Mundo cão – conto de Lulih Rojanski

Conto de Lulih Rojanski

Vestiu-se de Maria, donzela desamparada, vestido de laço e flor no cabelo, para ver a Banda passar. Ninguém, nem o Batman, quando passou atrás do trio elétrico, alisando as flores de seu vestido com um olhar de sarjeta, suspeitou de que aquela fosse a identidade secreta da Mulher Gato.

Do meio da profusão das marchas do carnaval, o Superpateta encontrou o olhar I believe in angels de Maria, a donzela desamparada, e não soube jamais explicar por que, naquele instante ad infinitum, desejou ser um Negro Gato de arrepiar.

O Negro Gato passou no meio da Banda, entre Frajolas e Mandachuvas… grisalho, quase calvo, hipnotizado pelo pó e pelo único trio elétrico que se rebelava em Racionais MC´s. Um cara que é da noite, da madrugada – ele cantou, absorto, ao passar sem ver o olhar de fera livre que lhe lançava Maria.

De laço de fita e flor no cabelo, Maria, desamparada na terça-feira gorda, sentiu-se tentada a cair nos braços do Gato de Botas, de lhe entregar seu calor animal. Isto antes de perceber que, em plena avenida, ele lambia o pelo translúcido de uma Thundercat – muito mais bela, embora bipolar.

Naquele último dia de carnaval, quando a Banda passou de passar, Maria arrematou a última cachaça de um ambulante perdido entre serpentinas e restos mortais de canções, e virou a dose de um gole só, pensando sobre o mundo cão… que poderia ser salvo pelos gatos. Então sentiu o convite de uma garra pousando tigresa em seu ombro, e se virou devagar, slow motion em trilha imaginária, para gozar felina o olhar daquele a quem entregaria, antes do fim da noite, a sua identidade secreta.

*Conto do livro Gatos Pingados

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *