Poema de agora: Ilê – Lara Utzig (@cantigadeninar)

Ilê

sem energia
mufina
com o ânimo macambúzio
recomendaram-me uma mãe de santo
e com o espírito confuso
fui ver se ela me benzia
[enquanto jogava búzios

— Minha filha, seu pai, Oxalá
o maior dos orixás
deixa uma lição:
tem que cuidar do ori
tem que cuidar de orá
não tema:
só fazer uma obrigação
para Iemanjá
[flores brancas e alfazema
que o mal vai desamarrar

saindo do terreiro
instantâneo encanto:
esbarrei com teu aroma de banho de cheiro
[recém-tomado
e com esses olhos-quebranto
que me fariam atravessar o Amazonas a nado

eu, até então cética
vazia
& charlatã
de repente,
passei a ter fé em meus guias
caboclos, pretos-velhos, pombas-giras
e em meu coração-xamã

padecendo ainda em frangalhos,
te convidei para me acompanhar nos trabalhos
e a partir daí tornei-me crente
desde quando observei esvair-se
com o nascer de uma estrela cadente
o-que-existe-de-ruim
o veneno de Circe
que sugaste de dentro de mim

tudo que havia de vil
sumiu
quando de manhã cedo
meu (dantes) infértil ventre
foi preenchido pela semente
deixada pelos teus dedos
ao redor de meu quadril

não resta suspicácia
sobre a origem dupla da eficácia
na cicatrização de minhas fraturas
se hoje estou bem melhor
foi graças ao ebó
e aos teus lábios de pitanga
nessa conjuntura
o que importa é a cura
tanto pelas mãos da umbanda
quanto pelas tuas mãos em minha cintura

Lara Utzig

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