O pescador do por do sol
Puxa, na verdade,
O crepúsculo que espelha
De outro mundo,
Da fundura solitária das águas
Puxa, na verdade,
Partículas de luz
E algumas horas
Entregues ao fim,
Fim que ainda não é
Fim que veio e está,
Puxa, na verdade,
Objetos fluviais
Não identificados
Do ventre idoso
Do velho Araguari
Puxa
O ômega da fome,
Erupções
E rios inteiros
De desamor
Ao certo,
Puxa cardumes
De garrafas de cachaça
E saudades
Que não sabem nadar
Puxa também,
Tempos inteiros de mortandade,
Expostos em inundações
E no progresso
Que sopra para uns
Puxa, na verdade,
Da imensidão de poesia,
O cio do abandono,
Iluminado e temperado
Por turbinas e comportas,
Modernidade longínqua
Da mesa de jantar
De um jovem pescador
Que puxa do vazio de peixes
Nada além que o pôr do sol
Júlio Miragaia