Mal entendido – Conto de Ronaldo Rodrigues

Conto de Ronaldo Rodrigues

Nos dávamos bem. Sexualmente, então, nos dávamos muitíssimo bem. Ficávamos trocando afagos e, depois das transas, longos papos. Roberta gostava de falar dos machos que passaram por sua cama. Sem fazer comparações, é claro. Eu falava das minhas mulheres também, mas ela sabia colocar mais entusiasmo nas suas histórias de amor e sexo, o que tornava sua vida bem mais interessante.

Roberta era legal. Se tivéssemos ficado juntos, hoje eu estaria morando no seu apartamento, no oitavo andar de um edifício mais ou menos chique, latinha de cerveja na mão, assistindo a algum programa vespertino babaca, sem muito o que fazer a não ser esperar a chegada de Roberta para darmos início a mais umas sessões de sexo. Algo bem parecido com felicidade. Pensei até em casamento, papel passado, aliança, champanhe e tudo o mais. O que fez as coisas entre nós desandarem foi a amiga que se hospedou no apartamento de Roberta.

*** *** ***

Quando eu ia ao apê de Roberta e Jane estava só minha libido disparava, passava do oitavo andar e ia muito além. Jane estava sempre fazendo ginástica. Meu Deus do céu! Quantas fantasias Jane despertava em mim, ela muito gostosa enfiada num microscópico short azul, malhando, louca pra deixar o corpo ainda mais delicioso.

Certa vez, cheguei ao apartamento numa hora em que Roberta não estava. Jane abriu a porta, tinha acabado de malhar, estava salgadinha de suor. Usava apenas uma camiseta, por baixo só a calcinha e a coisa maravilhosa que ela era. Ligou a televisão, dizendo que Roberta não demoraria. Imagina! Eu sozinho com aquela mulher! Ela andando pra lá e pra cá, com a ponta dos seios tentando romper a fina malha da camiseta.

Jane sentou no sofá e passou a cruzar as pernas a todo momento, comentando displicentemente o bárbaro crime que o telejornal tentava explicar. As fantasias rolavam na minha cabeça. Eu só conseguia me ver passando, muito lentamente a língua por toda a extensão do corpo nu de Jane. Não ficava um milímetro sequer daquele corpo sem sentir o calor da minha língua, que tinha calma suficiente para esperar a parte mais doce e procurar a parte mais salgada.

Quando minhas fantasias já cavalgavam furiosos cavalos alados, tentando dissipar o nevoeiro que me envolvia, me levantei pra ir embora. Jane barrou minha passagem, a ponta dos seios quase me tocando: “A Roberta vai chegar a qualquer momento. Espera um pouco. Fica aí, vendo televisão. Eu vou tomar um banho”.

Obedeci. Fiquei vendo TV e, através da tela, como se fosse um filme e com a trilha sonora do ruído do jato d’água do chuveiro, vi Jane tomando banho. Só que não era banho de chuveiro, mas de uma cachoeira que despencava de uma altura infinita, em câmera lenta, indo cair em cima de Jane.

Imaginei estar me aproximando da televisão para ver aquele espetáculo mais de perto, mas, na realidade, eu me dirigia ao banheiro. Abri a porta e vi Jane nua, majestosa, a água escorrendo por seus pelos. Ela não fez qualquer gesto de vergonha, parecia que já esperava a minha chegada.

*** *** ***

Nos deitamos na cama onde eu e Roberta tantas vezes realizamos nossos jogos eróticos. Jane só queria ficar deitada, abraçada comigo, nada mais. Ela sabia que não era o momento e eu não tentei nada, só a envolvi em meus braços. Eu queria mais, queria tudo, mas aceitei a situação.

Claro que Roberta não acreditou, ninguém acreditaria. No momento em que abriu a porta do quarto, sua cabeça só conseguiu registrar a imagem de dois corpos nus abraçados. Seu namorado e sua amiga deitados na sua cama. Que droga! Havíamos pegado no sono.

Me senti largado no vazio da cama quando Roberta, num golpe preciso, me cravou uma tesoura no pescoço. A única coisa que consegui divisar, antes de perder a consciência, em meio a tanto sangue, foi Roberta abrir a gaveta da cômoda, tirar um revólver calibre 38, apontar para Jane e disparar um tiro, dois tiros, três tiros.

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