Discos que Formaram meu Caráter (parte 54) – Legião Urbana … “A Tempestade ou O Livro dos Dias” (1996) – Por Marcelo Guido

Por Marcelo Guido

Muito bem moçada estamos de volta, de dentro de nossa nave com muitos sons, riffs e melodias para todos vocês, amantes do velho e bom rock and roll.

Este viajante foi até os derradeiros anos adolescentes e trouxe na bagagem mais um excelente míssil sonoro para o deleite geral, estamos falando nada mais nada menos de “ A Tempestade ou O Livro dos Dias”, derradeiro álbum de Renato Russo e dos caras da Legião Urbana, palmas pra ele.

Já corria o ano de 1996, a retomada do rock nacional já era uma constante, tinha uma turma muito boa tocando nas rádios e a turma da geração 80 tinha tomado um gás e estava fazendo muito para retornar aos caminhos da relevância.

Neste contexto a turma da Legião que andava meio sumida, não lançava nada desde o excelentíssimo “Descobrimento do Brasil” de 93 (procura aí, já escrevi sobre esse disco), os fãs não tinham muita notícia dos caras, e Russo já tinha brindado o público com os excepcionais “The Stonewall Celebration Concert” de 94 e “ Equilíbrio Distante” de 95, mas o mesmo já tinha assegurado que a Legião não tinha acabado e que estava fazendo algo muito legal, vide entrevista no Vídeo Show da Globo.

Como já disse, ninguém sabia muito sobre a banda, mas hoje em dia através de livros e entrevistas as coisas não andavam nada bem com Fontman, o abismo linear construído por Renato com a bebida e outras já não estava muito largo, e o cara já começava a pagar um preço.

Assim sendo a turma se reuniu para gravar o álbum, e entre janeiro e setembro existiram as incursões ao estúdio, nasceria como uma ideia inicial de um disco duplo, mas pelo estado do cantor a tal trama foi logo abortada.

O trabalho viaja por vários estilos, como soul, blues e o velho e bom punk rock que lembra  a Legião do comecinho, Renato foi poucas vezes ao estúdio, gravou tudo de primeira e voltou apenas para gravar “A via Láctea”, realmente ele não estava bem.

São melodias e letras tortuosas, a cara do momento dele e realmente acredito ser o disco mais pessoal do vocalista.

Vamos dissecar essa bela bolacha e deixar de papo furado:

O disco começa com a porrada na cara chamada “Natalia”, que trata toda esperança e hipocrisia. “L`Avventura” titulo de um filme de Michelangelo Antonioni. “ Musica de Trabalho” , o dia dia constante a alegria que se tem com pequenas vitórias. “Longe do Meu Lado”, melancólica tradução de uma paixão. “A Via Lactea” soa como uma despedida, foi regravada por Ricky Martin. “ Música Ambiente”, experimental. “Aloha”, sofrimento excessivo. “Soul Parsifal”, leveza constante. “ Dezesseis”, pesada trata de suicídio, com direito a trechos dos besouros de Liverpool. “Mil Pedaços”, reconstrução . “Leila”, sem dúvidas uma das mais descontraídas. “ 1º de Julho”, composta para a Cássia Eller. “Esperando por Mim”, um reencontro, perdão e desculpas. “ Quando Você Voltar”,  o fim, despedida. “O Livro dos Dias”, descanso.

Que puta disco bom bichos, na moral se tu não conhece não perde tempo. Não teve show, nem turnê promocional e mesmo assim vendeu pra caralho. Tua medalha de foda corre um sério risco, vai atrás.

Ah, gravaram uma versão de “Dezesseis” em inglês, mas o técnico de som apagou. Infelizmente.

Este disco foi realmente muito importante pra mim e sem dúvidas para muitos de vocês que estão lendo sobre ele agora. Solidão, passado, amor, intolerância, injustiça e saudade tudo isso misturado como sentimento puro e colocados em letras e melodias, sinceramente apesar das circunstâncias não tinha como dar errado.

Renato Russo se recusou a tirar fotos para o encarte, o disco  teve a participação foda do Carlos Trilha que é algo realmente singular.

Apesar de não conter “Urbana Legio Omnia Vincit” a Legião Urbana venceu mais uma vez. E mesmo sem o lembrete, é obrigatório ouvir no volume máximo.

Parte das vendas foram doadas para instituições de caridade e grupos de auto ajuda, Dona Penha a cozinheira do estúdio teve o privilégio único de ouvir a capela “ Là Soletude”, cantada por um Renato, já muito fraco.

 Renato Russo partiu desse mundo 21 dias após o lançamento do disco, no dia 11 de outubro de 1996.

Deixou belos trabalhos como esse nesse país que é o Brasil, uma República Federativa cheia de árvores e gente dizendo adeus.

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