MACAPÁ: 200 MIL AÇOITES – Por Fernando Canto #Macapa265Anos

Foto: Juvenal Canto

Por Fernando Canto

Neste 04 de fevereiro de 2022 Macapá faz 265 anos. Aproximadamente 200 mil marés do Amazonas lhe fustigaram a orla desde a fundação até hoje, contando parte dos anos bissextos.

Por obra e graça de Ianejar este lugar é o produto da eterna luta entre o rio e a terra, ambos iluminados pela luz do equador no meio do planeta em movimento, onde a lua rebrilha o surgimento de mistérios e suscita mitos e lendas. E aqui mesmo a Mairi construída pelos homens e mulheres resiste às chibatadas d’água.

Macapá é uma terna fonte vinda do oco da terra sob a energia radiante dos solstícios e equinócios e da oscilação do efeito coriolis. Aqui as espirais de água e vento giram em sentidos contrários, sempre conspirando em diálogos contínuos.

Foto: Manoel Raimundo Fonseca

Aqui somos seres a-sombrados pelo sol iridescente, cujos raios incidem sobre nossas cabeças no pino dos equinócios. Daí vem a luz que necessitamos a cada seis meses para que renovemos nosso amor por esta terra, convictos que somos de sua correspondência manifestada nas ondas das marés lançantes, ainda que seus governantes costumeiramente lhe neguem o amor que ela tanto necessita para se tornar mais bela e aconchegante.

Quisera que as 200 mil marés desse período não só lhe açoitassem a terra, mas que fossem adentro de seu corpo e penetrassem o coração e a alma para que seus habitantes, num ímpeto de emoção, bebessem sua água represada e transformada em nascente de amor e gratidão para sempre.

Foto: Juvenal Canto

Quisera que os 200 mil açoites servissem também para que não esquecêssemos da cruel colonização e da pele sofredora dos escravizados que deram o sangue e a vida para que ela e suas construções permanecessem no tempo e se tornasse um ícone da Amazônia.

Depois disso ela será, então, a bilha que saciará nossa sede à sombra de uma fortaleza, protegida por um santo e lavada pelas águas do rio mais belo, sempre abraçada e beijada por todos os que lhe querem bem.

Foto: Renato Ferreira

BILHA QUE ME SACIA A SEDE

Não morro mais de banzo
Nem sofro nos silêncios.
Nem choro por espiralados ventos de memórias.
Sou como fui sempre, parte da tua angústia, Macapá
E peça-carne do teu sofrimento.
Vínculo de ferro/elo de candura
Âncora/ferrugem/tempo oxidado
Limo esverdeado, se me queres
Pronúncia silabada que sepulto
Em teu armazém de água:
– Bilha viva e intransportável
Que me sacia a sede
À revelia do baque do cipó timbó
Que me cicuta artérias
Que nada sei, eu sei.

Apenas venho inaugurar silêncios
Romper murmúrios e espúrios sons
E desnudar-me diante de ti
Antes de fundir-me em ti em espírito.

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