Telefonema – Crônica de Ronaldo Rodrigues

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Crônica de Ronaldo Rodrigues

Ele foi acordado pelo toque do celular e seu bom-humor foi logo cancelado. Abriu os olhos sem acreditar que alguém estava ligando naquele dia e horário. Atendeu meio sonolento e ouviu a voz do outro lado:

– Bom dia, senhor. Aqui é da sua operadora e este telefonema está sendo gravado.

A sonolência passou na hora. Ele já tinha recebido esse tipo de telefonema outras vezes, em momentos também inconvenientes, mas daquela vez a coisa não ficaria por isso mesmo:

– Bom dia, só se for pra você! Que história é essa de me acordar no sábado, às 8 horas da madrugada?
– Calma, senhor…
– Calma é o cacete! Calma é a única coisa que não se consegue ter quando alguém liga pra gente numa hora dessas!
– Senhor, devo reiterar a advertência: este telefonema está sendo gravado.
– E ainda me vem com ameaça! Será que eu estou sendo investigado pelo Sérgio Moro? Será que foi aberto algum inquérito em que eu sou réu? Quem deu o direito de vocês gravarem a minha conversa? Isso é um crime!
– Isso é por motivo de segurança, senhor.
– Que segurança o quê? Isso é intromissão na minha vida! Isso se chama monitoramento, cerceamento, grampeamento! É invasão de privacidade!

O operador de telemarketing, ou que nome tenha isso, conseguia manter sua impassibilidade do outro lado da linha, como deve ter sido instruído nos mil cursos, oficinas e seminários que essas pessoas fazem para que fiquem bem capacitadas na arte de encher o saco:

– Peço que mantenha a calma, senhor. Daqui a pouco, o senhor vai estar sendo grosseiro e eu vou estar sendo obrigado a estar informando meu chefe…
– Dane-se, você e o seu chefe! Pouco me importa se você vai “estar fazendo” o que quer que seja! Eu quero é dormir! Será que um cidadão que acorda cedo a semana inteira não pode ficar dormindo o tempo que quiser no abençoado dia de sábado?

Houve uma pausa. O operador deve ter parado um pouquinho para tomar um gole de água. Sim, eles bebem água! Depois continuou, simulando um tom ofendido:

– Senhor, dessa forma não há como manter um diálogo civilizado.
– Civilizado? O que eu menos quero ser agora é civilizado! Pois saiba que você despertou os meus instintos mais primitivos, como disse o Roberto Jefferson a respeito do José Dirceu, na época do escândalo do mensalão!
– Não tenho conhecimento desse fato, senhor.
– Claro que não! Duvido que você tenha conhecimento de alguma coisa que não seja encher a minha paciência!
– Mas, senhor…
– E pare de me chamar de senhor toda hora! Que coisa irritante! Diga logo o motivo de você me ligar num sábado e a esta hora!
– A nossa operadora só ligou para lhe desejar um bom dia, senhor.

Aí, e com toda a compreensão da minha parte, não teve como segurar a explosão:

– Bom dia é o caraaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaalho!

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