Rumo ao pó das estrelas – Crônica de Fernando Canto

 

Crônica de Fernando Canto

Como o silêncio é uma árvore dormindo e um oco à espera do desejo, expresso meu princípio e estratégia de beijar-te perante o fogo do amor e o som das palavras.

Não justifico esta vontade só pelo prazer de interpretar metáforas, pois tudo urge no rio em seu curso indômito, sobre o rosnar das águas que lhe arranham o dorso pétreo. É um compartilhamento perene de dons alimentados mutuamente depois de tantas estiagens e abruptas enchentes, desses vilipêndios que causamos pela nossa natureza, talvez humana.

Penso que um ciclo temporal da vida não satisfaz o beija-flor. Apesar da abundância de flores sequer ele dispensa primaveras.

O tempo abre caminhos que se estreitam ao sabor da gravidade. E os sulcos da epiderme onde outrora líquidos corriam, abrigam fótons de raios siderais e apenas lampejos de dores passadas.

O amor, então, não é fator de espanto, de risco ou substância para qualquer sobrevivência, antes é uma nítida energia que transforma as leis do tempo em furtivas estrelas.

Afirmo, pois, que o meu amor não é discurso que reduz insumos oriundos de sistemas prontos, não se mensura por linguagens de processos. Ele é fonte criadora, útil, nascida, morta e renascida da alquimia da alma, da música estelar que harmoniza a vida.

Eu beijo à reorientação do inesperado, porque o amor não colhe néctar diariamente nem se prende a primaveras ou solstícios invernais, é mais que uma tabela, uma equação, é a minha e a tua vontade em dois relógios atrasados na viagem que não planejamos ao rio, ao mar e às estrelas.

Eu conto com o cúmplice ardume do amor: a poesia. Eu trago a contemporaneidade do sonho: o pesadelo do futuro, o ambiente maltratado, a água impura. Eu vivo! Ora, eu canto a perplexidade da vida e a paradoxal ternura que há nesses caminhos que contigo andei e continuo andando, obstinado, rumo ao pó das estrelas.

  • Ave !
    O destino dos Poetas…que é cantar o amor…
    …e se canta o seu particularmente…
    O canta de uma forma Universal.
    O segue…uma fileira de aplausos felizes.

  • Que -literal e visceral – viagem. Carl Sagan diz que somos poeira das estrelas e que nossa composição bioquímica vem dessa “misturinha do cosmo”.
    Aí vem o Fernando e diz que a energia dessa misturinha é o amor, e que por ele se caminha (de volta) às estrelas.
    E de pensar nisso tudo, me sinto voltando pra casa, ao ler essa linda crônica.

  • Penso duas vezes antes de lêr as obras de Fernando, ele nos arranca do quotidianismo nos levando para uma realidade paralela, seus portais estelares disfarçados de livros nos faz conhecer mundos de outras dimensões….
    Vós sois um escritor ou o anfitrião de vossos portais?

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