O pedreiro e os tijolos – Crônica de Fernando Canto

Crônica de Fernando Canto

Dois homens desciam o morro em busca de novas formas de ganhar a vida, pois estavam isolados e já sem condições de dar o sustento às suas famílias. Um era pedreiro, outro ferreiro. No caminho encontraram uma pedra. O ferreiro viu que seu amigo parou para ver a pedra e perguntou:

– Por que tu te admiras de uma pedra tão comum? Há muitas dessas por aí. E apontou ao redor.
– É que eu posso modificá-la, respondeu.
– Mas para que servirá essa modificação?
– Para chegar a um objetivo que não sei exatamente qual é.

E o outro disse:

– Então fica com a tua pedra que eu vou seguir o meu caminho. Preciso trabalhar para comer.
E o homem ficou e voltou para a sua casa, no alto do morro. Pegou duas ferramentas, uma de cortar e outra de bater, e foi lapidando-a até transformá-la em um cubo.
Tempos depois seu amigo voltou, viu a linda pedra polida naquela forma.

– Como fizeste isso?
– Com paciência, técnica e amor.
– Mas por quê?
– Porque algo me diz que a missão do homem é transformar as coisas e transformar-se a si mesmo.
– E daí? O que isso significa?


– Significa que Deus coloca em nosso caminho coisas que podem ser modificadas e que alimentarão a própria vida se nós mesmos mudarmos. Uma pedra bruta achada em nosso caminho poderá ser de grande valor, se for transformada em cubo polido. Ela também pode ser esculpida de outras formas como a pirâmide ou um globo que Deus nos põe para observar em noites estreladas. São coisas que nos invadem o coração e nos põem em harmonia no grande ciclo da vida dado a nós por Ele, enfatizou o pedreiro. E continuou: – Nossos sonhos e a vontade são projeções da nossa vida e realidade.


– Mas você não come pedras. Como se alimenta? Perguntou o ferreiro com malícia.
– Como o que produzo em minha roça e distribuo o excedente aos que necessitam. Não como pedra, modifico-a. Tem mais: – Polir a pedra agora é o meu ofício. Um cubo não precisa ser apenas um cubo e ficar aí somente para ser apreciado. Muitos cubos podem servir para construir uma grande casa que pode abrigar a natureza do homem e o esplendor de Deus.
– Está bem, concordou o ferreiro. – Mas assim tu vais morrer de fome.


Ele dormiu exausto da subida e desceu à cidade no outro dia para procurar trabalho. no caminho encontrou um pequeno caminhão. O motorista lhe perguntou:
– Bom dia, senhor. Você pode me informar se o pedreiro perfeito está em casa?

Assustado, o ferreiro disse-lhe:
– Não conheço nenhum pedreiro perfeito. Mas tem um pedreiro maluco ali naquela casa que se alimenta de pedra.

E seguiu, rindo do pedreiro ladeira abaixo. O motorista ainda gritou:
– Obrigado, meu amigo. É com ele que negociamos seus ricos tijolos de pedra para a construção do nosso templo.

*Macapá, 19 de abril de 2021.

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