O PERIGO DO “MAS”: momentos iniciais da greve na UNIFAP

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Foto: SelesNafes.com

Por Yurgel Caldas

Com a deflagração da greve na UNIFAP (Universidade Federal do Amapá), muitos debates surgem com relação à educação pública, à autonomia universitária e à valorização do trabalho docente, dentre outros temas centrais de luta contra a crise da educação no Brasil. Outros temas, mais ligados à greve em si, tomam a cena e ganham a ordem do dia. Nos primeiros dias da greve na UNIFAP, começam a aparecer muitas falas que, no fundo, questionam a greve, seu movimento de mobilização e as próprias decisões de assembleia docente. Não é raro ouvirmos a seguinte ideia que começa com a frase: “Eu apoio a greve, mas…”

Devemos estar atentos ao que vem após o “mas”, essa conjunção adversativa que contrapõe a ideia anterior, ou seja, o apoio à greve. Assim, frases como “Sou a favor da greve, mas… não vejo problema nenhum em ter adiantado minha disciplina de 60, 90 ou 105 horas, de modo que ela tenha terminado antes da deflagração desta greve”. Ou “Eu dou todo apoio à greve, mas… acho que não tem nada de mais em marcar minhas aulas no shopping em frente à UNIFAP para finalizar o conteúdo da minha disciplina”. Outras ideias, que já foram superadas em assembleias passadas, insistem em estarem presentes no discurso de outros docentes, que dizem: “Nada contra a greve, mas… acho que ela deveria ter iniciado depois logo após o termino do semestre, ou seja, nas férias”. Sempre em voga está o apelo em nome do aluno, que não deve ficar prejudicado, quando toda a educação já está prejudicada num processo crescente de mercantilização do ensino.

Assim como as ideias acima, outras se justificam por um projeto pessoal, por capricho, para não ficar mal com os alunos, com a administração ou com quem quer que defenda a não greve, o que já foi superado quando a categoria docente decidiu – com o voto de muitos que dizem o “mas” após declarar apoio à greve – que paralisaria as atividades docentes. Trata-se de uma afronta à decisão coletiva dos docentes, na tentativa de desmobilizar a crescente adesão à greve dos docentes da UNIFAP. Precisamos alargar nosso espaço da greve, esclarecendo professores e alunos dos motivos desse movimento, de maneira que toda a comunidade acadêmica entenda e de fato apoie a greve dos docentes da UNIFAP, na luta por uma educação pública de qualidade, garantindo-se a autonomia universitária e a valorização do trabalho docente.

Ora, o princípio de uma greve docente é paralisar suas atividades inerentes ao ensino, seja em sala de aula, seja em laboratório, seja em grupo de pesquisa, seja em graduação ou em pós-graduação. Mas temos enfrentado algumas resistências de alguns colegas de cursos como Direito e Medicina, curiosamente, os cursos que historicamente não aderem às greves, talvez porque boa parte de seu corpo docente não dependa do salário da docência para sobreviver.

Na próxima semana, o CONSU da UNIFAP fará uma reunião cuja pauta será a suspensão do calendário acadêmico. Nesta greve, por diversos meios e oportunidades, a Reitoria da UNIFAP se posicionou a favor do movimento de greve, mas… Enfim, a mesma Reitoria que declara apoio a esta greve terá agora uma grande oportunidade de materializar seu discurso defendendo a suspensão do calendário acadêmico e invalidando as ações letivas de colegas docentes que ainda insistem em fazer atividades durante a vigência da greve. Os Conselheiros, que são os representantes dos cursos, devem também fortalecer essa ideia favorável à greve, em respeito à decisão da categoria docente, que suspende as atividades letivas durante a greve}.

E é assim, entre mas, porém, contudo, todavia e entretanto, que segue a greve. Mas (só pra seguir na temática), o local e o momento para questionar a greve é a assembleia geral do sindicato. O professor que não se faz presente nesse momento abdica do direito de decidir favorável ou contrariamente a greve. A decisão pessoal, o instituto, o departamento, o curso não são instâncias com poder para essa deliberação, não sendo possível usar a malfadada estratégia de afirmar, nós estamos em greve, mas meu departamento… É na assembleia do sindicato, confrontando posições iguais e contrárias as suas que a categoria define ou não pela entrada na greve. Razões para entrar na greve há muitas. Mas se o professor não esteve na assembleia, ele passou aos outros o direito de definir a posição da categoria. Depois que a greve foi deflagrada, aí como diz o ditado, não tem mas, nem meio mas… é greve!

* Yurgel Caldas é professor do Curso de Letras da e Comunicação da Unifap.

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