Encontro com o Gino (aos cinco anos de sua morte) – Por Lulih Rojanski

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Encontrei-me com o Ginoflex recentemente, há cerca de uma semana. Ele estava jogando xadrez numa mesa de bar (pense numa coisa improvável) com alguém da terra das barbas longas. Sorriu um sorriso de muitos dentes, um sorriso branco como aquele que ele nunca teve e, com a cara mais serena do mundo, me contou que acabara de fazer uma limpeza de pele, como se aquilo fosse entrar no meu livro de importâncias. Aí, eu, obedecendo à minha natureza crítica , lhe perguntei se naquele lugar de pessoas de barbas longas e crânios pelados haviam lhe feito também uma limpeza de alma. E ele disse que não, que só faziam em quem precisava. E perguntou se eu viera fazer a minha. Minhas faces arderam. Então eu olhei bem naqueles olhos purificados pelas ervas das terras das barbas longas, admirei ainda uma vez seu sorriso iluminado e me preparei para ir embora daquele não sei onde, pois já me satisfizera em ver o Ginoflex como nunca antes imaginara ver. Foi quando ele me disse: “Estamos sonhando, mas estamos bem”.

Foi a primeira vez em dois anos que sonhei com o Gino. E foi também a primeira frase correta em português que ele me disse em toda a minha existência. (Desculpe, Gino, pela franqueza. É que ainda tô com a limpeza de alma entalada na goela!). As outras frases, embora me dessem muito orgulho, não eram suas. Podiam ser do Caetano, do Chico, do Raul ou de uma infinidade de compositores populares que povoavam a vida do meu amigo. Mas a que ele mais gostava de recitar pra mim era esta: “Besta é tu, besta é tu! Não viver nesse mundo!”. Eu me emburrava, feito criança, pois sabia que ele tinha razão: captava meus devaneios como ninguém era capaz de me dar um tapa na nuca pra me fazer apear da nuvens. Mas também podia me tomar pela mão no meio de uma tarde de segunda-feira, me jogar dentro de um carro cheio de gente louca e me levar pra tomar banho no lago do Curiaú… Sim, o Gino realizava esses pequenos sonhos! E é por estes rompantes de sabedoria, por estas invenções divinas nas segundas-feiras que o Gino é o melhor amigo que já tive! Que o Gino é o louco que me faz falta! Pra matar essa saudade, só veneno… A gente toma vinho, cerveja, vinil, e a saudade não morre, só cresce. Cresce em notas sustenidas!

Foi bom rever o Gino em sonho. Tenho minhas interpretações, sem precisar consultar o Dicionário dos Sonhos, sem recorrer a Jung nem a Freud. Simplistas, mas tenho. Vão ficar guardadas, esperando o próximo sonho. Penso que logo, logo o Gabiru (Gino) aparece de novo. Nem que seja pra me dar uma explicação sobre aquele jogo de xadrez. Enquanto espero, vou rodar um vinil d’Os Novos Baianos.

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