O batedor de falta é um atirador de elite

Por Fabrício Carpinejar

Um time campeão pede um cobrador de falta. Corinthians tem Alex, papou a Libertadores e o Brasileiro. Palmeiras tem Marcus Assunção, ganhou a Copa do Brasil.

O cobrador de falta é o segundo capitão. O xerife do ataque. A possibilidade de salvar o jogo quando nada funciona.

É um gerador de luz nos apagões do talento. Quando a bola não quer entrar, ele surge com força ou jeitinho para impor a vantagem. Assegura tranquilidade no nervosismo das prorrogações.

É o suspiro de esperança quando não resta sopro, é o que mantém o torcedor na arquibancada durante os acréscimos. 

O cobrador corresponde a um atirador de elite, aquele que fica no telhado com a mira do rifle esperando a mínima movimentação do goleiro para surpreender as redes. 

Os melhores plantéis sempre forjaram um cobrador em suas fornalhas. Não necessitava ser um craque, desde que não comprometesse a partida.

O Atlético Mineiro dos anos 80 contou com o canhotaço de Éder. Cruzeiro dos anos 70 se valeu da potência de Dirceu Lopes e Nelinho (sua força estrondosa está exemplificada no Guiness Book, conseguir chutar uma bola para fora do estádio do Mineirão). Flamengo brilhou com Zico, Tita e Júnior. Vasco reluziu com Roberto Dinamite. O Inter esbanjou títulos com Valdomiro e Jair em sua década vitoriosa no Brasileirão. São Paulo chegou ao tri da América e Mundial com Rogério Ceni e Raí. O timão nunca desprezou a essência desse personagem predestinado: Zenon, Neto, Marcelino Carioca.

Não há título mundial brasileiro que não requisitou de um matador de falta em suas trincheiras. Em 58 e 62, Didi e Garrincha desfilaram sabedoria e malandragem. Em 94, Branco fez a diferença. Em 2002, Ronaldinho Gaúcho e Roberto Carlos revezaram os tiros de misericórdia.  A seleção brasileira de 70 alcançou a proeza de juntar cinco grandes finalizadores a distância, um verdadeiro pelotão de fuzilamento formado por Gérson, Rivelino, Pelé, Tostão e Jairzinho.

Preparar um cobrador é cuidar da validade do extintor de incêndio e viabilizar saídas de emergência imediatas. É pensar no futuro.

Falta perto da área é quase inevitável, mesmo diante da zaga mais educada (já o pênalti é um milagre, e os juízes estão cada vez mais céticos diante das encenações constantes dos atacantes).

Equipe que se preza reivindica um batedor.  Um personagem unânime no grupo, o que treina um pouco mais com o fim do coletivo.

Acontece uma falta, e não existe confusão, protesto e briga para definir quem assumirá o lance. Está definido pelo treinador desde o início dos tempos. Ele aparece de longe e com a calma de um veterano. Transpira a exclusividade e o carisma de um líder – os demais se afastam por respeito. 

Todos sabem quem ele é, devem saber ao menos, para temer. O batedor vem com seu sangue-frio pegar a bola, ajeita a redonda na grama e dispara seu petardo ou com efeito ou com violência.

O colorado está carente de um cobrador, de um coringa. D`Alessandro não vem cumprindo a missão – é irregular e instável (poucos gols em cinco anos, mal enche as mãos). O último que apareceu no Beira-Rio foi Andrezinho (hoje no Botafogo), mas ele era um reserva de luxo e nem sempre estava em campo para chamar a responsabilidade.

O cobrador não é um acessório, mas é a alma da competitividade.

No caso do Inter, que já teve uma linhagem formidável de Mário Sérgio a Rubem Paz, não desfruta sequer de um cobrador de pênalti fixo.

Isso aponta para a ausência de liderança no vestiário e de referências em campo. É a manifestação da desordem, o aviso do caos.

Definir tarefas é a principal tarefa do técnico, e deve ser a preocupação imediata de Fernandão.

A bola parada é competência num jogo feito de sorte e azar.

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