Os sete pecados capitais- Parte I – Invidia – Crônica de Rebecca Braga (@rebeccabraga)

Crônica de Rebecca Braga

A inveja por definição, uma delas pelo menos, é a sensação ou vontade indomável de possuir o que pertence à outra pessoa. Pecado capital, tipificado como vício, figura como num tratado para seguir os preceitos cristãos dos Dez Mandamentos. Não se pode desejar o que o outro tem, aquilo que lhe falta, aquilo que você não alcança. A inveja é personificada como demônio através do Leviatã, que por vezes aparece na figura de um peixe, um crocodilo, um dragão marinho, uma serpente, um kraken.

Dito tudo isso, preciso admitir que sou uma pessoa invejosa. Eu simplesmente morro de inveja de quem dorme. Não, não é de quem tem sono. Sono eu tenho muito. O tempo todo. Tenho inveja dos que dormem.

Aquela gente que deita pra ver um filme e de repente dorme. Aquela gente que dorme no ônibus de tão cansado voltando do trabalho, que dorme a sesta da tarde, aquela gente que dorme suada depois de fazer amor.

Tenho inveja de quem estende o corpo em uma espreguiçadeira na beira da praia e acorda vermelho queimado de sol. Bem verdade é que, em tempos de pandemia, eu tenho inveja de qualquer pessoa que durma na beira da praia, igarapé, cachoeira, piscina. Mas só dos que estão longe das aglomerações, caso contrário, meu pecado capital é a Ira. Mas dessa, falemos em outro momento.

Esse demônio que me habita, tem inveja de quem dorme oito horas seguidas, de quem tem a consciência pesada e põe a cabeça no travesseiro e mesmo assim dorme tranquilo e leve, de quem não deseja desesperadamente pelo dia seguinte.

Tenho inveja de quem não tem a cabeça a mil rotações por minuto e não precisa levantar de madrugada para fazer aquilo que pode esperar o amanhã. Inveja de quem não se consome pela ansiedade.

Já me receitaram de tudo. Chá de camomila, leite morno, esquecer o celular, marijuana, alprazolam (e tantos outros medicamentos do tipo), uma taça de vinho, um livro. Mas dormir pra mim continua sendo um artigo de luxo, digno de loja de antiguidades ou de hospital particular.

Leviatã deve estar em algum lugar me vendo de noite revirando na cama e rindo da minha cara. Cada um com os seus demônios. O meu é esse, entre tantos outros.

Tenho uma amiga que sempre chegava em casa depois do almoço dizendo:

-Amiga, vou dar uma deitada no teu quarto cinco minutinhos…

Deitava e roncava enquanto eu olhava pra ela como quem olha pra algum achado absurdo.

Ela levantava depois de vinte ou trinta minutos de sono, acordava sem despertador com a cara de nova em folha e voltava para o trabalho.

Vai se foder! Dormir devia pertencer a todo mundo.

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