Poema de agora: CAL CINZENTO – Luiz Jorge Ferreira

CAL CINZENTO.

Por trás do muro da casa caiada de branco lá adiante
(Onde o branco quase foi embora)
‘Clarice’ de Caetano se Desvirgina, e eu perco as asas

Por testemunha…A folha seca da árvore caída ao acaso
Na outra página, o cao de gesso dilata as
Narinas e minha prima em Portugal…Ofega

Eu coloco ouro, e mirra, na rima rica
Não queria ser Cristo, nem seu primo, João Batista
Quero minha cabeça comigo
E na passarela entre o meu umbigo, e a placenta no útero de minha mãe
Sem pedágio

Não que eu veja os retratos, não os roídos de traças
E não reconheça nele suas saudades.
Não que eu veja os sulcos dos discos
Sumidos, e pise no silêncio de pé
Não que a voz da Clarice na voz do Caetano
Soe agora estranha ao destempero
Dos meus ouvidos
Onde gritos são sussurros

Não que me observe nu no espelho
E não mais reconheça meu sêmen seco
No âmago das entranhas
Não… É uma palavra antiga
Quase minha inimiga, o nó da razão

Quando guardei o mar, guardei o não
Seu barulho dentro dos meus ouvidos
Seu fedor dentro do meu intimo
Seu afogar dentro da minha existência
Cinza… Enxofre… Escamas da minha pele… Flutuando loucas
Em mim o mar caber onde acabo,
Seu ir e vir no fixo infinito
E o sinal que adiante eu não estou eu

Por trás do muro da casa caiada de branco lá adiante
(Onde o branco voltou, e floresceu)
‘Clarice’ de Caetano engravida


Enquanto minhas asas de penas ásperas
Nunca mais nascerão em mim

Luiz Jorge Ferreira

*Do livro “Nunca mais vou sair de mim, sem levar as asas”. Rumo Editorial – 2019.

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