CABA NO BICO (Fernado Canto)

Por Fernando Canto

Certa vez, no sítio de um amigo nas terras quilombolas do Curralinho, acompanhei a professora Raquel fazendo um dos mais difíceis pratos da gastronomia nordestina: a buchada de bode. Foram aproximadamente quatro horas de trabalho até a refeição deliciosa esperada por todos os que ali se encontravam, num sábado ensolarado.

Nessa feitura entre o tempo e o desejo angustiado da água na boca a professora assobiava uma antiga modinha do cancioneiro popular. Então veio o comentário infeliz: “ah uma caba nesse bico”. Ela redarguiu com toda a calma: “por que quando a gente assobia sempre dizem isso”? E completou: “eu assobio porque estou feliz”. E continuou seu trabalho, deixando o interlocutor perplexo com a resposta.

Assobiar porque se está num estado de felicidade… Que frase mais bonita, solta em uma época em que é cada vez mais raro encontrar alguém assobiando na rua ou silvando por aí sem incomodar as pessoas. Assobiar não é tão somente soltar um som agudo, exprimir irritação vaiando algo ou alguém, mas a expressão pura da alma ao manifestar a alegria. A mata assobia, o rio assobia, a natureza lança com o vento sibilante sua forma manifesta de nos avisar sobre alguma coisa que vem.

A cultura amazônica deixa na figura fantástica da Matintaperera a inesquecível marca de um assobio que incutia o medo às criancinhas, através de uma melodia simples plenamente associada a essa lenda. Até hoje lembro a melodia que minha mãe assobiava para chamar a Matinta, que era uma velha fumante de cachimbo e que exigia tabaco dos que se arriscavam na floresta densa.

Lendas à parte, o desejo do outro de transformar a alegria do assobio em dor labial, posto que a caba (do Tupi kawa) é um vespídeo temível (um marimbondo de peçonha forte, que tem uma ferroada de fazer inchar a pele de qualquer cristão), é uma reprimida vontade que vem à tona quando a alegria do assobiador se manifesta. É impressionante como as pessoas dificilmente evitam dizer ou pensar a frase infeliz. Não é que eu pense que isso seja apenas uma ação ou um pensamento sádico, mas parece que o propósito – inconsciente ou não – é atrapalhar a felicidade do outro ao desejar uma grande dor causada pela ferroada do inseto. É uma coisa que já está calcificada em nossa memória coletiva, como se quiséssemos também ser felizes e não pudéssemos por pura incompetência ou inveja; como se quiséssemos também a própria dor transferida num processo amargo e masoquista, um castigo desejado pelos nossos mais recônditos pecados cometidos e acumulados pela vida. “Ah uma caba nesse bico” também exprime a uma espécie de rancor contra o inseto que apenas se defende naturalmente se provocado. Já vi casos de moleques que esperavam pessoas passarem perto do ninho de caba para atirarem pedras com baladeiras; li relatos de igrejas e casas que se incendiaram durante a queima de ninhos e conheci vítimas da peçonha da caba tatu. Disseram-me que a dor é terrível. Imaginemos então o ferrão de uma caba de igreja na boca de alguém. E o inchaço seguido. Possivelmente uma pessoa alérgica morreria em algum lugar sem assistência médica como a maioria dos lugares dessa Amazônia imensa.

A simples resposta da professora Raquel ensina a lição do calar-se diante de uma poética expressão de felicidade. Remete, sobretudo, para a necessidade de penetrar a fundo nesse arcabouço de preconceitos que herdamos coletivamente em nosso inconsciente. E nos faz refletir que o assobio é um estado de espírito que poucos alcançam quando seus bicos soltam melodias para encantar o mundo. Experimente assobiar uma música e seja feliz nesta páscoa.

Luxo e pobreza no rock, dois músicos praticamente da mesma geração, mas com destinos cruelmente opostos

Por Álvaro Pereira Junior 

Um trabalhava nas madrugadas como frentista, era anoréxico, tornou-se músico sem estudo formal, virou ídolo (pelo menos de outros músicos), tem horror ao mundo corporativo das gravadoras e, agora, afundado em dívidas, precisou pedir dinheiro aos fãs pela internet para pagar o aluguel atrasado.

O outro tem origem de classe média, cresceu saudável, frequentou faculdade de música, criou um selo próprio para lançar o primeiro disco, sempre fez tudo sozinho, ganhou um Oscar e hoje mora em uma mansão envidraçada nas montanhas de Los Angeles.

O primeiro é o inglês Vini Reilly, 59, líder e guitarrista da banda Durutti Column (não se sinta ignorante se não conhecer -99,9999% da humanidade estão no mesmo barco). Seus discos, sem exceção cultuados por especialistas de todo o mundo, sempre venderam muito pouco.

O segundo, quem viu a entrega do Oscar 2012 talvez se lembre, é o americano Trent Reznor, 47, líder da banda Nine Inch Nails e autor da trilha sonora de “A Rede Social”, pela qual foi premiado pela Academia. Sucesso de crítica e público (pelo menos no mundo do rock alternativo), já vendeu 16 milhões de CDs.

São praticamente da mesma geração, mas tiveram destinos cruelmente opostos.

Vini é filho do pós-Guerra. Como tantos de seus contemporâneos e conterrâneos do rock, não frequentou “art school”, aprendeu nas ruas o muito que sabe.

Trent, não se pode dizer que tenha sido criado a pera com leite, mas, em comparação à dureza da infância e adolescência de Reilly, é um perfeito filhinho de papai.

O som de Vini Reilly, primordialmente um guitarrista, costuma ser chamado de pós-punk. Mas essa é só uma definição cronológica. Musicalmente, ele não tem nada a ver com as outras bandas desse período. Durutti Column incorpora os violões do flamenco, alguns climas de jazz e de música ambiente. É um esforço e tanto chamá-lo de rock.

Sobre a música de Trent Reznor e seu Nine Inch Nails, não há dúvida. É rock, da vertente industrial. Violento, confessional e fortemente baseado em sintetizadores. Vi o grupo em início de carreira, nos EUA, em março de 1990. Os músicos trocavam socos entre si e tratavam a plateia a golpes de correntes e cusparadas de cerveja.

Ambos, Vini Reilly e Trent Reznor, são absurdamente talentosos. Topei com os dois, metaforicamente, no começo do ano.

Com Trent, em um perfil publicado na revista “New Yorker” de 17/12/2012. Com Vini, lendo, nos primeiros dias de 2013, o blog de música do diário inglês “Guardian”.

A reportagem da “New Yorker”, assinada por Alec Wilkinson, faz uma radiografia detalhada de Reznor. Mostra que ele foi o primeiro a introduzir melodia na aspereza do rock industrial. E que também foi pioneiro nesse gênero ao atuar como “frontman”, face pública de uma banda. Até então, o rock industrial, de origem europeia e com forte influência marxista, rejeitava o individualismo.

O post do “Guardian” sobre Vini Reilly era tristeza pura. Relatava como um sobrinho do músico, para o tio não ser despejado, entrou no site oficial da banda pedindo doações. A mobilização foi imediata.

Em poucas horas, o sobrinho voltou a fazer contato, dizendo que já tinham arrecadado R$ 9,5 mil e não era preciso mais mandar dinheiro.

A história de Reznor é tumultuada, principalmente pelos problemas que teve com cocaína e heroína. Mas é uma história de showbizz, como tantas que se conhecem nesse meio.

Já a de Reilly é absolutamente incomum. Para começar, ele não conseguia aceitar a ideia de ter seu trabalho em lançamento comercial.

Quando um dia foi visitar a sede da gravadora Factory e viu seu primeiro álbum sendo embalado (por ninguém menos que o pessoal do Joy Division, que era do mesmo selo e dava uma força ao amigo), saiu correndo de pavor.

Também era, e é, dono de uma autocrítica incapacitante. Considera todos os seus álbuns -com exceção de “Keep Breathing”, de 2006- fracassos musicais.

Reznor esbanja vigor físico. Reilly se recupera de três acidentes vasculares cerebrais nos últimos dois anos. O americano enxergou um caminho relativamente suave em meio a um gênero musical essencialmente abrasivo.

Ironicamente, o inglês, de matriz musical mais plácida, mergulhou em abismos que ele próprio criou.

Trent Reznor se vira sozinho. Torçamos por Vini Reilly.

Jornalista com gosto


Gosto de ser jornalista.

Gosto dessa coisa de não ter rotina. Gosto da surpresa. Do imprevisível. Gosto da rua. De andar, de olhar. De ouvir. Gosto das coisas belas e das feias também. Gosto de gente.

Gosto do frio na barriga. Gosto do gosto de primeira vez pela milésima vez. Gosto das boas histórias para contar. Das boas histórias para lembrar.

Gosto de imaginar o que o leitor achou, se refletiu, amou ou odiou.

Gosto da dúvida. Gosto de questionar. Desconfiar. Gosto do desafio de sentar e escrever. Gosto de pensar como é que eu começo essa porra. Gosto de não saber como terminar.

Gosto de não me conformar. Da inquietação que me faz andar.

Gosto do cheiro de café. Gosto do jornal fechado, do jornal folheado. Gosto do bar. Dos amigos. Gosto da conversa fiada. Da piada. Gosto dos dias alegres e dos cheios de melancolia também.

Gosto de trapacear o destino. Gosto de reclamar. Caraca, como eu gosto de reclamar.

Gosto de ficar desgostoso com a minha vida de jornalista e logo depois achar tudo muito gostoso outra vez.

Meu comentário: Duda Rangel disse tudo. Só quem vive dentro de uma redação, com horários de pautas, correria, apuração e construção da informação sabe como essa profissão é penosa e fascinante. Eu amo o que faço, assim como os colegas. 

A graça feminina ( Dan Alves )

Por Dan Alves 

Por um bom tempo se fez acreditar que o homem era um ser engraçado, que por natureza tinha o poder do riso. O sujeito se obrigava a ser irreverente, forçando a barra em busca da gargalhada da fêmea.

Até hoje muitos homens se perdem tentando fazer uma mulher sorrir, o caminho é árduo e bem perigoso. Pode-se estar no céu e despencar ao inferno com uma simples piada de loira.

Na verdade, creio que a comédia nunca foi privilégio de homens, somos palhaços porque estamos a um tempão tentando maquiar nossas imperfeições com o riso.

As mulheres já acumulam nas costas anos de piadas sem graças de amigos, namorados e esposos. Podem até não proferir anedotas aos quatro ventos, mas são ótimas juradas das besteiras masculinas.

Com o tempo as mulheres aprenderam a ser espontâneas, o que os rapazes ainda desconhecem.

Em mim não existe a ditadura do homem engraçado, gosto também de mulheres que me fazem rir.

Aquelas que têm uma piada na ponta da língua, que dramatizam situações engraçadas para os amigos rolarem de rir, que quando bebem algumas doses, sobem a mesa e fazem todos lagrimarem de tanta bobagem.

O homem se perdeu enquanto a mulher ganhou o time.

Desoprimam o riso. Libertem a piada. 

DISCORDANDO DE ADORNO E HORKHEIMER

Por Adnoel Pinheiro 

Em seu ensaio “o iluminismo como mistificação das massas” os pensadores da escola de Frankfurt Theodor W. Adorno  e Max Horkheimer  cunham o tema da indústria cultural  através de criticas mais acintosas. Afirmam que a cultura contemporânea a tudo confere um ar de semelhança, ou seja, as nossas formas de reprodução técnica da cultura acabam por propiciar a sua repetição, deixando tudo semelhante e corroborados a isso estariam os meios de comunicação de massa que estão harmonizados entre os seus setores. 

Seguindo o tema chave abordado pelos autores que é a “Indústria Cultural” podemos fazer um paralelo reflexivo sobre a arte como mercadoria na contemporaneidade e nos permitir discordar em alguns aspectos da visão radical dos autores. Apesar de sabermos que a indústria cultural é algo inerente à cultura pós Revolução Industrial, o objetivo desse texto não é abordar a cultura de modo geral, pois iríamos ter que contextualizar bastante, então irá enfatizar a música e especificamente o Rock and Rool, gênero que tenho muito apreço.

Os pensadores Adorno e Horkheimer acabam por afirmar que os acontecimentos relativos à indústria cultural não decorrem exclusivamente da vontade dos que controlam ou fazem parte desses meios e técnicas, mas, também do público em geral que aceita esses fatos sem oposição. Partindo dessa afirmação podemos discordar dos pensadores, pois se pegarmos os movimentos de resistência, mídias alternativas como: blogs e canais diversos no ciberespaço podem elucidar que o público em geral nem sempre é passivo aos fatos relacionados à indústria cultural, desta forma estaria havendo uma generalização e exagero por parte dos pensadores e certa radicalização em seus pontos de vista.  Se o advento da indústria cultural não existisse ou se passarmos a vê-la com algo ruim como colocada pelos autores Adorno e Horkheimer não seria possível a divulgação de bandas de rock na forma que a conhecemos, a distribuição em massa da música ficaria comprometia e por seguinte deixaríamos de conhecer o trabalho de vários artistas, não só no ramo musical, mas na literatura, teatro, artes plásticas etc.

A indústria cultural se encarrega da distribuição em massa da cultura a qual os pensadores afirmam sem autenticidade. Essa distribuição técnica envolve não só a arte, mas também a política. Essa autenticidade é impossível com a distribuição em série, pois a cópia coloca o original em situações inimagináveis. Mas se analisarmos por outro ponto de vista, diferente de Adorno e Horkheimer, essa “cópia” sem aura alcança lugares também inimagináveis e públicos que jamais teriam a oportunidade de ver ou adquirir uma verdadeira obra de arte clássica, dando a oportunidade a nações, sociedades, lugares de conhecerem objetos culturais que talvez sem essa difusão em massa jamais tivesse a chance de conhecer. Esse é um ponto positivo a se ressaltar no processo de distribuição técnica da arte. Hoje temos a televisão, rádio, internet e as revistas especializadas em música que é o tema principal desse texto. Esses conglomerados midiáticos formam um gigantesco sistema de difusão da informação e comunicação nos trazendo a todo o momento informações sobre artistas, bandas e eventos culturais.

Os pensadores afirmam que tudo que é feito hoje já foi feito anteriormente e que na indústria cultural não existe autenticidade, e sim o equivalente estético da dominação. Mais uma vez nos permitimos discordar de tal afirmação dos teóricos, pois a própria indústria cultural acaba por beneficiar alguns artistas e bandas de rock na elaboração de materiais mais autênticos através da mistura de sonoridades e influências de décadas anteriores postas em prática hoje em dia. Feito isso, os consumidores de arte ao se depararem com essas múltiplas influências exercidas pelos artistas tendem a buscar e conhecer o que e quais as influências que norteiam a arte de seus ídolos. Isso acaba sendo um ponto positivo no resgate da sonoridade de décadas anteriores onde a indústria cultural não se fazia presente com tanta intensidade a qual se faz hoje. 

Não há duvidas quanto as inúmeras e brilhantes conclusões as quais, Max Horkheimer e Theodor Adorno chegaram na elaboração do texto “o iluminismo como mistificação das massas”. A indústria cultural, a serviço do sistema capitalista, utiliza-se de diversas áreas, principalmente, das artes e da política para manter a dominação de uma burguesia privilegiada sobre um fragilizado e estigmatizado proletariado. A tão sonhada liberdade, que se acreditava, seria talvez alcançada com o advento do pensamento racional dentro da corrente iluminista, e não se concretizou; ao contrário agora se observa uma forma de fascismo, este, no entanto mais sutil e mais incisivo, perceptível no poder concedido pelos autores à indústria cultural. Esse poder, não corresponde a nossa realidade. A teoria hipodérmica, muito perceptível nesse texto dos autores da escola de Frankfurt, atualmente não se mostra muito prestigiada, principalmente após estudos feitos, pautados não na emissão da mensagem e sim na recepção.

A indústria cultural tem sim seu poder, que se dissemina através das mídias transformando a cultura e a arte mais palpáveis, mas vale ressaltar que esse poder não é absoluto em seus efeitos sobre a massa. 

                                      REFERÊNCIAS

ADORNO, Theodor e HORKHEIMER, Max. A indústria cultural – o iluminismo como mistificação das massas. In: Indústria cultural e sociedade. São Paulo: Paz e Terra, 2002. 

COELHO, Teixeira. O que é Indústria Cultural. São Paulo: Brasiliense, 1996.

PORQUE ESCREVO ( Fernando Canto)

Fernando Canto

Escrevo porque o ato de escrever é aprendizado “imparável”, constante, é forma de enclausuramento voluntário, evocação de mistérios que instigam a (re)criação da (i)realidade. É como navegar, no dizer de Pessoa. Mas necessariamente, contatar o estranho, rir do absurdo e ultrapassar barreiras que o real não permite. O escritor tem passaporte para qualquer lugar porque escrever é processo conduzido pelo voo imaginativo. É flecha, é corredeira, é bólido que tem destinação. É paradoxo porque cada frase sua pode ser recriada ou refeita pelo leitor.

Escrevo porque posso fotografar na minha mente formas, ambientes e personagens; diluir e transformar sonhos e expressar várias visões de mundo através deles.

Escrever é ato libertário. Deve-se escrever para ser lido, óbvio, mas, sobretudo para ser debatido, criticado, odiado, amado; para provocar reações e sentimentos diversificados. Escrever é como produzir fluidos no corpo e fazê-los sair pelos poros da alma.

Meu comentário: Texto curto e porreta. Sempre digo que o Fernando Canto é genial. Grande Barba!

Os sinais de pontuação mais estranhos que existem

por Fabio Bracht

Interrogações, exclamações e reticências são ferramentas básicas de comunicação. A frase anterior usou uma vírgula e um ponto final e não teria como existir sem eles. Mesmo que você não escreva por profissão, esses sinais gráficos são tão necessários quanto parafusos e dobradiças, já que interligam nossas ideias.

Mas existem alguns sinais gráficos praticamente não utilizados. São ferramentas de comunicação para usos tão específicos que nunca se popularizaram. Alguns deles injustamente, na minha opinião. Imagina que legal ter um ponto para deixar claro que o que você escreveu deve ser entendido como sarcasmo? Pouparia muita confusão.

Asterismo ( ⁂ )
Nós mesmos aqui no PdH vivemos usando este símbolo, mas em sua versão simplificada. Ele serve para separar diferentes seções de um mesmo texto, mas sem a necessidade de usar um subtítulo.

Por ser um símbolo muito específico e de uso restrito, provavelmente as pessoas começaram a ficar com preguiça de usá-lo e ele foi abandonado em favor do uso de três asteriscos um ao lado do outro ( * * * ), ou mesmo outros sinais equivalentes. Literalmente qualquer forma de se iniciar uma nova ideia dentro de um texto sem usar um subtítulo ou uma quebra de capítulo é equivalente ao uso do asterismo.

Obelisco ( † )
Chamado de “dagger” em inglês, o que significa “adaga” e é um nome muito mais do caralho, o obelisco simboliza morte. É provavelmente o mais conhecido dessa lista, usado sempre que alguém morre, para indicar o ano da morte (nesse caso, o asterisco é utilizado para indicar o ano de nascimento).

Mas, além desse uso comum, o sinal também é usado em muitos outros contextos. No dicionário de inglês Oxford, por exemplo, é usado ao lado de palavras obsoletas, extintas. Em notações de xadrez, é usado para indicar uma jogada que resultou em xeque – a jogada do xeque-mate é indicada por um obelisco duplo ( ‡ ).

Em algumas publicações, é usado também para indicar uma nota de rodapé. Esse uso não tem nada a ver com morte, pra variar.

Indicador ( ☞ )
Não é apenas um desenho inútil do Wingdings. Um símbolo esquisito e ao mesmo tempo tão familiar. Era tão utilizado quanto qualquer outro símbolo de pontuação entre os séculos 12 e 18, mas caiu em desuso com o início da imprensa por ser muito largo, dificultando a fabricação do seu tipo móvel, e também por ser complicado de escrever à mão.

De significado bem óbvio, serve para chamar atenção ao texto que vai à sua direita. Em obras acadêmicas, às vezes é utilizado para indicar outras obras de referência, e também em algumas histórias em quadrinhos é usado para indicar que a história continua no verso da página atual.

Interrobang ( ‽ )
Sem muito mistério: significa exatamente o mesmo que uma interrogação ao lado de uma exclamação.

Só me pergunto qual foi o motivo que levou alguém a achar que era necessário criar um símbolo especial para esses casos. Tipo, por quê?!

Sarcmark ( )
Este é o sarcmark. Ele não gosta de você, mas vai dizer que você é o máximo. Isso porque é um símbolo feito para indicar sarcasmo.

Digo que ele foi “feito”, e não “é usado”, porque ele de fato… não é usado. O Sarcmark foi proposto não por escritores, filósofos ou linguistas, mas sim por uma empresa, querendo capitalizar em cima do fato de que a nossa geração é cada vez mais propensa a se comunicar ironicamente – algo que, sabemos, não funciona lá muito bem por escrito.

Boa ideia, péssima execução. O símbolo só existe como uma imagem, não como um caractere de texto, e ainda quiseram cobrar U$2 para quem quisesse “baixá-lo”.

É uma pena. Seria útil.

Sinal de conclusão ( ∴ )
Usado em matemática e às vezes como abreviação em textos, este símbolo indica uma… conclusão. (Odeio quando os nomes das coisas estragam a explicação que eu teria que dar sobre elas.)

Há também o símbolo inverso ( ∵ ), chamado de “porque”, que é usado como premissa para a conclusão. Alguns exemplos:

∵ x+1 = 6 | Porque x+1 = 6
∴ x = 5   | conclue-se que x = 5

∵ Fulano é um homem     | Porque Fulano é homem
∵ os homens são mortais | e porque os homens são mortais
∴ Fulano é mortal.      | conclue-se que Fulano é mortal.

∵ Não achei mais bons símbolos estranhos
∴ a lista desse artigo acabou.

FABIO BRACHT
Toca guitarra e bateria, respira música, já mochilou pela Europa, conhece todos os memes, idolatra Jack White. Segue sendo um aprendiz de cara legal. [Facebook | Twitter]

Texto paidégua sobre Macapá: Latitude 0° na capital do meio do mundo

Por IGNÁCIO DE LOYOLA BRANDÃO – O Estado de S.Paulo

MACAPÁ – Equilibro-me sobre fina barra de ferro, tentando manter-me em pé. Estou em uma situação curiosa. Não estou em lugar nenhum. Claro que é força de expressão, caminho na latitude 0º, é o que leio na placa aos meus pés. Se cair para a esquerda – meio da tarde, estou de costas para o sol -, penetro no Hemisfério Norte. Se cair para a direita, toco o Hemisfério Sul. Tênue linha divide o Brasil, a Terra. Subitamente, não estou aqui, equilibro-me sobre os trilhos de minha infância, quando o desafio era não cair, era manter-se de pé sobre estreita língua de aço.

Latitude 0°. Marco Zero da capital do Amapá, que indica a passagem da linha do Equador. Nos dias do equinócio, bianual, março e setembro, o sol atravessa um círculo em um monumento de concreto e acompanha certeiro essa linha. Fronteira que atravessa igualmente o meio do estádio Zerão, levando os jogadores a atuarem um tempo no Hemisfério Sul, outro tempo no Norte. Situação insólita. Grande, diverso e curioso este Brasil. Faltava-me apenas o Amapá para concluir um périplo (epa!) por todos os Estados brasileiros, ao longo destes anos. Fechei o trajeto.

Certo dia, Carla Nobre, poeta, cantadora, se perguntou: “Por que todos têm uma feira de livros, menos o Amapá?” Foi lá e convenceu o jovem governador Camilo Capiberibe, que concordou: “Organize, dou sustentação”. Havia no ar uma certa hesitação. Quem iria para tão longe? Afinal, não se chega a Macapá por rodovia, não há como. É barco ou avião, o que aumenta a excitação. Só duvidava quem não conhecia Carla e os escritores amapaenses e brasileiros contemporâneos. Ela e um grupo de assessore(a)s sorridentes e incansáveis buscaram parceiros e estruturaram a primeira Flap, Feira de Livros do Amapá.

Durante cinco dias, mais de 70 escritores (três internacionais) do Amapá e do Brasil, entre poetas, cronistas, dramaturgos, romancistas, ensaístas, contadores de histórias, se encontraram, conversaram com o público, foram às escolas, autografaram livros, frequentaram oficinas e cafés literários, participaram de mesas-redondas, de rodas de conversas e do Rufar e do Corredor literário. Houve a Tapaina das Palavras, com encontros e autógrafos. Tapaina é palavra indígena, da tribo dos vajãpis, e significa habitação.

Cada começo de noite, num palco ao ar livre, havia poetas e cantadores. Qual o diferencial da Flap? Ela é aberta, tudo é gratuito, a população participa. E como! Foi o maior ti-ti-ti. Era difícil circular pela feira de livros, sempre congestionada. Gente curiosa, gente feliz, gente a nos fotografar, a pedir autógrafos, a perguntar.

O governador injetou R$ 90 mil em vale-livro e o que se viu foi estudante (e professor) por todo lado com o vale na mão, comprando, comprando. (*) Ele e a mulher, a linda Cláudia, passaram todos os dias pela feira, o que me pareceu inusitado; em geral, autoridades desaparecem. Foi mais longe o casal, ofereceu na residência oficial um jantar com pratos típicos para todos os participantes.

Leandro Leite Leocádio, poeta e um dos organizadores da Off Flip, em Paraty, afirmou em seu blog: “A Flap nasceu grande, parece que já tem cinco anos, tudo funcionou azeitado.” Carla Nobre tem “musculatura”, mexe, remexe, leva escritor, organiza, comanda, esbraveja, sorri, vê o que funciona e o que não, acompanhada por um fiel escudeiro, o marido Bené, doce figura. Esta primeira Flap teve como patrona Esmeraldina dos Santos, poeta e escritora quilombola.

Macapá é cidade quente, arborizada, cheia de praças. O orgulho do povo é ser a única capital brasileira banhada pelo Rio Amazonas. Nem Manaus (Rio Negro) nem Belém (Rio Pará) podem ostentar o título. De margem a margem são 17 quilômetros, o que deixa embasbacado (epa!) um paulista como eu. As águas são pontilhadas por ilhas. Soube que são milhares! Imperdível – e necessário – é comer o camarão no bafo com açaí, mais farinha d’água e farofa, nos fins de tarde, à beira-rio. E deixar espaço para enfrentar o peixe ao molho de leite de coco, ou a maniçoba (a feijoada deles), o pirarucu crocante, o tucunaré grelhado ao creme e banana. Não esquecer de acrescentar pingos de tucupi com pimenta. Falando em tucupi, aqui também se come o pato nesse molho. Há ainda o charque, o tacacá, o tucunaré na chapa com leite de castanha, o filhote, o tambaqui, o gurijuba, a dourada e o matrinchã. Uma semana para experimentar todos. Caminhando pela orla, deparamos com vendedores de roletes gelados de cana.

Cuidado com o que ouve e com o que fala. Algumas dicas são necessárias. Se alguém disser que você é panema, saiba logo que está dizendo que você é paradão, abestado. Praticamente o mesmo que pomba-lesa. Se disserem fanchião, saiba que é vencedor, gabola, metido a besta. Fona quer dizer o último, insiguerado é viciado. Istórdio é ressaca, ficar doente. Jarana é o mão-de-vaca. Donzela é um tipo de bolacha, enquanto “dor de viado” é uma dor na altura do umbigo, por causa ao cansaço.

Capô de fusca é mulher que tem a genitália avantajada. E quando alguém ao seu lado comentar xilis-zire, saiba que disse: deixe eles irem. Só tome cuidado com a pissica, ou má sorte, mau agouro, azar. E olhe meu conselho: não saia de Macapá sem antes tomar uma boa gengibirra gelada. Quanto mais toma, mais disposto fica.

Chamada capital do meio do mundo, Macapá tem uma estátua de São José, padroeiro da cidade, colocada no alto da Pedra do Guindaste. Embaixo dessa pedra mora uma cobra grande que bebe a água do rio, de modo que as águas não sobem. Se a cobra for tirada dali, o Amazonas cresce, sobe e inunda a cidade.

(*) Aproveito para mostrar minha indignação. Diante de gestos como esse, de alguém que entende o papel do livro e sua importância, lembro que na semana passada fui a Itapeva, para a Feira de Livros, organizada com imenso sacrifício por um grupo e praticamente sem verbas. Procurada, a secretária de Educação desdenhou oferecendo nada mais nada menos que mil reais. Uma esmola. Depois, ela foi à abertura e falou da necessidade de feiras e foi fotografada. Nas mãos de gente assim está a educação em muitos lugares do Brasil.

Ainda nem é de manhã


Eu nem tinha caneta nem papel pra começar isso. Já era de manhã quando iniciei, após me levantar da cama sem ao menos ter dormido um segundo. Entre anseios, problemas, inquietações e virgulas, meus pensamentos corriam mais que um atleta queniano, mas minha vontade de redigir em um papel estava mais morta que as pernas de stephen hawking. No meio dos pré-socráticos, camisinhas, copos sujos, um disco de uma banda punk que não gosto e um livro costurado de um amigo, encontrei minha vontade perdida. Já nem sei que horas são, daqui onde estou não dá pra ver a luz, pois o vizinho tapou a janela colocando uma parede, maldito vizinho, se pudesse o matava. Minha cabeça faz mais barulho em meio ao silêncio dessa casa. A dicotomia do sim e do não duelam entre o café fervendo. Os pensamentos conflitantes me incomodam mais que panelas das donas de casas acordando. Se eu tivesse algo pra me orgulhar não estaria escrevendo, ainda não sei o que é vencer, nem chegaria ao pódio com essa letra feio e um texto sem nexo com pontuação incorreta. Ontem um briga, camas separadas, falsos sorrisos, a tristeza nunca escreveu nenhuma mentira, mas eu já menti. Ainda é de manhã e eu nem dormir, mas a única coisa que quero é acordar pra alguma coisa e voltar ao mesmo lugar pra repousar.

10 Argumentos básicos para você encarar um dilema de forma humana (Millor)


1. Meu amigo, acho que suas conclusões são perfeitamente discutíveis. 

2. V.Ex. está enganado; as estatísticas provam exatamente o contrário. 

3. Ora, as estatísticas não provam coisa alguma! 

4. Confesso que também já pensei dessa maneira. 

5. O senhor está sendo deliberadamente parcial. 

6. Bem, isso é uma maneira pessoal de ver as coisas. 

7. Aparentemente o senhor está certo. Mas as aparências enganam. 

8. Encarando as coisas desse modo chegaremos à conclusão que quisermos. 

9. Mas está claro que esse não é um ponto de vista científico. 

10. Só para encerrarmos a discussão: acho-o uma besta quadrada.

Millor Fernandes  

TEATRO DE CONFLITOS

Texto de Fernando Canto


Enganam-se os que pensam que a área geográfica onde se situa o Amapá nunca tenha sido palco de lutas sangrentas pela conquista da região amazônica. Durante séculos espanhóis, holandeses, franceses e ingleses tentaram se fixar na região visando principalmente a foz do rio Amazonas, caminho esse extremamente protegido pelos portugueses que fundaram suas bases militares e comerciais desde o início do século XVII. Segundo Cristóbal de Acuña, o autor de “Novo Descobrimento do Rio das Amazonas”, que na expedição de descimento de 1639 foi o escrivão dessa viagem comandada por Pedro Teixeira, um anseio no coração de Francisco Orellana o fez entregar-se a uma viagem às correntezas desse rio. 

Foi no ano de 1540 que esse episódio se sucedeu, tendo o rio recebido o nome do seu descobridor. Contente, o rei Carlos V, da Espanha deu-lhe as terras da região denominando-as de Adelantado de Nueva Andaluzia, tendo ordenado que dessem a ele três navios com tripulação e tudo o que fosse necessário para que voltasse ao local e o povoasse em seu régio nome. Mas sua tripulação não teve sorte. Foi morrendo no meio do caminho. Quando chegou aqui teve que abandonar os navios e construir lanchas. É provável que tenha morrido lutando contra os índios locais.

Em 1623, após combater estrangeiros e índios e destruir a fortaleza de Gurupá, o Capitão-Mor Bento Maciel Parente vai combater na “ilha dos Tucujás”, lugar que Antonio Baena acredita ser a costa de Macapá, onde há muitos anos habitavam os índios Tucujus. Entre os eventos dessas batalhas o autor de “Compêndio das Eras da Província do Pará” narra que uma nau de porte em socorro dos batidos surge no rio, próxima da área dos combates: 

Marcha imediatamente o Capitão-Mor com as forças: ataca a nau ao raiar do dia, e de tal maneira que os inimigos não querendo ser aprisionados praticam o último arrojo a que pode chegar a extrema desesperação, lançando fogo ao navio, o qual como matéria tão disposta é tragado brevemente pelo incêndio, e tudo o mais que no seu bojo encerra, menos um rapaz, que arremeçando-se ao mar obtém salvamento”.

No ano de 1630 corre no meio do povo do Pará que os holandeses, coadjuvados por 500 ingleses estão “fazendo assento na ilha dos Tucujus”. E em janeiro de 1631 o capitão Jacome Raimundo de Noronha, com 36 canoas bem guarnecidas de fuzilaria e frecharia chegam ao local. É feito o ataque e todas as medidas tentadas pelos inimigos são neutralizadas. Baena diz que “No dia da última peleja quando a noite no céu todo espalhava as pardas sombras foge em um lanchão e duas canoas a maior parte dos adversários com seu chefe Thomas, homem acreditado pelo seu valor nas campanhas da guerra de Flandres: e rendem-se com promessa de lhes salvar as vidas os que não desampararam o Forte: o qual é demolido até os alicerces”.

Feliciano Coelho, filho do governador e Capitão General do Maranhão e Grão-Pará, Francisco Coelho de Carvalho, que chega a Belém revestido da autoridade de Vice-gerente do governador logra várias vitórias em pouco tempo: Reforça Pedro da Costa Favela no combate a ferozes ingahibas insulanos da foz do Amazonas. Na noite de 9 de julho de 1632 o Capitão Pedro Baião de Abreu ataca os ingleses no forte Camaú, construído por eles aos pés dos fortes Torrego e Felipe, demolidos pelos portugueses. Os soldados se rendem, mas o comandante Roger Fray, que estava regressando da foz do rio à espera dos 500 homens de Londres é abordado pelo Capitão Ayres de Souza Chichorro, que sob as ordens de Feliciano Coelho, ataca a sua nau “desferindo sobre ele golpes tão poderosos que lhe levam de remate a vida”. (A.Baena). No ano seguinte é avistado o navio que Fray esperava.

Ao longo do tempo, inúmeros outros conflitos são descritos em correspondências oficiais, principalmente ocorridos entre portugueses e estrangeiros, estes que em 150 anos antes da fundação de Macapá não lograram êxito em suas conquistas.

Baena, o historiador, também foi governador interino da Praça de Macapá em 1821, na Província dos Tucujus, o mesmo lugar que chamara de “theatro constante de bellicos conflictos”.

O grande silêncio, por Luis Fernando Veríssimo


É sempre bom investigar a origem dos fatos e das palavras. Você pode descobrir coisas surpreendentes. Por exemplo: o final abrupto de uma frase de jazz moderno, vocalizado, soava algo como “be-ree-bop”. É daí que vem o nome do novo estilo de tocar jazz, “bop”.

O “biribop” foi usado numa música brasileira que falava da influência do novo jazz no samba — “eba biribop”, lembra? — e não demorou para que o “biribop” do samba se transformasse em “biriba” e acabasse sendo o nome do cachorro mascote do Botafogo, segundo alguns um dos maiores responsáveis pela boa fase do time na época — e nome de um jogo de cartas.

Hoje quem joga biriba (ainda se joga biriba?) não desconfia que tudo começou nos clubes de Nova York, onde alguns músicos faziam uma revolução que não tinha nada a ver com o baralho.

A procura de origens pode levar por caminhos errados, é verdade. Ainda no campo da música: quando a bossa-nova começou a ser tocada nos Estados Unidos uma das curiosidades dos nativos era o significado do termo “bossa”.

Quem procurou num dicionário leu que “bossa” era a protuberância nas costas de um corcunda, não podia estar certo. Aí alguém se lembrou de um LP gravado pelo guitarrista Laurindo de Almeida nos Estados Unidos anos antes, junto com três americanos, um saxofonista, um baterista e um contrabaixista, que incluía ritmos brasileiros. E surgiu a teoria que o disco do Laurindo de Almeida teria sido muito ouvido no Brasil e a marcação do baixo nos sambas muito impressionara os músicos locais.

Claro, “bossa” era uma corruptela de “bass”, contrabaixo em inglês. Tudo esclarecido. (Não foi a única injustiça que fizeram com o João Gilberto, o verdadeiro criador da batida da bossa. Ainda inventaram que ele roubara o jeito de cantar do Chet Baker.)

Mas tudo isto, acredite ou não, tem a ver com o mensalão. Ouvi dizer que a origem do esquema que está sendo condenado no Supremo é uma eleição em Minas que envolveu alguns dos mesmos personagens de agora, só que o partido favorecido foi o PSDB.

Se a origem é esta mesma, ou — como no caso da origem da bossa-nova — há um mal-entendido, não sei. Mas não deixa de surpreender a absoluta falta de curiosidade, da grande imprensa inclusive, sobre esta suposta raiz de tudo. Só o que há a respeito é um grande silêncio.

O barulho com o esquema precursor mineiro ainda está por vir ou o silêncio continuará até o esquecimento? É sempre bom investigar a origem dos fatos e das palavras. Inclusive porque dá boas histórias.

*Dica do amigo Ricardo Ribeiro. 

Dona Joaquina Jacarandá: os 60 anos da mestra de Mazagão Velho


Uma mulher abnegada. Uma senhora que se devota em nome da fé e da cultura de Mazagão Velho. A mestra da terra de São Tiago. Uma pessoa capaz de representar como poucas a simplicidade e simpatia da comunidade que atravessou o Atlântico.

Neste dia 31 de agosto, dona Joaquina da Silva Jacarandá completa seis décadas de vida. Ela é filha de um casal pioneiro da velha Mazagão: dona Olga Jacarandá, hoje com 101 anos de idade, e seu Acendino Jacarandá, que já partiu para o Plano Astral. Das várias irmãs, “Tia Joca”, como é conhecida pelos muitos amigos e admiradores, é a única que abraçou com afinco o legado de dona Olga: cuidar das festas religiosas da igreja de Nossa Senhora da Assunção.

Dona Joaquina pode ser descrita como uma síntese da fé e da cultura do povo mazaganense. É foliã de São Gonçalo, devota da Padroeira, Nossa Senhora da Assunção – e dedica atenção especial à igreja que leva o nome da Santa – é uma das principais organizadoras da parte religiosa da Festa do Divino Espírito Santo, em agosto, e mestra do premiado Cordão das Pastorinhas. Mas, claro, dança e se diverte quando se junta às amigas nas rodas de marabaixo e nas poucas festas que vai.

É cena comum dona Joca iniciando os cânticos religiosos entoados nas missas e novenas em Mazagão Velho. E essa voz também já foi emprestada para a gravação dos diversos CD’s que eternizam o batuque e o marabaixo mazaganenses, além de presença constante nas apresentações dos grupos em Macapá.

Por falar em São Tiago, durante o mês de julho, dona Joaquina abre mão de ficar ao lado da família para se dedicar com esmero à preparação de nossa maior manifestação cultural. Está sempre à disposição para colaborar para que o festejo do Glorioso saia o melhor possível. Também demonstra simpatia e bom humor invejáveis para dar informações e depoimentos aos visitantes.

Aliás, que sorriso capaz de irradiar alegria! Desde garoto, não lembro de ter visto dona Joaquina mau humorada, aborrecida. Ou ao menos demonstrando isso. E é dessa forma singela e carinhosa que sempre cuidou do marido, José da Conceição (Zé Cardinho), dos filhos André Luiz, Ana Luiza e Nazaré Jacarandá, dos muitos filhos de coração e dos netos Eduardo e Anderson; talvez seja dessa energia positiva que tire fé e forças para lidar com a perda do primeiro neto, Aluísio Neto, que ainda criança foi chamado por Deus.

Joaquina da Silva Jacarandá se traduz em uma linda figura humana. Se traduz em amor, fé, em uma supermãe, super avó, super irmã, super tia, super sogra, enfim, uma super amiga. É amada e respeitada, uma unanimidade em Mazagão Velho. Tanto que os amigos e familiares reúnem para festejá-la, numa noite que promete muita surpresa e emoção.

Mais do que homenagear dona Joaquina, a ocasião é para agradecê-la. Peço licença para falar em nome da comunidade de Mazagão Velho e dizer “obrigado” à dona Joca, por tudo o que já fez e ainda vai continuar fazendo em nome da nossa identidade, nossa fé e nossa cultura. Parabéns, mestra Joaquina, pelos seus 60 anos!

Gabriel Penha – Jornalista