Poema de agora: CONTÍNUO – Ori Fonseca

CONTÍNUO

Ela gosta de butterfly
Sabe o que é dragonfly
Mas não conhece firefly
Seu inglês entomológico
Hoje é ilógico
Não sabe para onde vai
Para onde voa
Ela não sabe se perdoa
Ou se executa
Se escuta
Ou caçoa
Mas ela sente muita culpa
E não se desculpa
Quer o céu só pra ela
Todo dela
Como num quarto sem telhado
Como num telhado sem quarto
Tendo o sonho iluminado
Com o lume preso no vidro
Farto
De solidão e gemido.

Ela é meiga e é boba
Por não gostar de ser meiga
Acha toda a gente leiga
Acha toda a gente boba
E rouba
O brilho do espaço
E chupa a luz da ribalta
Quando, bailarina, salta
No precipício da dança
No tropeço do compasso
No giro que nunca cansa.

Ela tem medo
De que seja muito tarde
De que seja muito cedo
Mas também não faz alarde
Morde o dedo
Range os dentes
Em segredo
E se esconde penitente
Debaixo da cama em gozo pra não ver o anjo
No arranjo
Sobre o telhado
Pra não ver a Terra
No armistício forçado
Pra não ter guerra
No sentimento trancado
Pra estancar a mágoa
No soluço estagnado
Como fosse água
Eternamente girando na caixinha –
Moto-contínuo do sonho da menina –
A dizer baixinho com voz fina:
“A vida é minha! A vida é minha!”.

Ori Fonseca

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