Crônica de Ronaldo Rodrigues
Daqui a pouco vou levantar desta cadeira, abrir a janela e gritar para o tráfego que corre lá embaixo, na avenida, que já raiou a liberdade no horizonte do Brasil.
Daqui a pouco vou afrouxar a gravata, arregaçar as mangas, abrir a porta com um chute e sair correndo até a rua, por todas as ruas, em busca do bar perfeito, que é exatamente o imperfeito.
Daqui a pouco vou adentrar o paraíso e o purgatório onde me aguardam as piadas mais infames e grosseiras, lado a lado com os comentários mais sagazes e coerentes.
Daqui a pouco vou gozar o direito de ir e vir aos botecos & bares & valas & esgotos & espeluncas & inferninhos.
Daqui a pouco vou usar minha liberdade condicional, com a condição de voltar para a prisão totalmente embriagado.
Daqui a pouco as borbulhas de cerveja que nascem no fundo do copo irão explodir no meu cérebro justamente no momento em que eu der a tacada mortal na bola de bilhar.
Daqui a pouco vou pegar o regime semiaberto, escancarar o regime, fugir para sempre de tudo e de todos e, na segunda-feira, me resignar e voltar para a prisão do escritório.
Daqui a pouco, bem pouco, vou acionar a lista dos meus contatos para dar início à grande rebelião. Mas só daqui a pouco.