Moradores da comunidade do rio Maniva mostram na prática as lições de sustentabilidade, organização e respeito ao meio ambiente

A comunidade de São José pertence ao estado do Pará, mas para chegar, saindo do município de Santana, basta percorrer 40 minutos e atravessar o rio Matapi até o rio Maniva, e encontrar uma modesta vila de pescadores e extrativistas, que se aventuram com sucesso pelo caminho da sustentabilidade. “Aprendemos a sobreviver da natureza sem desmatar, e aproveitar melhor o que temos de riquezas. Vivemos e comemos bem e sabemos na prática o que é uma vida saudável desde que a gente trabalhe para isso”, comemora a professora Kátia Facundes. Uma equipe da Promotoria de Meio Ambiente do Ministério Público do Amapá (MP-AP), foi até o local conhecer de perto a experiência com o intuito de incorporar novas práticas na proteção ambiental do Amapá.

Peixe, camarão, açaí, sementes como andiroba e murumuru, são apenas alguns dos produtos em abundância em São José do Rio Maniva, onde os ribeirinhos são cercados das mais variadas frutas regionais, e a fertilidade da terra é atraente a ponto de terem cultivado espécies que não são comuns na Amazônia, como figo e jabuticaba. Apesar de ser uma localidade do Pará, é para o Amapá que os produtos são escoados através do município de Santana, assim como a busca por atendimento de saúde e educação, unindo as duas fronteiras através dos rios e da cultura ribeirinha.

As lições que aprenderam com técnicos de órgãos como a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e o Instituto de Pesquisas Científicas e Tecnológicas do Amapá (IEPA), hoje fazem parte da rotina das famílias, que cultivam hortaliças e verduras orgânicas no quintal e criam frangos e outros animais que servem de alimento. Assim, também são tratados os problemas de saúde comuns, como resfriado e contusões sem gravidade, à base de terapia natural, com óleos de pracaxi, andiroba, copaíba, chás e infusões, tudo feito com plantas medicinais cultivadas nos canteiros ou encontradas na mata. Ainda hoje na comunidade os moradores recorrem às parteiras tradicionais e curandeiras.

Este lugar é procurado por instituições ambientais e de pesquisa, pela riqueza natural praticamente intocada que dispõe, facilitando a preservação de espécies da flora e fauna, e a descoberta de novos exemplares, a exemplo da Mormodes Ivanaluciae, coletada em 2015 pelos pesquisadores Patrick Cantuária e Tonny David Santiago e reconhecida em 2018. O nome, em homenagem à promotora de justiça do Amapá, Ivana Lúcia Franco Cei, é um raro exemplar de orquídea Mormodes, uma espécie que, no Brasil, tem pouco mais de 20 cultivadas. Foi esta equipe de pesquisadores que os técnicos do MP-AP acompanharam na expedição, resultando na coleta de um possível novo exemplar de baunilha.

A organização da comunidade do rio Maniva é o motor dos avanços ambientais que mudaram a vida dos ribeirinhos. A Associação de Desenvolvimento Intercomunitário dos Rios Corredor, Furo do Chagas, Maniva e Cutias (ADINCOCMA) está à frente do processo de evolução da conscientização ambiental e ousou abrir as portas para o aprendizado e desenvolvimento sustentável. Atualmente eles têm contrato com uma das maiores fábricas de cosméticos do Brasil, e para a Natura fornecem sementes de andiroba, ucuuba, murumuru e patauá, que viram produtos de beleza.

Geovanhi Facundes, presidente da Associação, relata que das 1.500 famílias dos quatro afluentes que a entidade abrange, mais de 300 estão inseridas no projeto de coleta extrativista, e na comunidade do rio Maniva, 28 famílias fazem a coleta. Um fato que chama atenção é que, do total de trabalhadores que catam sementes, 99% são mulheres. “Estamos batendo nossa meta de 2019. Do patauá, cuja meta era entregar 60 toneladas, já foram entregues 85. O trabalho extrativista é a segunda fonte de renda, a primeira é o cultivo de açaí, mas já está gerando outra atividade artesanal, que é a produção de sabão de andiroba, incentivada pela Embrapa”, declara Geovanhi.

Outro progresso sustentável é a solução para a falta de energia elétrica, e pouco a pouco os moradores substituem o motor à óleo diesel e as lamparinas por painéis de energia solar. O clima tropical e o sol intenso no verão alimentam os painéis que há um ano fazem parte da paisagem ribeirinha e se misturam com os açaizeiros. Com a energia, é comum nas casas o uso de modernos televisores e celulares, novidades adquiridas graças ao fruto do trabalho vindo do extrativismo e pescado, e a internet, disponibilizada pela Associação, conecta este pedaço de rio e mata com o mundo. “A renda da maioria das famílias permite que adquiram em parcelas os painéis de energia solar e tenham acesso à internet, facilitando o conhecimento e interação com outras experiências com produtos da biodiversidade”, disse Facundes.

“A organização e compromisso atraem pesquisadores e órgãos como o IEPA e Embrapa, que viabilizam alternativas para preservar a biodiversidade do rio Maniva – um verdadeiro laboratório da biodiversidade. Empresas também incentivam o uso sustentável e têm esta prática como marketing e diferencial. Como pesquisador venho sempre em busca de novas espécies, como a Mormodes Ivanaluciae, e de mais novidades que aqui se desenvolveram porque a natureza é pura e pouco explorada. Os moradores chegaram em um nível que cuidam para não haver desmatamento e extinção de plantas e animais, e isso é o resultado de um grande trabalho de conscientização e amor pela natureza”, avalia Patrick Cantuária.

“Conhecer um lugar como este, acende a esperança de que vale a pena acreditar que a humanidade pode viver de forma responsável e em comunhão com o meio ambiente. Não é somente a beleza natural, é uma energia que vem do trato das pessoas, que têm qualidade de vida, que vivem da natureza sem depredar, e esse conjunto é o que torna rio Maniva um encanto. Espero que esta experiência seja multiplicada”, disse a técnica ministerial Kézia Lucena.

“Sair da rotina e conhecer na prática o que só vemos em papel e na tela da TV ou do computador é a melhor aula que podíamos ter. Ouvir dos ribeirinhos e extrativistas as lições de vida, é um contraponto com nossa realidade diária de procedimentos de denúncias de crime ambientais. Vale a pena esta experiência”, falou a assessora Merilin Souza.

SERVIÇO:

Mariléia Maciel – Assessoria Operacional – CAOP/AMB
Assessoria de Comunicação do Ministério Público do Amapá
Contato: (96) 3198-1616
E-mail: [email protected]

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *