Televisão: um destino traçado na minha infância – Por @WalterJrCarmo

Por Walter do Carmo Júnior

Era um desses domingos de 1962. O Natal estava chegando, mas ainda se respirava a conquista do bicampeonato mundial de futebol. O auditório da Rádio Marajoara estava completamente lotado. Calor intenso. Gritaria ensurdecedora de centenas de crianças. No palco, um menino dublava uma música do Jerry Adriani. Momentos antes, a menina que dublou Babalú, o mega sucesso de Ângela Maria, havia sido aplaudida de pé. Eu, que já havia tentado subir ao palco três vezes, sem sucesso, estava pronto para mais uma tentativa.

A apresentação do “Jerry Adriani” terminou. O volume dos aplausos anunciava que a briga pelo primeiro lugar seria disputadíssima. Aproveitei um descuido dos seguranças e subi ao palco. Fui segurado por um palhaço, que me carregou no colo e já se encaminhava para me colocar fora do palco, quando o animador interveio.

Agoooora vamos ouvirrrrr a opinião do Nequinho!

Fui passado para os braços de um outro palhaço, o Alecrim. Ele me colocou no chão e me pediu para descer, pois o palco estava muito cheio. Mais um golpe de sorte: fui convidado por uma assistente para participar de um show de mágica do grande professor Chamon. Fui conduzido aos bastidores com o coração aos pulos. Enquanto aguardava a apresentação, comecei a explorar aquele teatro. Entrei em um corredor, passei por uma sala onde um técnico operava os equipamentos, responsáveis pela transmissão do programa de auditório. Era um dos maiores sucessos da época. Os principais artistas locais se apresentavam ali. Havia muita brincadeira com a participação das crianças que lotavam o auditório da rádio na avenida Nazaré, mais ou menos onde fica hoje o Banco Real.

De repente, abri uma porta e saí nos fundos do teatro. Comecei a andar em direção à avenida São Jerônimo, hoje governador José Malcher. Os restos de cenários de programas, de carruagens, me chamaram a atenção. Entrei em um imenso estúdio, onde estavam montando um ringue, não sei ao certo se era para o Luvas de Ouro, que mostrava lutas de boxe ou para o Duelo de Titãs, de Luta Livre. Eram dois programas semanais apresentados pelo Ivo Amaral, um dos galãs da época. Ele também apresentava o programa Todos os Esportes, patrocinado pelo Guarasuco.

A emoção era muito grande. Em outro local, a Isis Oliveira, uma das estrelas da TV Marajoara, ensaiava um comercial. Naquele tempo, como não existia o vídeo-tape, muitos comerciais eram exibidos ao vivo ou através de slides com um locutor de cabine, lendo ao vivo os textos dos reclames. Os outros comerciais eram feitos em filme. Saí do estúdio atordoado, sem entender porque os operadores ficavam “abanando” as imensas câmeras. Tempo depois descobri que, para evitar que o tubo da câmera ficasse marcado, o operador era obrigado a ficar balançando a câmera.

Subi uma escada, passei pelo complexo exibidor e entrei numa sala, de onde vinha uma voz inconfundível na época: a do Pica Pau. Era a sala onde os filmes eram revisados. Alguém entrou lá e me viu sentado, fazendo um monte de perguntas para o operador. O desconhecido perguntou se eu sabia ler. Respondi que sim e ele pediu que o acompanhasse até uma outra sala, onde um grupo de pessoas estava ensaiando um auto de Natal.

Mandaram-me ler umas frases de um roteiro, rodado em mimeografo. Li as frases e fui aprovado no teste. Começava aí a minha paixão pela televisão. Participei do auto de Natal, dirigido pelo Cláudio Barradas, Contracenei, ao vivo, com o Lindolfo Pastana e a Carmem Eunice, espécies de Tarcisio Meira e Glória Meneses da época. Virei celebridade na escola.

Em seguida, peguei o papel principal em uma novela. A mãe do meu personagem dava a luz a uma menina e o pai, como não tinha condições de sustentar uma família grande, o doava para um grupo de ciganos que passava pela cidade. O dramalhão fez muito sucesso, mas o personagem cresceu e fui substituído pelo Lindolfo Pastana.

Aliás, a TV Marajoara abria um grande espaço na programação para a teledramaturgia. Às terças e quintas havia um programa chamado “Videorama”. As segundas, quartas e sextas, outro sucesso: o “TV Romance”. Tudo ao vivo e em preto e branco. Para isso, a emissora contava com um grande elenco: Nilza Maria, Mendara Mariani, Tacimar Cantuária, Iracema Oliveira e muitos outros. E possuía grandes realizadores como a Maria Silvia Nunes e a Maria Helena.

Fui escalado para participar de uma campanha patrocinada pelo Toddy. Quem comprasse o produto, preenchesse um cupom e fosse sorteado ganhava um uniforme completo dos Patrulheiros do Oeste ou do Zorro, duas séries de maior sucesso naquele tempo. Uma hora aparecíamos vestidos de patrulheiros. No outro comercial, vestidos de Zorro.

Para mim era tudo uma brincadeira. Mas pude testemunhar um trabalho apaixonante nos bastidores da TV Marajoara, canal 2, a única emissora de televisão do Pará na época. Não cansava de participar do programa do Nequinho e do Alecrim. Entre um ensaio e outro assistia ao hilariante desempenho do Armando Pinho. Até hoje não esqueço do Armando vestido de mulher, dublando a música “Querido Papai Noel” da Maria Regina Cordovil. Além de participar da “TV Comédia”, um programa humorístico escrito pelo Raymundo Mário Sobral, Armando Pinho comandava o programa O Mundo Alegre de Armando Pinho.

Aos domingos havia o “Notícias a Rigor”, reunindo um time de apresentadores vestidos com reluzentes smokes. Entre eles, José Maia, Ivo Amaral, Abílio Couceiro, Joaquim Antunes, Armando Pinho e o Habib Frahia Neto. O José Travassos fazia a narração em off do programa. O “Notícias a Rigor” seria o que hoje é o Fantástico .

Um outro grande sucesso daquele tempo era o Programa do Ubiratan D’Aguiar: Pierre vê, ouve e informa. Perambulando pelos estúdios vi um cantor desconhecido que me chamou a atenção. Ele cantava uma música engraçada que falava da paixão dele por um calhambeque. Ele estava sozinho num canto do estúdio aguardando para entrar em cena. Apresentei-me e fiz um monte de perguntas a ele. O nosso papo foi interrompido quando ele foi chamado para se apresentar no programa do Abílio Couceiro. O rapaz de violão azul e calça jeans Faroeste era, nada mais nada menos do que, o Roberto Carlos.

Catorze anos depois eu entrei para a TV Liberal, convidado pelo Ronald Junqueiro, editor do “Jornal Hoje”. Mas aí já é uma outra história que qualquer dia desses eu conto.

  • Tempos bons. Criança naquela época não tinha noção mas cresci vendo meu tio escutando a Rádio Marajoara e em 1969 minha mãe comprou televisor onde tive a felicidade de ver muitos programas, jornais e apresentadores da famosa TV Marajoara. Muita saudade desse tempo.

  • Tempos bons. Criança naquela época não tinha noção mas cresci vendo meu tio escutando a Rádio Marajoara e em 1969 minha mãe comprou televisor e tive a felicidade de ver muitos programas, jornais e apresentadores da famosa TV Marajoara. Muita saudade desse tempo.

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