Poema de agora: Fica no meu quarto – Carla Nobre

Teto da Capela Sistina, de Michelangelo

FICA NO MEU QUARTO

Amor, o mundo deve acabar hoje
Fica no meu quarto que é lugar seguro
As coisas funcionam assim
Há bilhões de anos
Milhares de estrelas nasceram
Isso não é mistério
É ciência, critério divino, big ben
Não sei ao certo
Mas ficaram espalhados planetas e constelações
Como se o céu fosse um enorme tapete arpoador
Tudo isso é perigoso lá no céu, amor
Vê que ainda hoje
Vênus e marte nascem todo fim de tarde
Numa luta estelar pela lua
Que ora sorri enorme
Ora fica miúda como se fosse chorar
E ora some, com medo de amar
O mundo acaba hoje e ainda não se deu conta
Do amor que a gente faz
Tenho medo que ele se aborreça
E te roube para a eternidade
Essa coisa de explosão do nosso amor
que o mundo nunca terá


Porque você só explode no meu colchão
Isso tudo vai deixar o céu mordido de inveja
Fica no meu quarto, amor da minha vida
Que eu te faço um suco de graviola
Te deixo dormir cedo
mesmo com aquele perfume barato do infraero II
amor, esse negócio de você ser de áries
com ascendente em câncer,
meio do céu em áries de novo e lua em peixes
não vai te impedir de morrer
fica no meu quarto que o mundo acaba hoje
nem tudo que a gente vê no céu é estrela, amor
a gente confunde sentimentos, confunde astros
confunde tudo, quando o coração se parte
fica no meu quarto como se o mundo fosse
apenas esse mau elemento de saturno
uma nebulosa perdida com mais de 4 graus
escuta amor, o mundo está acabando
e eu tenho talento para feitiços medievais
conheço tuas vidas passadas, teus vales abissais
as coisas funcionam assim, amor


o mundo acaba hoje e a gente divide um cigarro caseiro
nesse banzeiro de brigas e beijos
afinal, chegamos ao século XXI, amor
o mundo só quer mesmo descansar
e ser essa enorme imensidão para amar

Carla Nobre

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