Sociedade do Superego (parte I)

Relação professor-aluno:

Na sala de aula vivo me questionando sobre qual é o real papel do professor. Cheguei até a ensaiar a diferença entre ser professor e ser educador. O primeiro segue as regras da relação com o aluno e as questiona pouquíssimo, um, para garantir sua autoridade, dois, para manter-se seguro e três deve ser também por alguma necessidade mais inconsciente.
O caso é que, por que é tão difícil sair do pedestal?
Bem, na minha opinião, um dos motivos deve ser o fato de vivermos na sociedade do superego, para quem faltou as aulas de psicologia superego é uma instancia psíquica que compõe a estrutura do aparelho psíquico, este formado também pelo Id (principio do prazer) e pelo Ego (mediador). O superego é a dimensão que vai se constituindo ao longo da vida (para alguns hehehe) que é regida pelo princípio do dever, ou seja, que reproduz as regras sociais e morais da sociedade.

Numa intervenção teatral que participei, e para facilitar a compreensão do grande público, ainda que caindo no perigo de resumir o conceito, se o superego tivesse uma fala ele diria: “Voce não pode”, “o que a sociedade vai pensar?”  ou “Isso é errado, ou isso é certo”. O Id por sua vez diria: “Eu quero, eu desejo…eu preciso”. Enfim, enquanto um quer realizar o seu desejo CQC, o outro tenta impedi-lo, censura-lo.
A partir dessa breve explicação sobre o conceito de Superego, que me perdoe Freud que dedicou a vida e produziu uma extensa obra sobre o assunto, eu repito a frase: vivemos numa sociedade do superego.
O que quero dizer é que estamos sempre precisando de alguém dizendo o que devemos fazer ou não. Estamos sempre requisitando as velhas formas de vigilância das quais falou Foucault. E ainda assim, falamos em liberdade, autonomia… Democracia!!!
Sinceramente, como podemos pensar em liberdade se não sabemos ser livre? Como falar em autonomia se precisamos sempre de alguém mostrando o caminho a seguir? Democracia nem se fale! Como podemos imaginar viver democraticamente se não respeitamos nossos opositores? Se não sabemos escutar e compreender que nas relações interpessoais há divergências de interesses e isso implica em de vez em quando EU ter que rever os meus para nos entendermos?!
Assim, sair do pedestal é sempre um movimento muito difícil e trabalhoso, pois vai nos colocar em um outro grau de relação com nossos alunos, e que nem sempre vai nos trazer boas experiências.

Janisse Carvalho

Reformar a saúde mental no Amapá: coisa de louco! (Será?)


Tratamento ou cuidado? Doente mental ou pessoa acometida por transtorno mental? Desinstitucionalização ou desassistência? A reforma psiquiátrica no Brasil já completa oficialmente uma década este ano. A lei 10.216 aprovada em abril de 2002 finalmente é possível de se em prática. Há os que criticam, afirmando que não dá certo, que os “loucos” ficam soltos por ai. Enfim, tudo isso é fruto do sistema “democrático” em que vivemos, cada um expressa sua opinião e esta deve ser respeitada.

Divergências a parte, é preciso focalizar mesmo nos desafios que esta proposta traz. Em vários estados brasileiros, as experiências são muitas e cada vez mais o Ministério da Saúde investe nesse campo. Mas ainda há o que avançar.

No que diz respeito à realidade da saúde mental no Amapá, é preciso levar em consideração alguns aspectos históricos centrais que desafiam a implementação da reforma psiquiátrica: 1) trata-se de um estado que não possui registro da existência de hospitais de grande porte (manicômios)[1] ; 2) a Política de Saúde Mental está na fase inicial; e 3) há uma escassez de profissionais especializados na área, em especial médicos psiquiatras.
No primeiro aspecto, apesar da não existência de manicômios no estado, nota-se entretanto, a cultura manicomial inscrita no tecido social, ou seja, a ideia de que a segregação e exclusão da pessoa acometida por sofrimento mental do convívio social são medidas necessárias. Este olhar dificulta a implementação dos serviços substitutivos, uma vez que estes atuam para inclusão e respeito aos direitos das pessoas acometidas por transtornos mentais. Vale ressaltar, que é necessário uma política de esclarecimento junto a população e à mídia local a respeito dos direitos e das mudanças na assistência médica-jurídica aos usuários e familiares.
O segundo ponto é consequência do primeiro, pois, a incipiente política de saúde mental precisa da organização política ativa da sociedade civil, como conselhos, fóruns e associações, isto é, para que uma política seja implementada é essencial que a sociedade civil também se comprometa nessa ação e deixe de centralizar as decisões no Estado.
O terceiro fator relaciona-se com os demais no que tange a formação acadêmica. No Amapá, ainda existem poucos cursos de nível superior e tecnológico no campo da saúde, em especial o curso de medicina que está em fase de implantação. A contratação de profissionais especializados fica dependente do recrutamento em outros estados, o que dificulta o andamento dos serviços de saúde mental, bem como aumenta os custos nessa área. Observa-se que este fenômeno traz sérias restrições no quadro funcional dos serviços substitutivos.

É claro que ainda há outros aspectos importantes que não cabem enumerar aqui. Contudo, estas são algumas variáveis a se considerar para o sucesso da implementação da política, com vistas à superação dos desafios. Para  equipe técnica que forma esta Coordenadoria Estadual de Saúde Mental da SESA, priorizar as ações na direção de um trabalho sensibilizador da comunidade em geral, no sentido de disseminar a cultura antimanicomial e promover a autonomia dos serviços oferecidos à população é talvez um dos maiores desafios.
Afinal, promover saúde mental é principalmente transformar olhares, e coisa de louco é continuar ampliando prisões, reproduzindo a lógica perversa do manicômio, repetindo por ai que “loucos são eles!”
E aqueles que foram vistos dançando, foram julgados insanos por aqueles que não escutavam a música” (Nietzsche)

Janisse Carvalho

Como a psicologia pode contribuir para a compreensão sobre a política?


Em primeiro lugar é importante reconhecer a Natureza contraditória da política. O grande desafio da política é sair do particular e chegar ao coletivo. Isso também se aplica de certa forma à psicologia, pois é uma prática que deve levar o individuo à emancipação e à sensibilização das necessidades dos outros sujeitos com quem convive.Isto é, ser ele mesmo sem prejudicar o outro.

É uma postura que quebra com a dicotomia entre individual e coletivo, pois propõe a compreensão de interdependência entre essas dimensões. Individuo era chamado de Idion, idiotes = individuo absoltamente singular. 

Esta interpretação coloca um desafio para psicologia contemporânea que de certa forma sofre os impactos dessa dicotomia, e tem o mesmo desafio da política: sair do particular e chegar ao coletivo. É um erro pensar a psicologia para o individuo, assim como é um erro pensar a política para um individuo ou determinado grupo. É preciso entender a dialética entre o individual e coletivo e incorporar essa relação sem cair no erro “didático” da dicotomia. 

A política é má interpretada devido ao pensamento reativo ao invés de critico-reflexivo. É preciso o pensamento crítico, segundo Marco Aurélio Nogueira.

A política é movida pelo poder. Segundo Nogueira, ajuda a domesticar a arrogância e autoridade, pois é a organização das diferenças. Não necessariamente o poder que gera opressão, mas aquele que significa possibilidade de transformação/decisão. 

Nesse aspecto é preciso reconhecer as representações sociais de poder na sociedade capitalista, que em última analise é de natureza econômica. Queremos dinheiro, porque significa poder. Isso causa impactos importantes nas práticas políticas e na personalidade, no caráter, na qualidade dos sentimentos humanos, enfim no psiquismo. 

Desta forma, a psicologia se aproxima da política, no que diz respeito à organização de sentimentos e necessidades. A vida política de alto nível (crítica, participativa, preocupada com o coletivo) exige uma reforma pessoal séria, e isso só acontece com o reconhecimento das necessidades pessoais e coletivas numa relação dialética e de contínuos processos de superação das contradições implícitas nessa relação. 

Reforma pessoal é o que acontece num processo terapêutico. Daí a importância do trabalho do psicólogo. É preciso ter a consciência que estamos formando pedagogicamente cidadãos.

Debater sobre psicologia e política pública é reconhecer essa íntima relação e também privilegiar a suspensão do cotidiano da pratica profissional do psicólogo, que significa dizer, valorizar o ser humano na sua integralidade (bio-psico-social-político-espiritual).

Assim sendo é preciso assumir uma postura crítica diante de práticas (emancipatórias /assistencialistas), ênfases (curativo/preventivo) e possibilidades de transformações (não de reprodução da lógica de opressão).

O psicólogo deve atuar antes de tudo pela libertação do homem (mesmo que isso seja uma fantasia) e a significação de sua existência, e a política pública deve dar o suporte para que isto aconteça!

Janis