Jogo contra a corrupção – Crônica de Ronaldo Rodrigues

Crônica de Ronaldo Rodrigues

O jeitinho brasileiro está ocupando com força total os campos de futebol, que, no final das contas, acaba sendo o espelho daquilo que rola fora dos gramados. A malandragem no futebol revela (ou glorifica?) o que anda pelo país afora.

Agora os nossos atletas estão passando dos limites da simulação de falta, quando, por causa do mais leve toque do adversário, o sujeito se joga que nem os dublês de Hollywood são capazes, se contorcendo todo, numa dor que deve ser a maior que já existiu na história da humanidade.

Num tempo não tão distante, em que se jogava realmente futebol, existiam jogadores desse naipe, mas se tratava de uma minoria. Hoje, o comportamento é comum. São tentativas de cavar pênalti, de arranjar cartão para o adversário, de incitar a torcida, que parece apoiar esse tipo de truque.

E num campo em que o errado está certo, o certo passa a ser encarado como errado. Vide a história de Rodrigo Caio, jogador do São Paulo, que, em jogo contra o Corinthians, assumiu ter sido o responsável pelo toque na coxa do goleiro do seu time e não o atacante Jô, que havia recebido cartão amarelo pelo lance. O cartão foi revogado e a atitude de Rodrigo Caio elogiada por muita gente, o que deveria ser unânime, mas não foi bem assim. Entre comentários prós e contras, houve quem tivesse achado que o zagueiro foi otário, o que nos leva a crer que agir com honestidade no futebol, e na vida em geral, não pega muito bem e o melhor mesmo é ser “esperto”.

O técnico Rogério Ceni ficou visivelmente aborrecido e pouco comentou a respeito. Espero que ele não tenha acatado a sugestão do ex-craque Romário, para quem a atitude de Rodrigo Caio merecia pelo menos um bom esporro do técnico. O pior disso é que Romário é senador da República, cargo que deve zelar pela manutenção do que é correto.

Muita gente está pronta a gritar contra a corrupção que rola solta em Brasília, mas esquece (ou releva, ou perdoa) as próprias atitudes de corrupção, essa do dia a dia, como furar fila, dar carteirada, parar o carro em cima da faixa de pedestres, estacionar na calçada ou em frente à rampa de acesso etc. É uma lista que parece não ter fim e é bom ficar atento para que os que ainda mantêm um mínimo de consciência não caiam no jogo cotidiano da corrupção. E lutar para que a corrupção, em todas as escalas, nunca seja algo aceitável.

Pouco antes de encerrar esta crônica, achando meio baixo astral, ouvi três relatos que me convenceram de que a corrupção ainda não ganhou o jogo. Uma pessoa devolveu os cem reais a mais que o caixa do banco havia dado. Outra pessoa deixou cair uma nota de cinquenta e foi avisada pelo funcionário do mercadinho que a nota havia caído. Outra pessoa deixou cair dez reais, prontamente devolvidos por um estudante que passava naquele momento.

São essas atitudes, que parecem mínimas diante do grosso da corrupção, que me fazem persistir na crença de que a honestidade vale a pena e, no final de tudo, ainda vai fazer a grande diferença.

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