Poema de agora: A PRAÇA DO SAPO E O GATO DO BAIANINHO – Obdias Araújo

A PRAÇA DO SAPO E O GATO DO BAIANINHO

Naqueles dias dos anos setenta
A coisa estava feia no Amapá.
O Engasga-Engasga havia sido eleito
Inimigo Público Nº 01.
Era preciso caçá-lo. Pegá-lo.
Acabar com a raça do sujeito
Que tinha mola nos pés
E sebo no resto do corpo.

José Índio Machado distribuiu
Entre os guardas territoriais
Metralhadoras INA e revólveres
Cuja munição falava dos primórdios
Da civilização pré-colombiana.

Aquele menino tinha apenas 20 anos.
Perito em executar
Dobrados e similares nada sabia
De mosquete mosquetão
Mosquefal, algema têje preso
E coisas do gênero.
Deram-lhe Armas uniforme novo
E poder de comando.

Uma tarde chuvisquenta veio o alarme:
O engasgagador estava debaixo
Do assoalho do Baianinho
Na Praça do Sapo que hoje atende
Pelo vulgo de Praça Floriano Peixoto.
Realmente dava para ver entre os sauveiros altos

E os esteios de sustentação da casa de madeira
Alguns tufos de cabelo.

O menino temperou a garganta e repetiu a ordem
Até à rouquidão: Têje preso! Têje preso! Têje preso!
E nada do famigerado bandido sair de debaixo da casa.
Sequer se mexia. Parecia extenuado após a noite inteira
Perseguindo alunas incautas do IETA, CCA, CA e adjacências.

O menino segurou firme a INA que sempre puxava para a
Direita quando se atirava e acionou o gatilho.
Alguma coisa explodiu e o sangue manchou as tábuas do
Assoalho tingindo de vermelho a farofa amarela
Dos sauveiros próximos.

Após a anuência do proprietário
Duas ou três tábuas foram arrancadas
E todos viram Palhaço – o gato siamês do baiano
Dono da casa – com a cabeça destroçada
E o corpo ainda trêmulo.

Até onde eu sei este inocente gato
Foi a única vítima da
Operação Engasga-Engasga.

Fora os poetas E os amigos
Dos poetas.

Obdias Araújo

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