Mazagão Velho, a cidade que atravessou o oceano, completa 254 anos – Crônica/resgate de Elton Tavares

Mazagão Velho – Foto: Gabriel Penha. Ruínas de uma igreja construída no século XVIII – Foto: Hélida Penafort Mazagão Velho, no frame de vídeo (documentário em produção) cedido pelo amigo Aladim Júnior Antigo cemitério de Mazagão Velho, no frame de vídeo (documentário em produção) cedido pelo amigo Aladim Júnior Prefeitura de Mazagão – Foto: Elton Tavares

Crônica/resgate de Elton Tavares

Mazagão Velho completa 254 anos de fundação hoje (23). A minha família paterna veio do Mazagão, não do Velho, mas do “Novo” (que não tem nada de novo). Bom, vou falar um pouco da cidade e depois da relação do local com o meu povo.

O município de Mazagão tem uma história peculiar, rica em detalhes sobre o Amapá. Mazagão foi fundada porque o comerciante Francisco de Mello pretendia continuar com o comércio clandestino de escravos, mas pressionado pelo governador Ataíde Teive, resolveu cooperar, fornecendo índios para os serviços de construção da Fortaleza de São José, na capital do Amapá, Macapá.

Foto: Gabriel Penha

Em retribuição, foi anistiado e agraciado com o título de capitão e diretor do povoado de Santana; mas, por conta de uma epidemia de febre, que acometeu os silvícolas, foi transferido para a foz do Rio Manacapuru, e, pelo mesmo motivo em 1769, para a foz do Rio Mutuacá.

Em 10 de março de 1769, D. José I, Rei de Portugal (POR), desativou a cidadela de Mazagão, na então colônia do Marrocos (MAR); eram 340 famílias sitiadas pelos mouros. Elas foram transferidas para Belém (PA). Para alojar estes colonos, o governador mandou construir um povoado às margens do Rio Mutuacá. Em 7 de julho de 1770, começaram a ser transferidas 136 famílias para a Nova Mazagão, hoje cidade de Mazagão Velho, como já se denominava o lugar, pois desde o dia 23 de janeiro de 1770, havia sido elevado à categoria de Vila.

Acervo familiar.

Na verdade, meu saudoso avô paterno, João Espíndola Tavares, nasceu na região do alto Maracá, no Sítio Bom Jesus – localidade de difícil acesso. Para chegar ao local, as embarcações precisavam passar por muitas cachoeiras do município de Mazagão. E minha santa vó, Perolina Tavares, bisneta do senador do Grão Pará, Manoel Valente Flexa (que foi manda-chuva em Mazagão, no tempo em que lamparina dava choque), também nasceu naquelas bandas. Ah, meu vô foi prefeito do Mazagão (preso pelo golpe de 1964, a então “revolução”).

Lá eles namoraram, casaram e constituíram família. Meu pai, Zé Penha e meus tios Maria e Pedro, nasceram no Mazagão. Os filhos mais novos do casal, Socorro e Paulo, nasceram em Macapá, onde minha família paterna é uma das pioneiras. Meu avô partiu em 1996 e meu pai depois dele, em 1998. Mas a família Tavares preserva a dignidade, o respeito e a amizade – fundamentais para a vida – aprendidos no Mazagão e trazidos para a capital amapaense.

Eu, com vó e vô. Gratidão! – Mazagão (AP) – 1978

Quando criança, fui ao Mazagão, mas não tenho essas lembranças na cachola dessa época. Retornei ao município em 2009, quando meu avô foi homenageado na Loja Maçônica da cidade, por ter sido um de seus fundadores. Depois, em 2010,  para cobrir a Inauguração da Ponte sobre o rio Vila Nova, na divisa da cidade com a vizinha Santana. Em 2012, para a cobertura do aniversário de fundação da antiga vila e em 2022, quando nos despedimos de nossa matriarca, a vó Peró, ao jogarmos suas cinzas no Rio Mutuacá.

É, minha família paterna veio do Mazagão (na década de 50). De lá trouxe uma nobreza que admiro e muito me orgulho. Não sei explicar a sensação de ir lá, mas a senti todas as vezes. Parece um lugar em que já estive há muito, muito tempo. Quem sabe noutra passagem por aqui. Do que tenho certeza, é que tais raízes nos deram muita cultura, histórias legais e respeito às tradições. Meus parabéns, Mazagão!

Arte: Secom/TJAP

*Este texto, atualizado para hoje, é parte da monografia que escrevi para o meu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) de Comunicação. E também é um entre os 60 escritos do livro “Crônicas de Rocha – Sobre Bênçãos e Canalhices Diárias”, de minha autoria, lançado em 2021.

Ainda sobre Mazagão Velho, assistam a reportagem do programa “Repórter da Amazônia | Mazagão”:

  • Riquíssima a história de Mazagão…de entremeio ascendentes do Elton…
    👏🏽👏🏽👏🏽👏🏽

  • Mazagão Velho, pela sua rica história e tradições deveria ser mais conhecida no Brasil, não apenas como objeto de estudos, mas pelas diversas festas que lá existem além das cavalhadas de São Tiago e o teatro de rua representativo da odisseia que antecedeu a vinda das famílias portuguesas de Marrocos para a Amazônia.

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