Pedalando e cantando – Crônica de Ronaldo Rodrigues

Crônica de Ronaldo Rodrigues

Meu veículo preferencial, depois dos livros, que me levam a qualquer lugar, é a bicicleta. É a bordo da magrela, do camelo, que faço o caminho de casa para o trabalho e vice-versa. E também quando saio desse percurso para me encontrar com amigos.

Enquanto pedalo e a bike me leva, vou pensando o quanto esse ato me traz a sensação de liberdade. O corpo vai se exercitando em meio ao burburinho urbano, vou vencendo a distância como se eu voasse, planasse, pairasse, algo assim. E a certeza de pilotar um veículo não poluente ajuda a despoluir a mente. No caminho, solto as asas do meu poder criativo, ou ele é liberto pelo pedalar, e vou cantarolando canções já existentes, minhas e de outros autores. Tento criar letras e ritmos, penso no texto que preciso fazer quando chegar ao trabalho, olho pessoas em seus afazeres cotidianos, lamento pelas infrações no trânsito, grito palavrões (às vezes, apenas imaginários) ao motorista que atenta contra minha existência e contemplo o majestoso rio Amazonas, quando resolvo sair do meu caminho de pedras e estender o olhar até onde os olhos possam chegar.

A minha indignação diante do que não entendo das decisões políticas também tem vez em comentários que não chegam a estragar meu dia, mas reforçam o fato de que a mobilização urbana é algo que precisa ser muito bem pensado e executado. Aí saem pensamentos assim: “Caramba! Quando é que estas obras vão acabar? E, se já acabaram, pelo visto, por que deixaram tudo quebrado, sujo, poeirento no sol e lamacento na chuva? Cadê a ciclovia?”.

A magrela já foi tema de várias crônicas minhas e continuo pensando nela com pureza. Sinto a bicicleta como uma ilha de lirismo em meio às buzinas e chiados de pneus de um trânsito caótico, como um sonho de serenidade na contramão de uma realidade que insiste num dinamismo da vida moderna que, muitas vezes, é somente pressa.

Enquanto não convenço pelo menos a metade do mundo a sair por aí de bicicleta, vou ao encontro dos entusiastas desse esporte, filosofia, estilo de vida. Ou saio pedalando solitariamente pelos meus pensamentos. Fazendo analogia entre pedalar e viver, sei que vou chegar a algum lugar e, apesar de não saber onde é esse lugar e quando será minha chegada, vou apreciando as belezas do caminho, sentindo o vento no rosto e sorvendo minhas doses diárias de felicidade.

Vale terminar citando a música Tesouro da Juventude, de Tavinho Moura e Murilo Antunes, cantada por Beto Guedes: a pedalar / camisa aberta no peito / passeio macio / levo na bicicleta o meu tesouro da juventude… piso no pedal do sonho / e a vida ganha / mais alegria.

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