A fábrica de best-seller – Crônica de Ronaldo Rodrigues

Crônica de Ronaldo Rodrigues

A consagrada escritora de livros infantis, com um sorriso que quase chega a ofuscar os flashs das câmeras fotográficas, desfila à luz dos holofotes da fama. É a noite de autógrafos de seu quinquagésimo oitavo livro, que deve seguir o caminho dos anteriores: se transformar em best-seller, sucesso total de crítica e público.

A escritora de livros infantis está esfuziante em seu vestido de pedras preciosas. Agora, sentada em sua mesa florida, ela distribui autógrafos e simpatia entre seus milhares de leitores. Apesar de ter crianças como público-alvo, sua literatura atrai pessoas de todas as idades. As quinze secretárias e os trinta e cinco garçons transitam pra cá e pra lá na gigantesca mansão da escritora, atendendo imprensa, convidados e penetras.

Após o festejado evento, onde houve distribuição de comidas e bebidas da melhor procedência e discursos das maiores autoridades da cidade e do mundo literário, vamos encontrar a grande escritora de livros infantis em seu gabinete. Longe do glamour que a cercou por toda a noite, ela se despe de seu vestido de pedras preciosas, veste uma bata simples, pega um cesto, onde estão algumas migalhas do que restou do farto coquetel, e se dirige ao porão de sua mansão. É lá que ela encontra um batalhão de crianças acorrentadas, diante de computadores, digitando alucinadamente. São elas as verdadeiras autoras das histórias lançadas regularmente e com as quais a escritora obteve o reconhecimento de toda a indústria editorial.

Com os olhos brilhando de satisfação cada vez que escuta o som de notificação de pix chegando ao seu celular, a consagrada escritora passa a distribuir as migalhas entre as crianças.

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