vídeos de Bruninho com o famoso bordão já foram vistos por milhares de pessoas e o rapaz se tornou sucesso na web. O jovem já gravou diversos comerciais e virou garoto-propaganda de várias empresas. Com o sucesso, vieram também as críticas, e o pior, o preconceito.

Bruno Cézar de Souza Brito, o “Bruninho RD”: sucesso com bordão que tem mensagem positiva Fotos: Rodrigo Indinho

“Gravei um comercial para uma famosa casa noturna de Macapá, e um rapaz comentou que não iria mas frequentar o local porque como eu tinha gravado a chamada só participaria da festa gente de baixo nível, assim como eu. Aquilo me doeu muito e pensei em desistir”, lembra.

“Mas as pessoas me abraçaram, foram solidárias na web, os ingressos esgotaram e a festa bombou. Minha agenda aumentou e decidi nem ligar para esses comentários maldosos e seguir minha vida alegrando as pessoas com meus vídeos”, acrescentou.

Mensagem virou arte de camisetas, bonés e brindes

Atualmente, Bruno é agenciado por uma empresa de marketing e gravou mais de 12 comerciais em apenas cinco dias. Ele conta o que espera para seu futuro.

“A vida não é fácil, então pretendo me formar em educação física e continuar trabalhando para poder ajudar minha avó e minha família. Queria também deixa um recado para as pessoas, para que elas não julguem os outros sem saber da história ou conhecer melhor. Todos nós temos sentimentos.

Ei, o Rock não para, só muda de lugar. Não, mais firme logo”, finalizou Bruninho.

O bordão chegou a países da Europa e América do Sul, onde pessoas gravaram vídeos e divulgaram. O sucesso fez com que camisas, bonés, copos e outros produtos fossem comercializados.

Jovem diz que pessoas não podem julgar pela aparência

Para encontrar o artista, as pessoas podem entrar em contato pelo (96) 98119-4089 ou acessar a página dele no Facebook. Lá, ele se apresenta como “Bruninho rock doido mais firme logo”.

Fonte: SelesNafes.Com

MAS PERA LÁ, É PAQUERA OU É ASSÉDIO? – Por Mariana Distéfano Ribeiro

Por Mariana Distéfano Ribeiro

Eu escrevo muito sobre feminismo. E escrevo porque falo e estou sempre refletindo sobre as situações da vida que a gente passa e que outras mulheres passam. É assim que acontece, depois que a gente desperta a mente, os ouvidos, os olhos e os sentidos, é que a gente descobre que devia ter reagido a muitas situações que passamos e vimos passar e que nem tudo é brincadeirinha e nem sempre é sem querer.

Mas, depois de escrever e revisar alguns textos sobre feminismo, depois de repensar algumas atitudes e reações minhas, fiquei imaginando se eu poderia ter exagerado em alguma coisa ou de alguma forma. É que detesto incoerência, em qualquer lugar ou qualquer coisa. Ainda mais quando percebo desconexão lógica e argumentativa em alguma coisa que falei ou que escrevi.

Porque, quem nunca riu de uma piadinha de putaria? Quem nunca ouviu um “ê lá em casa” e até curtiu? Aí me perguntei: mas um “ê lá em casa” é assédio ou é uma cantada? Eu posso ser feminista e gostar de ouvir um funk de mexer a raba? Uma cantada chula, é só xaveco ou pode se transformar num assédio?

Aí, mais uma vez, depois de refletir um pouco, a ficha caiu e minhas dúvidas foram sanadas. Então vamos lá, vamos esclarecer esses pontos.

Direto e reto: a diferença entre assédio e cantada está no CONSENTIMENTO. Se você está numa festa de carnaval, por exemplo, e um cara chega em você pedindo um beijo, com uma cantada bem escrota do tipo “ei gostosa, vamo dar uns pega?” e você diz “ah, num tô fazendo nada, bora lá” – isso não é assédio! É uma cantada, é só uma paquera, porque teve o seu consentimento.

Agora, se o cara chega com a mesma cantada e você diz “não amigo, muito obrigada”, e o cara insiste com um “ah coé? Eu vi você beijando vários caras já, vamo dar uns amasso…” e você insiste que não quer, aí o cara insiste que quer e te xinga ou te puxa à força, aí sim é assédio. Aqui não houve o seu consentimento, você demonstrou a sua recusa, disse claramente que não. Entendeu?

Tudo depende do bom senso de cada um e do limite de tolerância que cada um tem. Mas fato é: se alguém te abordar de qualquer forma, desde que não haja violência física, e você demonstrar não gostar da abordagem, deixar claro que não quer, e a pessoa te deixar em paz, não há assédio, nem abuso. Talvez uma ofensa à sua honra, à sua moral, ou aos seus princípios, mas aí já é outra história.

Fato é que, se a pessoa respeitou o seu “não” e parou de fazer o que quer que seja que estivesse fazendo, não estará configurado o assédio.

Mas isso não quer dizer que você precise aturar aquele coleguinha que toda vez que te encontra te abraça como se estivesse se esfregando em você, nem que você precise escutar calada aquela piadinha sexista que te ofende. Nesse caso, deixe claro que você não concorda com aquela abordagem ou com aquele comentário. E não tem que ter medo de falar. Tenha certeza, sempre vai ter alguém falando que você está exagerando. Deixa falar e seja firme.

A figura feminina foi legalmente e culturalmente tão oprimida e por tanto tempo que é meio difícil mesmo quebrar esse paradigma agora. Mas as paqueras e as cantadas saudáveis são muito bem vindas sim, desde que sejam consentidas.

Vovó já dizia “o que um num quer, dois não fazem”. E se o um insistir, é assédio sim.

*Além de feminista com orgulho, Mariana Distéfano Ribeiro é bacharel em Direito, servidora do Ministério Público do Amapá e adora tudo e todos que carreguem consigo o brilho de uma vibe positiva.

A barreira ao feminismo contemporâneo – Por Mariana Distéfano Ribeiro

Por Mariana Distéfano Ribeiro

Sabe que esses dias eu me dei conta de que a luta pela igualdade entre homens e mulheres hoje em dia é muito mais difícil que a luta travada antigamente, quando mulher não podia votar, não podia usar calça, não tinha direito a dispor de sua herança, não podia estudar (até hoje há lugares em que é proibido), era um ser que servia apenas para procriação (a criminalização do aborto pela Câmara dos Deputados não é mera coincidência).

Estranha essa afirmação, né? A luta feminista dos dias de hoje ser mais difícil que a luta de antigamente parece até falácia, mas vem comigo nesse raciocínio que eu te mostro o porquê.

Quando se tinha uma linha divisória bem definida entre a existência de um direito ao homem e a impossibilidade do exercício desse direito por uma mulher, ficava muito clara a injustiça. Vejamos o direito ao voto, por exemplo, um dos maiores marcos civis da vitória das mulheres por direitos iguais. A barreira era formal (porque a lei proibia) e material (porque o próprio direito da mulher não existia).

Aí eu pergunto: qual explicação jurídica, ontológica, antropológica ou até biológica que justifique o impedimento de uma mulher ao voto? Nenhuma né?! Ou o fato de ter uma vagina entre as pernas seria uma justificativa?

Outro exemplo é o direito de frequentar escolas e universidades. Até hoje existem regiões do mundo em que meninas não podem frequentar escolas e nem as mulheres podem frequentar universidades. A história da paquistanesa, ganhadora do prêmio Nobel da paz, Malala Yousafzai, é um exemplo de ativismo pelos direitos humanos das mulheres e do acesso à educação no Paquistão.

Mais uma vez eu pergunto: qual explicação jurídica, ontológica, antropológica ou até biológica que justifique o impedimento do acesso de uma mulher à educação, às escolas e universidades? Nenhuma né?! Ou o fato de ter uma vagina entre as pernas seria uma justificativa?

Mas hoje em dia, pelo menos na esfera civil e jurídica, tanto formal e materialmente (perante a lei e o direito), existe paridade de direitos entre homens e mulheres. Isso nas regiões do mundo em que impera o regime democrático de governo.

Então, a barreira que tem que ser vencida aqui e agora é a barreira moral, filosófica, cultural, dos costumes. E isso é muito mais difícil de derrubar. É o preconceito velado, oculto, latente que a gente, que é mulher, vivencia todos os dias.

Percebeu que a barreira que limita o direito da mulher hoje em dia é cultural? Quando um homem se relaciona com várias mulheres solteiras ou casadas, sendo ele mesmo solteiro ou casado, o que as pessoas vão pensar dele? Que é um bon vivant, um dom juan, o pegador, no máximo vão falar que não vale nada. Mas ainda assim, ninguém vai desprezar um homem por pegar geral e não valer nada. Vão dar um tapinha nas costas, isso sim, e dizer: esse é meu garoto!

Agora, considere uma mulher que se relaciona com vários homens solteiros ou casados, sendo ela mesma solteira ou casada, o que as pessoas vão pensar dela? Que é uma vadia, que é vagabunda, que não vale nada, que não serve para ser mãe e se for mãe é um mau exemplo para os filhos. E por aí vai, a lista de adjetivos pejorativos é longa. E com certeza vai ser desprezada por pegar geral e não valer nada. Vão dar um tapa na cara, isso sim, e dizer: sua puta!

Esse é só um exemplo de como a moral e bons costumes são relativizados dependendo de quem se trata, e isso tem consequências direta ou indiretamente relacionadas à violência contra a mulher e a figura homossexual feminina.

Entre 1980 e 2013, 106.093 pessoas morreram apenas pela condição de serem mulheres¹. É uma média de quase 1 mulher por dia a cada ano! Sem falar nos casos que não entram nas estatísticas por não serem considerados violência contra a mulher por sua condição. Quanto aos homens? Esses não sofrem violência apenas pela condição de serem homens.

Percebeu agora? É matemático, é estatístico. E ainda tem gente que acha que feminismo é mimimi, que é vitimismo.

As igualdades formal e material existem. A igualdade de fato ainda é utopia.

*Além de feminista com orgulho, Mariana Distéfano Ribeiro é bacharel em Direito, servidora do Ministério Público do Amapá e adora tudo e todos que carreguem consigo o brilho de uma vibe positiva.

Fonte: Agência Brasil

Sobre sonhos, pesadelos e outras viagens – Por Cleomar Almeida

Meu amigo Cleomar Almeida é um competente engenheiro. O cara também é a personificação da pavulagem e gentebonisse, presepeiro e boçal como poucos que conheço. Um figura divertido, inteligente, gaiato, espirituoso e de bem com a vida. Dono de célebres frases como “ajeitando, todo mundo se dá bem” e do “ei!” mais conhecido dos botecos da cidade. Quem conhece, sabe. Hoje ele escreveu essa:

Sobre sonhos, pesadelos e outras viagens

Queria que alguns de meus sonhos pudessem ser gravados, só pra eu assistir novamente, tal a veracidade das coisas que neles acontecem. Alguns seriam dignos de um Oscar, outros, mero refugo da pornochanchada. Dia desses, digo, noite dessas, creio eu, de tanto ficar assistindo programa de bicho, me peguei dormindo em meio a uma mata, riacho passando ao lado, canto de pássaros e uma penumbra bacana.

Eis que ao longe vejo aquele enorme felino, rastejando em minha direção, nessa hora de desespero meu único pensamento é correr. Posiciono-me para iniciar a disparada da minha vida, como Usain Bolt na linha de partida para os cem metros e só então percebo que não estou só naquela situação periclitante, minha mulher dorme ao lado, alheia ao risco de virarmos bóia do animal faminto. Onça chegando, eu pronto pra correr, mulher dormindo ao lado, macaco gritando, desespero total na mata e é quando tomo a decisão, vou correr, não sem antes avisar minha parceira, isso seria uma covardia sem tamanho.

Dou-lhe um belo de um tapa na bunda e grito: Amor, corre que tem onça!! Minha disparada é curta e breve, minha cama é colada à parede, quase arrebento os cornos por conta da velocidade impressionante que atingi naquele meio metro que tinha pra avançar. Ainda atordoado olho para o lado, minha mulher sentada na cama me fita com ar de reprovação e diz: Eu “mínino”, tu vais quebrar esta parede!!!. Mal sabe ela a fogueira que acabamos de pular.

Onde andará Mariazinha, que estaria festejando entre nós 85 anos? Saudades minha estrela!

Dia 2 de fevereiro de 1934 foi o dia do calendário escolhido para dar início à saga da mamãe neste mundo. Não que tenha nascido nesta data, mas foi a ditada em seu registro de nascimento, e nem ela sabe o porque, assim como tantos outros porquês de seus primeiros anos neste mundo que ficaram sem respostas. E sua passagem por aqui foi sempre desse modo, com uma cortina de mistérios nunca desvendados, alguns ela se recusava a falar, e outros, nunca ela nem nós descobrimos. Nossa Mariazinha jurou que antes de partir iria nos dizer o que sabia de sua infância, mas a dificuldade em se comunicar quando percebeu que era chegada sua hora, e nossa falta de habilidade com a leitura de pensamentos e outros métodos e linguagens, além da situação triste e incômoda em sua última estadia, no hospital, não inspirava curiosidade, porque nossa esperança que dali levantasse, era maior que qualquer outro sentimento.

Eu sempre tive curiosidade em saber de onde tinha vindo aquela mulher baixinha, forte, decidida e trabalhadora, que não cansava de repetir todo sacrifício que passou para estudar e trabalhar ao mesmo tempo, morando na casa dos patrões, e tendo como única referência de família a madrinha e o padrinho, Dolores e Eugênio, que colocaram no seu registro de nascimento seus nomes, e que aprendemos a chamá-los de avô e avó. Ninguém dizia nada, uma única pista, e os caminhos para encontrar o início dessa história ficavam turvos com a falta de informações, porque o mais perto que tínhamos da verdade era o sobrenome Alcântara, e que ela vinha das ilhas do Pará. O pouco que ela sabia, se foi com sua memória, e continuamos aqui, sem saber dos primos e tios que não conhecemos, e nem como eram nossos verdadeiros avós. O sobrenome que ganhou dos padrinhos foi Cardoso Coelho, herdamos o Cardoso, e ela adotou o Maciel do papai. E os filhos da Maria e do Raymundo formaram então a família Cardoso Maciel.

Assim como os médicos, papai sempre questionou sua idade, e dizia que tinha mais que o registrado oficialmente. Seus documentos indicavam ser mamãe um ano mais velha que ele, também nascido em fevereiro. Nunca soubemos de uma paixão antes do papai, porque sua descrição e falta de amigos da juventude para nos revelar algum segredo, deixou esse campo vazio, e para mim, seu único amor foi papai, com quem se casou na delegacia, na frente do juiz, inúmeras vezes nas fogueiras de São João e na igreja, com uma festa de três dias, narrada com detalhes pelos meus tios. Seus amigos sempre foram a família do papai e da escola Barão do Rio Branco, onde lecionou por longos anos, e nos alertava sobre cuidados com as amizades, talvez por alguma decepção, ou porque seu sangue de índia misturada com a ascendência ribeirinha a tornassem uma mulher desconfiada por natureza.

Para mim, a história de nossa família começou quando mamãe chegou no Bailique, Igarapé Grande do Curuá, para assumir o cargo de professora, e conheceu papai, marítimo, primeiro filho da vó Rosa e do pai que o adotou com um amor imenso, nosso avô Tomás Pena Amanajás, O Velho. Foi a partir daí que ela soube o que era uma família de verdade. Os irmãos do papai, foram alunos da mamãe, e quando se tornaram cunhados, continuaram a chamando de professora, e foi escolhida pra madrinha de familiares e vizinhos, sendo então uma pessoa querida e respeitada, temida e amada. Foi mamãe quem insistiu em vir para Macapá quando minha irmã mais velha terminou a 4ª série. Papai relutou em sair do Bailique, onde caçava e pescava, ajudava vovô no comércio e de onde saia para atravessar rios e mares em barco à vela até Belém para vender mercadoria. Ele então veio, e aqui, por incentivo da esposa, estudou, foi secretário escolar, professor e se aposentou como diretor da escola Augusto dos Anjos, cargo em que ficou por 16 anos.

Depois dessa travessia de mudança pelo rio Amazonas, começa nossa história em Macapá, com mamãe sempre à frente da família, decidindo, opinando, aconselhando, ralhando, com o jeito Mariazinha de ser, que virou lenda entre nós. Sempre nos incentivando a estudar e crescer na vida. Mamãe era feminista sem saber ao certo o que significava esse termo. Dizia sempre pras sete filhas não dependerem de marido, tinha que ter estudo e emprego, e mesmo sem a obrigação de ir às urnas, votava sempre em mulheres, quando elas passaram a ter oportunidade de se tornarem candidatas. Sua elegância estava na naturalidade e simplicidade. Sua história de vida ainda hoje é bússola e os mistérios de sua estadia aqui, nossa força para sermos sempre unidos e nunca passarmos pela saudade de algo que não viveu.

Ainda somos os mesmos e vivemos como nossos pais

Me vejo hoje repetindo os gestos e manias que critiquei e viraram piadas iniciadas por papai, e se tornaram folclore entre nós, como me preocupar com panelas e louças, se tem toalha e lençol para todos que se abrigam em nossa casa, levantar pra confirmar se a porta está de fato trancada, e vou mais na igreja que em qualquer outro tempo, porque o que me ensinou sobre fé e amor, eu fortaleço em frente ao altar, como ela dizia que era o certo. Todos os dias rezo em seu altar na sala, faço o café, e quero mesa arrumada para as refeições. Sinto uma enorme falta dela, que fez de mim uma mulher mais forte e pronta enfrentar muitas guerras, inclusive uma doença em um idoso. Mamãe despertou em mim a segurança que deixei escondida em um canto dentro de mim na pior época da minha vida, porque eu precisava estar firme para cuidar dela, que sempre cuidou de todos nós.

Sou grata eternamente à ela e ao papai, e por eles, quando sinto necessidade, derramo lágrimas de saudades, oro e desejo felicidades para este amado casal, que finalmente se encontrou novamente após 5 anos de separação física. Talvez neste dia 2 , dia de Iemanjá, que como mamãe, é das águas, esteja completando 85 anos, ou mais. Minha única certeza é meu desejo de que mamãe também tenha encontrado sua mãe, pai e irmãos, e que esteja olhando pior nós todos, completando o ciclo de amor que nos envolveu e chegou até filhos, netos e bisnetos, inclusive Maria Elis, que foi sua bonequinha em seus últimos anos.

Nunca esquecerei as primeiras músicas religiosas, para Mãezinha do Céu, Anjo da Guarda, as do Luiz Gonzaga e da Ângela Maria, nem das suas preferidas do Zeca Pagodinho. Não esqueço também das músicas que assobiava na cozinha, dos chorinhos e boleros dançados com papai, dela regando as plantas, fazendo as asinhas de frango de forno e o bife bem passado. Lembro bem do tempo em que decidiu comer somente em um prato em formato de peixe, que já procurei e nunca encontrei; e de seus últimos anos andando devagar pela casa, mas sempre independente, dispensando ajuda; nem de sua saída do banho para o café, da resistência para tomar remédios, e da missa no final da tarde. Saudade grande também do “bença mãe, bença, pai”. Meu Deus, se eu soubesse que a saudade doía tanto, talvez tivesse feito bem mais. Não me arrependo de nada, nem das festas que perdi, nem dos amores que passaram sem eu ter dado atenção, porque hoje meu peito é só gratidão.

Esteja bem mamãe e papai, meus velhos mestres, amigos e protetores, obrigada por tudo!

Feliz aniversário minha estrelinha!

Mariléia Maciel 

Roubei mais um ladrão. Às lagrimas, o Sambódromo! – Por @rostanmartins

Por Rostan Martins

Percorrendo a Avenida Ivaldo Alves Veras, nos deparamos com o Sambódromo, com a Avenida do Samba e com a Cidade do Samba. Complexo do samba; palco de caqueados; cenário de histórias vividas, de emoções, de alegrias e de amores.

Mas, atualmente, tudo num completo abatimento. Topamos com as lágrimas do Sambódromo. Sem as agitações dos dias que antecedem os desfiles; sem os desfiles das escolas de samba. Este cenário declina para a melancolia. Vamos chegar, há exatos, quatro anos sem as alegrias e as emoções do Sambódromo. A mesma situação que dar vontade de chorar.

Nosso carnaval é grandioso! Alcançamos um nível de mega espetáculos; exportávamos carnavalescos; fomos enredo na Sapucaí, enredo campeão.

Temos a Liesap – Liga Independente das Escolas de Samba, onde abriga um Conselho de Representantes das agremiações, entidade que tem a competência de organizar os desfiles. 10 escolas de samba; 11 blocos carnavalescos; 5 barracões destinados às confecções das alegorias e das fantasias (Cidade do Samba). Ainda temos o Sambódromo, com camarotes, arquibancadas e infraestrutura necessária par os desfiles.

Somos uma comunidade apaixonada pelo samba, pelo carnaval. Além disso, temos o suporte governamental: iluminação, segurança pública, sistema de saúde, limpeza, etc.

Então por que a não realização dos desfiles, com toda essa trajetória e história?

O som dos surdos não mais ecoara lá pelos campos do Complexo do Marco Zero; os sambas de enredo não mais cantaram as nossas culturas, nem as nossas memórias. Os sambistas não vão bazofiar o breque na pista. Não veremos as emoções das mulatas, nem das rainhas. E nem as disputas, nem as notas 10. O rei Momo está desolado. Estamos sem majestade. A sua fantasia está sem o brilho da felicidade.

A culpabilidade pelas lágrimas do Sambódromo recai a quem? Aos líderes das agremiações? Ao presidente da Liesap? Aos governos (municipal e estadual)? Aos brincantes? Aos sambistas? Ao rei Momo? De quem é essa responsabilidade?

Ao final de tudo, o motivo da passarela do samba, local de demonstração de emoção e alegria, estar desamparada, é culpa de todos nós que adoramos carnaval.

Mas, não vamos desistir, mesmo com o rosto em lágrimas, com o Sambódromo às lagrimas, vamos no “Pererê”, no “Aqui nós bebe, aqui nós cai”, ou, nos arrastões de algumas escolas de samba. Ou seja, carnaval vai ter. Preparamos nossa fantasia e vamos na “Banda”. E, no ano que vem, nós nos encontraremos com o Sambódromo, enxugaremos as suas lágrimas, e sambaremos.

Esta situação daria um belo Ladrão de Marabaixo, concordam?

(Ladrão, no Marabaixo, são as cenas cotidianas de personalidades, autoridades, ou simples cidadãos, ou também situações, que memorizadas (roubadas) são socializadas, em forma de poemas, no Ciclo do Marabaixo). 

SER SOLIDÁRIO – Crônica de Fernando Canto

Por Fernando Canto

Ao sair de casa na manhã de uma quinta-feira, a jornalista Andréia Freitas se viu numa situação inusitada. Na esquina de sua casa um casal de velhos pedia socorro aos passantes porque a senhora passava mal. Ela se prontificou em ajudar, colocou os dois no carro e foi direto para o Hospital de Emergência. No caminho a mulher se debatia e o velho rezava. Desesperada de tentar chegar a tempo e salvar a vida da mulher, Andréia tentou furar sinais, solicitando espaço aos motoristas, mostrando a urgência de ultrapassá-los, tendo os faróis e o pisca – alerta ligados. Contudo, os motoristas não a deixavam passar, o que notadamente contribuía para o atraso de sua missão àquela hora da manhã.

A duras penas chegou ao hospital gritando para que socorressem a senhora, até que alguém veio com uma cadeira de rodas ao invés de uma maca. Como tinha que dar seu expediente no trabalho, voltou mais tarde ao hospital, onde lhe informaram que senhora já havia chegado morta, após fulminante infarto que ela não percebera no trajeto.

Mesmo tentando se controlar do estresse pelo qual passara, a jornalista chegou a passar mal com a notícia, pois esperava ter salvado a mulher. Então um misto de tristeza e impotência lhe abateu.

Esta história verdadeira nos faz pensar na solidariedade de poucos heróis anônimos urbanos, ao mesmo tempo em que olhamos Macapá hoje praticamente assemelhada aos grandes centros, onde a desconfiança e a falta de urbanidade se alastram como produtos do individualismo, da competição e do medo.

Embora pequena, nossa cidade começa a ter características urbanas, não apenas pela violência nas ruas, como gangues, trânsitos e assaltos, mas por essa ausência de olhar o “outro” como olhávamos até há pouco tempo. Éramos talvez uma família pronta para ajudar os mais necessitados e aqueles que vinham de longe em busca de um lugar melhor para viver. Pelo prestígio de cada chefe de família trabalhador se podia conseguir emprego aos que chegavam “com uma mão na frente e outra atrás”. Dávamos esmolas conhecendo a realidade do pedinte e ninguém acreditava em lendas importadas de outros centros urbanos, como as que diziam serem os mendigos pessoas ricas que investiam seu dinheiro – produto da caridade alheia – em compras de casas e carros. Todo mundo conhecia o seu Chico Mocó e a Cega do Morro do Sapo, lá do Laguinho, que nem sempre pediam dinheiro, mas mantimentos para suas famílias, já que eram notórios deficientes físicos e não podiam exercer plenamente atividades rentáveis. Mas isso não era importante. O importante era ficar bem com a sua consciência solidária, certamente avivada pelos preceitos religiosos que faziam as pessoas ficarem mais felizes e cumpridoras de seus deveres espirituais.

Talvez eu esteja sendo um pouco romântico ou mesmo saudosista ao enfocar este tema. Porém, não tenho a menor vergonha de dizer, sim, que fui ajudado por amigos nas horas mais difíceis, que fui solidarizado e defendido em situações de agressões espúrias e infundadas e que sou grato a muitos, anônimos ou não, que me levantaram quando vacilei na caminhada. Embora particularize uma história, vejo que a solidariedade não sumiu totalmente da nossa vida. Observo sucessivas campanhas realizadas por instituições sérias; admiro aquelas que poderão realizar o sonho de muitos (ainda que suscitadas possíveis irregularidades fiscais na Internet), e acompanho atentamente entidades locais que têm satisfação em ajudar aqueles que necessitam.

O medo, a violência e o individualismo geram consequências atrozes, posso reiterar aqui, pois, se de um lado o ser humano torna-se mais egoísta, em função do status quo que alcança na sociedade, de outro se percebe o crescimento da miséria humana, notadamente entre uma juventude que não consegue se desvencilhar das drogas que torna os indivíduos presos a uma anomia irreversível.

A humanidade não é humana – Por Pat Andrade

Foto: Revista Veja

Não entendo como é que as pessoas conseguem não se importar.

Lembro de quando eu era estudante e as pessoas não entendiam como e porque eu me importava com uma greve do outro lado do continente, uma manifestação na França, uma tragédia na China ou no Japão.

E eu não entendia essas pessoas.

Foto: Agência Brasil

Como podiam não se importar? Como?

E, de lá pra cá, nada mudou. As pessoas continuam não se importando.

E eu continuo sem entender.

E as catástrofes? O que temos a ver com suas vítimas? Nada?!!!

E as pessoas de Brumadinho? Não falo só dos que morreram. Mas de todos os que foram afetados diretamente pela tragédia (que poderia ter sido evitada, blá, blá, blá – mas não foi). Vidas inteiras destruídas. Não só casas e bens materiais.

Há três anos, vimos a mesma lama se derramar sobre nossas mesas. Passamos um paninho e esperamos outra notícia. Enquanto as vítimas da Vale (sim, da Vale do Rio Doce, responsável pelas barragens) esperam pelo resgate. Esperam pela indenização. Esperam pela vida de volta. Não terão.

Foto: BBC Brasil

Como é que o Brasil e o mundo podem continuar tomando café, almoçando, trabalhando, jantando, cagando enquanto Brumadinho se enche de lama e Mariana nunca mais sairá da Lama.

Nossos pratos, nossas camas, nossos quartos, nossos banheiros se enchem de lama. Ninguém sente? Ninguém vê? Ninguém se desespera, meu Deus? Que porra de humanidade é essa?

Patrícia Andrade