Visitando Freud – Conto de Luiz Jorge Ferreira

Conto de Luiz Jorge Ferreira

Caminhei quase por toda a cidade, recém chegado de São Paulo. Agora eu conclui que Dr. Freud não é de muitos amigos.

Afora nós…refiro-me a meia dúzia de psiquiatras …Euler… Juraci Cruz…Max…Alcides Neves, e alguns outros …os de sua própria turma na Faculdade e os de conclusão do Curso de Especialização…poucos se lembram dele.

Engraçado…É na velhice que precisamos mais dos amigos que fizemos pela vida. Por carta, entre as tantas que trocamos…ele rebateu.

Precisamos dos amigos durante a vida toda. A velhice não muda isso…e complementou…sei que você não gosta dessa ideia…mas no fim estamos fadados ao esquecimento…

Engoli em seco.

Um Psiquiatra do Grupo existencialista de Viena, dissera…que permaneceríamos para sempre no Inconsciente Coletivo.

Animei e abasteci a caixinha de Rapé.

…certa vez me escreverá que minha obsessão pelo nome Luiz para todos os meus filhos, vinha calcado na tentativa de me sentir perpetuado para sempre, começando a dinastia dos Luiz’s.

Essas cartas estão lá em casa , em um baú.

Eu estou em Bruxelas na esperança de encontrá-lo…Enquanto atravesso uma rua sonolenta com um dos envelopes na mão onde carrego um mal traçado mapa que ele me enviou …

Recordo que por muitas vezes lhe confessei achar ter exagerado um pouco, em fincar os alicerces de sua teoria…na unidade das queixas de uma viúva, que só imaginava…digo sonhava, ser vitima de perseguições com fins sexuais…e a mim…contado pelo próprio Dr.Freud…havia sessões que ele deixava a viúva deitada no divã contando suas aventuras, e ia ao Saloon dali a poucas quadras onde era habitué cliente…

Fumar um Charuto Havana…e tomar um Absinto…confidenciara em certo trecho que a viúva era descendente Judia…e muito bem de vida, pois se tornará herdeira de uma fábrica de Maquinas de Costura…estas recém criadas, que revolucionaram a indústria de fabricação de roupas.

Ela sonhava…

Dr…recolhia dados para desenvolver sua teoria revolucionaria também…

Sorvia Absinto e mantinha o proprietário do Saloon e seus empregados sobrevivendo e progredindo…todos estavam bem.

Nesse ínterim…um pouco antes que eu chegasse a rua Fauno.

A Senhora Daguirre…pontual como em todas as vezes anteriores, entrou com chave que possuía na Casa Consultório do Dr.Freud…porque o chamará varias vezes, e não obtera resposta.

Provavelmente havia saído, quem sabe devesse ter ido a Charutaria renovar seu estoque…o Dr apreciava demais aqueles charutos fedorentos cujo o cheiro ela detestava.

Ele dizia terem sido fabricados um a um… manualmente…com o mais puro tabaco que pudesse existir, muito longe dali, em uma ilha afrodisíaca…repetia com ênfase…e trazidos via marítima…cuidadosamente…

A Senhora Daguirre fez um gesto quase teatral sinalizando repugnância…aff!

Ela gastava muitas garrafas de um desinfetante Polonês…de nome Flores do Campo para tentar disfarçar o cheiro forte que os charutos fumados deixavam pela casa…uma simpática casa de meia água, onde o Dr. instalará seu Consultório há quase oito anos.

Ela saiu de seus pensamentos…olhou entre as duas folhas da porta, entreabertas…que davam passagem para a sala onde ele atendia.

De lá vinham conversas, risos e exclamações em Francês.

Foi em silêncio…pé ante pé, e olhou.

Era a cliente rica…Sarah.

Estava deitada de olhos fechados no divã…o único da sal, afora a estante repleta de livros e a cadeira de palinha traçada, de duplo apoio para os braços, cadeira na qual o Dr….ficava escutando horas a fio aos seus pacientes, o cinzeiro, a caixa de charutos, e ao lado um acendedor de cigarros de pedra e rebite.

Duas quadras além, eu entrei no Saloon, nome dado ao misto de bar e Charutaria, guiado pelo mapinha…havia acertado o caminho.

Bem na hora que o Dr. Freud meteu a mão no bolso esquerdo do Paletó com a sua mão direita e retirou um reluzente relógio de Algibeira…imaginando que aquela mesma hora a sua cliente que ele deixará narrando sua epopeia de perseguições, empurrões, bulinamentos, barulhentos beijos roubados de si por um desconhecido fedendo a whisky na escuridão do vagão dormitório do trem Budapest-paris…havia chegado.

Acenei levemente…assim que ele me reconheceu…se aproximou para os cumprimentos de praxe.

Pensei comigo…então ele calcula no relógio o fim das sessões…a hora que ela chega a viajando na fantasia a Paris.

Fomos para seu Consultório.

A Senhora Daguirre que por muito tempo cuida da arrumação da casa e limpeza, disse-me algum tempo depois que assim foi que conseguiu identificar que ela desceu na Estação em Paris…

Então deposita, visível a quem de longe olhar…seu grande Chapéu enfeitado com pena azulada…sobre um extendedor de tapetes.

Para sinalizar que vá.

Tomamos vários Conhaques conversamos sobre Dante Alighieri e mais a noite eu deitei no Divã para passar a noite e cheguei antes do fim da semana a Portugal…

Freud me levou em uma pequena Carruagem muito em moda entre os ilustres até o Porto.

Prometi a mim mesmo escrever um texto sobre a minha visita a Bruxelas.

Mas o tempo foi passando…

Vez por outro encontro o recibo de uma passagem de trem Bruxelas-Paris …e me questiono…como isso veio parar aqui?

*19.08.2021 – Osasco (SP) – Brasil.

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