MEU JARDIM
Já teve um dia
Que eu quis partir de vez
Mas eu decidi ficar
Havia tanta folhagem bonita
No meu jardim
Que eu nunca tinha olhado
Havia muita dor
Onde eu só tinha me lamentado
Beleza e dor
Alimentaram minha decisão de ficar
Chorei 600 dias
Em samambaias mortas
Eu já quis partir de vez
Para esse buraco
Que ainda existe fundo dentro de mim
Ele não é feio
Nem monstruoso
É apenas um buraco imenso
Lajotado de solidão
Já teve um dia
Que eu quis partir de vez
Mas eu decidi ficar
Acender velas
Tocar sinos
Mesmo sem vontade
Eu decidi cuidar do meu jardim
Deixar ele cuidar de mim
Arei a terra
Peguei em minhoca
Preparei uma horta
É muito triste cuidar de um jardim
Tão descuidado em memória ruim
Mas eu decidi ficar
Limpar as larvas de mim
Esse meu jardim é traiçoeiro
As vezes seca inteiro de novo
E eu me despedaço imediatamente
Mormaço, areia, pedra
Até que da lágrima descrente
Brotam sementes perdidas
Chicórias riem
Flores rosas brilham
Então o jardim ilumina meu buraco de solidão
Assim, em paisagens onde eu só morreria
Borboletas azuis enfeitam os dias
Há quem diga que isso é sorte
Eu prefiro acreditar
Que é simplesmente a vida verdadeira
Depois do casulo triste da morte
Carla Nobre
2 Comentários para "Poema de agora: MEU JARDIM – Carla Nobre"
Aplausos… para o jardim dentro e no Poema.
A poesia de Carla Nobre nos deixa marcas profundas ,pois nos traz a certeza que as palavras só falam a verdade contida em nossa alma.