Poema de agora: Flutuante – Luiz Jorge Ferreira

Flutuante

Eu me lembro do calção encardido de açaí do Sussuca…extendido no limite do Mundo.
Eu me recordo das duas marcas sinuantes como rastros de serpentes, das rodas da bicicleta Merckswissa do Alceu.
E da fome atroz das Pipiras roendo cajus verdes, eu me lembro do dor d’olhos na imagem de São Benedito…na Capelinha do Laguinho.
Eu me lembro de mim…Gitinho…olhando para mim e perguntando para mim…Que Queres?

Foto: Blog Porta Retrato

Eu me lembro do Sol bebendo água no Pacoval…e a minha alma de cócoras, torcendo para que uma Mutuca ferrasse o dorso dele. Eu me lembro da minha sombra correndo atrás de mim e perguntando…
Tu acreditas em amor?
Eu amo a lua…
E eu respondendo…eu acredito em noite nua…
Que roupa ela veste?…perguntei.
É tecido de chita que ela usa para ficar mais bonita…e ela pega lá nas lojas da Doca da Fortaleza?
Eu acho que ela ama a Fortaleza. Admira a coragem dos passarinhos que pousam próximos aos seus canhões.
Eu me lembro de achar que jesuíta era um Padre que vinha por os índios em fila para apresenta-los a Jesus…

Foto: Wonders Brazil

Tu sabes onde moram as estrelas ?
Depois da mata dos Tucanos coloridos do Curiaú…
Sombra….sabes porque amas a lua…
Porque jogas por terra teus sonhos, assim que banhas.
Vamos passar pela Ernestino Borges…vamos até a venda de Bill pefir que Neusa nos leia a mão…
O cego que pede esmolas lá na Padaria do Seu Oswaldo…as leu…
O que ele disse não lembro …estava chovendo e levei a sombra para dentro da casa de titia Benedita…
A única que acredita que Deus é brasileiro.
Lá fora…dentro do olhar sem luz do cego que acredita enxergar o futuro o barulho das moedas agitadas dentro da cuia vazia ecoa.

A vida tropeça na sombra que ele arrasta que é a mesma que me convence que a lua ama a escura noite para ser notada sobre a luz dos pirilampos que esvoaçam atônitos com a beleza dela.

Sombra….Deixemos de andar a esmo…convide Pedro…chame Seu Rô…assuste Quincas…
Cubra o Sol com um pano rendado e com um anzol estrovado pesque restos de lembranças boiando no Matapi …e as traga até aqui, para o embevecimento do menino …
Que arrasta a sombra pelas marca feita ali pelo destino.
Embriagado de alegria…
Perambula…pela ilharga ímpar das costelas magras…desta tal de vida.

Luiz Jorge Ferreira

*Do Livro “Diante da Boca da Noite…ficam os dias de dias de Ontem” – Osasco (SP) – 10.10.2021

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *