Iara

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Crônica de Ronaldo Rodrigues

A madrugada toda foi de chuva. As ruas ficaram alagadas. Quase toda a cidade ficou paralisada, esperando as águas baixarem. Eu acordei cedo, como todas as manhãs, para ir ao trabalho, mas tive que esperar até 10 horas para poder sair. Quando abri a porta, vi um peixe enorme estirado no pátio. Revirando aquele peixe, vi que ele ainda estava vivo, se debatendo levemente. Examinando melhor, constatei que não se tratava de um peixe. Era uma sereia.

Levei a sereia para dentro, agasalhei-a, esquentei uma sopa e dei para ela que, muito debilitada, talvez pelo esforço de nadar entre a maresia que o temporal tinha provocado, sorveu bem devagar.

Ela foi, aos poucos, recobrando a consciência e perguntou onde se encontrava. Eu disse que ela estava numa cidade à beira de um grande rio, que ficou maior ainda por causa da chuva forte. Falei que eu precisava ir ao trabalho e que ela poderia ficar em casa, descansando. Na volta, nós pensaríamos numa maneira de devolvê-la ao rio.

Quando voltei, encontrei a sereia no sofá da sala, assistindo a uma novela na TV. Ela tinha varrido, espanado e arrumado a casa toda, que estava brilhando, muito diferente de quando eu saí. Ela disse que aquilo era um agradecimento pela forma como eu a tinha tratado.

E a sereia foi ficando, ficando. Depois de três dias, já dormíamos juntos, ela tomava conta da casa, fazia comida, tudo com muito esmero. Até que senti ameaçada a minha resolução de eterna solteirice. A convenci a voltar para a sua casa, fosse lá onde fosse, imagino que nos recônditos do imenso rio.

Ela compreendeu, se despediu, muito educadamente, e partiu. Mas, sempre que o temporal e a saudade vêm mais forte, ela me faz uma visita.

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