Poesia de agora: Chutando Poeira – Luiz Jorge Ferreira

Chutando Poeira

Eu moro em uma casa de madeira ‘velha em folha’.
Na terceira telha, uma goteira, espia, e goteja.
Derrama no chão, lágrimas paridas no exílio, por Saturno, Urano, e Platão.
Eu tenho um grito gelado que não ultrapassa as telhas.
Apenas chia junto as ondas do Rádio a pilha.

Eu tenho no quintal insosso, um cão pele e osso.
Que uiva para o cântico assexuado das filhas de Maria.
Eu tenho dois vizinhos Pastores Americanos do Norte.
Eles têm um Papagaio que em inglês xinga os ateus.

A noite o som da Rádio Educadora de Macapá.
Comunica em Latim que Deus dorme.

Eu fecho o olho, e cuspo o outro no ralo do banheiro.
Apago as pegadas do medo cicatrizadas no corredor.
E se tenho fome mastigo saliva.
E engulo os sabores que esteja afim.

O Governo Federal em Janeiro paga aos funcionários, em prestações.
Eu me alimento a prazo.
Dentro de casa sou Rei.
Só saio Domingo para a Matinê do Cine Macapá.


Fora de casa, mora o ano de 1964.
Chato, enjoado, malvado, fardado.
Eu chuto o bruto, com os meus sapatos Vulcabras.

Bar Gato Azul – Foto encontrada no blog do jornalista João Silva.

Volto cansado, pés machucados da areia da rua.
Apaixonado pelas estrelas embriagadas, sentadas na escada do Bar Gato Azul.
Agora sou Maciste, sou Ringo, sou o Zorro, sou Roy Rogers.
Tenho um cavalo Branco, que relincha em Inglês..
E uma enorme casa de madeira velha em folha.
Que só cabem dois heróis, a minha mãe…e eu.

Luiz Jorge Ferreira

  • Luiz Jorge pega a enxada das recordações e cava funda a saudade.
    Macapá vive. APENAS o cine ficou mudo.
    O filmes foram morar pras bandas de Belém ou de São Paulo?

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