Peixe – Crônica de Ronaldo Rodrigues

Crônica de Ronaldo Rodrigues

O secretário nacional de Aquicultura e Pesca, Jorge Seif Júnior, afirmou que o peixe é inteligente e sabe se safar das manchas de óleo que infestam o litoral nordestino. Para o secretário, é mais “inteligente” deixar os peixes e toda a biodiversidade expostos do que tomar medidas para diminuir o impacto ambiental. Eu concordo que o peixe é inteligente, mas não pra deixar somente sobre ele a responsabilidade de sobreviver.

O peixe é um bicho inteligente, sim, senhor! Nunca vi uma piaba afirmando que a Terra é plana. Jamais testemunhei a declaração de uma corvina de que o aquecimento global é uma balela, uma falácia. Nenhum tucunaré joga óleo no próprio habitat. Peixe é inteligente e gente boa. Tubarão só é assassino no cinema. Ele só mata mesmo pra se alimentar, como, aliás, todos os bichos, a exceção do que se acha mais inteligente do que os outros.

Nunca vi uma traíra tendo que confessar uma traição. Traíra não trai e não merece a fama de traidora que muitos seres humanos dão a ela. Na verdade, ser humano é como o reino animal chama a traíra que cai em tentação e sai traindo todo mundo, a si mesma, inclusive.

Bagre não tem nada de desinteligente. Uso a palavra desinteligente para não usar a palavra burro. Seria mais uma injustiça com esse outro bicho esperto, que é o burro. Quem chama de cabeça-de-bagre a uma pessoa curta das ideias é porque nunca levou um papo-cabeça com um bagre. O jaraqui jamais pegou uma propina sequer, a dourada nunca se envolveu em negociatas e o peixe-espada nunca recorreu à sua arma para reforçar seus argumentos e intimidar aqueles que não concordam com sua opinião.

Peixe é muito inteligente. Se dependesse da piramutaba, “caneta azul, azul caneta” jamais seria sucesso. Aliás, todas essas bobagens e notícias que as pessoas espalham nas redes sociais, sem se preocupar se é verdade ou não, o acará e a tainha nem tomam conhecimento.

Mas não vou me alongar nessa defesa da inteligência do peixe, porque me basta saber que da boca do tamuatá jamais sairá um comentário homofóbico, da gurijuba jamais se ouvirá uma fofoca sobre a vida de alguém e um lambari nunca será racista. E também louvo a coragem do peixe em enfrentar as marés de petróleo e ignorância sem ter que contar com a “inteligência” das autoridades que deveriam defendê-lo.

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