O ladrão circunstancial e a guerra total

                                                                                          Por Régis Sanches

Merla e Crack
Nos últimos dias e noites, estive em batalha campal contra inimigos ocultos e outros nem tanto. Há tantos ladrões em Macapá, que seria necessário construir pelo menos cinco novos complexos penitenciários. Os ladrões têm atazanado a minha paciência e dos meus amigos. Já perdemos a conta de quantos telefones celulares nos foram furtados.

Um dos aspectos mais emblemáticos da ladroagem é sua face oculta. Existem os ladrões profissionais, que investem na carreira e tratam o seu ofício como outro qualquer. Nesse rol estão empresários, políticos e uma hierarquia que termina com o reles ladrão de galinha.

O ladrão profissional deveria ter carteira assinada e aposentadoria paga pelo INSS. Afinal, quantos nobres bandidos travestidos já não gozam desse benefício?

Vamos deixar os figurões de lado, pois quero explorar aqui a figura do ladrão circunstancial: é aquele sujeito que se vê na premência de subtrair o celular alheio para alimentar o seu vício. Refiro-me à famigerada legião de dependes de crack e merla que vagueiam como zumbis pelas vielas escuras das bocadas de Macapá e Santana.

O crack, todos sabem, é a “pedra da morte”; a merla, eu a denominei de “Lady Mellody”, em alusão a duas drogas: a química – feita da borra da cocaína – e o estilo musical oriundo do Pará, cuja poesia, lirismo e conteúdo estão abaixo de zero.

A história é mais ou menos assim: era uma vez um cidadão respeitável, com emprego fixo, esposa bonita, também empregada, e filhos maravilhosos. Um belo dia, após ingerir uns tragos de cerveja e várias talagadas de cachaça, esse sujeito é apresentado à insuspeitada Lady Mellody. Os pais de dependentes, que porventura lerem este texto, saberão que o vício é instantâneo. E as conseqüências são nefastas para todo o clã.

Não vou citar nomes, mas o problema das drogas é o mais grave do Amapá, até mesmo que o da saúde pública. O homem que depende da Lady Mellody perde todos os valores morais. Primeiro, começa a faltar ao emprego, é demitido e, na sequência, sua mulher, desde que também não seja viciada, o abandona. Já na sarjeta, se lhe resta algum bem material, certamente ele será vendido para alimentar o casamento com a Lady Mellody.

A pior fase acontece quando o viciado se transforma em mentiroso compulsivo e ladrão contumaz. Furtam cartões de bancos de parentes. Mas o grande alvo dos “Mellodies” é mesmo o telefone celular, artigo de fácil aceitação e melhor moeda de troca nas bocadas de qualquer cidade. Em Macapá não é diferente.

Dito isto, para todas as famílias que convivem com o drama do crack deixo uma mensagem de esperança. E, especialmente, para os que estão casados com Lady Mellody, esta senhora perniciosa e desdenhosa, escrevi o seguinte poema:

            Guerra total – (Régis Sanches)
 

O inimigo oculto

Mora dentro de mim

Habita minhas entranhas

Consome meus neurônios

Mutila meu corpo

Possui minha alma

Domina meu espírito

Anula o meu poder

Transforma um Titã

Num boneco tantã:

Nômade, bêbado, trôpego;

Trêmulo, errante, delirante;

Passivo, autodestrutivo.

Derrotar o inimigo oculto

É mister do guerreiro impecável:

Humilde e disciplinado,

Impregnado de amor,

Mestre do autoconhecimento.

É uma guerra sem fim,

Batalha cruel,

Confronto inadiável.

Todos os dias, todas as noites

Uma vitória retumbante

Para, enfim, flutuar

Nas asas da liberdade

Rumo à poeira das estrelas.

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