Discos que Formaram meu Caráter (Parte 33) – Engenheiros do Hawaii – “Longe Demais das Capitais” (1986) – Por Marcelo Guido

Por Marcelo Guido

Muito bem meninos e meninas!

Estamos de volta do mundo incrédulo, vagando por ondas muito loucas – mas extremamente sonoras – com a cabeça a mil neste Brasil tropical que – sei lá por que caralhos – está a ficar conservador demais da conta para trazer a vocês mais um discão.

Apresento a vocês diretamente do Rock Grande do Sul:

“Longe Demais das Capitais” – disco de estreia dos caras dos Engenheiros do Hawaii. Palmas pra ele.

Já corria o ano de 1986: a nossa democracia estava jovial, os ares de liberdade sopravam por essas bandas e nossa juventude ainda respirava os bons fluidos trazidos pelas grandes atrações do “Rock in Rio”. Nossa jovem e democrata nação estava banhada pela influência rock and roll… Bons tempos aqueles.

Uns caras da faculdade de arquitetura da UFRGS, que já faziam um som contundente e já apresentado na grande coletânea “O Rock Grande do Sul” de 1985 (corra atrás desse disco), foram chamados nos acréscimos pra essa empreitada, só entraram pela desistência de uma das bandas vencedoras do concurso que escolheu as bandas do disco (Replicantes, Garotos de Rua , TNT, De Falla). Consolidados como banda Gessinger Licks e Maltz, eles preparavam uma verdadeira porrada sonora. E o que esperar de uma banda com nome desses? É, amiguinhos… a rixa com os estudantes de engenharia que usavam bermudas de surfista batizou a banda. Muito inspirador por sinal.

O rock fervia no eixo Rio-São Paulo, e não seria diferente no sul. Um disco gravado praticamente por acidente – só foi viável depois do estouro de “Toda forma de poder” e “Segurança” presentes na coletânea sulista. Algo que poderia ficar só pra lá, acabou pegando o país inteiro de “cabo a rabo”. Também pudera; quem conhece esse míssil sonoro, sabe do que estou falando.

As influências marcantes do “The Police”, eram características dos bons ventos vindos da Inglaterra. O lirismo impressionante das letras compostas por Humberto são e sempre serão uma marca consolidadora desse disco; ele realmente chegou para ficar e fixar os caras no panteão das grandes bandas nacionais.

Crítica social, amarrada de forma inquestionavelmente envolvente pelos caras, não tinha como dar errado.

Conheci este disco ainda bem moleque (acho que deveria ter uns nove anos), não me lembro por qual influência. Só sei que o mesmo faz parte da minha vida e, com certeza, da vida de muitos que agora estão lendo essas frases e parágrafos.

Vamos ao que interessa e esmiuçar esse bombardeio de boas canções:

O disco começa com tudo, logo em “Toda Forma de Poder”: uma raiva incrédula sobre o controle e a passividade, a inércia de um povo que, sem posicionamento político, sem ideais vive em um comodismo. “Segurança”: ganhou versão em inglês, interpretada pelo grande Nei Lisboa, com as bênçãos do excepcional Manito, fala das inseguranças em um relacionamento, você realmente precisa de alguém que te dê segurança e não te troque por um escroto de carro importado. “Eu ligo pra você”: a passividade de um relacionamento vivido a três. “Nossas Vidas”: a mais influenciável The Police do disco, chega a ser parecida com os Paralamas do Sucesso. “Fé Nenhuma”: um ralho visceral aos rebeldes sem causa. “Beijos pra Torcida”: crítica ao extremo, a preocupação com o rumo que as coisas estão: guerra iminente (fique com a letra, não se deixe levar pelo som alegre). “Todo Mundo é uma Ilha”: uma bela canção de amor ao avesso. “Longe Demais das Capitais”: a cara do disco, nada por menos batiza o álbum. “Sweet Begônia”: rejeição e insistência, quem nunca? “Nada a ver”: na carência, não há nada a perder. “Crônica”: uma reflexão pessoal sobre tudo o que está errado em nossa volta. “Sopa de letrinha”: trilha sonora de novela (Corpo Santo), uma paixão quase adolescente, algo doce porem destrutivo.

E aí, quem se atrever a dizer que não conhece este disco tem mais é que pegar a medalha de foda e enterrar no panteão da vergonha.

Sem dúvida alguma um dos melhores álbuns do rock nacional. Este disco é atemporal. Seria lindo se fosse lançado nos dias de hoje. Este disco foi o começo da consolidação de Humberto Gessinger como um dos grandes poetas do Rock Brazuca.

Impressionante como o fascismo fascinante ainda hoje deixa a gente ignorante fascinada.

*Marcelo Guido é Jornalista, Pai da Lanna Guido e do Bento Guido, Maridão da Bia.

“Não foi fácil esse fim de semana…”

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